O DOCE VOO NO SANGUE DAS ANDORINHAS INVISÍVEIS DO CANAVIAL - O dia amanhece e as pessoas das cidades e dos mais
longínquos lugares desse Brasilzão véio, arrevirado e de porteira escancarada,
acordam com o sonho de mesa farta em todas as suas refeições. Seja no café da
manhã, almoço e janta, ou mesmo nos lanches fortuitos, todos desejam bolos,
doces, molhos de tomates, munguzá, arroz-doce, biscoitos, pudins, assados
brilhosos, café, sucos, pamonha, canjica, compotas, chás, melado ou mesmo a
rapadura, tudo delicioso ao paladar. Pança cheia e corpo bem nutrido, qual não
é a satisfação com a higiene, limpeza, esterilizantes, perfumes, aperitivos e
tira-gostos, remédios e inflamáveis, tanto para uso como explosivo ou
combustível, quanto para o asseio pessoal apresentável, ou, sobretudo, para
promover riqueza e fazer o progresso e o desenvolvimento individual e do país. Nessa
hora e, quase sempre o tempo todo, nem dá para saber que desde 1532, quando
aqui chegou, fez a riqueza pretérita de Pernambuco e a viga-mestra de
sustentação econômica das cidades nas mais diversas regiões da Patriamada.
Desde então fez história, promoveu a monocultura e a secular escravidão de
índios, negros e pobres deserdados – mesmo tendo sido abolida há alguns
séculos, contudo, mantém-se disfarçada no subemprego e no trabalho de
invisíveis migrantes sazonais, que labutam insones como andorinhas que vêm nos
períodos de safra e se vão quando da entressafra. Esses acordam no meio da
madrugada com a marmita e moringa embaixo do sovaco, para enfrentar a labuta
diária e às pressas, pendurados na condução rumo alguma plantação longínqua. As
suas tarefas é cortar, limpar a palha entre adubos, bagaços, óbitos, ossadas e
carniças para urubus, e amontoar tudo num fardo, desde a aurora até o
crepúsculo, nos tabuleiros, morros e onde quer que a lavoura esteja pronta para
ser recolhida para a botada das usinas ou destilarias, a partir da primavera até
o outono do ano seguinte, quando a pejada empurra num êxodo para outras propícias
regiões do país. São gente cor da noite com a mistura de fuligem e carvão
grudados no suor do corpo, camponeses que sobrevivem entre um e outro local e
que vão por trilhas daqui pra acolá e de lá pra cá, com suas viúvas de maridos
vivos para servir de mão de obra nos latifúndios que demandam de grandes contingentes
de força laboral. Hoje não mais com a vida empenhada no barracão do engenho, vivem entre
pelegos e outros caboetas arranchados nas periferias dos nanicos e indigentes,
depois de uma jornada de trabalho extenuante com suas foices e facas, sal na
moleira e o peso da vida no corpo envergado pro doce do açúcar,
pro álcool queimar na garganta e no trânsito, e o sangue jorrar do sacrifício
na queda com uma cana atravessada na goela até a alma. © Luiz Alberto Machado.
Veja mais aqui.
Curtindo o álbum Bate o Mancá: o povo dos canaviais (Outro Brasil, 2000), do cantor,
músico e compositor Silvério Pessoa,
em homenagem ao cantador alagoano Jacinto
Silva.
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DESTAQUE: PADRE ANTÔNIO VIEIRA & CANAVIEIROS
[...] Quem via na escuridade da noite aquelas
fornalhas tremendas perpetuamente ardentes [...] o ruído das rodas, da gente toda de cor da mesma noite, e gemendo tudo,
sem trégua e descanso [...] toda a
máquina e aparato confuso e estrondoso daquela Babilônia não poderá duvidar,
ainda que tenha visto Étnas e Vesúvios, que é uma semelhança do inferno (Padre Antônio Vieira).
[...]
Para se compreender porque
esses/as trabalhadores/as ainda migram tanto, mesmo em condições desfavoráveis,
há que se entender a problemática social da migração, que se expressa,
inclusive, na obrigatoriedade da separação do meio familiar e social para ir ao
encontro do estranho, rompendo, em certa medida, com o substrato sociocultural
ao se sair de uma sociabilidade mais estável para uma transitória, sentida como
a falta de um lugar e dita nas falas locais do “andar pelo mundo”, como se fora
um fardo e um desalojamento [...] A
sociabilidade do trânsito é sentida por quem migra e pelos familiares que
ficam. A separação se expressa por um sentimento de dor, vazio, saudade e de
perda da “graça”, na verdade o sentimento da falta, e da incompletude. Por seu
turno, a temporalidade da migração faz com que o “estar junto” se restabeleça,
mesmo que de forma precária, para logo se desconstruir. E o ente querido
permanece no imaginário constituído pela saudade e pela preocupação. (...) É
muita preocupação os filhos tá no mundo sujeito a um acidente, principalmente,
no corte de cana que é muito perigoso acidente de corte, cobra e tudo mais. Mas
a gente vai rezando e pedindo a Deus pra abençoar eles pra ver se ajuda a gente
mesmo assim (M. G. S. R., Pai Chicô, Várzea Grande). Ë a expressão de
desconforto de famílias que não podem proteger, amparar o filho que “está no
mundo” e das angústias de quem migrou. Por outro lado, a migração temporária é
vista positivamente, por possibilitar o reencontro num tempo mais curto, se
comparada às de mais longa duração, como as destinadas aos empregos em
“firmas”, como se referem localmente, a empregos permanentes. Com o reencontro,
ressurge a alegria e sossego perdido com a separação, embora o reencontro seja
também temporário porque por maior que seja o desejo de ficar, as necessidades
de sobrevivência são mais fortes, além do que, inaugura-se uma nova forma de
vida: a de viver entre dois mundos. Mesmo que o trabalho “pelo mundo”, como
dizem, em alguns casos traga frustrações, pois os esforços empreendidos para
garantir a independência econômica, aprofundam ainda mais a dependência como
ocorre, por exemplo, com quem volta doente e passa a depender da família como
cuidadora. Em meio a tudo isto, a esperança de um futuro melhor. Embora as
atuais condições precárias de muitas famílias gerem pessimismo quanto ao futuro
dos/as filhos/as, no geral, a positividade prepondera. Grande parte dos/as
filhos/as que estão fora deseja estabilidade econômica para voltar às origens.
Pais e mães de migrantes querem para os filhos/as o que não tiveram: vida mais
confortável. Para muitos/as, esse futuro depende de estudo, e trabalham para
garantir a educação escolar dos/as filhos/as e, para algumas famílias, a
primeira migração – do “interior” para a cidade – foi impulsionada pela
educação formal de filhos e filhas. Agora, essa migração continua, em outros
termos, pelos pais e mães ou mesmo pelos filhos e filhas, visando à
sobrevivência – ou a constituição – da família.
Pensamento do Padre Antônio Vieira & trecho do
estudo A questão social das migrações
temporárias de trabalhadores agrícolas do Nordeste para a agroindústria
canavieira de São Paulo: uma das faces do agronegócio da cana, no Brasil, (Revista
Desenvolvimento Social, Unimonrtes-MG, Montes Claros - Nº 3 - jul 2009), de Maria
Dione Carvalho de Moraes, Francisco Frazão & Teodório Rogério Júnior. Veja
mais aqui, aqui e aqui.
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
A arte da pintora ucraniana Iryna Yermolova.
DEDICATÓRIA: VERA SALBEGO
Sou apenas uma mulher
Que crê no poder do amor
Sou essencialmente sentimental
Vivo necessito de amor
Sou apenas uma mulher
Que quer viver a plenitude do amor
Desfalecer de emoção
Viver por amor
Sou apenas uma mulher
Que quer amar e ser amada
E por isso dedico meus dias
Para amar e me entregar
Verdadeiramente ao amor!
(Sou Apenas Uma Mulher)
A edição de hoje è dedicada à poeta,
professora, escritora e psicopedagoga Vera
Salbego. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra: art by Arthur Brouthers