terça-feira, janeiro 22, 2008

OCTAVIO PAZ, MORIN, MIGUEL REALE, UMBERTO ECO, WIELAND, KAREN FINLEY & TRUPE DO FECAMEPA

 
A arte da poeta, músico & artista performática estadunidense Karen Finley.

A TRUPE DO FECAMEPA - Gente, pela primeira vez em mais de 500 anos de camuflagens & presepadas, a trupe do FECAMEPA que, com certeza, sai todo ano e ninguém se dá conta do estrupício e do vitupério, este ano sai do armário e promete botar para quebrar nas principais avenidas carnavalescas do país. Vai bombar, eu sei, mesmo porque o bando de trupe não tem nada e vai mostrar o poder de fogo da maior agremiação que faz deste Brasilzão a maior baderna do planeta. Pois é, perto dessa cambada qualquer escola de samba de gabarito é uma verdadeira pechincha. O enredo traz a odisséia dos privilegiados tupiniquins, com o tema “Se existe futuro não verás país nenhum!”, onde são contadas pormenorizadamente as 507 bancarrotas por segundo vezes milhares de golpes com todas as peripécias e falcatruas dos sabidos que chegaram lá e só se deram ao trabalho de virar urubu em cima da carniça, prometendo mundos e fundos no maior engodo de todos os tempos. Na comissão de frente, com toda soberba e vestidos a rigor está o Cabral fantasiado de Carmen Miranda com todo o séqüito de peros esfomeados e seus sicários, ladravazes, clérigos e outros facínoras apenados da patifaria de pior índole. Eles vão entoando o fado “Erramos o alvo, mas acertamos na botija, pá” sob o maior apupo da galera. A segunda ala vem ao ritmo dos caboclinhos (o mesmo baticum usado por Djavan na sua música “Sina”), os índios nus e estropiados com pinturas e marcha de guerra, índias fogosas rebolando aprisionadas e os jesuítas moribundos com uma imagem imensa do bispo Sardinha gritando: “Não foram eles, não foram eles, é mentira!”. A terceira ala traz o desfile dos negros acorrentados aos tombos com os seus tambores e alaridos, sob a imagem altissonante de Zumbi com a inscrição: “Liberdade pra sempre, Palmares”. A quarta ala traz os açucarocratas barrigudos e vencedores enrolões, carregando uma imensa alegoria do maior símbolo dos mamoeiros: uma usina de cana-de-açúcar. Eles expõem os aditivos e refinanciamentos impagáveis dos contratos rurais, a substituição dos escravos por andorinhas humanas e a cara lisa da isonomia do preço do álcool com a gasolina. Ih! Na ala seguinte, os holandeses capitaneados por Nassau com uma alegoria “Não acreditaram em mim, agora é tarde!”, expondo a laranja mecânica do carrossel de Johan Cruijff e seu exército batavo composto por Marco van Basten, Dennis Bergkamp, Ruud Gullit, Patrick Kluivert, Ronald Koeman, Frank Rijkaard, Clarence Seedorf, Ruud van Nistelrooy, dentre outros fregueses desde 74. Depois a outra ala, a dos mineiros aluados depois que surrupiaram todas as minas, agora só com todos os ouropéis restantes dos gerais, as vísceras de Tiradentes e os poemas dos Inconfidentes, cantando “Ó Minas Gerais, Ó Minas Gerais, Quem te conhece não esquece jamais, Ó Minas Gerais”. Na ala logo a seguir, D. João VI acompanhado de Carlota Joaquina e toda a corte de larápios suntuosos e refinados fugindo de Napoleão, abrindo os portos e afanando todas as pilas no solfejo: “Nós amamos o Banco do Brasil!”. No meio da súcia, D. Pedro I com a espada empunhada aos berros: “Independência ou morte!” ao som de “(...) Brava gente brasileira! Longe vá temor servil Ou ficar a Pátria livre Ou morrer pelo Brasil; Ou ficar a Pátria livre, Ou morrer pelo Brasil”. Depois D. Pedro II se escafedendo ao som de O Guarani de Carlos Gomes e com quase todos os lusos com os pés na bunda. Engatados nessa malta, os barões do café com a União Democrática Ruralista – UDR, desfilando toda prepotência dos bandeirantes que desbravaram e foderam a alma de muito ser vivente. E ainda acham pouco. Logo atrás a turma da República com os cavalos-batizados dos marechais e seus lambecus, os positivistas e os maçons entoando disfarçadamente o estribilho: “(...) Liberdade! Liberdade! Abre as asas sobre nós! Das lutas na tempestade Dá que ouçamos tua voz!” A ala seguinte traz o Estado Novo de Getúlio Vargas com os militares, os gritos da Semana de Arte de 22, as arengas dos pioneiros da Educação e misturando tudo daqui com fascismo, populismo e reforma com base na Carta Del Lavoro. Depois muitas turbulências, relâmpagos, trovões até aparecer Juscelino Kubitschek sob uma chuva de confetes e serpentinas, carregado pela turma da Bossa-Nova, do Cinema-Novo, da coisa nova quer era “50 anos em 5”. Depois dele, Jânio Quadros varrendo todo lixo pra sua casa e dando palmada nas bundinhas dos biquinis. E, logo após, Jango fugindo dos militares do golpe num pega-pra-capar com o lema “Liberdade jamais”. Ao som do “O bêbado e a equilibrista”, da dupla Bosco & Aldir, das bandeiras do Pasquim, dos desenhos do Henfil, das músicas do Chico e de muita esperança adiada, vem a ala da redemocratização disfarçada na posse que não houve de Tancredo, aos planos furados do Sarney e muita maracutaia nos balaios de gato. Era a Nova República, “um sorvete em pleno sol”. Na penúltima ala, lá vem FHC feito um inseticida vencido com pinta de estadista, puxando, por uma mão, as orelhas de Fernando Collor e, pela outra, os colhões de Itamar Franco. Ele passa acompanhado por todos os asseclas em cima do muro da Social Democracia, das privatizações, das flexibilizações e das enrolações para a venda do país. Por fim, a última ala com os olhões dos excluídos, miseráveis e assalariados esbugalhados com o aceno de Lula & Mariza a bordo do laerolula, com uma flâmula onde há uma paráfrase de O Corvo de Edgar Allan Poe: “O Brasil, nunca mais!”. É hora de entoar o “Descobrimento do Brasil” de Gonzaguinha & Ivan Lins, né não? O que resta, então? Viva o carnaval! Se dirigir, não beba; se beber, me chame que a gente toma uma de estuporar tudo da sexta até a quarta-feira de cinzas. E vamos aprumar a conversa, gente! E tataritaritatá!!! Ah, a Trupe continua interminável... aguardem as próximas alas. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados.
 
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PENSAMENTO DO DIANo que respeita à dignidade do educador, à medida que nos identificamos com a tarefa básica que nos cabe exercer no mundo, o nosso comportamento vai se convertendo imperceptivelmente em missão, em forma de vida, no nosso peculiar e irrenunciável modo de existir. Pensamento do jurista, advogado, filósofo, professor e poeta Miguel Reale (1910-2006). Veja mais aqui, aqui e aqui.

PARA ONDE VAI O MUNDO - [...] Não existe progresso definitivamente conquistado, nem progresso exclusivamente progresso, sem sombras. Todo progresso corre o risco de se degradas e comporta um duplo sentido: progressão/regressão. O progresso é, portanto, uma das fisionomias, uma das faces incertas do futuro. Estamos num mundo que nos aparece simultaneamente em evolução, em revolução, em progressão, em regressão, em crise, em perigo. Vivemos tudo isso ao mesmo tempo. Nossa incerteza consiste em saber qual destes termos será finalmente decisivo. [...] Trecho extraído da obra Para onde vai o mundo (Vozes, 2010), do antropólogo, sociólogo e filósofo francês Edgar Morin. Veja mais aqui e aqui.

COMO SE FAZ UMA TESE – [...] O importante é fazer as coisas com gosto. E se você escolheu um assunto que lhe interessa, se decidiu dedicar verdadeiramente à tese o período mesmo breve que se fixou, você vai perceber então que a tese pode ser vista como um jogo, uma aposta, uma caça ao tesouro. [...] Escrever bem para transmitir mensagens claras para ser interpretadas sem equívocos. Na redação científica, busca-se antes a objetividade e a isenção do autor, bem como sua fidelidade ao fato, a descrição pura e simples, a neutralidade, sem posicionamentos subjetivos, ideológicos ou éticos... Manter um saudável equilíbrio entre precisão terminológica e clareza vocabular, entre rigor científico e bom senso. [...]. Trechos extraídos da obra Como se faz uma tese (Perspectiva, 2010), do escritor, filósofo, semiólogo, linguista e bibliófilo italiano Umberto Eco (1932-2016). Veja mais aqui e aqui.

OS FILHOS DO BARRO – [...] A sensibilidade dos pré-românticos não tardará em se transformar na paixão dos românticos. A primeira é um acordo com o mundo natural, a segunda é a transgressão da ordem social. Ambas são natureza humanizada: corpo. Ainda que as paixões corporais ocupem um lugar central na grande literatura libertina do século XVIII, somente nos pré-românticos e nos românticos o corpo começa a falar. E a linguagem que fala é a linguagem dos sonhos, dos símbolos e das metáforas, numa estranha aliança do sagrado com o profano e do sublime com o obsceno. Essa linguagem é a da poesia, não a da razão. [...] Na obra mais livre e mais ousada desse período, a do marquês de Sade, o corpo não fala, embora tenha sido o corpo e suas singularidades e aberrações o único tema desse autor: quem fala através desses corpos ensangüentados é a filosofia. Sade não é um autor passional: seus delírios são racionais e sua verdadeira paixão é a crítica. Exalta-se, não diante das posições dos corpos, mas diante do rigor e do brilho das demonstrações. O erotismo de outros filósofos libertinos do século XVIII não tem o exagero de Sade, porém não é menos frio e racional: não é uma paixão, mas uma filosofia. [...] Para uns a liberdade erótica é sinônimo de imaginação e paixão, para outros significa uma solução racional dos problemas das relações físicas entre os sexos. Bataille acreditava que a transgressão era condição e também essência do erotismo; a nova moral sexual acredita que se forem suprimidas ou atenuadas as proibições, a transgressão erótica se atenuará ou desaparecerá. Blake disse: “Nós dois lemos a Biblia noite e dia, mas tu lês negro onde eu lei branco” [...] O sonho de uma comunidade igualitária e livre, herança comum de Rousseau, reaparce entre os românticos alemães, aliado como em Holderlin ao amor, só que agora de um modo mais violento e denunciador. Todos estes poetas vêem o amor como transgressão social e exaltam a mulher não apenas como objeto, mas como sujeito erótico [...] A figura de Wiliam Blake condensa as contradições da primeira geração romântica. Condensa-se e as faz rebentar uma explosão que vai além do romantismo. Foi um verdadeiro romântico? O custo da natureza, que é um dos rasgos da poesia romântica, não aparece em sua obra. Acreditava que o mundo da imaginação é o mundo da eternidade, enquanto o mundo da geração é finito e temporal. Esta idéia aproxima-o dos gnósticos e dos iluminados, mas seu amor ao corpo, sua exaltação do desejo erótico e do prazer – aquele que deseja e não satisfaz seu desejo engendra pestilência – o colocam contra a tradição neoplatonica. Embora se chamasse adorador de Cristo, foi cristão? Seu Cristo não é o Cristo dos cristãos: é um titã nu, que se banha no mar radioso da energia erótica. Um demiurgo, para quem imaginar e agir, desejar e satisfazer o desejo são uma única e mesma coisa. Seu Cristo lembra mais o Satã de The marriagé of Heaven na Hell (1793); seu corpo é como uma gigantesca nuvem iluminada por relâmpagos incessantes: a escritura chamejante dos provérbios do Inferno [...] A influência dos gnósticos, dos cabalistas, dos alquimistas e de outras tendências marginais dos séculos XVII e XVIII foi muito profunda, não entre os românticos alemães, como no próprio Goethe e seu circulo. A mesma coisa deve-se dizer dos românticos ingleses e, claro, dos franceses. De seu lado, a tradução ocultista dos séculos XVII e XVIII entronca-se com vários movimentos da critica social e revolucionária, simultaneamente libertária e libertina. A crença na analogia universal está tingida de erotismo: os corpos e as almas unem-se e separam-se, regidos pelas mesmas leis de atração e repulsão que governam as conjunções e disjunções dos astros e das substancias materiais. Um erotismo astrológico e um erotismo alquímico; igualmente um erotismo subversivo: a atração erótica rompe as leis sociais e une os corpos sem distinção de classes e hierarquias. A astrologia erótica oferece um modelo de ordem social fundamentado na harmonia cósmica e oposto à ordem dos privilégios, da força e da autoridade; a alquimia erótica – união dos princípios contrários, o masculino e o feminino, e sua transformação em outro corpo – é uma metáfora das trocas, separações, uniões e conversões das substancias sociais (as classes), durante uma revolução. Correspondências verbais: a revolução é um crisol no qual se produz a amalgama dos diferentes membros do corpo social e sua transubstanciação em outro corpo. O erotismo do século XVIII foi um erotismo revolucionário de raízes ocultistas, tal como pode ver nos romances libertinos de Restif de La Bretonne. Do misticismo erótico de um Restif de La Bretonne à concepção de uma sociedade movida pelo sol da atração apaixonada, não havia senão um passo. Esse passo chama-se Charles Fourier. A figura de Fourier é central tanto na história da poesia francesa como na do movimento revolucionário. Não é menos atual que Marx (e suspeito que começa a sê-lo mais). Fourier pensa, como Marx, que a sociedade é regida pela força, a coerção e a mentira, mas diferentemente de Marx, acredita ser a atração apaixonada, o desejo, o que une os homens. A palavra desejo não figura no vocabulário de Marx. Uma omissão que equivale a uma mutilação do homem. Para Fourier, mudar a sociedade significa liberá-la dos obstáculos que impedem a operação das leis da atração apaixonada. Esse leis são leis astronômicas, psicológicas e matemáticas, mas são também leis literárias, poéticas. [...] Fourier sustenta que o desejo não é necessariamente mortífero, como afirma Sade, nem a sociedade é repressiva por natureza, como pensa Freud. Afirmar a bondade do prazer é escandaloso: Sade e Freud confirmam de certo modo – o modo negativo – a visão pessimista do cristianismo judaico [...] Baudelaire reprova Fourier por não ter escrito uma poética, isto é, reprova-o por não ser Baudelaire. Para Fourier, o sistema do universo é a chave do sistema social; para Baudelaire, o sistema do universo é o modelo da criação poética [...] Novalis havia dito: tocar o corpo de uma mulher é tocar o céu. E Fourier: as paixões são matemáticas animadas. [...] O espanhol Cernuda vê no prazer não só uma explosão corporal como uma critica moral e política da sociedade cristã e burguesa: abaixo estátuas anônimas, preceitos de névoa, uma chispa daqueles prazeres brilha na hora vingativa, seu fulgor por destruir vosso mundo [...] O capitalismo dessagrou o corpo: deixou de ser o campo de batalha entre os anhos e os demônios e transformou-se em um instrumento de trabalho. O corpo foi uma força de produção. A concepção do corpo como força de trabalho conduziu imediatamente à humilhação do corpo como fonte de prazer. O ascetismo mudou de signo: não foi um método para ganhar o céu, mas uma técnica para aumentar a produtividade. O prazer é um desperdício, a sensualidade, uma perturbação. A condenação do prazer abrangeu também a imaginação, pois o corpo não é apenas um manancial de sensações, mas também de imagens. As desordens da imaginação não são menos perigosas para a produção e seu rendimento perfeito que os abalos físicos do prazer sensual. Em nome do futuro, completou-se a censura do corpo com a mutilação dos poderes poéticos do homem. Assim a rebelião do corpo é também a da imaginação. Ambas negam o tempo linear: seus valores são os do presente. O corpo e a imaginação ignoram o futuro: as sensações são a abolição do tempo no instantâneo, as imagens do desejo dissolvem passado e futuro em um presente sem datas. É o retorno ao principio do principio, à sensibilidade e à paixão dos românticos. A ressurreição do corpo talvez seja um aviso de que o homem recuperará em algum tempo a sabedoria perdida. Pois o corpo não nega somente o futuro: é um caminho para o presente, para esse agora onde a vida e a morte são as duas metades de uma mesma esfera [...] OCTÁVIO PAZ – Poeta, escritor e diplomata mexicano, Octavio Paz (1914-1998), foi Prêmio Nobel de Literatura de 1990, foi integrante do Movimento Surrealista, sendo autor de mais de 20 livros de poesia e incontáveis de ensaios de literatura, arte, cultura e política. Os textos aqui publicados foram retirados do seu livro “Os filhos do Barro”, traduzido pela poeta Olga Savary. FONTE: PAZ, Octavio. Os filhos do Barro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. Veja mais aqui.

A PEQUENA LOUVAÇÃO - O jardinzinho bem fechado / Todo mês de rosas ornado / Onde o jardineiro se enfia / E cuida e rega noite e dia, / Louvado seja! / O bom mineiro tão robusto / Que em negro buraco, sem susto, / Penetra e fura sem cansaço, / Até acabar-se, ficar lasso, / Louvado seja! CRISTOPH MARTIN WIELAND – Formado no ambiente do pietismo luterano, Christoph Martin Wieland (1733-1813) cedo se libertou dele para afirmar-se um livre-pensador segundo o modelo voltairiano. Autor de romances, dramas e narrativas em verso, viveu parte de sua vida na corte de Weimar, ao lado de Goethe e Schiller. Dentro do Rococó literário, destaca-se, conforme Otto-Maria Carpeaux, como um libertino alegre cujo erotismo não temia ofender ouvidos castos. Era considerado o Baccaccio alemão.


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