sexta-feira, junho 27, 2014

EMILY DICKINSON, CROCE, CARMEN MIRANDA, KIAROSTAMI, ALETTA JACOBS & CARMENCITA MIRANDOLINA

 


CARMENCITA CAI NO FREVO! – (Imagem: acervo ArtLAM). Alô, alô! Quem vem lá? Tô chegando! Achegue-se! Ô de casa! E invadia porta adentro acordando defuntos e desafetos! Que mocreia é essa? Pra quem não se lembra era aquela aquariana festeira desde que nasceu sob o signo do carnaval. Quem? Oxe, a menina assanhada que andava feito menino de bodoque, chimbras e golpes, pronta para estapear o primeiro intrometido que lhe atrapalhasse as jogadas e ousadias. Oxe! Isso mesmo, lembra não? Ela corria solta pelo campinho atrás de bola, aos dribles sobre os peladeiros e comemorando gols e jogadas. Danou-se! Ela se atrepava em qualquer pé de planta, subia pau-de-sebo e desafiava até marmanjos aos punhos cerrados. Isso é um buruçú! Cruz-credo! Parentes arredios insinuavam língua nos dentes: Vai ser uma sapatona deslavada! E ela: Que é isso? Eu gosto é de banana! Será o fim do mundo? Era mesmo, havia quem duvidasse; mas ela fez de tudo e chegava ali moça feita, de volta dum convento, desistindo de vez de ser freira. Pronto! Chegava com a boa nova: a garantia de um emprego de chapeleira. Isso é um trubufú! A felicidade fê-la dançarina ocasional e cheia dos balangandãs, como quem queria se tornar a musa de Bizet e famosa como a Pequena Notável. Destá. Que troço é esse? E lá ia embalada com com aquela boca graciosa pela sinuosidade de seus lábios salientes realçados no sorriso arredondado pelas barroquinhas nas bochechas, herdadas do pai barbeiro aboletado pigarreando na sala da pensão de dona Emília. Hum! Assim passava os dias cantando sorridente e logo aprendeu a fazer todo tipo de coisa para realçar-lhe o penteado, chamando atenção de todos. Vixe! Queria era ser cantora do rádio, brilhando no palco e fazendo pose nas telas dos cinemas, a desfilar exótico figurino como se fosse uma bomba tão explosiva de estrondar até na televisão: O que é que a priquita tem? Baixa o facho, menina, segura o fogo no rabo! Essa tem um calor danado na bacurinha! Tem nada! Sou da banda escura da lua, viu? Brinque não! Quero é chegar lá na calçada da fama, tá! Segura o baruncuntum! Agora deu! Eu dei, ai, ai, ai! Como é? Ah, Iaiá-ioiô, Mamãe eu quero! Era a Bonequinha de seda gingando no bamboleô, segurando o pirulito pro seu show no tabuleiro da baiana! Rebola, bola! Tico-tico no fubá! Que coisa é essa? E era Rosita ou Marina, quando não Dorita, ou era Chiquita ou Chita, ou outra Carmelita e até Michelle e tantas pelas cinco estações do ano. Vôte! Saía na batucada feito uma boneca de pixe: Taí, meu! Isso é pra você gostar de mim, ora! E aí se engraçava dum vira-lata qualquer pra botar na casinha embaixo dum arlequim de bronze. E pulava, corria, frevava e seguia noite adentro, dia afora. Até certa noite viu-se enfeiada: cruzes! Teve um piripaque lá nela, chega cair no corredor com o que vira no espelhinho! Babau! Que nada, o mundo não se acabou. Ninguém nem esperava e lá reaparecia ela rediviva, tão altiva quanto escandalosa: Sou Carmencita Mirandolinda, um vaso ruim de quebrar! Festê gente, vambora! E caiu no frevo que ela não é besta de perder! Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.

 


DITOS & DESDITOS - Tenho certeza de que não vivemos nada. Fizemos o nosso trabalho e podemos deixar o mundo para trás com a opinião de que fizemos melhor do que o encontramos. As mulheres em breve terão poder político. O sufrágio feminino e a paz permanente caminharão juntos. Quando um país está disposto a conceder o voto às suas mulheres, é um sinal de que esse país está maduro para uma paz permanente. As mulheres não se sentem preparadas para a guerra como os homens. Elas são as mães da raça. Os homens pensam nos resultados económicos, as mulheres pensam na tristeza e na dor. Pensamento da médica e sufragista neerlandesa Aletta Jacobs (1854-1929)

 

ALGUÉM FALOU: Gosto muito dos aplausos de uma plateia, seja esta qual for. Gosto de toda a gente e adoro as reuniões festivas. Vivo de alegria. Uma bunda pode ser tão atraente, tanto no homem, como na mulher. É realmente linda, como um rosto de criança. Detesto homens sem bunda, desses com a calça solta no corpo. Eu desmereço os artistas que dizem que não é preciso ganhar um prêmio para ter seu talento reconhecido. Se eu fosse uma verdadeira atriz (Sou apenas uma intérprete) eu daria tudo de mim para ganhar um Oscar, ainda mais sabendo que a Academia é uma instituição formada por pessoas que realmente entendem do assunto. Não é certo nem verdadeiro, que eu tenha afirmado nos Estados Unidos a minha nacionalidade, sou brasileira, porque aqui me encontro desde a idade de um ano; e nesta terra me eduquei e fiz minha carreira artística. É ao povo brasileiro — aos meus patrícios — que devo todo este incentivo, todo este aplauso, todas estas homenagens. E não ha, sequer, uma entrevista minha, em qualquer órgão de imprensa, em que não tivesse sempre reafirmado, categoricamente, este meu amor, este meu carinho, esta minha admiração pelo Brasil. Nasci em Portugal, mas me criei no Brasil e, portanto, considero-me brasileira. O local do nascimento não importa, nem sequer o sangue. O que importa é o que os americanos chamam de "environment", a influência do país e dos costumes em que vivemos, se bem que sempre existe um grau de gratidão e fidelidade aos pais que nos geraram. Da minha parte, sou mais carioca, mais sambista de favela, mais carnavalesca do que cantora de fados. O sangue tem uma certa importância, mas só no temperamento, não na maneira de sentir as coisas. Pensamento da cantora e atriz Carmen Miranda (1909-1955). Veja mais aqui e aqui.

 

ALGUÉM MAIS FALOU - Não importa se se trata de um documentário ou de ficção. No final, apenas estamos contando uma grande mentira. Nossa arte consiste em contá-la de forma que se possa acreditar. Que uma parte seja real e a outra seja uma reconstrução, é a nossa maneira de trabalhar e o público não se importa. O mais importante é encadear uma série de mentiras para chegar a uma verdade maior. São mentiras irreais, mas são verdadeiras de certo modo. Pensamento do premiado cineasta, poeta, roteirista, produtor e fotógrafo iraniano Abbas Kiarostami (1940-2016). Veja mais aqui e aqui.

 

CONHECIMENTO HUMANO - O conhecimento humano tem duas formas: é ou o conhecimento intuitivo, ou o conhecimento lógico; ou conhecimento pela fantasia, ou conhecimento pelo intelecto; ou conhecimento individual, ou conhecimento do universal; das coisas singulares ou das suas relações: é, em suma, o produtor das imagens ou o produtor dos conceitos  [...] uma intuição é a unidade indiferenciada das percepções do real e das simples imagens do possível [...] O fato estético foi, em suma, considerado em si mesmo e nas suas relações com outras atividades espirituais, com o sentimento de prazer e de dor, com os fatos que se chamam físicos, com a memória e com a elaboração histórica. Passou diante de nós de sujeito até se tornar objeto, isto é, desde o momento em que nasce, gradativamente, até o momento em que se transforma através do espírito em sujeito da história [...] A Estética, como ciência da expressão, foi então estudada por nós sob cada aspecto. Caso contrário, ainda teremos que justificar o subtítulo de Linguística Geral, que acrescentamos ao título do nosso livro; e propor esclarecer a tese de que a ciência da arte e a da linguagem, a Estética e a Linguística, como verdadeiras ciências, não são duas ciências distintas, mas uma única ciência. Não que exista uma Linguística Especial; mas a ciência linguística procurada, a Linguística Geral, naquilo que é redutível à filosofia, nada mais é do que Estética. Aqueles que lidam com a linguística geral, ou seja, a linguística filosófica, lidam com problemas estéticos e vice-versa. Filosofia da linguagem e filosofia da arte são a mesma coisa [...] As expressões já produzidas devem voltar às impressões. Quando produzimos palavras novas, geralmente transformamos as antigas, variando ou ampliando seu significado; mas este procedimento não é associativo, mas sim criativo, embora a criação tenha como material as impressões, não do hipotético homem primitivo, mas do homem que viveu em sociedade durante séculos e que armazenou, por assim dizer, em seu organismo psíquico muitas coisas e, além dessas, a linguagem [...] Veja, como prova, a confissão dos linguistas de que realmente não existem leis fonéticas de hiato, cacofonia, trema, sinérese, mas apenas leis de gosto e conveniência; o que significa leis de estética. E quais são as leis relativas às palavras que não são ao mesmo tempo leis de estilo? [...]. Trechos extraídos da obra Estetica come scienza dell’espressione e linguistica generale. Teoria e storia. (Laterza & Figli, 1908), do filosofo idealista italiano Benedetto Croce (1866-1952). Veja mais aqui e aqui.

 

I NEVER LOST AS MUCH BUT TWICE - Duas vezes perdi tudo \ E foi debaixo da terra.\ Duas vezes parei mendiga\ À porta de Deus.\ Duas vezes os anjos, descendo dos céus,\ Reembolsaram-me de minhas provisões.\ Ladrão, banqueiro, pai,\ Estou pobre mais uma vez! Poema da poeta estadunidense Emily Dickinson (1830-1886). Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.

 

OUTRAS TIRADAS MAIS

 

Ouvindo a Terceira margem do rio, de Milton Nascimento & Caetano Veloso.

O senhor... mire veja: o mais importante e bonito do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão...
(Guimarães Rosa, Grande sertão: veredas). 

GUIMARÃES ROSA – A descoberta da obra do Rosa foi iniciática. Pelas mãos do poetaprimo, Afonso Paulo Lins, recebi o volume de Sagarana: as sagas de Augusto Matraga, do burrinho pedrês, do marido pródigo, Sarapalha e conversa de bois. Um verdadeiro encantamento: gente, lugares, bichos e lendas. Depois, Primeiras estórias: da terceira margem do rio, de Sorôco, Darandina, Famigerado, pirlimpsiquice, Tarantão e do cavalo que bebia cerveja. Depois, O corpo de baile: de Manuelzão e Miguilim, uma história de amor e campo geral; No Urubuquaquá, no pinhén, com recado do morro e cara de bronze; e Noites do sertão, com Lão-Dalalão (Dão-Lalalão) e buriti. Chegou a vez do grande sertão de Riobaldo e Diadorim: “[...] Por enquanto, que eu penso, tudo quanto há, neste mundo, é porque se merece e carece. Antesmente preciso. Deus não se comparece com refe, não arrocha no regulamento. Pra que? Deixa: bobo com bobo – um dia, algum estala e aprende: esperta. Só que, às vezes, por mais auxiliar, Deus espalha, no meio, um pingado de pimenta...”. E veio Tutameia (terceiras estórias): de Droenha, João Porém, os temulentos, Ripuária e o palhaço da boca verde - “A estória não quer ser estória. A estória, em rigor, deve ser contra a História. A estória, às vezes, quer-se um pouco parecida à anedota”. Foi daí pra Estas estórias: do retábulo de são nunca, do burrinho comandante, do vaqueiro Mariano e o dar das pedras brilhantes. Quando, enfim, Ave, palavra: de Evanira, das coisas de poesia, de Sanga Puytã, Cipango, Sirimin e “[...] Trazia também um violão a tiracolo – acrescentam. E explicam que o violão, para o paraguaio, é arma de combate e ferramenta de lavoura. Se verdadeira, bela é a história, se imaginada, ainda mais”. Esse o João, o Rosa, o Guimarães.  Veja mais aqui e aqui.

 Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

ZEZÉ MOTTA – Primeiro eu vi a atriz na tela de Cacá Diegues do livro de João Felicio dos Santos e na música de Jorge Benjor: Xica da Silva, a negra escrava do Tijuco, alforriada pra vida do contratador de diamantes, João Fernandes de Oliveira. Nessa época eu contava com 16 anos e assisti às escondidas numa sessão lotadíssima no Teatro Cinema Apolo. Depois revi no Vai trabalhar vagabundo, do Hugo Carvana com música de Chico Buarque. E filmes e peças de teatro, até Prazer, Zezé, de 1978: um primor musical. Muitos filmes, muitas músicas. E eu até hoje fã dessa grande atriz e cantora.

SÓSTENES LIMA - Conheci primeiro o Boca de forno: “Meu verso é semente Pra tudo se presta Apara as arestas Exalta bandeiras Nos campos, nas feiras Canais e lagoas Faz odes, faz loas E até elegias Se é bravo e é forte Por que que da morte Da vida o reverso eu não falaria?”. E foi mais ou menos quase meados ou isso mesmo dos anos 2000. Eu acho, sei lá. Só sei que topei com Vestindo a Carapuça e peitei uma entrevista: ele concedeu na hora. Foi aí que conheci, de mesmo, o poeta, músico e blogueiro Sóstenes Lima. A amizade veio com o tempo: shows, Comusa, comemorações. Até a música “Noites de bar” que é uma das minhas prediletas. Pra você, parabéns & sucesso, feliz aniversário.

REJANE SOUZA - A professora universitária Rejane Souza concedeu tempos atrás uma entrevista pra nossa campanha Todo dia é dia mulher. E como hoje é o aniversário, fazemos nossa homenagem aqui.

RAFAEL NOLLI – Acompanho o trabalho literário de Rafael Nolli há tempos e hoje me toquei que nunca comentei a respeito. Agora faço esse registro: ele é autor do Memórias à beira de um estopim (2005) e de Elefante (2012). Entre as coisas que mais gostei no meio de tantas coisas boas que conferi e apreciei do seu blog Stalingrado II, destaco Hefesto/Vulcano: “Era um deus, no entanto. Porém, não o poupavam. “Coxo Coxo Coxo” sussurravam pelas ruas. Nos inferninhos e na boca do lixo o consenso era geral: “feio como um beliscão no cu” “a própria mãe reconhece a merda que fez” & demais despautérios. Entre os seus, em língua grega – ou naquela que lá se fala & tampouco compreendemos –a fama de corno corria aos quatro cantos: “vencido por um amor de espuma” “enfeitiçado pelos olhos de cigana oblíqua...” & coisas do tipo. Distraído, no cômodo do fundo, iluminado pelo fogo da fornalha ele nada ouvia senão o som do martelo malhando o metal” ( do livro "poemas é um péssimo título").

ISABELLE ADJANI – A bela atriz francesa Isabelle Yasmine Adjani sem foi maravilhosamente linda desde que a vi nos filmes como “Camile Claudel”, “A história de Adele H”, de François Triffaut, no “O Inquilino” de Roman Polanski e... muitos: ela aparece, eu aprecio. Ora, ora, sempre linda, hoje completando 59 anos de idade.



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MARIA RAKHMANINOVA, ELENA DE ROO, TATIANA LEVY, ABELARDO DA HORA & ABYA YALA

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Triphase (2008), Empreintes (2010), Yôkaï (2012), Circles (2016), Fables of Shwedagon (2018)...