CARMENCITA CAI NO FREVO! – (Imagem: acervo ArtLAM). Alô, alô! Quem vem lá? Tô chegando! Achegue-se!
Ô de casa! E invadia porta adentro acordando defuntos e desafetos! Que mocreia
é essa? Pra quem não se lembra era aquela aquariana festeira desde que nasceu sob
o signo do carnaval. Quem? Oxe, a menina assanhada que andava feito menino de
bodoque, chimbras e golpes, pronta para estapear o primeiro intrometido que lhe
atrapalhasse as jogadas e ousadias. Oxe! Isso mesmo, lembra não? Ela corria solta
pelo campinho atrás de bola, aos dribles sobre os peladeiros e comemorando gols
e jogadas. Danou-se! Ela se atrepava em qualquer pé de planta, subia pau-de-sebo
e desafiava até marmanjos aos punhos cerrados. Isso é um buruçú! Cruz-credo! Parentes
arredios insinuavam língua nos dentes: Vai ser uma sapatona deslavada! E ela: Que
é isso? Eu gosto é de banana! Será o fim do mundo? Era mesmo, havia quem
duvidasse; mas ela fez de tudo e chegava ali moça feita, de volta dum convento,
desistindo de vez de ser freira. Pronto! Chegava com a boa nova: a garantia de
um emprego de chapeleira. Isso é um trubufú! A felicidade fê-la dançarina ocasional
e cheia dos balangandãs, como quem queria se tornar a musa de Bizet e famosa
como a Pequena Notável. Destá. Que troço é esse? E lá ia embalada com com
aquela boca graciosa pela sinuosidade de seus lábios salientes realçados no
sorriso arredondado pelas barroquinhas nas bochechas, herdadas do pai barbeiro aboletado
pigarreando na sala da pensão de dona Emília. Hum! Assim passava os dias
cantando sorridente e logo aprendeu a fazer todo tipo de coisa para realçar-lhe
o penteado, chamando atenção de todos. Vixe! Queria era ser cantora do rádio,
brilhando no palco e fazendo pose nas telas dos cinemas, a desfilar exótico
figurino como se fosse uma bomba tão explosiva de estrondar até na televisão: O
que é que a priquita tem? Baixa o facho, menina, segura o fogo no rabo! Essa tem
um calor danado na bacurinha! Tem nada! Sou da banda escura da lua, viu?
Brinque não! Quero é chegar lá na calçada da fama, tá! Segura o baruncuntum! Agora
deu! Eu dei, ai, ai, ai! Como é? Ah, Iaiá-ioiô, Mamãe eu quero! Era a Bonequinha
de seda gingando no bamboleô, segurando o pirulito pro seu show no tabuleiro da
baiana! Rebola, bola! Tico-tico no fubá! Que coisa é essa? E era Rosita ou Marina,
quando não Dorita, ou era Chiquita ou Chita, ou outra Carmelita e até Michelle e
tantas pelas cinco estações do ano. Vôte! Saía na batucada feito uma boneca de
pixe: Taí, meu! Isso é pra você gostar de mim, ora! E aí se engraçava dum vira-lata
qualquer pra botar na casinha embaixo dum arlequim de bronze. E pulava, corria,
frevava e seguia noite adentro, dia afora. Até certa noite viu-se enfeiada:
cruzes! Teve um piripaque lá nela, chega cair no corredor com o que vira no
espelhinho! Babau! Que nada, o mundo não se acabou. Ninguém nem esperava e lá reaparecia
ela rediviva, tão altiva quanto escandalosa: Sou Carmencita Mirandolinda, um
vaso ruim de quebrar! Festê gente, vambora! E caiu no frevo que ela não é besta
de perder! Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
DITOS & DESDITOS - Tenho certeza de que não vivemos nada. Fizemos o nosso trabalho
e podemos deixar o mundo para trás com a opinião de que fizemos melhor do que o
encontramos. As mulheres em breve
terão poder político. O sufrágio feminino e a
paz permanente caminharão juntos. Quando um país está
disposto a conceder o voto às suas mulheres, é um sinal de que esse país está
maduro para uma paz permanente. As mulheres não se
sentem preparadas para a guerra como os homens. Elas são as mães da raça. Os homens pensam nos
resultados económicos, as mulheres pensam na tristeza e na dor.
Pensamento da médica e sufragista neerlandesa Aletta Jacobs (1854-1929)
ALGUÉM FALOU: Gosto muito dos aplausos de uma plateia, seja esta qual for. Gosto de
toda a gente e adoro as reuniões festivas. Vivo de alegria. Uma bunda pode ser
tão atraente, tanto no homem, como na mulher. É realmente linda, como um rosto
de criança. Detesto homens sem bunda, desses com a calça solta no corpo. Eu
desmereço os artistas que dizem que não é preciso ganhar um prêmio para ter seu
talento reconhecido. Se eu fosse uma verdadeira atriz (Sou apenas uma
intérprete) eu daria tudo de mim para ganhar um Oscar, ainda mais sabendo que a
Academia é uma instituição formada por pessoas que realmente entendem do
assunto. Não é certo nem verdadeiro, que eu tenha afirmado nos Estados Unidos a
minha nacionalidade, sou brasileira, porque aqui me encontro desde a idade de
um ano; e nesta terra me eduquei e fiz minha carreira artística. É ao povo
brasileiro — aos meus patrícios — que devo todo este incentivo, todo este
aplauso, todas estas homenagens. E não ha, sequer, uma entrevista minha, em
qualquer órgão de imprensa, em que não tivesse sempre reafirmado,
categoricamente, este meu amor, este meu carinho, esta minha admiração pelo
Brasil. Nasci em Portugal, mas me criei no Brasil e, portanto, considero-me
brasileira. O local do nascimento não importa, nem sequer o sangue. O que
importa é o que os americanos chamam de "environment", a influência
do país e dos costumes em que vivemos, se bem que sempre existe um grau de
gratidão e fidelidade aos pais que nos geraram. Da minha parte, sou mais
carioca, mais sambista de favela, mais carnavalesca do que cantora de fados. O
sangue tem uma certa importância, mas só no temperamento, não na maneira de
sentir as coisas. Pensamento da cantora e atriz Carmen
Miranda (1909-1955). Veja mais aqui e aqui.
ALGUÉM MAIS FALOU - Não importa se se trata de um
documentário ou de ficção. No final, apenas estamos contando uma grande
mentira. Nossa arte consiste em contá-la de forma que se possa acreditar. Que
uma parte seja real e a outra seja uma reconstrução, é a nossa maneira de
trabalhar e o público não se importa. O mais importante é encadear uma série de
mentiras para chegar a uma verdade maior. São mentiras irreais, mas são
verdadeiras de certo modo. Pensamento
do premiado cineasta, poeta, roteirista, produtor e fotógrafo iraniano Abbas
Kiarostami (1940-2016). Veja mais aqui e aqui.
CONHECIMENTO HUMANO - O conhecimento humano tem duas formas: é ou o
conhecimento intuitivo, ou o conhecimento lógico; ou conhecimento pela
fantasia, ou conhecimento pelo intelecto; ou conhecimento individual, ou
conhecimento do universal; das coisas singulares ou das suas relações: é, em
suma, o produtor das imagens ou o produtor dos conceitos [...] uma intuição é a
unidade indiferenciada das percepções do real e das simples imagens do possível
[...] O fato estético foi, em suma, considerado em si mesmo e nas suas
relações com outras atividades espirituais, com o sentimento de prazer e de
dor, com os fatos que se chamam físicos, com a memória e com a elaboração
histórica. Passou diante de nós de sujeito até se tornar objeto, isto é, desde
o momento em que nasce, gradativamente, até o momento em que se transforma
através do espírito em sujeito da história [...] A Estética, como
ciência da expressão, foi então estudada por nós sob cada aspecto. Caso
contrário, ainda teremos que justificar o subtítulo de Linguística Geral, que
acrescentamos ao título do nosso livro; e propor esclarecer a tese de que a
ciência da arte e a da linguagem, a Estética e a Linguística, como verdadeiras
ciências, não são duas ciências distintas, mas uma única ciência. Não que
exista uma Linguística Especial; mas a ciência linguística procurada, a
Linguística Geral, naquilo que é redutível à filosofia, nada mais é do que
Estética. Aqueles que lidam com a linguística geral, ou seja, a linguística
filosófica, lidam com problemas estéticos e vice-versa. Filosofia da linguagem
e filosofia da arte são a mesma coisa [...] As expressões já produzidas
devem voltar às impressões. Quando produzimos palavras novas, geralmente
transformamos as antigas, variando ou ampliando seu significado; mas este
procedimento não é associativo, mas sim criativo, embora a criação tenha como
material as impressões, não do hipotético homem primitivo, mas do homem que
viveu em sociedade durante séculos e que armazenou, por assim dizer, em seu
organismo psíquico muitas coisas e, além dessas, a linguagem [...] Veja,
como prova, a confissão dos linguistas de que realmente não existem leis
fonéticas de hiato, cacofonia, trema, sinérese, mas apenas leis de gosto e
conveniência; o que significa leis de estética. E quais são as leis relativas
às palavras que não são ao mesmo tempo leis de estilo? [...]. Trechos
extraídos da obra Estetica come scienza dell’espressione e linguistica
generale. Teoria e storia. (Laterza & Figli, 1908), do filosofo
idealista italiano Benedetto Croce (1866-1952). Veja mais aqui e aqui.
I NEVER LOST AS MUCH BUT TWICE - Duas vezes perdi tudo \ E foi debaixo da
terra.\ Duas vezes parei mendiga\ À porta de Deus.\ Duas vezes os anjos,
descendo dos céus,\ Reembolsaram-me de minhas provisões.\ Ladrão, banqueiro,
pai,\ Estou pobre mais uma vez! Poema da poeta estadunidense Emily Dickinson (1830-1886). Veja mais aqui,
aqui, aqui e aqui.
OUTRAS TIRADAS MAIS