quarta-feira, dezembro 01, 2010

MARK DOTY, RAUL PASSOS, GARETH EVANS, RENÉ CREVEL, STOCKINGER & LITERÓTICA: ROL DAS PAIXÕES


A arte do escultor, gravurista, fotógrafo, artista gráfico, gestor cultural e chargista austríaco Francisco Stockinger (1919-2009), dito Xico Stockinger.


ROL DAS PAIXÕES - ANIVERSÁRIO DELA, A PROTAGONISTA - A gente era ainda criança quando o amor passou a conviver fagueira e inquietantemente no meu coração. Tinha eu lá a idade dos 10 anos amparado pelo bigodinho ralo embaixo da venta, magricela, inquieto e com muita meninice no coração, quando ela surgiu lépida com suas sardas encantadoras, seu olhar agudamente vivo e o sorriso duma sedução envolvente. Eu já era um precoce presepeiro licencioso dado às trêfegas libidinosas sucumbindo às tentações da carne diante da voluptuosidade das deidades fêmeas que me desafiava o sexo pela antecipada busca em desvelar os mistérios ocultos que as saias escondiam, esfomeado pelos seios mais generosos, achegado às ajeitadas mais safadas entre as coxas roliças das pernas femininas e com uma azáfama constante que me levava a amolegar o pingolin a todo momento nas tocas mais recônditas das minhas querências. Ela surgiu num dia ensolarado como um impacto sideral de colisão das galáxias, paralisando o tempo e todas as coisas para me deixar num estupor de perder a noção de tudo. Ao mesmo tempo ela se mostrou pra mim como uma dádiva além do meu quinhão, um repasto suntuoso além do mérito para indigno reles atarantado, já que ela brilhou nos meus olhos como uma Tália fazendo festa na minha idéia, uma Euterpe que me deleitava a alma, uma apaixonante Erato que me envolvia num idílio impetuoso, uma Clio que celebrava todos os meus prazeres, uma ninfa que me enfeitiçava pra loucura juvenil, uma piéride que me encantava rodopiante e virava numa urraca para grasnar no futuro com seu gozo no meu mastro, uma sereia saltitante na minha libido, uma Energeia para minha adoração D´Annunzio, uma pitonisa que me realizaria homem acima das expectativas, uma sibila que me faria rei do seu reinado, uma amazona que me faria superior sobre todas as mulheres. Só conseguia eu recobrar meus sentidos quando ela dobrava a esquina para encher o mundo de pernas às gargalhadas. E mesmo sumida, ela permanecia incólume povoando todos os meus pensamentos. Por isso, doravante eu seria o lunático quixotesco entregue à fortuna das vicissitudes, mergulhado no amor que nunca morre de Bram Stoker. Na verdade, foi aí que eu endoidei. A coisa pegou. Eu só queria estar com ela, falar com ela, escrever versos para ela, construir um universo só pra ela. Ela a princesa eternamente assentada no trono idílico do meu coração e no pedestal de ser a minha exclusiva rainha. Era que eu respirava ela, eu vivia e a minha vida era ela. Éramos partícipes de uma infância muito buliçosa. Eu com 10 anos turbulentos precoces e amostrados; ela com 9, linda, risonha e espalhafatosa. Eu, um geminiano insaciável perdido na curiosidade e querendo sempre muito mais; ela, uma ariana inatingível e serelepe aguçada emanando vida. Brincávamos de tudo: ciranda, cirandinha, pega-esconde, adivinhas, queimado e academia pelas salas, quartos, quintais. Eu cantava me esgoelando canções apaixonadas pra ela ao solo de uma guitarra invisível no bucho e uma vontade imensa de impressioná-la. Ela só se ria de mim, enquanto eu me achava abafando. De certa forma ela correspondia no jeito menina de sempre. Muitas vezes embolamos na cama, riso solto, inocência viva. Mas ela era atirada e eu, perto dela, era só timidez. Afinal, ela era minha deusa. E por isso muitas noites amanheci em claro só pensando como eu teria coragem de agarrá-la, sapecar-lhe os muitos beijos mais arrebatados, apertá-la com meus braços para gritar-lhe a plenos pulmões o quanto a amava com toda a força da minha vida. E me doía ter que deflorá-la na hora ardente de nossos desejos, não isso eu não podia fazer porque ela era a minha princesa. Mas eu ardia de volúpia e não me permitia enfiar-lhe toda a força do meu sexo, isso eu não podia fazer na minha exaltada veneração. Eu podia arrancar qualquer cabaço, invadir qualquer vagina e me envolver na safadeza com qualquer mulher, ela não, ela era a minha rainha, a minha santa, a minha devoção. E nisso foi até o tempo de 3 anos depois, quando ela cansou da minha timidez. Morri mil vezes a cada segundo com a sua ausência. Renascia e tornava a falecer mais de mil vezes a cada lembrança dela. Assim foram e persegui essa dor por 18 anos de uma paixão que insistia em morar atormentadamente nos meus sentimentos. Foram 18 anos de angústia. Até que um dia tudo dá uma reviravolta e eu sou jogado de novo no meio de um revertério com a vida de pernas pro ar. Foi quando o rumor da infância entrou com força de bramido no mar revolto da minha adulteza que virou adolescência despranaviada, e o seu olhar pousou no meu depois de todo esse tempo suspenso e o que estava na mentira da dormência e que teimava insistir vigente virou insone. Deu-se o flerte dos olhares. Eu cada vez mais arrastado pela provocação do seu jeito mais que desejado, da sua boca sedutora e do seu ar menina que me enlevava no meio de um redemoinho que eu me deixava levar para não sei onde. Tinha eu a impressão que tudo isso fazia parte de uma dívida solidária que tínhamos um com o outro. Tudo me levava a crer que precisávamos prestar contas daquele feitiço que nos envolveu na infância e que amaldiçoadamente atravessou a adolescência e nos atingia em cheio em plena maturidade. E eis que numa tarde mormaçada levado pela urgência insensata da paixão indômita, dei de cara com a circunstância, coloquei a timidez na regra três e encarei a horagá das instruções procedimentais de quem está com todas as obrigações vencidas, todas as exigências não cumpridas, todas as impugnações indevidas, todas as gestões insatisfeitas e todas as razões injustificadas para resolver uma pendência de muito requerida. Era tudo muito adiado na fome era de anos. Era tudo muito evitado e a atração incendiando nossas interações. Era tudo muito mal resolvido e o amor dominando no pedaço. Nisso os prós e os contras não resistiram aos desejos, arrebentando barreiras, intrigas e suscetibilidades, ao se meter num turbilhão que nasceu no meio de olhares, bocas, desejos, beijos, pernas e paixão. Não havia como evitar, estava iminente. Não havia como conter, tudo se derramou esborrando com o apetite das nossas ambições de usurparmos todos os nossos limites e sobrepujarmos todas as nossas mais vorazes necessidades de satisfação. Essa foi a hora em que cobramos mutuamente uma dívida que jamais seria satisfeita ou quitada por nós dois porque o saldo devedor sempre se renovava mais e se avolumava com a força da inflação de todos os reajustes que careciam de novas prestações de contas e cumprimento na escala de zilhões de beijos não dados, de afagos pedintes, de abraços necessários, de fodas requerentes e de gozos que não provados concorriam para enriquecer o nosso endividamento recíproco. Éramos inadimplentes do amor, insolventes na paixão e que carecíamos de uma vida além de tantas e muitas re-encarnações para se poder mensurar o tamanho do débito a ser pago por nós dois, um ao outro. Foi aí que descobrimos que essa nossa dívida era uma maldição: a de termos de querer um ao outro para todo o sempre. E isso me fez arrastar por seus pés para escalar suas pernas e alcançar o relicário da sua intimidade mais deliciosa que eu lambi, chupei e me enfiei zilhões de vezes e que jamais poderei abdicar dessa gostosura imensa que me contaminou com uma doença incurável: o amor eterno. E flagrei seus olhos ávidos de vida e de prazer que me levaram aos beijos na sua boca ardente e poderosa que me dei aos ósculos desmedidos e que gozei e jamais poderei renunciar de beijar os seus lábios apetitosos do mais agradável gosto de todos os sabores porque sou sedento de sua faminta luxúria, sou caudatário da sua atirada e gulosa forma de querer inteiramente até a última gota espremida do meu sangue e suor, sou refém de sua determinada forma de se dar por inteiro e com a urgência dos enfermos terminais que anseiam estertorar na última gota de prazer. E me deitei nos seus seios que se fizeram mãe e puta para me fartar de todas as fomes e sedes de séculos e milênios de amor adiado que me atormentava a alma e que nunca foi suficiente ainda os tantos gozos vindouros, as tantas trepadas extravagantes, as tantas entregas mais enlouquecidas que já nos possuímos e que ainda exigimos possuir e eu ainda quero tudo de novo e outra vez e muito mais e sempre possuí-la poderosamente no jardim, no carro, no quarto, na sala, no chão, no canto da vida ou na beira da morte porque ainda não fui feliz, nem gozei o tanto do que preciso na sua carne apetitosa, nem tudo chegou ao ponto da satisfação plena da alma. Tudo foi escandalosamente revivido. E eu cantando Desejo no nosso aniversário. E os nossos prazeres atravessaram o dia e a noite, todo o tempo e todo espaço, e ainda ardo a todo momento incendiado pela requerência de tê-la aos meus braços, nua, linda, inteira e pronta pra ser devorada pela gula da reintegração de posse da minha louca ejaculação que preencherá os meus e os seus vazios, que transbordará os meus e os seus gozos e que premiará as minhas e as suas necessidades como o presente de aniversário que precisamos ambos ganhar um do outro. © Luiz Alberto Machado.. Veja mais  aqui, aquiaqui.


DITOS & DESDITOSPenso que o amor é uma porta de entrada para o mundo, não uma fuga dele. Pensamento do poeta estadunidense Mark Doty. Veja mais aqui.

VARIÁVEIS DE REFERÊNCIA – [...] Os estados informacionais que um sujeito adquire pela percepção são não conceituais, ou não-conceitualizados. Juízos baseados em tais estados necessariamente envolvem conceitualização: movendo-se de uma experiência perceptiva para um juízo sobre o mundo (usualmente exprimível em alguma forma verbal), o que se estará fazendo é exercer habilidades conceituais básicas; O sujeito concebe a si mesmo como estando no centro de um espaço (em seu ponto de origem), com suas coordenadas dadas pelos conceitos ‘cima’ e ‘baixo’, ‘esquerda’ e ‘direita’, e ‘na frente’ e ‘atrás’. Podemos chamar isso de ‘espaço egocêntrico’, e pensar sobre posições espaciais nessa estrutura [framework] centralizante no corpo do sujeito pode ser chamado de ‘pensar egocentricamente sobre o espaço’. Os pensamentos-do-‘aqui’ [‘here’-thoughts] de um sujeito pertencem a este sistema: ‘aqui’ denotará uma área mais ou menos extensiva que se centraliza no sujeito; O sujeito deve conceber a si próprio como estando em algum lugar – num ponto no centro de um espaço egocêntrico capaz de ser alargado de modo a encompassar todos os objetos; A essência do ‘eu’ é a auto-referência [self-reference]. Isso significa que pensamentos-do-‘eu’ [‘I ’-thoughts] são pensamentos em que um sujeito de pensamento e ação está pensando sobre si mesmo – i.e. sobre um sujeito de pensamento e ação. É verdade que eu manifesto um pensamento consciente de-si [self-conscious], assim como um pensamento-do-‘aqui’, em ação; mas eu o manifesto, não ao saber em que objeto agir, mas agindo. (Eu não movo a mim mesmo; eu mesmo me movo). Igualmente, eu não meramente tenho conhecimento de mim, como poderia ter conhecimento de um lugar: eu tenho conhecimento de mim como alguém que tem conhecimento e que faz juízos, inclusive os juízos que faço sobre mim [...]. Trechos extraídos de The Varieties of Reference (John McDowell/Oxford, 1982), do filósofo britânico Gareth Evans (1946-1980).

A MORTE DIFÍCIL[...] anda sempre por montes e vales entenda-se por isto o cinema, o teatro, a casa de amigos e Deus sabe que outros lugares [...] Diane sabe tudo, pelo menos tudo o que Pierre deve fazer, ver, ouvir, ler para se sentir feliz. Diane é o bom senso de Pierre, que se enternece e pensa ter acabado por encontrar nela a felicidade [...] Agradeçamos portanto aos senhores nossos pais. Ao teu o suicídio, ao meu a loucura. [...]. Trechos extraídos da obra La Mort difficile - L'Esprit contre la raison (A morte difícil seguido de o espírito conta a razão - Éditions du Sagittaire/ Marseille, 1926-28), do escritor francês René Crevel (1900-1935) que suicidou-se quando ainda não tinha completado 35 anos de vida. Em outra de suas obras, O meu corpo e eu (Sistema Solar, 2014), ele expressa: [...] Na nossa família suicidamo-nos muito [...] a obsessão do suicídio permanecerá [...] como a melhor e a pior garantia contra o suicídio.

ROMEO E GIULIETTA EM VERONA - Em Verona, onde o ar familiar de algo que não vivi / sussurra na sombra dos que passam, / Um segredo me seguia / E eu não sabia... / Me falava de confissões que não fiz / do meu orgulho que esqueci / e de amores que abandonei / Que nunca amei... / Romeo desiludido - de passos perdidos / E lembrança firmemente posta nela - / Amarga e desesperançosa Giulietta - / Quella maledetta! Poema do pianista, regente, compositor e poeta Raul Passos, que é diplomado em Composição e Regência pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná (EMBAP), cursou Letras na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Posteriormente, aprimorou-se na Universidade Nacional de Música de Bucareste (UNMB). Ele é autor de obras musicais como Música da Morte (canto e piano, poema de Cruz e Souza, 2001), 4 Prelúdios (piano, 2002); Novellette (clarinete e piano, 2002); Il Manque des Mots Qui S'Écroulent (canto e piano, 2002); Estudo de Concerto em Re Bemol Maior (piano, 2002); Aos Teus Pés (canto e piano, 2004); A Música das Almas (coro a capella, poema de Vinicius de Morais, 2005), Papillon (clarinete e piano, 2007); Noturno (piano, 2008); Perpetuum Mobile (clarone solo, 2008) e Cartas Romenas (piano a 4 mãos, 2009), além de editar o blog Raul Passos dedicado ao estreitamento das relações Brasil-Romênia, à cultura desses países e a tudo que represente a evolução e o crescimento interior do ser humano. Veja mais aqui.


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