segunda-feira, dezembro 03, 2018

EDUARDO GALEANO, STÉPHANE GRAPPELLI, SARAH MEYOHAS & ALDEIA UNIDA PELO PARQUE


APONTAMENTOS DE VIAGEM – Imagem: arte da artista visual franco-americana Sarah Meyohas. - Uma vez, duas, mil vezes às ruas da cidade e o meu país é estampa corroída, como um dia e outro nunca na ironia do calendário. Olho e não me perco, apesar da travessia. O mundo cresce e todos morrem um dia, como se o canto vivo fosse reunião dos mortos que renascem e nem se sabe como outro dia o susto ressurreto, como se não tivessem existido e nada acontecesse. Agora ali na porta está o luto das imundícies, uma herança vil do ouro puro e sem sangue que tantos amofinam e não aguentam mais a vida soterrada nos cadernos das contas com seus medos de balas e bigodes, esparros e estultices. Porque no céu deles não existe nada e intranquilos temem, só sabem temer e temem, aliás, por eles mesmos, por serem eles mesmos fabricantes do terror e temem carrascos que também se tornam vítimas um dia e se quebram como um bisqui, vísceras e intestícios, e não restará nenhuma ameaça no pó, a poeira de cinza perecível, erosões, tremores: o vento arrasta tudo, a água lava tudo, o fogo queima tudo, a terra enterra tudo. E o poema errante e perdido entre tesouros desmoronados, desposses do inútil na estirpe de órfãos e matricidas com olhos que doem escancarados. Tudo pereceu ao meio dia e perderam os que queriam das asas da serpente ao topázio do rancor, as moedas do sol, o lugar incalculável com telhados estéreis, tudo desabado ao redor na pena instransferivel da sorte calcinada de minha pátria desfeita e a horrenda desgraça de quem desconhece a gratidão de quem agradece, o perdão de quem perdoa, o amor de quem ama. Só o meu canto vive ardente e fragrante com as pequenas e supremas celebrações do véu da luz ao caminhante cego que acha meu poema infiel, nunca foi, nem pode ser. Só o canto da viagem leva o peso dos golpes. Não há ninguém nem mel nas mãos, a lembrança é um relâmpago e chega para que eu cante na torre da tristeza e sorrio, passo a passo, voando com o vento para quem só tem para guardar os ossos. Tudo se move e eu conheço o movimento eterno do mar porque sou a chuva e não sei de muro, cercas, arames, fronteiras, a minha duradoura solidão como pungente violão alimentando amores e adeuses de desterrado: o destino não existe, o acaso inexiste. Na ausência da minha rua, passou o passado e o cofre vazio na paz profunda do elefante. O coração lateja de outro jeito, aos farrapos, ensanguentado, troando forte para retumbar no canto construído de uma estrela que brilha no céu de ásperos dias e duros tempos, na dor do esquecimento para quem não esqueceu entre cicatrizes e castigos: um homem entre a semente e o pó, a carta da mulher amada e o grande beijo nos lábios dela. Saúdo a solidão e beijo o abismo dos antigos sonhos, uma rosa na tempestade colhida ali onde nasci, uma pedra na primavera. Vou embora e me despeço de tudo e de todos, vou com meu violão e o canto a fundar todo dia a esperança e a flor do sorriso paratodos. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

DITOS & DESDITOS:
Um homem da aldeia de Neguá, no litoral da Colombia, conseguiu subir aos céus. Quando voltou, contou. Disse que tinha contemplado, lá do alto, a vida humana. E disse que somos um mar de figueirinhas. — O mundo é isso — revelou — Um montão de gente, um mar de fogueirinhas. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos são bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo.
O mundo, extraído da obra O livro dos abraços (L&PM, 1991), do jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano (1940-2015). Veja mais aqui.

A ARTE DE SARAH MEYOHAS
A arte da artista visual franco-americana Sarah Meyohas.

AGENDA:
Aldeia Unida pelo Parque & muito mais na Agenda aqui.
&
Eu xexéu & Quintana passarinho, Carlos Drummond de Andrade, Hermilo Borba Filho & Virginia Gisele Carvalho, Victor Hugo, Djanira Silva. A multidão e o comum de Antonio Negri, Luiz Felipe Pondé, São Caetano, Rosana Paulino & Lori Shorin Clay, Sônia Mello & Ricardo Machado aqui.
&
É sim e como é que não pode, Josué de Castro, Thomas Mann, Autran Dourado, Jessier Quirino, Teatro de Pernambuco, Carlos Alberto Fernandes, Venturosa, Barbara Heinisch, Maria Callas & Toninho Horta aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje curta na Rádio Tataritaritatá a música do violonista francês de jazz, Stéphane Grappelli (1908-1997): Live in San Francisco, Umbia Jazz Festival, In Tokyo & com Baden Powell – La grande reunión & muito mais nos mais de 2 milhões & 900 mil acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja aqui.




HIRONDINA JOSHUA, NNEDI OKORAFOR, ELLIOT ARONSON & MARACATU

  Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Refúgio (2000), Duas Madrugadas (2005), Eyin Okan (2011), Andata e Ritorno (2014), Retalho...