A DANÇA DE ROSA NA ÓPERA DO CAVALO – ATO 1 – A DANÇA - Imenso salão e lá está ela em
pé de costas, com seu vestido negro, ao som da Sonata para Violino nº 3 –
Melodia e nº 4 Presto, de Béla Bártók. Fita as velas acesas. De repente
tira os sapatos e descalça transita pelo espaço enorme. Então se deita sobre o
frio piso, rola o chão, levanta-se e rodopia, braços abertos com passos firmes
desenvolve uma coreografia inspirada em Anne Teresa De
Keersmaeker. E lá chego na carreira para encontrá-la Fumiyo Ikeda pro nosso pas de deux. E dançamos e rolamos pelo chão e crescemos juntos e
pulo no voo, tiro o paletó e faço o solo para que tenhamos o nosso momento de
ir embora. ATO 2 – A ÓPERA DO CAVALO – Lá
estava ela jogadora de tênis acendendo o cigarro enquanto as bolas rolavam no
piso ao som dos arcordes de Andriessen. O amante à luz noturna
seguia firme, outros acompanhavam enquanto o balé pelas tábuas do piso
rastejava o matadouro sob os olhos da investigadora. Ela expõe o glúteo rebolador
sob a saia curta ao pegar o isqueiro, acendeu o cigarro em tragadas oníricas,
sob o olhar dos supostos jogadores que passavam giz no taco imaginando-a caçapa
da sinuca. À invasão de intrusos ela se desfez da peruca, largou os óculos e as
vestes, seguiu ao estrado para adorar o cavalo do amante. Foi desmascarada e completamente
desnudada sacudiram-na ao sofá. Ajeitou-se aboletando-se às tragadas: pensava naquele
que preferia o cavalo, ignorando-a, enquanto desejava que ele a fizesse sua
égua, adorando-a com o mesmo fervor que dedicava àquela montaria. O sonho dela
nua sob as investidas certeiras do amo reverberava entre bailarinos e figurantes
engalfinhados promiscuamente, todos fodiam como cachorrinhos ao som dos acordes
da Im Sommerwind de Webern. Ele então se aproxima e espanca-a até
tê-la Conchita, a estendê-la às palmadas nas nádegas, ela sorridente deliciosa,
revirando-a a afagar-lhe violentamente os seios e a possuí-la inclemente. Abruptamente
abandona-a e solitária ela unta o corpo nu com óleo negro provocando-o para
estrupá-la por trás ao dedilhado do piano. E a trota dançante enquanto beija a
partitura e a distribui aos demais presentes para que todos os cavalos trotem e
possam galopar sob as ordens do ufano cavaleiro de todos os mandos, enquanto
ela supliciada chora abandonada abundantemente. Fez-se égua ao seu cavaleiro. E
ele cavalgava pelos desertos distantes e amava seus cavalos que escravizavam
índios, caras-pálidas, dançarinos, beberrões, campesinos, abastados, o poderoso
fazendeiro com seus capangas no galope. Entristecida com todas as lágrimas como
se fosse a de Hiroshima do Vinícius, girava na cadeira. O trem passava tronitruante
com as notícias das mortes de Bucket, Arcadio, Zick, Marseil, Juan Manuel,
Butlizer, Fallthuis, Felixchange & Lennon. Ela bêbada fumando os tiros do
assassinato é levada ao sacrifício, torturada, sevidiada, abusada, até ser
deitada sobre o morto a chamá-lo, ambos aprisionados pela turba. Mais estupram-na
e é a festa popular correndo solta, o morto enfim crucificado e ela com ele,
para sempre na chuva e no fogaréu, sucumbem. Ela não sabia que renasceu no meu
coração e me trouxe a sorte como se fosse a dos Ventos e se fez Amarela como presente
de Afrodite a Eros e, por isso, a louvarei como se fosse a de Pixinguinha, celebrando
Esmeralda com a morte do compositor. Veja mais aqui, aqui e aqui.
DITOS & DESDITOS - Nunca haverá uma nova ordem mundial até que as
mulheres façam parte dela. Nunca duvidei que a igualdade de direitos fosse a
direção certa. A maioria das reformas, a maioria
dos problemas são complicados. Mas para mim não há nada
complicado na igualdade comum. Quando você coloca a mão no arado, você não
consegue largá-lo até chegar ao final da linha. Pensamento da ativista
feminista e sufragista estadunidense Alice Paul (1885-1977).
ALGUÉM FALOU: Eu sei que parece muito estranho, mas somos todos
crianças que buscamos a aprovação de nossos pais. Quando lhe dizem que, como
cineasta negra, as histórias que você quer contar
não são comerciais o suficiente, você começa a pensar: 'Vou contá-las de
qualquer maneira.' Quanto mais faço filmes, mais me sinto menos inclinada a falar sobre eles e
apenas deixar as pessoas assisti-los. Sinto que as fotos
contam a história e não posso acrescentar nada, exceto apenas falar sobre os
detalhes técnicos do que aconteceu naquele dia. Pensamento da cineasta
e roteirista queniana Gurinder Chadha.
ROSA – O curta-metragem Rosa (1992), dirigido por Peter Greenaway,
apresenta o encontro de um casal de bailarino durante dois movimentos da Sonata
para Violino, de Béla Bartók, foi filmado na Gent Opera House com coreografias
de Anne Teresa De Keersmaeker. Já o longa-metragem Rosa, A Horse Drama (1994),
é uma ópera em 12 cenas do compositor holandês Louis Andriessen com libreto da
série Death of a Composer de Peter Greenaway, que explora as mortes de
dez compositores do século 20, dois reais, nos casos de Webern e Lennon, e os
demais fictícios, contando a história do compositor argentino fictício Juan
Manuel de Rosa, que escreve trilhas sonoras para faroestes e é assassinado no
Uruguai. Sua noiva Esmeralda inveja o cavalo de Rosa, porque ele o ama mais do
que ela. Rosa se apaixona por seu cavalo enquanto maltrata sua noiva, Esmeralda
Boscano, que escreve constantemente para a mãe sobre esses acontecimentos. Num
movimento desesperado para atrair a atenção de Rosa, ela se despe e se cobre
com tinta preta, na tentativa de se parecer com o cavalo de Rosa, uma égua
preta. Enquanto isso, dois cavaleiros, possivelmente irmãos de Esmeralda,
avançam sobre Rosa enquanto ele cavalga e o matam a tiros. Eles então realizam
o casamento de Esmeralda com o cadáver de Rosa. Acontece que Rosa deixou um
testamento com uma frase "Quando eu morrer, mate meu cavalo e
queime-o". A ópera termina com o cadáver nu de Rosa montado em seu cavalo
morto que foi eviscerado e agora contém Esmeralda e todo o dinheiro de Rosa.
Tudo é então queimado. A ação se passa em um matadouro abandonado. Veja mais
aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
JANE - [...] Bem, você quer fazer alguma coisa? - Eu acho que não. - Acho que você quer
ir a algum lugar, ver gente? - Na verdade. Não tenho nada a ver com
ninguém. Não há nada para conversar com ninguém. Não há o que conversar
quando você não vê ninguém, não faz nada, não vai a lugar nenhum. - Você
deveria ir a algum lugar e fazer alguma coisa? - Por que? - Bem, havia algo
para conversar. - Mas você não sabe se quero falar com alguém. Por que eu falaria? [...]. Trecho extraído
da obra Baby Jane (WSOY, 2005), da escritora e dramaturga
finlandesa Sofi Oksanen, que da sua arte expressa: Escrever é como representar, a questão é
que está no papel, escrever um ato político e os livros são importantes para
criar opinião.
SEM DELICADEZAS - Nada
mais me agrada. \ Devo\ guarnecer uma metáfora\ com uma flor de amêndoa?\ crucificar
a sintaxe\ sobre um efeito de luz?\ Quem despedaçará o crânio\ por coisas tão
superficiais —\ Aprendi a levar em consideração\ as palavras\ que lá estão\ (para
a classe mais baixa)\ fome\ vergonha\ lágrimas\ e\ escuridão.\ Saberei lidar\ com
o soluço impuro,\ com o desespero\ (e ainda me desespero de desespero)\ com a
muita miséria,\ o estado dos doentes, o custo de vida.\ Não desprezo a escrita,\
mas a mim.\ Os outros sabem\ sabe Deus\ se entender com as palavras\ Não sou
meu assistente.\ Devo\ aprisionar uma ideia,\ conduzi-la até uma célula
iluminada da frase?\ alimentar olho e ouvido\ com bocados \de palavras da
melhor qualidade? \ analisar a libido de uma vogal,\ investigar o valor erótico
de nossas consoantes?\ Tenho que\ com a cabeça destruída por granizo,\ com a
cãibra por escrever com esta mão,\ sob a pressão da tricentésima noite,\ rasgar
o papel,\ varrer as tramas de palavras operísticas,\ destruindo assim: eu tu e
ele ela isso\ nós vós?\ (Devo, sim. Devem os outros.)\ Minha parte, que se
perca. Poema da da poeta e filósofa austríaca Ingeborg Bachmann
(1926-1973). Veja mais aqui.