A arte do escultor e poeta italiano Raffaele
Monti (1818-1861). Veja mais abaixo.
SONHO DE ADOLESCÊNCIA – Homenagem à atriz sueco-francesa Marika
Nicolette Green – Era adolescente quando vi uma foto daquela
de Södermalm para brilhar na vida. Não sabia quem era, não fosse o Pickpocket, a Jeanne tão bela de antemão.
Eu gamei na hora, ali ela com dezesseis anos naquele ano, eu tinha bem menos
quando a vi pela primeira vez. Dela tudo catei ao passar dos anos, não foi
fácil, como na mais que bela quando apareceu no curta Le Récit de Rebecca do Paul Vechialli, baseando em um
manuscrito encontrado em Zaragoza de Jean Potocki e eu vi às pressas e uma vez
só. Pude ver melhor e mais cobiçada ainda no Five Ashore in Singapore, do Bernard Toublanc-Michel, baseado no romance de Jean Bruce; e pra mim
brilhou no Le Golem de Pauwels & Kerchbron na televisão que apenas vi
uns trechos numa revista de não sei quando, nada demais. Só sei que ela estava linda
anfitriã no premiado thriller de
mistério Rider on the Rain
de René Clément; mais ainda como a irrecusável prostituta no The Crazy Capo Affair do Patrick
Jamain; e estonteante como a linda Bee no erótico softcore Emmanuelle
de Just Jaeckin, baseado na Emmanuelle Arsan - nem quis saber da protagonista,
era ela que eu procurava e quase sequer vi na participação no Le Bal des
voyous de Jean-Claude Dague. Mas pude enxergá-la bem como a garota oposta
no La Fille d'en face de Jean-Daniel Simon, quase passando batido na participação
do drama romântico Until September de
Richard Marquand, me redimindo mesmo com ela toda inesquecível no Hanna
Monster, Darling de
Christian Berger. Quantas noites ela na ideia e eu sem dormir a levá-la por
sonhos irrealizáveis, menino travesso com suas fotos. Paixão de quase adolescência que me perseguiu por um
bocado de tempo. Veja mais aqui e aqui.
A arte do escultor e poeta italiano Raffaele
Monti (1818-1861).
DITOS & DESDITOS - O
pensamento é uma coisa corrosiva. É destrutivo em si mesmo. Ele constrói e
destrói, constrói e destrói. Mas nesse processo corrosivo não é algo que pode
ser avaliado em um curto espaço de tempo. Acho que os efeitos ou o processo que
ele pode gerar. Cinema é assim mesmo, um fragmento de um processo de
pensamento. Não é nem um pensamento, apenas um processo. É o processo de pensar
sobre algo. E isso é algo que está solto, e está vivo, porque não é um
pensamento acabado ... Então, o efeito que isso pode ter fora eu não vou saber
agora, não sei se vou saber. Talvez algum dia eu encontre alguém que depois de
20 anos serviu assistindo o filme, talvez eu irei não encontrar ninguém e
sentir que minha vida foi um verdadeiro desperdício de celulóide. O que
questiono sobre meu trabalho agora é que acho que é muito caro para a abrangência
que tem. Eu acho que você tem que ser mais eficaz. Mais eficaz no combate ao
moral. Pensamento da cineasta argentina Lucrecia Martel. Veja mais
aqui e aqui.
ALGUÉM FALOU: A
marionete tem que voltar; o ator vivo deve desaparecer. O homem, criado pela
natureza é uma ingerência estranha na estrutura abstrata de uma obra de arte.
Pensamento do ator, diretor, cenógrafo e teórico do teatro inglês Edward Gordon Craig (1872-1966),
que considerava o homem na estética simbolista, submetido a paixões diversas, a
emoções incontroláveis, como um elemento absolutamente estranha à natureza
homogenia e à estrutura de uma obra de arte, como um elemento destruidor do
caráter fundamental desta. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
A FAMÍLIA – Cada um constrói uma fisionomia própria, uma maneira pessoal de sentir e
pensar... Trecho
extraído da obra Sociologia da família contemporânea (FGV, 2007), do sociólogo francês François
de Singly, especialista em sociologia da família e do casal,
educação, infância e adolescência, bem como relações de gênero. Veja mais aqui,
aqui e aqui.
A FOTOGRAFIA – [...] É
uma operação diversa e ambígua em que o único denominador comum entre os que a
praticam é a ferramenta utilizada. [...] O que sai do aparelho registrador não escapa às exigências de um mundo
de desordem e desperdício, com tensões cada vez mais intensas e consequências
ecológicas insanas. [...]. Trechos extraídos da obra O imaginário segundo a natureza (GG Brasil, 2004), do fotógrafo
francês Henri Cartier-Bresson
(1908-2004). Veja mais aqui, aqui e aqui.
PICKPOCKET – [...] É
necessário que uma imagem se transforme em contato com outras imagens, como uma
cor em contato com outras cores. Um azul não é o mesmo azul ao lado de um
verde, de um amarelo ou de um vermelho. Não há arte sem transformação [...]
Criar não é deformar ou inventar pessoas
e coisas. É encontrar entre as pessoas e as coisas que existem, e enquanto
existem, relações novas. [...] Trechos extraídos da obra Notas sobre o Cinematógrafo (Porto,
2000), do cineasta francês Robert Bresson (1901-1999), conhecido por sua
abordagem ascética que contribuiu notavelmente para a arte do cinema,
utilizando seus atores não profissionais, as elipses e o uso escasso de
pontuação, itens que levaram seus trabalhos a serem considerados como exemplos
proeminentes de filmes minimalistas. Da sua lavra destaco o seu quinto longa e
o segundo que utiliza música clássica de forma extradiegética, Pickpocket (1959), inspirado em Crime e Castigo, de Dostoievsky, que
conta a história de um estudante que se torna batedor de carteiras e se
apaixona por uma jovem, Jeanne, que é vizinha da sua mãe. Sobre sua obra o
livro Bresson – ou O Ato Puro das
Metamorfoses (E Realizações, 2011), do crítico e ensaísta Jean Sémolué,
apresentando toda sua trajetória, visando estabelecer um contato preciso com os
filmes, trazendo à luz as particularidades de cada um deles. Veja mais aqui,
aqui, aqui e aqui.
TODA TERÇA – [...] Estudei
um pouco, não muito, o problema é que não consigo me concentrar direito.
Começo a ler cheia de ânimo, leio às vezes uma página inteira, duas páginas,
mas, quando vou ver, nem sei do que se trata, não sei mais o que li. Sabe?, eu
leio mas não leio, é como se as palavras não entrassem na minha cabeça, como se
eu estivesse lendo em japonês, sabe aqueles desenhinhos? [...] Duas horas depois a eternidade já havia
terminado. [...]. Trechos extraídos do livro Toda terça (Companhia das Letras, 2007), da escritora e tradutora
chilena Carola Saavedra, autora de outras obras como Do lado de fora (2005), Flores azuis (2008) e Paisagem com dromedário (2010).
DIFERENÇA
- A medusa / flutuar na baía rasa / como
escolas de nuvens, / uma dúzia de idênticos - está certo / chamá-los de
criaturas, / esses sacos elaborados / de nada? Todos eles parecem / é a forma e
a mudança, / e embora uma tropa inteira / de primos ondulantes / ir sobre os
negócios deles / dentro do intervalo de uma única onda, / cada um faz algo
diferente: / este aqui um balão / aberto em ambas as extremidades / mas inchado
em toda a sua extensão, / este aqui é um coração que respira, / esta é uma flor
pulsante. / Este é um preservativo enrolado, / ou uma bolsa de plástico se
engolindo, / aquele um tom Tiffany, / este é um guarda-sol problemático. / Esta
ópera submarina / todo subterfúgio e disfarce, / seu enredo é um emaranhado fabuloso
/ de esconder e reconhecimento: / nada além de tropa, / nada além de algo / se
formando em figuras / então reconfigurando, / puro ectoplasma / reconhecível
apenas como o material / de metáfora. O que as palavras podem fazer / mas ligue
o que sabemos / para o que nós não fazemos, / e assim formar uma forma? / Que
encolhe ou incha, / configura ou desmorona, floresce / mesmo como é descrito /
em algum improvável / chiffon marinho: / um vestido para Isadora? / Nada além
de estilo. / O que liga / uma forma para outra / também os diferencia / - mas o
que é mais adorável / do que a mudança de forma / transparência de gosto e como: /
palavras claras e ondulantes? / Nós olhamos para a graça alienígena, / livre /
por qualquer forma determinada, / e dizemos: balão, flor, / coração,
preservativo, ópera, / abajur, sombrinha, balé. / Ouça como a boca, / tão cheio
/ de saudade do mundo, / muda sua forma? Poema do poeta estadunidense Mark
Doty. Veja mais aqui.
A LEITURA – A leitura e a
escrita: buscando definições conceituais: A leitura e a escrita são duas
habilidades complexas e imprescindíveis para aquisição das demais habilidades escolares,
como a de calcular e de contemplar os saberes acumulados, historicamente, na
civilização do conhecimento. Tanto que para ser um estudante completo, hoje, o
aluno precisa estar sempre motivado para a leitura, para as artes e para as
ciências matemáticas, físicas, químicas e biológicas. E não adianta sedimentar
apenas conceitos superficiais. É necessário que tenha uma visão ampla para uma
participação ativa na complexa teia da vida social, laboral e política do homem
moderno. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais - Língua Portuguesa,
(Brasil, 1999:21): A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho
ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do
seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a
língua, características do texto, do portador que o apresenta, do sistema de
escrita. Isto quer dizer que os novos parâmetros curriculares elaborados pelo
MEC colocaram o problema da leitura e da biblioteca escolar na sua devida importância.
Buscando melhor entender leitura, encontra-se a definição de Kleiman (1995:12),
com o seguinte significado: (...) como processo psicológico em que o leitor
utiliza diversas estratégias baseadas no seu conhecimento lingüístico,
sociocultural, enciclopédico. Tal utilização requer a mobilização e a interação
de diversos níveis de conhecimento, o que exige operações cognitivas de ordem
superior, inacessíveis à observação e demonstração, como a inferência, a
evocação, a analogia, a síntese e a análise. Tal concepção de leitura se opõe à
prática autoritária comum em sala de aula que parte do pressuposto que há
apenas uma maneira de abordar o texto e uma interpretação a ser alcançada. Essa
maneira de trabalhar a leitura, a interpretação e a produção de texto é chamada
tradicional. Nela, a interpretação é assumida como o re-conhecimento de um
sentido único existente no texto. Pois bem, a construção conceitual em relação
à leitura é produzida de forma progressiva, mas não linear e ocorre de modo
pessoal, de acordo com cada criança. Os conflitos são constantes e provocam
mudanças cognitivas importantes para a formação do leitor. Na construção da
leitura, a mediação pedagógica é um fator importante para essa aquisição, no
sentido de promover conflitos e desafios cognitivos. De acordo com Sánches, in
Coll et alii, (1995), o processo cognitivo implicado para a aprendizagem da
leitura envolve as vias lexical e fonológica. A primeira via pressupõe
emparelhar a palavra impressa com alguma representação interna e a segunda
(fonológica), pressupõe a mediação da própria linguagem oral para obter o
significado. A partir dessas condições, pode-se supor que a leitura de uma
determinada palavra não pode ocorrer somente mediante o reconhecimento
imediato. Segundo o autor, a criança não pode ler a palavra por via lexical. No
entanto, Coll et alii, (1995:104) observam que "o que a criança pode fazer é reconverter a palavra escrita(...) à sua
modalidade oral(...) aplicando as regras que relacionam as letras aos fonemas,
a via fonológica". Assim, para Coll et alii, (1995:105) "(...) Os processos de leitura não são construídos
a partir, apenas, dessas vias expostas pelo autor em foco. Normalmente, não se
reconhece as palavras uma a uma, senão dentro de contextos lingüísticos mais
amplos". Assim, quando se analisa uma palavra, ela está dentro de
unidade mais ampla, sendo as informações contextuais e perceptivas importantes
para a construção do significado da leitura. Para os autores, então, a leitura
não é um processo exclusivamente perceptivo.
Alguns autores (Smith, 1978 e Goodman, 1976 in Coll et alii, 1995)
acentuam que a leitura é um processo mais psicolingüístico do que perceptivo;
um processo de criação e confirmação de hipóteses, a partir do conhecimento
prévio sobre a linguagem e o mundo. Considerando que a leitura constitui a
interação dos conhecimentos do leitor com aqueles que emergem do texto, pode-se
ainda acrescentar que ler é interpretar e adivinhar o que o outro quer dizer
(Curto et alii, 2000); extrapola, portanto, a idéia da relação direta entre
leitura e decodificação, visto que qualquer professor pode reconhecer alunos
que decifram corretamente e não conseguem compreender o significado do que
acabaram de “ler”. Ao escrever sobre o vínculo entre decodificação e
compreensão textual, Curto et alii (2000:47) dizem que decifrar sem compreender
é um sintoma de hábitos prejudiciais, em que se separou o mecânico do
compreensivo: "(...) Ler é
compreender um texto. Compreender é um ato cognitivo, ou seja, o resultado de
uma atividade mental". A leitura é compreensiva na medida em que se lê
de forma ativa; assim serão capazes de antecipar interpretações, reconhecer
significados e ainda identificar dúvidas, erros e incompreensões no processo de
leitura. Curto et alii, (2000), acrescentam, ainda, que a decodificação também
é necessária, mas como um instrumento a serviço da compreensão. No movimento de
construção do significado da leitura, as estratégias cognitivas e
metacognitivas desempenham um papel importante para esse aprendizado e,
conseqüentemente, para a formação e desenvolvimento do leitor proficiente. Com
relação a tais estratégias, recorre-se à definição de Valls (1990, in Solé,
1998:69), que ressalta que a estratégia "(....) tem em comum com todos os demais procedimentos sua utilidade para
regular a atividade das pessoas, à medida que sua aplicação permite selecionar,
avaliar, persistir ou abandonar determinadas ações para conseguir a meta a que
se propõe". Isto quer dizer que o uso de estratégias parece possibilitar
reflexões dos atos, na medida que podem permitir o direcionamento das ações. Solé
(1998:69), ao descrever as características das estratégias, assinala que (...)
Sua potencialidade reside justamente nisso, no fato de serem independentes de
um âmbito particular e poderem se generalizar; em contrapartida, sua aplicação
correta exigirá sua contextualização para o problema correto... as estratégias
envolvem autodireção e autocontrole. Solé (1998) compartilha com Valls (1990) e
ainda com Nisbet e Schucksmith (1987) suas idéias a respeito de micro e
macroestratégias. Embora os referidos autores diferenciem esses dois conceitos
da seguinte forma: microestratégias são habilidades, técnicas, destrezas etc.
Todos esses processos estão ligados a tarefas muito concretas. As
macroestratégias são concebidas por meio de um caráter de capacidades
cognitivas de ordem superior, relacionadas, portanto, a metacognição -
capacidade de conhecer o próprio conhecimento, de pensar sobre nossa atuação,
de planejá-la - e que permitem controlar e regular a atuação inteligente (Solé,
1998). Nesse sentido, as estratégias de leitura são procedimentos de caráter
elevado, porque "(...) elas envolvem
a presença de objetivos a serem realizados, o planejamento das ações que se
desencadeiam para atingi-los, assim como sua avaliação e possível mudança"
(Solé, 1998:70).
O TEXTO, A LINGUAGEM E A LEITURA - Considerando que o
texto, por sua vez, desvencilhou-se das amarras estruturalistas/funcionalistas,
notadamente a partir de novas abordagens da linguagem (pragmática, teoria da
enunciação, análise do discurso), que passaram a considerar mais enfaticamente
a relação linguagem/sociedade, o texto deixou de ser mera organização
lingüística que carrega ou que “transmite” pensamentos, informações ou idéias
de seu produtor. Assim sendo, a linguagem passou a ser entendida nos estudos
lingüísticos contemporâneos como incapaz de traduzir todas as intenções do
falante. Tal concepção de linguagem influenciou a caracterização do texto como
estrutura cheia de lacunas e de não-ditos. Daí, se o texto contém “espaços em
branco”, “vazios”, “interstícios” como propuseram Iser (1979, 1996), Eco
(1979), Jauss (1979) e outros, o leitor tem sido considerado peça fundamental
na leitura. Pode-se dizer, inclusive, que este é o grande pivô das mudanças
epistemológicas em relação aos estudos de leitura e de literatura. Considerado
individual ou coletivamente, o leitor é a instância responsável por atribuir
sentido àquilo que lê. A materialidade do texto, o preto no branco do papel só
se transformam em sentido quando alguém lê. E, assim, o texto é lido sempre de
acordo com uma dada experiência de vida e de leituras anteriores. Dessa nova
caracterização do leitor em relação
ao texto e ao autor, os estudos de práticas de leitura, tais como os propostos
por Chartier (1997), consideram a leitura como uma atividade humana que tem,
portanto, uma história e uma sociologia. A significação é, para este autor,
função direta da “atuação” do leitor ou dos leitores: (...) é preciso lembrar
que a leitura tem uma história (e uma sociologia) e que a significação dos
textos depende das capacidades, dos códigos e das convenções de leitura
próprias às diferentes comunidades que constituem, na sincronia e na diacronia,
seus diferentes públicos. (Chartier, 1997b:67) Assim,
ler deixou de ser uma atividade universal, praticada sempre da mesma maneira.
As inúmeras possibilidades de encontros entre os textos e seus prováveis
públicos (diferentes no tempo e no espaço) abriram caminhos para variadas
leituras. Produto de um tempo e de um espaço, o leitor é produzido socialmente
assim como a leitura que ele pode efetivar não é única, mas variável de acordo
com as circunstâncias em que é realizada. Além de elemento fundamental na
constituição dos sentidos, o leitor pode ser considerado também em seu aspecto
coletivo, ou seja, enquanto comunidade de leitores que compartilham certas
maneiras de ler. Formulados social e historicamente, esses modos
característicos de ler “constroem”, “formatam” a interação leitor/texto no
momento da leitura: "Paralelamente
também deve considerar que o “mundo do leitor” é sempre aquele da “comunidade
de interpretação” (segundo Stanley Fish) a que pertence e que define um mesmo
conjunto de competências, de normas, de usos e de interesses" (Chartier, 1997b:67).
Como se observa, existe uma ênfase nos
aspectos sociológicos da leitura, quando se considera uma dada comunidade de
leitores como elemento chave na construção de sentidos. Tendência semelhante, a
de observar os aspectos sociológicos, pode ser encontrada nos estudos
literários, sobretudo nos que se aproximam das várias vertentes da Estética da
Recepção, como Fish (1980) acima mencionado. Aqui se unem, portanto, os dois
temas: leitura e literatura. Se a literatura existe através de textos, certamente, a
leitura ou os modos através dos quais ela foi e é lida prefiguram os sentidos
que ela teve e pode vir a ter. De forma que, hoje, seria pouco proveitoso
pensar no literário sem considerar sua natureza social ou os complexos
mecanismos que ajudam a construir aquilo que se chama literatura (Eagleton,
1997; Culler, 2000; Scarpit, 1958). Além da leitura, importa para Chartier
(1997) a historicização do literário, ou seja, a verificação de como acontecem
as variações, no tempo e espaço, entre o que é considerado ou não literário. Em
busca dessa historicização da literatura, ele propõe o estudo de algumas
categorias responsáveis por construir a literariedade: Ao aplicar a noção de
sistema literário para as condições atuais de produção e de circulação de
textos, vê-se proposto que se inscrevam na noção de sistema literário as
condições de leitura e de escrita, sugerindo, também, que os pontos de contato
entre cada um dos elementos da tríade autor-obra-público tornem-se mais visíveis,
através desses outros componentes. Vez que eles abrangeriam, por exemplo, o
grau de letramento da população, as tecnologias de produção de livros e
impressos, as instituições voltadas para a circulação de livros, as práticas
discursivas que estabelecem, avaliam e afiançam o caráter literário dos textos,
o imaginário social relativo a livros e leituras e mesmo a regulamentação
econômica e legal da produção e distribuição de livros (Zappone, 2001). A
partir disso, em um levantamento bibliográfico sobre o tema em questão foram
pesquisados e cotejados vários textos e autores, o que permitiu o
estabelecimento de quatro linhas básicas em que se ramificam as pesquisas sobre
leitura no Brasil. Para fins de exposição, essas linhas foram designadas como
linha diagnóstica, linha cognitivo-processual, linha discursiva e linha
estruturalista.
A LINHA DIAGNÓSTICA DA LEITURA - Pode ser chamado de diagnóstico um primeiro conjunto de
textos que se destaca por seu caráter detector e denunciador da situação
desfavorável de leitura no Brasil como se observa nos textos mais típicos dos
primeiros anos da década de 1980, quando a leitura começava a ingressar nos
círculos acadêmicos. Freire (1987), Silva (1988) e Silva (1995) colocam em cena
uma discussão sobre leitura ancorada basicamente nas relações escola/sociedade.
O primeiro, partindo de uma discussão fortemente relacionada à educação e à
ideologia, desenvolve suas reflexões em torno desses temas e as aplica no campo
de leitura. É assim que a crítica à educação
bancária transforma-se, em sua abordagem da leitura, na crítica à leitura
meramente decifrativa, que não leva em consideração o universo do sujeito
leitor e sua experiência vivencial ou ainda, seu conhecimento prévio à leitura
(Freire, 1987). A concepção de leitura de Freire (1987) está ancorada numa
premissa que poderia ser chamada de sócio-política. A leitura para ele seria
uma interpretação crítica e, de certa forma, personalizada do que se lê, pois o
leitor levaria em conta todo o seu conhecimento prévio, sua experiência de vida
e de leituras anteriores e, acima de tudo, a sua realidade. Sua concepção de
leitura, portanto, supõe para o leitor uma posição de sujeito no processo de
atribuição de significado e não de mero receptor das idéias veiculadas pelo
texto e pelo autor. Trata-se, portanto, de uma concepção de leitura que
pressupõe a inserção de sua prática na esfera social, histórica e ideológica,
pois argumenta a favor da luta pela competência do leitor não só em termos dos
conteúdos referenciais mas e, sobretudo, da sua competência enquanto um leitor
das relações sociais que permeiam o seu meio. Por isso, o caráter político
desta abordagem. Enquanto sujeito, ou seja, ao mesmo tempo
receptor/interlocutor do texto, o leitor seria levado a tomar partido, agir criticamente
diante do texto e esse movimento estaria dialeticamente relacionado com a forma
de o indivíduo se situar no mundo. Por isso o autor enfatizar que "(...) a leitura da palavra não é apenas precedida
pela leitura do mundo mas por uma certa forma de “escrevê-lo” ou de
“reescrevê-lo”, quer dizer, transformá-lo através de nossa prática consciente" (Freire, 1987:22). Na medida em que a
leitura resulta uma compreensão crítica do mundo, ela significa, para o autor,
uma forma de ação contra-hegemônica, pois, ao tornar o leitor consciente da
realidade, ela desvela as contradições do sistema, permitindo uma visão mais
clara das relações de dominação e de poder do sistema capitalista: Essa leitura
mais crítica da leitura anterior menos crítica do mundo possibilitava aos
grupos populares, às vezes em posição fatalista em face das injustiças, uma
compreensão diferente da sua indigência. (....) É neste sentido que a leitura
crítica da realidade, dando-se ou não num processo de alfabetização associada
sobretudo a certas práticas claramente políticas de mobilização e de
organização, pode constituir-se num instrumento para o que Gramsci chamaria de
ação contra-hegemônica. (Freire, 1987:23-4). A leitura e a sua prática, nesse
sentido, seriam a base de seu projeto pedagógico. Trata-se de um projeto que
pressupõe um objetivo específico: a emancipação do leitor através da
conscientização do sistema onde se insere. Para Freire (1987), o resgate dos
sujeitos e das classes sociais menos privilegiadas se dá através do processo
educacional, notadamente através do desenvolvimento da leitura, e abarca uma
dupla contextualização, pois engloba de um lado a voz do aluno que traz para a
leitura seu universo vivencial, sua experiência para a concretização de um
sentido; e, de outro lado, a figura do professor que intervém com a introdução
de uma outra voz no processo de leitura, um outro olhar que possibilita ao
aluno a contemplação de outros mundos, outra visão que permite a instalação da
contradição. A introdução da voz do professor no momento da leitura na escola
pode, dessa forma, criar para o aluno o distanciamento crítico necessário para
que ele possa ver a si mesmo e sua classe em relação ao outro e aos setores
dominantes. A partir da distância ‘lingüística, discursiva e ideológica, a fala
do professor pode sinalizar para os alunos essas diferenças, como bem citam
Busnardo e Braga (2000:97): "Em
outras palavras, o processo a que nos referimos envolve dois tipos distintos de
contextualização: o sujeito contextualizando o texto a partir de sua
experiência vivida e o professor contextualizando a partir de outro olhar, de
outros referenciais lingüísticos, discursivos e ideológicos. Toda a
concepção de educação e, conseqüentemente, de leitura do autor baseiam-se nessa
premissa que é, prioritariamente, uma premissa política, que tem forte
compromisso ético com a justiça social e a liberdade. Por essa razão, essa
linha poderia também ser nomeada político-diagnóstica. Tais idéias são fruto
das reflexões de um intelectual que pensa a educação e a leitura numa
perspectiva propiciada pela visão do exilado político, cujo projeto ideológico,
plenamente favorável ao resgate dos setores dominados e das formas
democráticas, a ditadura não conseguiu driblar. Concomitantemente à divulgação
das idéias de Freire, também as formulações teóricas de Silva (1988) ganham
espaço e divulgação, caminhando ambas em direção muito próxima, senão
semelhante. O ponto de partida das investigações de Silva também é a escola. O
autor aponta a grande valorização da atividade de leitura tanto no contexto
escolar como fora dele, mas considera que a leitura, no sentido crítico que
atribui a ela, não se faz presente na escola. Para ele, o ensino de leitura na
escola se dá de maneira descontextualizada por dois motivos básicos: seja por
sacralizar demasiadamente o texto impresso destituindo-o da condição de
questionamento e interlocução com o leitor, seja porque a escola não estabelece
objetivos concretos para a leitura. Quanto ao primeiro aspecto, o autor critica
severamente a sacralização dos texto na escola. Essa sacralização é entendida
como a atribuição de uma certa impassibilidade ao texto, como se este
contivesse verdades ou idéias inquestionáveis. Esta concepção de leitura
criticada pelo autor compreende o texto como objeto a ser decodificado e aceito
prontamente tanto pelo professor quanto pelo aluno (Silva, 1988). Há também,
nesse sentido, críticas à visão reprodutivista de ensino e de leitura que a
escola promove, ao adotar como corretas apenas as idéias do professor ou do
próprio livro didático. Para Silva (1988), a interpretação de textos deve
proporcionar uma compreensão do contexto onde o leitor se situa, permitindo uma
abertura para a discussão do que foi lido e não ser imposição de pontos de
vista pré-determinados ou pelo professor ou pelo autor do livro didático. Por
entender o ensino de leitura a partir dessa problemática, o autor analisa,
freqüentemente e em muitos de seus textos, as condições de ensino da escola e
chega à conclusão de que a causa desse tipo de ensino de leitura reside na
presença da censura enquanto um problema característico da sociedade, que cerca
os indivíduos num ambiente social tipicamente autoritário, o que facilitaria a
transferência dessa concepção autocrática para o ensino de leitura (Silva,
1988). Alguns procedimentos comuns de aulas baseados nesse modelo autocrático
de leitura seriam, para Silva (1988) o apego exagerado aos manuais e livros
didáticos, apego exagerado aos programas curriculares, seleção prévia de
livros, sem consulta aos leitores, a mistificação ou a anteriormente referida
sacralização do texto impresso. Tais procedimentos apontam que na escola e nas
aulas de leitura nada é discutido, apenas “descodificado” e aceito. O segundo
motivo pelo qual o ensino de leitura é, para Silva (1988), descontextulizado
refere-se à ausência de objetivos concretos para a leitura. Para que se
recuperem esses objetivos, o autor considera fundamental que sejam repensados
os objetivos da educação e que os professores e a escola e se desvencilhem da
repressão e da censura que se refratam em sua prática do ensino de leitura.
Para isso, propõe uma pedagogia de leitura para a qual se estabeleça uma
concepção de homem e de sociedade. Nessa nova pedagogia, Silva (1988) pressupõe
que se saiba que tipo de homem se quer formar e os objetivos a serem alcançados
com o processo de formação do leitor. O estabelecimento de objetivos para o
trabalho com leitura pressupõe que o educador assuma e demonstre, na prática,
um posicionamento político frente à realidade social e frente ao papel da
escola enquanto instrumento de conscientização, como assinala na concepção: Em
essência, a leitura caracteriza-se como um dos processos que possibilita a
participação do homem na vida em sociedade, em termos de compreensão do
presente e passado e em termos de possibilidade de transformação sociocultural
futura. E, por ser um instrumento de aquisição, transformação e produção do
conhecimento, a leitura, se acionada de forma crítica e reflexiva dentro ou
fora da escola, levanta-se como um trabalho de combate à alienação, capaz de
facilitar às pessoas e aos grupos sociais a realização da liberdade nas
diferentes dimensões da vida. (...) Por isso mesmo, considerando as
contradições presentes em nossa sociedade, uma concepção de leitura não pode
deixar de incluir movimentos da consciência, voltados ao questionamento, à
conscientização e à libertação. (Silva, 1988:24) Como se pode observar,
trata-se de uma concepção de leitura fundamentada no aspecto político como
propusera Freire, já que, em última instância, pensa o ato de ler como uma
estratégia de desvelamento das formas hegemônicas de dominação social na medida
em que possibilita, através da leitura e do debate de idéias, a conscientização
do leitor sobre a ideologia dominante. Ancorada nesse aspecto
político-ideológico-social, a pedagogia de leitura de Silva (1988) situa dois
papéis para o educador: educar para submeter os alunos à ordem vigente ou
educar para libertar e transformar a sociedade, emancipando seu aluno. De
acordo com o primeiro papel, Silva (1988) considera que o educador atua como um
reprodutor das verdades impostas pelo livro e pelo sistema, por isso, não
promove o debate de idéias nem a interlocução com seus alunos. Logo, não pode
desenvolver a crítica e conscientização dos mesmos. Já se adotando o segundo
papel, Silva (1988) entende que as finalidades do ensino da leitura seriam:
mostrar o livro como instrumento de conhecimento e crítica, como meio de luta
contra o status quo dominante e
mostrar o livro e a leitura como forma de conhecimento do mundo, o que levaria
o leitor à crítica e, conseqüentemente, à conscientização e libertação de seu
lugar de alienação e de exploração. Ambos os autores se inserem num contexto de
produção teórica sobre a leitura que enfatiza a valorização do leitor como
instância participante do ato da leitura e partem da crítica à referencialidade
do texto enquanto estrutura fechada e dotada de significado. Por isso,
enfatizam que a leitura não se limita à “decodificação” da escrita, como
processo acabado no momento da alfabetização, mas se amplia na prática crítica
de leitura de um leitor que, com sua experiência de mundo, constrói um sentido
para o que lê, como se vê nas palavras de Freire (1988:11): (...) uma compreensão crítica do ato de ler,
que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem
escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do
mundo precede a leitura da palavra".
Em suas propostas há claramente um
descentramento da leitura enquanto ato de mera descodificação, fato que
atrelava a discussão sobre leitura, anterior a esses autores, quase
exclusivamente à questão da alfabetização. Logo, essa primeira linha de
abordagem de leitura caracteriza-se por discutir dois fatos importantes sobre a
leitura: O fato de esta englobar habilidades e competências muito mais
complexas do que aquelas envolvidas no processo de descodificação da escrita
priorizado na alfabetização; O fato de a leitura constituir-se em instrumento
capaz de dotar o leitor de uma determinada condição sócio-política, cognitiva e
cultural. Assim, esses autores foram pioneiros, no Brasil, na abertura de novas
possibilidades para as investigações sobre o como a leitura poderia ser
entendida em relação à sociedade na qual os indivíduos praticam o ato de ler.
A LINHA COGNITIVO-PROCESSUAL DA LEITURA - Os
estudos sobre leitura nessa linha são desenvolvidos sob o ponto de vista das
teorias da cognição, ou seja, de abordagens teóricas que procuram explicitar os
processos de compreensão desencadeados no momento da leitura. São, portanto,
abordagens que se desenvolvem a partir da psicolingüística e da
sociolingüística. Tais estudos, conforme Kato (1985), se dão pela preocupação
com a questão da leitura dos alunos, constatando a dificuldade de interagir com
o texto escrito. As dificuldades encontradas no desenvolvimento da leitura,
determinou a criação de uma série de teorias explicativas para diagnosticá-la,
dentre elas, a primeira foi a hipótese do
déficit visual, que perdurou da década de 20 até os anos 70, segundo a qual
problemas de leitura se devem a dificuldades com o processamento de padrões
visuais ( Busnardo & Braga, 2000; Rangel, 1989). A partir da década de 70,
evidências de distúrbios de processamento fonológico subjacentes aos problemas
de leitura e escrita começaram a enfraquecer a hipótese do déficit visual. Vários estudos foram conduzidos
demonstrando que dificuldades fonológicas, isto é, com a percepção e o
processamento automático da fala e metafonológicas, quer dizer, com a
segmentação e manipulação intencionais de segmentos da fala, são capazes de
predizer dificuldades ulteriores na aprendizagem de leitura e escrita, e que
procedimentos de intervenção voltados ao desenvolvimento de habilidades
metafonológicas, especialmente procedimentos para desenvolver a consciência
fonológica, são capazes de produzir ganhos significativos em leitura e escrita.
Com tais estudos, a hipótese do déficit fonológico
tornou-se predominante e, segundo tal hipótese, os distúrbios de processamento
fonológico são a principal causa dos problemas de leitura e escrita. Mediante
isso, a importância do processamento fonológico para a leitura e escrita pode
ser compreendida analisando-se os estágios pelos quais a criança passa na
aquisição da linguagem escrita. Conforme descrito por Frith e Capovilla &
Capovilla (apud Rangel, 1989), a criança passa por três estágios: o
logográfico, o alfabético e o ortográfico. No estágio logográfico a criança lê de maneira visual direta; a
leitura depende do contexto e das cores e formas do texto. Isto quer dizer que o
estágio logográfico é considerado uma forma de pré-leitura, visto que as
palavras escritas são tratadas como desenhos, e não propriamente como um código
alfabético. No estágio alfabético, a
criança compreende que a escrita mapeia a fala e, portanto, começa a escrever
como fala. Conseqüentemente pode ocorrer erro de regulação grafofonêmicas. Tais
erros são esperados neste estágio, visto que a criança está aplicando as regras
da escrita intermediadas pelos sons da fala. A partir deste momento a criança
pode começar a aprender as regras de posição. No terceiro estágio, o ortográfico, a leitura e a escrita
ocorrem por reconhecimento visual direto das formas ortográficas de morfemas ou
de palavras, pré-armazenadas no léxico. A criança passa, portanto, a ler e
escrever corretamente palavras irregulares. Quando a criança dominou todas as
estratégias desenvolvidas nos estágios logográfico, alfabético e ortográfico,
ela torna-se capaz de ler e escrever palavras novas e palavras irregulares de
alta freqüência. Portanto, há duas formas básicas de ler e escrever de forma
competente: pela estratégia fonológica (desenvolvida no estágio alfabético) ou
pela estratégia lexical (desenvolvida no estágio ortográfico). Assim, conforme
Ellis (apud Rangel, 1989), a leitura competente pode ocorrer de acordo com um
modelo de duplo-processo: a leitura fonológica ou por associação, e a leitura
lexical ou por localização. A partir disso, encontra-se a leitura por
localização, rota lexical ou léxico-semântica, que é utilizada para ler
palavras familiares que estão armazenadas na memória ortográfica, isto é, no
sistema de reconhecimento visual de palavras, em decorrência das experiências
repetidas de leitura. Após o reconhecimento da palavra, o acesso ao sistema
semântico permite a compreensão do seu significado. Em seguida, é possível
produzir a pronúncia pelo sistema de produção fonológica de palavras,
finalizando assim a leitura em voz alta do item escrito (Rangel, 1989). A
memorização da forma ortográfica das palavras envolve um grande esforço por
parte do sujeito (Ellis apud Rangel, 1989). Os modelos cognitivos sugerem a
existência de um local de armazenamento lexical da ortografia de palavras
familiares, semelhante ao que existe para a fala ou léxico de produção da fala,
que também é usado no momento da leitura. Ele contém todas as palavras cuja
ortografia foi armazenada na memória. Ellis (apud Rangel,1989) o chamou de léxico de input visual ou sistema de reconhecimento visual de
palavras. Este léxico possui conexões com o sistema semântico que contém o significado das palavras e com o sistema de produção da fala que contém a
pronúncia de palavras familiares; logo, o reconhecimento da forma ortográfica
da palavra permite o acesso tanto ao seu significado quanto à sua pronúncia. A
leitura por associação, rota fonológica, é utilizada para ler palavras pouco
freqüentes ou desconhecidas. Para fazer a leitura dessas palavras, a seqüência
grafêmica, isto é, a palavra escrita, é segmentada em unidades menores, como grafemas
e morfemas e associada aos seus respectivos sons. Em seguida, faz-se a junção
dos segmentos fonológicos e produz a pronúncia da palavra. O acesso semântico é
obtido depois, pelo feedback acústico
da pronúncia produzida em voz alta ou encobertamente (Rangel, 1989). Assim, a forma fonológica de uma palavra pode ser obtida por dois
caminhos: ou por meio da decodificação ou pela ativação da forma ortográfica
correspondente. Nos
leitores competentes as duas estratégias estão disponíveis, sendo utilizadas em
diferentes situações de leitura, dependendo do tipo de item a ser lido. Segundo
Ellis (apud Rangel, 1989), as dificuldades relacionadas à aquisição de leitura
estão associadas às diversas competências necessárias ao uso de ambas as rotas,
tais como: competência léxica:
conhecimento que o indivíduo possui de um certo número de palavras da língua e
sua aptidão para ter acesso rapidamente ao vocabulário mental assim
constituído; competência fonológica (ou
consciência fonológica): capacidade
de segmentar uma palavra em unidades menores, como as sílabas e os fonemas,
decompondo-as em seus componentes fonológicos; memória operacional: capacidade de operar com conteúdos mantidos por
curtos períodos de tempo na memória. Nas crianças em processo de aquisição de
leitura e escrita é preciso verificar o uso das duas rotas de leitura, isto é,
verificar se há dificuldades no uso de uma ou outra rota. Neste caso,
atividades devem ser desenvolvidas para promover o uso efetivo de ambos os
processos: o fonológico e o lexical. Porém, diversas pesquisas em todo o mundo
têm apontado a prevalência de problemas fonológicos em relação aos lexicais,
conforme destacado por Capovilla & Capovilla Ellis (apud Rangel, 1989). Para
a compreensão das habilidades de decodificação e de compreensão envolvidas na
leitura, é interessante o uso da equação de Gough e Tunmer (apud Rangel, 1989),
L = D x C. Nesta equação, L representa a compreensão em leitura; D, a
capacidade de decodificar uma mensagem escrita e C, a capacidade lingüística de
compreender, isto é, de dar um sentido a uma informação léxica, a frases ou a
um discurso verbal. Segundo essa equação, a leitura só ocorre de forma
competente com a integração dessas duas habilidades essenciais, por isso o uso
do sinal x, que representa a multiplicação, e não simplesmente a justaposição
ou a soma dessas habilidades, para a qual se utilizaria o sinal +, que
representa a adição. Assim, para que as leituras ocorram ambas as habilidades
de decodificação e de compreensão são necessárias; se uma das duas estiver
comprometida (isto é, se tiver o valor = 0), o resultado da operação também
será nulo, ou seja, a leitura competente não ocorrerá. A aplicação da equação
sugere a existência de perfis diferenciados de crianças com dificuldades de
aprendizagem em leitura, que variam em função da origem de tais dificuldades.
Assim, teoricamente, deveria haver um grupo de crianças cuja dificuldade
principal reside na identificação das palavras; um outro grupo cuja dificuldade
básica está na compreensão; e, finalmente, um terceiro grupo que possui
dificuldades tanto na decodificação quanto na compreensão. Todos os três grupos
apresentariam problemas de leitura, visto que nos três casos o resultado da equação
seria nulo. Dados empíricos confirmaram essa hipótese (Rangel, 1989). Já a pesquisa
de Aaron (apud Rangel, 1989) ilustra a existência dos três perfis que, a partir
dos resultados em testes de compreensão oral e de decodificação de
pseudopalavras isoladas, foram identificados três grupos distintos de crianças
com dificuldades de leitura: crianças apresentando "dificuldades
específicas em leitura". Elas mostram desempenhos fracos em decodificação
(D) e em compreensão escrita (L), mas seu nível de compreensão oral (C) é
normal, ou até mesmo superior à média. São caracterizadas como tendo
dificuldades específicas de leitura visto que suas habilidades de compreensão
oral estão preservadas. Geralmente tais crianças são diagnosticadas como
disléxicas; crianças apresentando "dificuldades inespecíficas em
leitura". Possuem dificuldades de compreensão escrita (L) associadas às
dificuldades de compreensão oral (C), mas apresentam boas ou mesmo excelentes
capacidades de decodificação (D). Logo, o problema de tais crianças não é
específico à compreensão da linguagem escrita, mas inclui dificuldades mais
amplas que afetam a compreensão da linguagem oral. Tais crianças apresentam
perfis do tipo hiperléxicos; e crianças apresentando "dificuldades
cognitivas generalizadas". Nestas, os desempenhos estão rebaixados nas
três habilidades: compreensão escrita (L), compreensão oral (C) e decodificação
(D). Portanto, as dificuldades que elas apresentam na leitura são fruto de uma
combinação das dificuldades no reconhecimento das palavras escritas e nas
habilidades lingüísticas mais gerais de compreensão. Assim sendo, a abordagem
de Aaron, com a proposta de analisar o distúrbio de leitura a partir da equação
L = D x C, é importante para direcionar programas educativos ou reeducativos,
diferenciando o tipo de intervenção em função do perfil específico
identificado. Esta análise permite prescindir da avaliação do quociente de
inteligência (QI), tão amplamente usada no passado para o diagnóstico dos
problemas de leitura. Segundo a proposta de Aaron, a avaliação do QI pode ser
substituída pela avaliação da compreensão oral, permitindo uma análise mais
refinada dos aspectos lingüísticos, diferenciando entre habilidades especificas
de leitura e habilidades gerais de linguagem, mais do que simplesmente
diferenciando entre habilidades gerais de linguagem e habilidades de desempenho
não-verbal, como era possibilitado pelas análises de QI e pela comparação entre
QI verbal e QI de desempenho (Rangel, 1989). No entanto, apesar da grande
contribuição de Aaron com a proposta da análise diferenciada dos três perfis de
problemas de leitura, segundo Grégoire e Piérart (apud Rangel, 1989) os estudos
realizados para detectarem as habilidades prejudicadas nos maus leitores
sugerem que a maioria dos distúrbios situa-se no nível dos mecanismos básicos
que tornam possível o reconhecimento das palavras escritas, isto é, decodificação,
e não no nível dos componentes sintáticos ou semânticos, ou seja, compreensão. Daí,
confirmando tais achados, nos estudos sobre as habilidades cognitivas
relacionadas à aquisição de leitura e escrita, a consciência fonológica,
habilidade essencial para o desenvolvimento da decodificação, tem se mostrado
como de extrema importância. Enfim, sumariando, tais achados de pesquisa evidenciam
a prevalência dos problemas de leitura devidos a dificuldades na decodificação,
em oposição àqueles devidos a dificuldades de compreensão. Estes dados mostram
a importância da rota fonológica ou por associação na leitura competente, e
apontam para a necessidade de desenvolver instrumentos de avaliação e
procedimentos de intervenção remediativa e preventiva relacionada às
habilidades fonológicas. Assim, diagnosticadas tais dificuldades, os
pesquisadores centraram sua atenção no desvendamento dos processos subjacentes
ao ato da leitura, objetivando como aplicação pedagógica desse conhecimento uma
maior proficiência do leitor ou, em outras palavras, a formação do bom leitor.
Essas abordagens têm como preocupação básica a pesquisa dos processos envolvidos
no ato de compreensão do texto. O interesse básico delas está na investigação
das ações ou reações psicolingüísticas vivenciadas pelo leitor no momento da
leitura e nos mecanismos lingüísticos (fonológicos, sintáticos, semânticos,
pragmáticos) e psicológicos intervenientes no processo. Essa abordagem processual ou cognitivo-processual, em virtude da ênfase que concede à
interação leitor/texto/autor, baseia-se em teóricos da inteligência artificial
e da ciência da cognição. Kato (1985) distingue dois modos básicos de
processamento da informação, chamados processamento bottom-up ou ascendente e processamento top-down ou descendente. Ambos referem-se aos processos utilizados
pelo leitor a fim de compreender o texto. O primeiro implica o reconhecimento e
compreensão das partes menores que compõem o texto, as relações entre palavras,
os sintagmas, os períodos que aparecem no texto como estruturas coesivas e que
estão organizadas de maneira contígua e seqüencial. A organização dessas partes
normalmente é feita segundo regras já internalizadas pela gramática tanto do
leitor quanto do produtor. Através da compreensão dessas fatias menores, o
leitor vai compondo o significado do texto, num processo indutivo: (...) O processamento ascendente (bottom-up) faz
uso linear e indutivo das informações visuais, lingüísticas, e sua abordagem é
composicional, isto é, constrói o significado através da análise e síntese do
significado das partes" (Kato, 1995:50). O segundo processo, processamento
top-down, refere-se ao uso de conhecimento prévio, à formulação de
hipóteses e deduções, enfim, ao uso de elementos extralingüísticos, ou seja,
elementos que não estão propriamente contíguos ou explícitos no texto. São
processos dependentes do leitor e partem da macroestrutura (o nível de
seqüências maiores do texto como os períodos, parágrafos, ou mesmo capítulos,
onde os laços coesivos não são contíguos ou explícitos e constroem os onteúdos
do texto ou a sua estrutura temática) para as estruturas menores construídas
por laços coesivos entre elementos contíguos e seqüenciais do texto, chamadas
de microestrutura: (...) O processamento
descendente (top-down) é uma abordagem não-linear, que faz uso intensivo e
dedutivo de informações não-visuais e cuja direção é da macro para a
microestrutura e da função para a forma" (Kato, 1995:50). Segundo essa autora, a escola parece
priorizar o processamento ascendente pois centra sua atenção apenas nos
elementos lingüísticos. Assim, ao enfatizar os aspectos gramaticais, transforma
as aulas de leitura em pretextos para o estudo de questões normativas, e deixa
de lado a constituição de possíveis significados do texto que não estão
estabelecidos no nível mais propriamente microestrutural do texto. A
valorização dessa forma de processamento de leitura no contexto escolar se
deve, segundo Kato (1995) e Coracini (1995), à prevalência do modelo
estruturalista de linguagem na escola. Segundo esse modelo, que se desenvolve a
partir dos sucessores de Saussure, e que entende a língua não mais como sistema, mas como estruturas, por isso, estruturalismo (Orlandi, 1986), a linguagem é
vista de maneira mecânica, de forma que os segmentos menores se juntam para
formar o maiores. Assim, um fonema se junta a outro formando as palavras e
estas, juntas a outras, formam estruturas maiores. Dessa soma do significado de
cada palavra é que surgiria o sentido do texto. No modelo estruturalista, o
sentido está necessariamente arraigado à forma; o sentido está na forma. Para
Kato (1995), que se situa na posição intermediária entre a abordagem
estruturalista e a abordagem cognitivista, a constituição do sentido depende
tanto do texto (forma) quanto do leitor. E, por isso, defende que o leitor
maduro é aquele que utiliza, de maneira adequada e no momento apropriado, os
dois tipos de processamento mencionados (ascendente - dependente do texto e
descendente - dependente do leitor). E a melhor abordagem pedagógica seria
aquela que formasse ou preparasse um leitor capaz de monitorar a atividade da
leitura, percebendo quando necessita predizer, inferir, hipotetizar, e quando
necessita conferir ou checar tais predições ou hipóteses através dos elementos
materiais ou visuais do texto. Logo, rejeitando uma abordagem meramente
estruturalista (processamento ascendente) ou meramente cognitivista (processamento
descendente), Kato (1995) opta por uma abordagem interacionista, onde tanto os
elementos textuais (vindos do texto) quanto os elementos extratextuais
(processos desencadeados pelo leitor) entram em cômputo no momento da leitura e
da compreensão. E, a partir dessa concepção de leitura como interação, a autora
trabalha com algumas premissas básicas sobre como entende tal processo, ou
sobre a maneira como se dá a interação leitor/texto. Kato (1995) descreve
quatro tipos de leitor (analisador, construtor-analisador, cooperativo e
reconstrutor). Cada tipo de leitor pressupõe uma concepção de leitura que vai
da mera descodificação (leitor analisador) até o leitor reconstrutor, baseado
na concepção de leitura defendida pela autora. Para Kato (1995), os três
primeiros tipos leitores citados são reflexos de concepções de leitura nas
quais o texto é tido como unidade formal, com significado próprio. O leitor
reconstrutor, leitor proficiente na visão de Kato (1995), é aquele pressuposto
na concepção de leitura que prevê o texto como unidade funcional, como unidade
de comunicação e a leitura como um ato de reconstrução dos processos de sua
produção. Logo, o texto não é tomado como um objeto acabado, pois a construção
de seu sentido depende do ato do leitor em conceder-lhe significado. Ler seria,
para a autora, reconstruir os processos de construção do texto, por isso o uso
da expressão leitor reconstrutor. Kato (1995) interessa-se também em debater o
conceito de estratégia em leitura.
Para ela, o termo estratégia refere-se
a procedimentos inconscientes que o leitor realiza a fim de extrair significado
do texto lido. Na verdade, estratégias
seriam habilidades do leitor que englobariam: a) encontrar parcelas
significativas do texto, b) estabelecer relações de sentido e de referência
entre essas parcelas, c) encontrar a coerência entre as proposições do texto,
avaliar a consistência das informações extraídas do texto, e) inferir
significado e o efeito pretendido pelo autor do texto. No desenvolvimento
dessas estratégias, o leitor utilizaria os seus esquemas, ou seja, formas de compreensão que podem ser ativadas
tanto por fatias maiores como menores e através dos dois modos de processamento
- bottom-up e top-down. Enfim, para ela, o leitor pode variar o uso de estratégias
dependendo da situação que o texto lhe apresentar e de acordo com sua intenção
ou objetivos de leitura. Finalmente, Kato (1995) discute os conceitos de
estratégias cognitivas e metacognitivas, já que ambas entram em cômputo no
processo de leitura. As estratégias cognitivas são aquelas que auxiliam a
retenção e a utilização de novos conhecimentos, sua associação com
conhecimentos prévios, assim como o desenvolvimento e a reconstrução desses
novos conhecimentos e sua transferência para outros usos, situações e
contextos. Sendo assim, incluem-se nesta categoria as estratégias mnemônicas,
aquelas que otimizam a retenção do conhecimento (Kato, 1995). Essas estratégias
também podem ser entendidas como os princípios que regem o comportamento
automático e inconsciente do leitor, enquanto as metacognitivas são como os
princípios que regulam a desautomatização das estratégias cognitivas. Mais
especificamente, as estratégias
cognitivas seriam o ativamento natural, inconsciente de formas de
interpretação das marcas formais do texto, como se o leitor “obedecesse” a
certos princípios de construção do texto, tais como princípio da coerência
(global, local e temática), princípio da canonicidade ou da ordem natural,
princípio da parcimônia e outras regras ou princípios que permitem desvendar o
texto em sua macroestrutura e em sua microestrutura. Enfim, são os processos
inconscientes através dos quais o leitor interpreta as marcas formais do texto.
Já as estratégias metacognitivas seriam
todos os processos utilizados pelo leitor como monitoração de sua atividade de
leitura. Entendendo que a metacognição é, em termos simples, exatamente a
consciência dos processos mentais que se emprega em um processo de
aprendizagem, a capacidade de identificar as estratégias que se utiliza para
promover uma aprendizagem mais duradoura e que leve a resultados mais eficazes
(Kato,. 1995). A
abordagem sistemática da metacognição foi introduzida nos cursos de leitura
para fins específicos não há muito tempo. Advinda dos estudos em psicolingüística,
a metacognição tem estado presente geralmente nas primeiras unidades de curso
de leitura, considerando o fato de o aluno saber ou estar ciente de como ocorre
o processo de significação em sua mente, no entanto, não encontra unanimidade
na literatura no que diz respeito a ser um elemento facilitador no processo. De
todo modo, uma vez que a questão é discutível, trabalhos de Kleiman (1993) têm
servido como base para o trabalho do aspecto metacognitivo, como o de Kato
(1995), que centra-se na questão da cognição e metacognição, e o de Silva
(1988), que trabalha os fundamentos psicológicos envolvidos no ato de ler, são
paradas obrigatórias para o professor no que tange a esse tema. Quanto a Kato (1995), esta apresenta duas estratégias metacognitivas
básicas: o estabelecimento dos objetivos para a leitura e a monitoração da
própria compreensão tendo em vista os objetivos estabelecidos para a leitura. Daí
entende-se que as estratégias metacognitivas permitem planejar, controlar e
avaliar a aprendizagem, uma vez que a consciência dessas estratégias e sua
utilização são essenciais para a utilização eficaz das estratégias cognitivas e
para orientar e avaliar o progresso em direção aos objetivos traçados (Kato,
1995). Rubin e Thompson (apud Kato, 1995) definem "o bom aprendiz"
como sendo aquele que é capaz de avaliar sua própria aprendizagem, seus
processos mentais e agir conscientemente
para dirigir esse processo. Segundo Cohen e O'Malley & Chamot (apud
Kato, 1995), o bom aprendiz é capaz de utilizar estratégias cognitivas e
metacognitivas para tornar a aprendizagem mais rápida, prazerosa, direcionada,
eficaz e mais facilmente transferível a novas situações. É conveniente entender
que a metacognição integra vários processos de raciocínio e reflexão. Sendo
assim, deve ser desenvolvida através de um processo composto onde além de
receber informações, os alunos experimentam situações da vida real, trocam
experiências e discutem casos da vida real. Ou seja, através da aprendizagem situada ou vivenciada (Kato,
1995). Os componentes primários da metacognição são: preparação e planejamento
da aprendizagem, seleção e uso de estratégias de aprendizagem, monitoramento do
uso das estratégias, integração das várias estratégias e avaliação do uso de
estratégias e da aprendizagem. Cabe ao professor levar os alunos desse processo
a identificar as estratégias que podem ser utilizadas em diversas situações e
contextos, discutir seu emprego, e promover a identificação das estratégias que
eles utilizam consciente e inconscientemente em cada uma das cinco áreas
discriminadas acima (Kato, 1995). Postulando, também, uma concepção
interacionista de leitura, estão as pesquisas de Kleiman (1993) com as
formulações teóricas básicas com algumas propostas pedagógicas desenvolvidas
que parte do pressuposto que a teoria básica não necessita de limitar-se em
função de critérios apenas utilitários, ou seja, nem sempre a teoria deve estar
comprometida em resultar em dados práticos. O objetivo do desenvolvimento da
pesquisa básica não é sempre uma aplicação. Principalmente no caso da leitura,
em que a prática acontece antes da própria pesquisa. A autora considera que a
prática do professor não deve apenas refletir os ecos da teoria básica, mas ele
também pode e deve traduzir sua prática em descobertas que enriqueçam a
pesquisa. Isto quer dizer que, partindo desse pressuposto, a autora realiza um
resgate de diversos modelos teóricos de leitura que vão desde propostas mais
unidirecionais (modelo de processamento serial de Gough, modelo de processamento
automático de LeBerge e Samuels, modelo de sistemas de comunicação de Ruddel,
modelo de testagem de hipóteses de Goodman) até propostas interacionistas,
perspectiva por ela adotada. Kleiman (1993) se posiciona, portanto,
favoravelmente ao que denomina perspectiva interacionista de abordagem da
leitura, enquanto perspectiva baseada na pragmática e que concebe a leitura
como uma atividade que produz compreensão, sendo que esta depende basicamente
das relações que o leitor estabelece com o autor durante o ato da leitura. Para
ela, no momento da leitura, o leitor negocia sentido com o autor através da
interpretação e atribuição de valor intencional a certas “pistas lingüísticas”
que o autor providencia em seu texto. Assim, a leitura seria uma atividade de
interação: “No processo [de leitura] são
cruciais a relação do locutor com o interlocutor através do texto e da
determinação de ambos pelo contexto num processo que se institui na leitura”(Kleiman,
1993:39) .Assim, Kleiman (1993) a considera a figura do professor como
constitutiva do processo de leitura, já que ele é um dos elementos fundamentais
do contexto imediato do leitor. Sendo assim, ela aponta dois caminhos para a
ação do professor, que pode atuar como: 1) mediador entre leitor e autor, normalmente
enfatizando a sua leitura do texto, já que ele também é um interlocutor do
texto e normalmente se posiciona como intérprete do autor; 2) fornecedor de
condições para que se estabeleça a interlocução leitor/autor. No contexto
escolar, Kleiman (1993) observa que o aluno, apesar de ser um indivíduo com
infinita capacidade de aprendizagem, não consegue se constituir em sujeito na
leitura propiciada pela escola, pois no ambiente escolar ele não é levado a
usar capacidades desenvolvidas em outros contextos ou a dar sentido e coerência
às tarefas requisitadas nas aulas de leitura, ou a desenvolver outras
capacidades através da aprendizagem. Ao contrário, o aluno é exposto a
atividades banais que apenas restringem sua capacidade de leitura, em virtude
da inadequação de práticas pedagógicas de leitura desenvolvidas na escola. Assim,
compreendendo a leitura como interação e analisando a situação da leitura na
escola, toda a proposta de ensino da autora está voltada para a recuperação do
leitor enquanto autor da leitura, mediante a ação do professor. Isso quer dizer
que as dificuldades de leitura são determinadas tanto pelo texto, com suas
estruturas e marcações formais, como pelo sujeito. Kleiman (1997) procura
detectar os problemas de linguagem que os alunos apresentam no nível da
leitura, pois o conhecimento dos mesmos pode levar à sua superação, através da
criação de estratégias de ensino de leitura que visem a superar tais
dificuldades, como se observa em muitos artigos da autora. Considerando que a
leitura é uma faculdade que envolve o desenvolvimento de várias atividades por
parte do leitor, Kleiman (1997) considera que tais atividades são efetuadas
tanto a partir dos elementos extralingüísticos ou contextuais como a partir dos
elementos lingüísticos ou cotextuais. Como componentes
extralingüísticos ou contextuais entende tudo o que é externo ao texto e
que permite ao leitor definir para si o que é texto. Esse elemento contextual
implica o estabelecimento de objetivos para a leitura, a realização de inferências
e a criação de hipóteses e, principalmente, a ativação de conhecimento prévio. A
leitura enquanto compreensão de um texto é uma faculdade que se caracteriza
pela utilização do conhecimento prévio, isto é, o leitor ativa em sua leitura o
conhecimento adquirido ao longo de sua vida. Esse conhecimento prévio é
relativo a três formas de conhecimento: conhecimento
lingüístico que implica o conhecimento do significado das palavras, dos
constituintes imediatos, noções dos sintagmas, conhecimento dos agrupamentos
possíveis entre as palavras que às vezes são colocadas de maneiras discretas ou
discontínuas etc; conhecimento textual que
diz respeito a noções e conceitos sobre o texto enquanto conjunto que pode
conter uma estrutura expositiva, descritiva ou narrativa; conhecimento enciclopédico que abrange todo o conhecimento de mundo
do leitor e refere-se ao conhecimento estruturado que se tem na memória sobre
assuntos, situações ou eventos da cultura. Ao entender a compreensão como o
esforço para recriar o sentido do texto, ou o esforço inconsciente na busca de
coerência do texto, Kleiman (1997) pressupõe ainda que existam duas atividades
relevantes nessa tarefa: o estabelecimento de objetivos para a leitura e a
formulação de hipóteses. Quando o leitor formula um objetivo para a leitura, há
uma melhor interação com o texto, já que as atividades solicitadas para a
compreensão são ativadas a partir de um propósito específico. Além de auxiliar
nessa ativação de estratégias específicas, o estabelecimento de objetivos
também é fundamental para que o leitor possa formular hipóteses mais
pertinentes sobre o que lê, já que a leitura é considerada por Kleiman (1997)
como uma espécie de jogo de adivinhação, onde um sentido, ainda velado ao
leitor, deve ser encontrado. Essas duas atividades são consideradas
metacognitivas para a autora, pois pressupõem um monitoramento consciente por
parte do leitor da atividade da leitura. Os componentes
cotextuais ou lingüísticos são
entendidos por Kleiman (1997) como as propriedades internas do texto, os
elementos que materializam a significação do texto. Para ela, o texto é
considerado enquanto “(...) unidade
semântica onde os significados estão materializados em categorias léxicas,
sintáticas, semânticas, estruturais” (Kleiman, 1997:45). Assim, supõe
relevante o levantamento desses elementos, cujo conjunto ou cuja somatória
estabelecem a coerência do texto.
Para ela, o processo de compreensão do texto engloba atividades inconscientes
(processos cognitivos) realizadas pelo leitor que dão conta de interpretar
essas marcas formais do texto. O leitor busca a coerência e a coesão textuais
tanto em nível da microestrutura do texto (elementos que estabelecem a
coerência local do texto) quanto em nível da macroestrutura (elementos que
ligam seqüências maiores e que propiciam a coerência global). Para tal, Kleiman
(1997) usa uma série de regras ou princípios internalizados, que são utilizados
automaticamente e de forma inconsciente pelo leitor. Uma delas, por exemplo, é
o princípio de parcimônia, que rege
outras regras como a de recorrência e de continuidade
temática e que implica na redução do número de agentes ou de elementos
significativos do texto ou o princípio de
canonicidade ou da ordem natural (implica regra da linearidade ou máxima da
antecedência, regra da distância mínima); princípio
da coerência (quando há informações conflitantes, deve-se escolher aquela
que torne o texto coerente). É esta regra que orienta o texto no sentido de
eliminar as contradições (princípio da não-contradição). Finalmente,
enfatizando sempre sua concepção de leitura - uma interação à distância entre
leitor e autor via texto -, Kleiman reitera a importância de ambas as
instâncias que desempenham papéis no ato da leitura: o leitor que constrói e não apenas recebe um significado global para
o texto, através da associação das marcas formais do texto, da formulação de
hipóteses e outras formas de processamento e o autor que, por sua vez, busca a adesão do leitor, apresentando os
melhores argumentos, a evidência mais convincente, as marcas formais mais
claras etc. Uma característica, porém, desse tipo de interação é a
descontextualização, ou seja, não há um confronto direto entre autor/leitor, de
forma que não se podem efetivar certos reajustes de comunicação como acontece
na relação falante/ouvinte. Para Kleiman, o autor se faz presente no texto não
só em termos da organização formal dos elementos referencias do texto, mas
também através de outras marcas formais que explicitam sua atitude
proposicional, ou seja, seu posicionamento diante do referente. Essas marcas
são abserváveis, segundo a autora, através de três procedimentos básicos: a) da
articulação de temas e subtemas, mediante o uso de operadores lógicos que vão
compondo a forma de raciocínio do autor, organizado em forma de argumentações,
explicitações, exemplificações, enumerações etc; b) da utilização de
modalizadores, ou seja, expressões que indicam o grau de comprometimento do
autor com o referente, relativizando seu posicionamento entre a certeza
absoluta ou possibilidade mais remota; c) das adjetivações, nominalizações, uso
de nomes abstratos ou expressões qualificadoras que mostram a atitude ou
opinião do autor diante daquilo que escreve -repúdio, crítica, apologia,
aprovação etc. O resgate da posição do autor diante daquilo que escreve, ou
seja, a tentativa de compreender como o autor pretendeu que seu texto fosse
entendido, ou ainda, o resgate da força ilocucionária do texto é que situa a
proposta de leitura de Kleiman (1997) como uma proposta baseada na pragmática.
Por isso, freqüentemente, seus textos providenciam partes específicas para
abordar a relação leitor/autor, abarcando, segundo ela, o aspecto discursivo da
relação comunicativa estabelecida no momento da leitura. Partindo da exposição
da leitura enquanto interação autor/leitor via texto e da análise dos elementos
que entram em cômputo no momento da realização da atividade de leitura
(articulação entre processos que recuperam elementos cotextuais e contextuais e
recuperação dos aspectos pragmáticos da leitura), Kleiman (1997), integrando
suas pesquisas com o ensino, especifica algumas dificuldades dos alunos em
relação à leitura e propõe para as mesmas alguns objetivos metodológicos para o
professor, já que, em sua perspectiva, este é considerado uma instância
constitutiva da atividade de leitura na escola: Quanto aos aspectos de
estruturação semântica: levar o aluno a compreender que o texto possui uma
coerência global que se articula em torno de uma unidade temática, razão pela
qual os professores devem evitar abordagens segmentadoras dos textos,
privilegiando partes em detrimento do todo; Quanto à construção de conexões
lógicas: levar o aluno a identificar e compreender a função das diversas
conexões lógicas dos textos (conjunções ou expressões ou sintagmas que denotam
relação de oposição, adição, exclusão, enumeração etc). Sem o reconhecimento
dessas estruturas, o aluno pode incorrer numa série de problemas: deslocamento
de funções das partes do texto, ao entender uma premissa ou justificativa como
elemento central; não compreensão do objetivo do texto; não percepção dos
elementos ou estruturas que sustentam a argumentação; incapacidade de retomar
pressupostos e argumentos e dificuldades de realizar inferências; Marcação de
conexões lógicas: ensinar ao aluno o papel dos marcadores de conexões lógicas
através do desenvolvimento de atividades que privilegiem o texto enquanto
estrutura global. Para Kleiman, devem-se evitar abordagens que segmentem os
textos ou privilegiem o nível sentencial, pois estas impedem que os leitores
integrem as diversas informações lidas; Quanto à modalização (expressões que
indicam o grau de comprometimento do autor com a verdade da informação a que se
refere): o professor deve habilitar o aluno a apreender e avaliar a posição do
autor com respeito ao conteúdo referencial do texto, ou seja, treinar o aluno
na percepção das marcas textuais que são contextualmente relevantes para a
percepção das intenções e das posições do autor. Quanto à polifonia (presença,
no texto, de vozes diversas a do autor): o professor pode desenvolver
atividades de leitura que propiciem ao aluno a percepção de outros focos
enunciativos que não sejam exclusivos do autor. Nessa abordagem pode-se
perceber que à leitura subjaz a noção de que, ao ler, o leitor estaria
recuperando o sentido do texto, bem como as intenções do autor, através das
marcas por ele deixadas no mesmo. A recuperação dessas intenções, pontuadas por
marcas textuais específicas é que caracterizam o aspecto pragmático desta
abordagem de leitura e a caracterizam como uma forma de interação.
A LINHA DISCURSIVA DA LEITURA - Ao pensar o texto como
elemento dotado de significado e portador das intenções do autor, as autoras
anteriormente citadas (Kato,1995; Kleiman 1993, 1996, 1997) e outros
(Cavalcanti, 1989) estariam adotando, segundo Coracini (1995), uma concepção
que se constitui em prolongamento da visão tradicional ascendente - aquela
privilegiada pelas abordagens estruturalistas), já que, embora enfatizem o
caráter interacional da leitura através da valorização do papel desempenhado
pelo leitor (delineamento de objetivos, formulação de hipóteses, conhecimento
prévio etc), sua ênfase recai, ainda, sobre o texto, elemento central do
processo de leitura, pois é nele que se encontram até mesmo os elementos que
permitem a interpretação pragmática, como enfatiza Coracini: Se é o texto que
predetermina, ou seja, autoriza um certo número de leituras (através das
chamadas inferências autorizadas) e impede ou impossibilita outras, então, o
texto é ainda autoridade, portador de significados por ele limitados, ou
melhor, autorizados; o texto teria, assim, a primazia sobre o leitor, que
precisa, com competência, apreender o(s) sentido (s) nele inscrito(s).
(Coracini, 1995:15) A crítica de Coracini à abordagem interacionista de leitura
tem seu ponto central (ausência de uma real interação) apoiado numa premissa
que Orlandi (1996) já havia destacado a respeito do jogo interacional. Para
essa autora, a relação que se dá no momento da leitura é uma relação entre o
leitor virtual e o leitor real, sendo, portanto, uma relação de confronto.
Logo, o leitor não interage com o texto,
mas com sujeitos que podem ser o
autor, o leitor virtual e outros. Assim, Orlandi (1996) considera a abordagem
interacionista, aqui mencionada como abordagem cognitivo-processual como uma
abordagem, embora nomeada interacionista, ainda centrada na “objetualidade” do
texto: Se se deseja falar em processo de interação da leitura, eis aí um
primeiro fundamento para o jogo interacional: a relação básica que instaura o
processo de leitura é o do jogo existente entre o leitor virtual e o leitor
real. É uma relação de confronto. O que, já em si, é uma crítica aos que falam
em interação do leitor com o texto. O leitor não interage com o texto (relação
sujeito/objeto), mas com outro(s) sujeitos(s). A relação, (...) sempre se dá
entre homens, são relações sociais; eu acrescentaria, históricas, ainda que (ou
porque) mediadas por objetos (como o texto). Ficar na “objetualidade” do texto,
no entanto, é fixar-se na mediação, absolutizando-a, perdendo a historicidade
dele, logo, sua significância. (Orlandi, 1996:9). É nesta perspectiva de
questionamento da abordagem interacionista e de introdução das preocupações
teóricas sobre leitura no âmbito da análise do discurso que se pode introduzir
uma terceira abordagem teórica de leitura: a abordagem discursiva. Introduzida, inicialmente, por Orlandi (1996)
e divulgada também por Coracini (1995), esta abordagem tem como premissa o fato
de que a leitura ou o ato de ler implica um processo discursivo, o que permite
problematizá-la no domínio do discurso, buscando entender como se dá a
compreensão realizada na leitura, o que, em última instância significa, como
assinala Orlandi (1996:101) pensar uma questão fundamental dentro da analise do
discurso: “a reflexão sobre o
funcionamento discursivo da compreensão tem, como veremos, um retorno que
incide sobre uma questão crucial para a própria análise de discurso: a
constituição dos processos de significação.” Orlandi (1996) explicita o
conteúdo teórico que sustenta as discussões propostas na maior parte dos textos
que tratam a leitura sob a perspectiva discursiva. Nele, procura delimitar o
método que rege a Análise do discurso, já que entende que em linguagem todo
método, técnica e mesmo as propriedades do objeto são sempre determinados por
pressupostos filosóficos. Isso porque Orlandi (1996) considera a linguagem como
trabalho, como produção e o fato de ser trabalho determina a produção da
linguagem enquanto parte da produção social. Esse fato de considerar a
linguagem como trabalho implica dois fatos significativos para a Análise do
Discurso: 1) que a linguagem não é apenas instrumento de comunicação, ela é
importante não só pelo conteúdo referencial que traz, mas pelas implicações
psíquicas, sociais e, principalmente, ideológicas de seu uso, 2) que tomar a
palavra é um ato social com todas as sua implicações, conflitos,
reconhecimento, constituição de identidade etc. Logo, se a linguagem é trabalho
e seu uso é um ato social, com todos os desdobramentos que este ato pode gerar,
torna-se de extrema importância a compreensão das condições de produção do discurso, ou seja, a compreensão da
situação de comunicação, que envolve a somatória
dos interlocutores envolvidos, da situação de produção e do contexto
hitórico-social e ideológico que vai constituir a semântica discursiva: “análise
dos processos característicos de uma formação discursiva que deve dar conta da
articulação entre o processo de produção de um discurso e as condições em que
ele é produzido” (Orlandi,1996:19). Orlandi (1996) aponta também dois
processos que se articulam na produção do discurso: o processo parafrástico (é o que permite a produção do mesmo sentido
sob várias de suas formas - matriz de linguagem) e o processo polissêmico (é o responsável pelo fato de que são sempre
possíveis sentidos diferentes, múltiplos - fonte de linguagem). E daí, discorre
sobre as técnicas e o objeto. A unidade da Análise do discurso é o texto,
“(...) definido pragmaticamente como a
unidade complexa de significação, consideradas as condições de sua produção. O
texto é considerado um processo de interação” (Orlandi, 1996:21). O texto,
na análise do discurso, ultrapassa a noção de informação e coloca a necessidade
se ir além do nível segmental. Por isso, a Análise do Discurso não trabalha com
“distribuição segmental”, mas com “recortes” que são as unidades discursivas.
Finalmente, a Análise do discurso não descreve a função, mas o funcionamento,
já que considera o discurso como parte de um mecanismo em funcionamento,
correspondendo a um certo lugar no interior de uma formação social. Tendo como
base essa formulação teórica, a leitura é concebida como um processo discursivo
onde atuam dois sujeitos que, por sua vez produzem sentido, o leitor e o autor,
sendo que cada um desses se insere num momento sócio-histórico sendo, portanto,
ideologicamente constituídos. Assim, tanto leitor como autor, produzindo
sentido sempre a partir de contextos histórico-sociais determinados, produzirão,
conseqüentemente, sentidos determinados ideologicamente. Assim, pode-se dizer
que os sentidos produzidos são determinados por formações discursivas,
inscritas dentro de determinadas formações ideológicas: A formação discursiva
se define como aquilo que numa formação ideológica dada (isto é, a partir de
uma posição dada em uma conjuntura sócio-histórica dada) determina o que pode e
deve ser dito. (...) a formação discursiva é, enfim, o lugar da constituição do
sentido e da identificação do sujeito (Orlandi, 1996:58). Por conseguinte, o
texto, enquanto uma forma de articulação da linguagem não mais é tomado como
uma unidade de sentido pré-estabelecido, já que os sentidos não se inscrevem
nele, mas nos sujeitos determinados por contextos sócio-históricos que para ele
produzem sentido. Sem o leitor, ou sem uma instância que possa atribuir
sentido, os textos não possuem sentido por si só, como afirma Coracini
(1995:17): (...)os textos,
independentemente das convenções partilhadas, independentemente da formação
discursiva, são conjuntos amorfos de sinais gráficos, incapazes de reter
sentido fora do jogo lingüístico, fora do universo de discurso”. Nesse
sentido, não é o texto (mesmo com todas as marcas que pode conter) que
determina a leitura, como se viu na abordagem pragmático-processual, mas o
leitor. Este é um sujeito inserido em determinado contexto histórico-social por
sua vez gerador de uma formação discursiva que também é determinada por uma
certa formação ideológica. Logo, a leitura é sempre produzida, como coloca
Orlandi (1996:10): Daí nossa afirmação de que a leitura é o momento crítico da
produção da unidade textual, da sua realidade significante. É nesse momento que
os interlocutores se identificam como interlocutores e, ao fazê-lo, desencadeiam
o processo de significação do texto. Leitura e sentido, ou melhor, sujeitos e
sentidos se constituem simultaneamente, num mesmo processo. Orlandi (1996)
afirma que a leitura é uma questão que se refere a três áreas básicas, à
lingüística, à pedagogia e à sociedade, principalmente no sentido de que cada
uma dessas áreas deve evitar alguns reducionismos a que têm submetido a
leitura. Esses reducionismos pedagógicos referem-se ao fato de a escola
restringir a reflexão sobre a leitura ao seu caráter mais técnico ao pensar
exclusivamente em soluções pedagógicas para a leitura, o que acaba, segundo
Orlandi (1996), por desvincular a leitura de seu caráter histórico mais amplo. Para
Orlandi (1996) é preciso que se permita ao aluno uma leitura que leve em consideração
a sua própria história de leitura, assim como a história das leituras dos
textos e a história da relação do aluno com a escola e com o conhecimento
legítimo. O reducionismo lingüístico está no sentido de se entender a leitura
como uma descodificação, considerando-se o texto como dotado de um conteúdo
(sentido específico) que o aluno deva apreender. Essa é uma crítica às
abordagens de leitura que enfatizam a textualidade e a questão da legibilidade.
Para Orlandi (1996), leitura não é descodificação e apreensão de um sentido que
já está inscrito no texto; o sentido é produzido pelo leitor e não
pelo texto. Além disso, o texto não é mero produto, ele é um objeto que foi
composto como um processo e por isso seu sentido também tem uma história.
Leitura é produção de um sentido para o texto e o que a Análise do Discurso
procura fazer é investigar o processo e as condições da produção desse sentido:
Leitura é o momento crítico da constituição do texto, o momento privilegiado do
processo de interação verbal, uma vez que é nele que se desencadeia o processo
de significação. No momento em que se realiza o processo da leitura, se
configura o espaço da discursividade em que se instaura um modo de significação
específico (Orlandi, 1996:38). Outra tese fundamental, segundo Orlandi, para se
pensar a leitura na perspectiva discursiva é a que toda leitura tem sua história, ou seja, o sentido de um texto é
variável de acordo com as “condições” em que se lhe foi (foram) atribuído(s)
sentido(s). Há algumas variantes que podem influenciar a historicidade da
leitura e Orlandi (1996) se detém nas três que considera fundamentais:
condições de produção dos sentidos e contexto de utilização desses sentidos, ou
seja, todo o sentido é produzido de acordo com condições sociais, históricas e
ideológicas específicas; relações de intertextualidade de um texto com outros
textos, ou seja, os sentidos estabelecidos ou atribuídos aos textos são função
direta da relação que eles possuem com outros textos, já que é o conjunto de
relações entre os textos que mostra como o texto deve ser lido. Estas relações
constituem a história de leitura dos textos; e a história de leitura do leitor,
já que o conjunto de leituras feitas por ele vão configurar a sua compreensibilidade de um texto, ou seja,
tudo o que ele leu vai auxiliar no processo de atribuição de sentido a um
texto. Partindo desta noção de história de leitura, Orlandi emprega, também, o
termo arquivo, relacionado à memória
de leitura dos leitores. O conhecimento desses fatores que produzem a história das leituras implica, para
Orlandi, algumas conseqüências pedagógicas: a) evitar as petrificações das
leituras previstas, a fim de que se possam realizar leituras novas tanto quanto
possível; evitar as leituras censórias, típicas de um sistema reprodutor; b) os
professores deveriam propor uma organização curricular que fosse capaz de
provocar o aluno a trabalhar em sua própria história de leitura, os seus
arquivos pessoais enquanto leitores. Embora trabalhando com a leitura a partir
de uma perspectiva de aplicação teórica da análise do discurso, tentando
compreender um processo de significação específico, que é aquele que se
instaura no momento da leitura, também esta abordagem discursiva da leitura tem
sua inserção no mundo prático, na medida em que problematiza, questiona e até
sugere mudanças pedagógicas em relação ao encaminhamento teórico que dá às
questões de leitura no interior da escola, como se viu anteriormente. No
entanto, Alexy (1989), os problemas da teoria do discurso são ordenados em três
grupos. Os do primeiro grupo dizem
respeito ao status da teoria do
discurso enquanto teoria da verdade, os do segundo, à sua aplicabilidade e os
do terceiro, à fundamentação da teoria do discurso. Assim sendo, sendo Alexy
(1989), trata-se do status da teoria
do discurso enquanto teoria da verdade, quando é discutida a relação dos
conceitos de verdade e adequação com conceitos como os de consenso, discussão
ilimitada e racionalidade, observados por Scheit e Wellmer, no tocante ao
problema da aplicabilidade quando se objeta à teoria do discurso que ela seria
puramente formal e sem qualquer conteúdo, o que demonstraria que ela não pode
levar a qualquer resultado definitivo. Já o problema da fundamentação diz
respeito à justificação dos princípios e regras do discurso, conforme
demonstrado por Habermas. A teoria do discurso, conforme Alexy (1989), pertence
à classe das teorias procedimentais, o que segundo esta teoria, a adequação de
uma norma ou a verdade de uma proposição depende de se a norma ou a proposição
é ou pode ser o resultado de um procedimento determinado, defendendo, assim,
que se algo é efetivamente o resultado de um procedimento, isto significa que
esse algo também pode ser o resultado do mesmo procedimento, enquanto a
recíproca não é verdadeira. Já em relação aos indivíduos, ressalta Alexy (1989)
que é preciso diferençar segundo número e características. No que concerne às
características dos indivíduos, pode-se partir de indivíduos faticamente
existentes ou de indivíduos ideais ou construídos. A teoria do observador ideal
proposta por Firth(apud Alexy, 1989) é exemplo de um procedimento que se
utiliza, primeiramente, de apenas um indivíduo, e em segundo lugar, de um
indivíduo ideal. Diante disso, a teoria
do discurso é caracterizada pelo fato de que um número ilimitado de indivíduos,
tais como realmente existem, podem tomar parte em um procedimento. O caráter do
procedimento depende do número de indivíduos e dos tipos de requisitos
exigidos. A diferença mais importante no
caráter do procedimento é saber se está ou não prevista, com base no
procedimento, a possibilidade de uma mudança nas convicções e nos interesses
empíricos e normativos dos participantes (Alexy, 19989). Os requisitos exigidos
pela teoria do discurso, seguindo a idéia de Alexy (1989), já que esta não
apresenta prescrições concernentes aos indivíduos, podem ser inteiramente
formuladas através de regras. Essas
regras compreendem aquelas que prescrevem, por exemplo, não-contradição,
clareza de linguagem, verdade empírica e sinceridade; aquelas que expressam,
entre outras, a idéia de universalidade, garantindo a todos o direito de
participarem do discurso e de serem tratados com igual consideração; e aquelas
que valem para a argumentação sobre as conseqüências, ponderação e análise da
gênese das convicções normativas. Contra este espectro variado objetou-se que
expressaria um conceito confuso de racionalidade, defendido por Weinberger, o
qual de nada serviria para a clareza da análise. Esta objeção somente seria válida, contudo,
se pelo menos um de três pré-requisitos fosse verdadeiro. O primeiro é que o conceito de racionalidade
prática explicitado pelas regras não pode ter conteúdo moral. O segundo estaria
satisfeito se aquelas regras que revelam conteúdo moral, tais como as que
expressam exigências não-triviais de universalidade, fossem insusceptíveis de
fundamentação. E o terceiro para aceitar a objeção mencionada acima seria se o
conteúdo moral de algumas regras do discurso privasse todo o sistema de sua
aplicabilidade (Alexy, 1989). Do ponto de vista da aplicabilidade, a principal
fragilidade da teoria do discurso consiste no fato de que seu sistema de regras
não oferece qualquer procedimento que permita chegar exatamente a um resultado
em um número finito de operações. Há
três razões para isto. Em primeiro
lugar, as regras do discurso não contêm quaisquer prescrições concernentes aos
pontos de partida do procedimento, os quais são constituídos pelas convicções
normativas e as interpretações de interesse dos participantes existentes a cada
tempo. Em segundo lugar, as regras do
discurso não prescrevem todos os passos da argumentação. Em terceiro lugar, há uma série de regras que
podem ser cumpridas apenas de maneira aproximada (Alexy, 1989). Assim, a teoria
do discurso não pode sempre garantir uma decisão definitiva. O primeiro
problema, quando da aplicação do discurso ideal como critério de adequação,
resulta do fato de que um procedimento, que é essencialmente uma cooperação
entre várias pessoas, tem de ser desenvolvido na mente de uma pessoa e, neste
sentido, monologicamente. A cooperação
entre várias pessoas é necessária ao discurso prático pelos seguintes motivos:
nele busca-se a solução adequada para questões práticas que envolvem interesses
de várias pessoas, isto é, trata-se da solução adequada para um conflito de
interesses. Para este fim, as convicções
normativas efetivamente existentes de cada participante sobre a solução
adequada são submetidas a uma investigação racional. Neste processo, as respectivas interpretações
dos interesses dos participantes, assim como sua modificação por meio de
argumentos, desempenham um papel decisivo (Alexy, 1989). O segundo sub-problema
do problema do critério resulta do caráter ideal dos requisitos exigidos pelo
discurso ideal. Nem um discurso real nem
um discurso virtual levado a efeito na mente de uma pessoa pode jamais
satisfazer inteiramente esses requisitos.
Mas um preenchimento aproximado é possível. Um resultado que satisfaz apenas
aproximadamente os requisitos do procedimento é necessariamente um resultado
incerto. Mas, como já foi dito, incerteza não implica em impropriedade. O
terceiro sub-problema do problema do critério resulta da estrutura interna do
discurso ideal. Quando da discussão do
problema do consenso verificou-se, em primeiro lugar, que mesmo em um discurso
ideal potencialmente infinito nunca se pode ter certeza de se um consenso já
atingido é final ou definitivo; e, em segundo lugar, que não pode ser excluída
a possibilidade, mesmo em semelhante discurso, de não se chegar a qualquer
consenso, o que significa que duas normas mutuamente contraditórias podem ser o
resultado de um procedimento ideal. O
problema do caráter definitivo do consenso causa menores dificuldades. Um consenso resultante de um discurso ideal
potencialmente infinito de fato não assegura qualquer certeza definitiva, mas
mesmo assim garante um grau de segurança suficiente para poder ser aceito como
critério (Alexy, 1989). Ainda que muitas objeções contra a teoria do discurso
possam ser respondidas, o resultado permanece particularmente
insatisfatório. Por um lado, o conceito
de adequação dissolve-se em uma idéia regulativa, de outro lado ele é em alto
grau relativizado e sobrecarregado de incertezas. Contudo, esta ainda não será a última
palavra, caso seja acertada a tese de que o valor prático da teoria do discurso
só se mostrará plenamente se ela for tomada como uma teoria básica das
instituições do Estado constitucional democrático que se assentam sobre a idéia
de discussão (Alexy, 1989).
A LINHA ESTRUTURALISTA - Como se viu anteriormente, as
abordagens de leitura aqui referidas concebem a leitura como uma atividade que
envolve não só o ato primeiro de descodificação de um código, mas outras
atividades mais amplas e complexas. Entendem a leitura como uma forma através
da qual são criados os sentidos, além de concederem ao leitor um lugar
fundamental na prática desta atividade. Sob essas abordagens de leitura,
pode-se inferir a prevalência de um ponto de vista sobre o fato lingüístico e
sobre a linguagem que se aproxima mais de uma tendência que, segundo Orlandi
(1999:18), pode ser chamada de sociologista e que “se aplica em estudar o percurso social, explorando a relação entre
linguagem e sociedade. Procura o que é múltiplo, diverso e variado”. Em
oposição a essa tendência sociologista, estaria uma tendência formalista da
linguagem, entendida como aquela que “se
ocupa do percurso psíquico da linguagem, observando a relação entre linguagem e
pensamento. Busca o que é único, universal e constante (Orlandi,1999:18). Pensando
a leitura como uma prática que envolve a linguagem e que implica um processo de
constituição de significado, seu estudo abarca, portanto, relações com a
linguagem e, certamente, insere essa prática enquanto um fato lingüístico.
Conseqüentemente, diferentes direções ou tendências dos estudos lingüísticos
acabam por gerar perspectivas diversas com relação à leitura. O funcionalismo caracteriza como uma forma
de estudo lingüístico que vem do estruturalismo
e cuja marca seria o estudo das funções que os elementos lingüísticos podem
desempenhar. Assim, são estudadas as distinções e funções que cada aspecto da
linguagem (morfológico, fonológico, semântico, gramatical, etc) pode envolver. Uma
das versões do funcionalismo pode ser encontrada nos estudos de Jakobson
(1991), nos quais o autor adota uma postura que privilegia a linguagem em
função da atividade comunicativa que ela pode desempenhar no interior das
atividades humanas. Fundamentada na Teoria
da Comunicação, essa perspectiva lingüística entende a linguagem
prioritariamente como instrumento de comunicação, de forma que esta passa a ser
pensada por um prisma exterior à própria linguagem. Nesse sentido, a linguagem
estaria a serviço de algo alheio, exterior a ela mesma. Partindo desse objetivo
prioritário, ou seja, comunicar, a Teoria
da Comunicação, segundo Vanoye (1996), propõe um esquema que abarca várias
instâncias intervenientes no processo da comunicação. São elas: o emissor (instância que emite a mensagem),
o receptor (instância que recebe a
mensagem), a mensagem (o objeto da
comunicação, conteúdo das informações transmitidas), o canal ou meio (veículos da comunicação), o código (conjunto codificado de signos usados para transmitir a
mensagem), referente (mundo,
contexto, realidade, situação a que a mensagem remete). O desdobramento do
processo comunicativo, compreendido através de todas as instâncias que dele
participam objetiva o bom funcionamento da linguagem em termos da atividade
comunicativa. Assim, o estudo desse processo visaria atingir uma comunicação
eficaz, ou seja, garantir que a mensagem seja transmitida sem problemas,
estabelecendo a relação entre emissor-receptor. Aplicando essas considerações
para a leitura, o esquema da comunicação pode ser entendido nos seguintes
termos: o remetente seria o autor do texto que teria por função enviar uma
mensagem ao leitor (destinatário). Este, por sua vez, deveria produzir uma
resposta a essa mensagem a partir da descodificação dos signos que a compõem. Como
se observa, essa forma de compreensão da leitura não considera outros fatores,
extralingüísticos, como a historicidade, o contexto de produção da leitura e
outros enquanto intervenientes no ato da leitura. A partir dessas idéias,
disseminou-se, principalmente a partir da metade da década de 1970, no Brasil,
uma abordagem de leitura aqui denominada estruturalista,
realizadas por Penteado (1977) e
Blikstein (1991). Para Penteado (1977) a busca pela efetivação eficaz da
comunicação é uma tônica. O autor trabalha com as quatro habilidades básicas:
fala, audição, leitura e escrita, e apresenta, em forma de manual, técnicas
destinadas a melhorar e aperfeiçoar essas habilidades comunicativas. Com
relação à leitura, destina à conceituação do ato de ler, bem como aos problemas
de leitura e às técnicas destinadas ao desenvolvimento da mesma. Assim sendo,
para Penteado (1977:198), a leitura é processo de busca ao significado do
texto, sendo este compreendido como uma codificação feita pelo emissor (autor) e
que precisa ser apreendida pelo receptor: "Na leitura, os olhos e a mente cooperam intimamente: os olhos para ver
e a mente para compreender. A finalidade da leitura é compreender o sentido das
palavras, rápida e facilmente. Pode-se definir a leitura como a procura do
significado; ler é procurar o significado". Permanece, assim, como
idéia corrente sobre a leitura que o texto possui uma codificação que contém as
idéias do autor, como se o texto fosse capaz de transmitir os pensamentos do
autor e como se linguagem e pensamento guardassem entre si uma relação estreita
de correspondência. O leitor, por sua vez, ao “descodificar” o texto, ou seja,
ao ler, estaria compreendendo as
idéias geradas na mente do autor. Por isso, são recorrentes o uso de
vocabulários como compreender ou interpretar para caracterizar-se o
processo de “retenção” do pensamento do autor: A leitura é processo de
interpretar o texto impresso e tem a finalidade de compreender esse texto.
Sendo a leitura um processo, compreende seis atividades distintas:1a)
o reconhecimento dos vocábulos, 2a) a interpretação do pensamento do
autor, 3a) a associação das idéias do autor com as idéias do leitor,
4a) a retenção dessas idéias, 5a) a capacidade de
reprodução dessas idéias.(Penteado, 1977:186). Como se nota, o ponto de vista
de Penteado (1977) privilegia a descodificação do código e fundamenta-se na
idéia de que a linguagem serve prioritariamente à comunicação, para a qual não
concorreriam quaisquer outros aspectos extralingüísticos. Logo, para esse
autor, a leitura seria mais eficaz quanto mais o leitor pudesse reproduzir e
reter a mensagem do autor através das marcas lingüísticas do texto: Na leitura,
só podemos ter a certeza de que o processo se completou, se identificarmos a
quinta e última atividade. Essa quinta atividade, que coroa o processo da
leitura, é a reprodução que o leitor fará, sempre que necessário, do que leu,
ou seja, do que reconheceu, interpretou, compreendeu, reteve, e é capaz de
parafrasear (Penteado,1977:189). Essa compreensão funcionalista da leitura
certamente teve seus correspondentes pedagógicos e, mesmo a utilização de
certos termos (compreensão,
interpretação, parafrasear) atestam sua pronta adoção por parte de autores
de livros didáticos e de propostas pedagógicas. Essa mesma abordagem de leitura
é de Blikstein (1991), que propõe algumas assertivas que evidenciam as idéias
sobre sua concepção de leitura, numa concepção de que é possível que um autor
transmita seu pensamento, como se a linguagem existisse de forma neutra,
límpida, fora do jogo social e histórico em que é utilizada. Assim, o autor
(emissor) é dono de um falar que lhe é próprio e que não sofre quaisquer
injunções nem mesmo por parte daquele que o recebe (emissor/leitor),
caracterizando uma relação transparente e reflexa entre idéias/pensamento e
linguagem/código. Cada um dos dois extremos do processo comunicativo
(emissor/receptor) têm, para Blikstein (1991:33), papéis definidos, com funções
muito precisas na emissão/apreensão dessa mensagem transparente: O remetente
tem por função enviar uma mensagem ao destinatário, estimulando-o a produzir
uma determinada resposta. O destinatário, por sua vez, ao ser estimulado pela
mensagem, deverá produzir, em princípio, a resposta esperada ou desejada pelo
remetente.(....) No ato comunicativo, as idéias do remetente serão comuns ao
destinatário, quando: a) o remetente transformar tais idéias em mensagens, isto
é, associá-las a estímulos físicos ou significantes, formando signos; b) o
remetente enviar a mensagem, constituída de signos, ao destinatário; c) o
destinatário receber os signos, captando os significantes e entendendo os
significados ou idéias a eles associados. A relação pensamento/linguagem
defendida pelo autor parece ser baseada na correlação de significantes e
significados, ou seja, basta que os signos convencionalizados sejam comuns a
emissor e receptor, a transmissão dos pensamentos do autor para o leitor
estaria garantida. Isso quer dizer que a boa codificação, feita com signos
comuns entre emissor/destinatário, garantiria a eficácia da escrita e a boa
descodificação, a eficácia da leitura, como se fosse possível ao autor ter
pleno controle dos sentidos a serem produzidos pelo leitor nos mais diversos
contextos de efetivação da leitura. Como se vê, a abordagem estruturalista
trabalha a leitura como uma atividade invariável, já que os leitores
encontrariam no texto sempre o mesmo sentido, independentemente das
circunstâncias sociais, culturais ou históricas em que a leitura possa ser
realizada. Além disso, o leitor não contribui para a constituição dos sentidos
e estes encontram-se atrelados exclusivamente aos elementos lingüísticos do
texto, tornando o autor, produtor do texto, o “dono dos sentidos”. Embora
tratando a questão da leitura através de recortes metodológicos diferentes,
sejam eles o da pedagogia crítica (linha político-diagnóstica), a
psicolingüística e a pragmática (linha cognitivo-processual) e a análise do
discurso (linha discursiva). Mediante tais abordagens, no que concerne
especificamente à leitura, as novas teorias que surgiram nas últimas décadas
sobre o processo de ensino-aprendizagem certamente provocaram transformações
nos instrumentos e critérios para avaliação, quer dizer, que antes valoriza-se
o ensino de estruturas formais, passando-se hoje a enfatizar o uso comunicativo
e a considerar uma variedade de influências – cognitivas, afetivas e
contextuais Kato, 1995b; Zilberman, 1995). Todas essas mudanças sugeriram novas
formas de abordar a avaliação de leitura que, ao invés detestar pontos
isolados, itens estruturais ou lexicais específicos, levando-se, então, em
conta o efeito comunicativo global do texto (Gimenez, 1999). Assim sendo, as
concepções de leitura na prática avaliativa não pode ser concebida como uma
atividade isolada ou simplesmente como uma etapa final de um processo de
ensino-aprendizagem, vez que requer do professor uma visão ampla sobre sua
disciplina e um conhecimento teórico consistente sobre os princípios da
avaliação. Portanto, é importante considerar até que ponto a prática de ensino
e avaliação de leitura está fundamentada teoricamente (Kato, 1995; Kato, 1995b;
Zilberman, 1995). Ao observar a articulação entre ensino e avaliação de
leitura, parte-se do pressuposto de que é preciso saber o que se ensina para
saber avaliar. Nesse sentido, se o professor não for capaz de definir o que
entende por habilidade de leitura, será muito difícil pensar em meios adequados
para avaliar tal habilidade. Ou melhor, como afirma Alderson (apud Júdice,
2000), “a nossa avaliação representa a
nossa visão de leitura”. Por esta razão, a escolha de um determinado modelo
de leitura tem implicações sobre o quê e como avaliar. Assim, para elaborar
instrumentos de avaliação, o professor precisaconhecer as diferentes concepções
sobre a natureza da leitura e levar em conta o que as pesquisas mais recentes
sugerem sobre o processo e não apenas sobre o produto (Hoffman, 1997). A
complexidade do processo de leitura, que tem sido amplamente estudado nas
últimas décadas, despertando o interesse de pesquisadores das mais diversas
áreas, como antropologia, filosofia, psicologia, educação e inteligência
artificial, além da lingüística e da lingüística aplicada, na verdade, como
afirma Goodman (apud Hoffman, 1997), tem-se já um conhecimento considerável sobre
leitura, mas há muito mais a aprender, uma vez que esse é um processo
essencialmente dinâmico. Outra dificuldade refere-se ao fato de que a leitura
passou a ser estudada de modo muito segmentado. No conjunto das pesquisas,
prevalece uma visão compartimentalizada. Em meio às várias perspectivas, em que
cada aspecto envolvido é tomado isoladamente, a investigação acaba por perder o
caráter totalizador, que ajudaria a compreender melhor o fenômeno. Essa
excessiva fragmentação do objeto de estudo afeta não só o trabalho dos próprios
especialistas, mas exerce uma influência decisiva sobre a atuação do professor
(Kato, 1995). Conforme observa Kato (1995:98), "(...) em virtude do pedagogo ser bombardeado com várias teorias, várias
terminologias e várias concepções, o
mesmo ocorre no contexto de sala de aula com o professor", isso porque
ele tem a difícil tarefa de operacionalizar essas muitas concepções em termos
de metodologias e abordagens. Ademais, Zilberman (1995:84), já chamava a
atenção para o fato de que,“(...) no
âmbito da escola, a reflexão sobre leitura confunde-se com metodologia de
ensino”, reduzindo-se, via de regra, a técnicas propostas pela didática ou
a modelos voltados exclusivamente à leitura de obras literárias. Acredita-se,
contudo, que o professor deva sempre contar com um suporte teórico e incorporar
a pesquisa à sua rotina de trabalho para enfrentar tais desafios e ser capaz de
analisar criticamente o que é mais adequado ao seu programa de leitura em cada
contexto específico de ensino-aprendizagem.
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BIENAL DO LIVRO DE ALAGOAS
TATARITARITATÁ: CELSO SISTO
& LUIZ ALBERTO MACHADO – Durante a programação da Bienal Internacional do Livro de Alagoas,
tive a oportunidade de conhecer e conversar com o escritor e ilustrador,
contador de história do grupo Morandubetá (RJ), Celso Sisto. Esse acontecimento se deu por causa da gentil intervenção da Turma da Carochinha, especialmente
da Marize Sarmento.
V BIENAL INTERNACIONAL DO LIVRO DE ALAGOAS: 25 OUT 2011 - Também
estiveram comigo:
Todo
pessoal presente na Bienal da Editora Iluminatta e do Portal do PoetaBrasileiro
As escritoras Simone Cavalcante e Claudia Lins com o pessoal do Mundo Leitura
A jornalista Gal Monteiro da TV Educativa de Alagoas
A escritora Fatima Maia
ESTANDE
DA SECULT/BIBLIOTECA PÚBLICA DO ESTADO – Estarei todos os
dias até o dia 30 no estande da Secult/Biblioteca Pública do Estado, com
exposição de todos os meus livros infantis, DVD e folheto de cordel, além da
distribuição gratuita do zine Tataritaritatá. Espero você por lá. Veja mais desse evento no Brincarte.
Veja mais sobre:
Infância, imagem e literatura, Hermilo Borba Filho, Ixchel, Diego Rivera, Jean Sibelius, Epicuro de Samos, Horácio, Anne-Sophie Mutter, Irene Ravache, Ziraldo & Maria Luísa Mendonça aqui.
E mais:
Educação, Professor, Inclusão, Emir Ribeiro & Velta aqui. Paulo Freire & a Pedagogia do Oprimido aqui. Formação docente & Ensino Médio aqui. Afetividade & pedagogia do afeto aqui. Desenvolvimento Psicossocial & Justiça à Poesia aqui. A mulher da Renascença ao Marxismo aqui. A mulher, o Movimento Sufragista, o Feminismo & Vida de Artista aqui. A trajetória da mulher por seus direitos no sec. XX aqui. Precisando de secretária, uma homenagem aqui. A mulher no Brasil Colônia aqui. A mulher no Brasil Império aqui. Josiele Castro, a musa Tataritaritatá aqui. A mulher na República e na campanha sufragista do Brasil aqui. Fecamepa: corrupção x cláusula da reserva do possível aqui. Feminismo no Brasil, Vera Indignada & Nitolino aqui. O pisoteio noturno & Anátema aqui. Combate à violência contra a mulher aqui. Paroxismo do desejo aqui. A arte de Mariana Mascheroni aqui. A mulher Lutas & Conquistas & Festa Brincarte do Nitolino aqui. Todo dia é dia da mulher aqui. Palestras: Psicologia, Direito & Educação aqui. Livros Infantis do Nitolino aqui. &
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
Leitora Tataritaritatá
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na Terra:
Recital Musical Tataritaritatá - Fanpage.