SASKIA AMADA DO QUE FUI – Era a descoberta do amor, uma vez e nunca
mais. Era ela, ao lado do tio: a deusa de Leeuwarden,
a imagem do fascínio. Eu já vivia lá no canal Amstel, e ela sorriu por
baixo da aba de um amplo chapéu de palha: seus lábios brilhavam mais que a
grandeza do ouro, seus olhos brilhavam mais que o Sol radiante. Em sua mão uma
flor, excelsa ternura, exaltada generosidade. E eu era apenas a sua pele fresca e brilhante, os lábios sutis e sensuais, pequenos
dentes perolados, face cheia de reluzente inteligência, tão astuta e constante,
juventude eterna. Tudo nela era como um veludo vermelho e dourado, voluptuoso,
à luz do dia, a água fluindo, as íngremes
escadas de madeira, seus movimentos apressados. Eu nunca fui páreo para uma linda
mulher de família rica respeitada, só um reles rebelde, tropical Niágara, que saí
do Lácio para a vida: o puro prazer de viver. Era ela toda para mim e foi
contra todas as convenções na flor da idade e me fez feliz. Ela com todas as poses:
a pentear os cabelos, deitada na cama, dormindo, sonhando, o olhar provocante no
pátio, exultante à janela, ah, infinidade
de nuances, era ela, a compreensão da mente e dos olhos. Ah, minha Saskia, mulher destemida,
educada, o meu diário: todo meu afeto, memórias, vida, a minha arte humana roubada
dos céus para os filhos dos homens, a noite da alegria, a eterna fé e coragem.
Ah, como adorava Saskia, minha musa amada, deusa
esvoaçante. Era ela a minha Flora, deusa das flores; a minha Danae
nua na cama, a minha Betsabea com la
lettera di David, a minha Andromeda
Chained to the rocks, o meu asteroide iluminado, a minha noiva judia: a sua
mão na minha, o gesto de adoração. Todas elas e mais tantas que é ela e só ela no
meu coração. Deu-me tudo: a alma do cronista de todos os rostos humanos. E nela
conheci a ascensão e o declínio. Sobrevivi a
todos que amava, a minha luz subitamente perdida nos ares, as trevas,
difamações, e eu com camponeses, pescadores, velhos moradores; e sem ela, cego,
fracassado, envelhecido prematuramente: o meu sorvedouro de dívidas, o funeral
da reputação, tristeza, privações, o grande silêncio da minha
solidão devastadora, da minha tristeza destrutiva. Só ela vive no meu coração
indigente que tudo ganhei e perdi, nem ela está mais aqui. Sou apenas meu rosto
invernal, alma solitária. Empobreci, reduzido a nada e sem ela. Desconsolado, sou
cônscio da minha própria mortalidade. Vivo apenas dela, para ela, nada mais. © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS:
[...] as
canções de berço portuguesas, modificou-as a boca da ama negra, alterando nelas palavras;
adaptando-as às condições regionais;
ligando-as às crenças dos índios e às suas. Assim a velha canção
"escuta, escuta, menino"
aqui amoleceu-se em
"durma, dur-ma,
meufilhinho", passando
Belém de "fonte" portuguesa, a "riacho" brasileiro. Riacho de engenho. Riacho com
mãe-d'água dentro, em vez de
moura-encantada. O riacho onde se lava o timãozinho de nenê. E o mato ficou povoado por "um
bicho chamado carrapatu". E em
vez do papão ou da coca, começaram a rondar o telhado ou o copiar das casas-grandes, atrás dos meninos
malcriados que gritavam de
noite nas redes ou dos trelosos que iam se lambuzar da geléia de araçá guardada na despensa -
cabras-cabriolas, o boitatá, negros de surrão,
negros velhos, papa-figos. [...] E havia o papa-figo, homem
que comia fígado de menino. Ainda hoje se afirma em Pernambuco que certo ricaço
do Recife, não podendo se alimentar senão de fígados de crianças, tinha seus
negros por toda parte pegando menino num saco de estopa. E o
Quibungo? Este, então, veio inteiro da África para o Brasil. Um bicho horrível. Metade gente, metade animal.
Uma cabeça enorme. E no meio
das costas um buraco que se abre quando ele abaixa a cabe-ça. Come os meninos abaixando a cabeça: o
buraco do meio das costas se
abre e a criança escorrega por ele. E adeus! está no papo do Quibungo. [...].
Trechos extraídos da obra Casa-grande & senzala: formação da família
brasileira sob o regime da economia patriarcal (Livros
do Brasil, 1957), do sociólogo Gilberto Freyre (1900-1987). Veja mais
aqui, aqui & aqui.
A POESIA DE JULIO CORREA
A PRÓDIGA - Eu
a conheci uma noite, doce e tentadora, / Como uma fruta no tempero. / Risos
acariciando aleatoriamente / Um presente tão celestial. / De sua boca fluiu / em
excitação louca / sua risada musical, / docemente infernal. / Quando a vi,
fingi / uma sacerdotisa, / rainha da alegria, / de amor, de riso / e prazer; / alguns
Messalina / par carnal e divino, / de feitiço irresistível / isso para muitos
Claudios / fez o amor enlouquecer. / Depois de quatro anos eu achei mentirosa /
para se proteger do frio em uma porta, / e vi sobre sua boca desbotada / um
sorriso morto, / e olhando nos olhos dela / Eu vi um arrependimento / que sede
de perdão / colocar erva-doce / inutilmente triste com o fatal / Distribuidor
do bem e do mal.
MATERIAL DE MARIONETES – Ele fez o marionetista como vinte fantoches.
/ Por muitas noites, / em frente ao pobre retábulo, / para o príncipe, a rainha
e o arlequim e o diabo, / feito de madeira encontrada aleatoriamente, / as
pessoas humildes e boas aplaudiram incessantemente. / Eles disseram na vila, / dos
bonecos: -Todos, bons artistas são; / e o marionetista, também com essa ideia,
/ Ele sentiu seu coração dançar alegremente. / Ele foi beijar suas marionetes e
dormiu em paz / em uma calma doce, / amarrou os fios / dos fantoches à sua
alma. / E o marionetista acordou de seu sonho de paz / e ele ouviu os bonecos
gritarem em coro: / -Nós somos homens, sim, senhor, e também / Ser artista é um
desperdício, / Sr. marionetista: você passa, boa noite - / e quebrando os fios
os fantoches deixaram. / O deserto é o retábulo. / O príncipe, a rainha e o
arlequim e o diabo, / o rei com sua coroa, / ouro falso brilhante / e aquela
Polichinela que a fez rir tanto, / Eles foram embora. Com choro / chora o marionetista: -É um
andaime / este meu retábulo; / Eu sinto que eles te matam, oh, coração, frio, /
de um resfriado que quebra você / em pedaços de lágrimas, em pedaços de morte!
/ Oh malditos fantoches, você roubou sua sorte / ser artistas, ser capaz de
fazer arte! / Oh! fantoches,
fantoches, / fantoches, amaldiçoados, / perdido à noite / De todo o anônimo, de
todo o esquecimento. / Eu te fiz de tarugos, / Eu coloquei em você todas as
minhas preocupações, / e você era meus carrascos, / e você até me abandonou ...
o mesmo que algumas crianças.
Poemas do poeta paraguaio Julio Correa (1890-1953).
A ARTE EVELYNE
AXELL
A arte
da artista pop belga, Evelyne Axell (1935- 1972), conhecida por suas obras
psicodélicas e eróticas, autorretratos em plexiglas que misturam os impulsos
hedonistas e pop dos anos 1960. Veja mais aqui.
A OBRA DE REMBRANDT
A obra do pintor e gravador holandês Rembrandt Harmenszoon van Rijn (1606-1669), com destaque para sua obra
dedicada à sua amada Saskia van Uylenburgh (1612-1642) aqui e aqui.
&
A ARTE DE CARLA VAN DE PUTTELAR
A arte
da série The Rembrandt
Series (Rembrandt House Museum in Amsterdam,
2016), da fotógrafa
& artista plástica holandesa Carla Van de Puttelaar. Veja mais aqui.