VAMOS APRUMAR A CONVERSA? VOU
PRO CINEMA – Era eu ainda
menino quando vi pela primeira vez um filme no cinema. Era Chaplin, O
vagabundo. Fiquei apaixonado por Carlitos e sempre queria que meu pai me
levasse para assisti-lo nos cinemas da minha cidadezinha de interior. Vi todos
os filmes dele, os quais passaram nas matinês que não perdia todo final de
semana no Teatro Cinema Apolo ou no Cine São Luiz. Depois foi a vez de Buster
Keaton, Harold Lloyd, Teixeirinha, Mazzaropi, Jerry Lewis, muitos faroestes,
comédias, dramas. O fascínio foi tão grande que não mais deixei de ir a todos
os filmes que chamasse a atenção. Em toda minha infância e adolescência, não
deixava de ver películas as mais diversas. Isso ampliava o rol das minhas
predileções e, talvez, tenha sido o meu primeiro contato com a poesia,
levando-me a escrever quadrinhas inocentes todo dia para a professora da escola
do primário; ou contando histórias e inventando mentiras cabeludas para
aparecer nas brincadeiras; ficar solando no bucho uma guitarra invisível
sonhando de olhos abertos como se estivesse no glamour do palco num show
musical; e de representar personagens horrorosos pra meter medo nas crianças
menores; era que eu gostava mesmo de contar histórias e estórias, e usava das
minhas mais incipientes noções teatrais, musicais e literárias, para inventá-las
ao bel prazer, sem pés nem cabeça. Os personagens, as tramas, as imagens, a
música, tudo me dava ideia da vida em movimento, o que me fazia cada vez mais
próximo do invento dos irmãos Lumiére e das demais expressões artísticas,
chamando-me atenção para o roteiro, os cortes, closes, conduzindo-me a um olhar
mais agudo da condição humana, como da descoberta do simbólico e do imaginário.
Eu me deixava passageiro seguindo à própria sorte do enredo nessa experiência
radical que me colocava frente a frente com Eros e Tânatos, e com as verdades
mais recônditas da alma na sua lógica particular e na expressão do inconsciente
coletivo. Quando me casei aos 15 anos, fui emancipado pela Lei e pude, então,
assistir todos os filmes da Nouvelle vague e os escandalosos filmes de Pasolini
e Peter Greenaway. Foi nesse tempo que tive acesso às leituras de Nietzsche,
Walter Benjamim, Freud, Jung e Derrida e, por conta disso mesmo, aproveitava, no
Recife, para ir quase todo dia pras sessões do Cine Arte AIP, não perdendo sessões
nem lançamentos importantes noutros cinemas da cidade, como os de Fellini,
Buñuel, Saura, Antonioni, Malle, Trufaut, Polanski, Godard, Kurosawa, Coppola,
Lars von Trier e Almodóvar, entre muitos outros. Lembro que quando surgiram os
videocassetes, eu pegava uns dez pra assistir nos finais de semana. O mesmo
quando apareceram os dvds. Ainda hoje sou apaixonado pela telona e quase na
condições de cinéfilo, não consigo passar uma semana sem que possa apreciar um
bom filme, razão pela qual sempre destaco aqui diariamente um entre os filmes
que já tive oportunidade de assistir. E veja mais aqui.
Imagem: Nu, do artista plástico realista francês Javier Arizabalo.
Curtindo o álbum Strip Me (Sony, 2010), da cantora e compositora pop britânica Natasha Bedingfield, participante ativa
de campanhas por causas humanitárias ao redor do mundo, conhecida por seu
trabalho com crianças na campanha Stop the Traffik da instituição de
caridade de sua mãe, chamada Global Angels.
AS PALAVRAS SOB AS PALAVRAS – A obra As
palavras sob as palavras – os anagramas de Ferdinand Saussure (Abril, 1978),
do linguista suíço Ferdinand Saussure
(1857-1913), trata a respeito de hipograma, aliteração, hemistíquios, timbres,
assonâncias, anagrama, anafonia, paronomásia, paragrama, paratexto, antigrama,
logograma, simetria fônica, poesia homérica, entre outros assuntos atinentes à
linguagem. Da obra destaco o trecho inicial: [...] absolutamente incompreensível se eu não fosse obrigado a confessar-lhe
que tenho um horror doentio pela pena, e que esta redação me causa um suplicio
inimaginável, completamente desproporcional à importância do trabalho. Para
mim, quando se trata de linguística, isto é acrescido pelo fato de que toda
teoria clara, quanto mais clara for, mais inexprimível em linguística ela se
torna, porque acredito que não exista um só termo nesta ciência que seja
fundado sobre uma ideia clara e que assim, entre o começo e o fim de uma frase,
somos cinco ou seis vezes tentando refazê-la. [...] A língua só é criada com vistas ao discurso, mas o que separará o
discurso da língua ou o que, num dado momento, permitirá dizer que a língua
entra em ação como discurso? Conceitos variados estão disponíveis na língua
(isto é, revestidos de uma forma linguística) tais como boeuf, lac, ciel,
rouge, triste, cinq, fendre, voir. Em que momento, ou em virtude de qual
operação, de qual jogo que se estabelece entre elas, de quais condições
formarão estes conceitos o discurso? A sequencia destas palavras, por mais rica
que seja pelas ideias que evoca, não indicará jamais a um ser humano que um
outro individuo ao pronunciá-las, queira significar-lhe alguma coisa. O que é
preciso para que tenhamos a ideia de que queremos significar alguma coisa,
usando termos que estão disponíveis na língua? [...]. Veja mais aqui e
aqui.
O SACRÍFICIO – O livro No tribunal de meu pai – crônicas autobiográficas (Companhia das
Letras, 2008), do escritor polonês Isaac
Bashevis Singer (1902-1991), conta a historia ocorrida no início do século
XX, no qual os moradores da rua Krochmalna, no velho bairro judeu de Varsóvia,
acorriam à modesta casa de número 10 em busca de solução para problemas. Ali,
vez ou outra, apareciam casais à procura de matrimônio ou separação, credores e
devedores à cata de solução justa para suas pendências, além de manifestações
misteriosas que demandavam explicação, como a de gansos que, mesmo mortos, não
paravam de grasnar. Religiosas ou mundanas, deste ou de outro mundo, essas
questões eram submetidas a uma antiga instituição judaica, o tribunal rabínico
- mescla de corte de justiça, sinagoga, casa de estudos e consultório
psicanalítico. O da Krochmalna era presidido pelo rabino Pinhos-Mendel, pai do autor
da obra, e funcionava em sua própria casa. Nestas memórias o autor recria o
ambiente em que cresceu, rico em histórias e personagens a um só tempo
divertidos e comoventes. Da obra destaco o trecho denominado O sacrifício: Há neste mundo indivíduos muito estranhos,
cujos pensamentos são ainda mais singulares que eles próprios. Em nossa casa em
Varsóvia - na rua Krochmalna, número 10 -, dividindo o hall de entrada conosco,
vivia um casal de anciãos. Eram pessoas simples. O homem era artesão, ou talvez
vendedor ambulante, e seus filhos já estavam todos casados. Contudo os vizinhos
diziam que, apesar da idade avançada, os dois continuavam apaixonados. Todo
sábado à tarde, após o cholent, saíam para passear de braços dados. Na
mercearia, no açougue - aonde quer que fosse fazer compras -, a mulher só
falava do homem: "Ele gosta de feijão... ele gosta de um bom
pedaço de carne... ele gosta de vitela...". Há mulheres
assim, que vivem falando de seus maridos. Ele, por sua vez, estava sempre
dizendo: "Minha mulher". Minha mãe, descendente de várias gerações de rabinos, implicava com o casal. A
seus olhos, tal comportamento era uma demonstração de vulgaridade. Mas no fim
das contas, o amor - sobretudo entre duas pessoas idosas-não pode ser tão
facilmente repudiado. De repente começou a correr um boato que escandalizou a
todos: os dois velhos pretendiam divorciar-se! A Krochmalna ficou em polvorosa.
O que significava aquilo? Como podia ser? As moças torciam as mãos:
"Mamãe, não estou me sentindo bem! Acho que vou desmaiar!". Mulheres
maduras proclamavam: "É o fim do mundo". As mais enfezadas maldiziam
os homens: "Ora, se não são piores que animais!". Logo a rua foi
convulsionada por uma notícia ainda mais ultrajante: o casal iria se divorciar
para que o velho pecador pudesse se casar com uma mocinha. Não é difícil
imaginar a profusão de pragas rogadas contra o homem: uma queimação na barriga,
dores em seu coração negro, um braseiro nas entranhas, um braço e uma perna quebrados,
uma pestilência, o castigo dos céus! O mulherio não economizava nas
imprecações, vaticinando que o bode velho não chegaria vivo ao dia do casamento
- em vez do dossel de núpcias, depararia um ataúde preto. Nesse ínterim, em
nossa casa, a verdade veio à tona. A velha procurou minha mãe e falou-lhe em termos tais que o rosto pálido de
mamãe enrubesceu de constrangimento. Apesar de ela ter tentado me despachar
para longe dali, a fim de que eu não escutasse, acabei escutando, pois estava
ardendo de curiosidade. A mulher jurava que amava o marido mais do que qualquer
outra coisa no mundo. "Cara senhora", argumentava ela, "eu daria
minha vida para salvar uma unha dele que fosse. Pobre de mim, estou velha - sou
um trapo de gente -, mas ele, ele ainda é um homem. E precisa de uma mulher.
Por que obrigá-lo a carregar esse fardo? Enquanto nossos filhos viveram
conosco, era preciso ter cuidado. As pessoas falariam. Mas agora o que elas
dizem me preocupa tanto quanto o miado de um gato. Já não preciso de marido,
porém ele - oxalá continue assim-é como um jovem. Ainda pode ter filhos. E
agora encontrou uma moça que o quer. Ela tem trinta e poucos anos; é a hora
dela de também ouvir a música das bodas. Além do mais, é órfã e trabalha como
criada numa casa; será boa para ele. Com ela, ele gozará a vida. Quanto a mim,
não passarei necessidade. Ele garantirá meu sustento, e eu sempre ganho alguns
trocados vendendo badulaques. De que preciso na minha idade? Só quero que ele seja feliz. E ele
me prometeu que - após cento e vinte anos, quando chegar a hora - jazerei a seu
lado no cemitério. Voltarei a ser sua mulher no outro mundo. No Paraíso,
servirei de escabelo para seus pés. Está tudo combinado." A mulher viera a
fim de, simplesmente, pedir a meu pai que cuidasse do divórcio e celebrasse o
matrimônio. Minha mãe tentou dissuadi-la. Como as outras mulheres, ela via
naquele caso uma afronta ao sexo feminino. Se todos os homens de idade dessem
para se divorciar de suas esposas e casar-se com mocinhas, em que bonito estado
ficaria o mundo. Mamãe disse que a idéia toda era evidentemente obra do Diabo e
que tal amor era uma coisa impura. Chegou a citar um dos livros de ética. Porém
aquela mulher simples também sabia citar as Escrituras. Lembrou a minha mãe que
Raquel e Lia haviam dado suas servas Bala e Zelfa como concubinas a Jacó.
[...]. Veja mais aqui.
OS POEMAS QUE ELA FEZ PRA MIM – No seu maravilhoso blog Baú de Ilusões, a queridamada poeta e radialista Meimei Corrêa expõe seu talento e
comete alguns belos poemas, entre eles, alguns com os quais ela me agraciou com
o prêmio da dedicatória e vários deles reunidos no Momento de Poesia do seu
espaço. Destaco os poemas sem título a seguir: I - Cubra-me com teu canto, meu encanto, no
espanto das estrelas que se perdem em nosso universo. Cubra-me com tua poesia,
minha alegria, na alegoria das flores nos jardins que bailam em nossos sonhos. Cubra-me
com teu corpo que te sorvo nas horas serenas das noites, nos espaços inventados
dos dias, meu açoite, minha lei... E te deixo com meus traços de paixão quando
te afastas, para que não te esqueças dos sabores, dos nossos rumores, gozos e
prazeres até que voltes e tudo aconteça novamente... II - Teu toque em
minha pele permeou-me o corpo e tomou minha alma, arrebatou-me o coração,
arrancou-me a calma e não foram necessárias tantas palavras... Levaste as
chaves de todo o meu tesouro, meu mundo, guardado em poesia para cobrir-te os
caminhos com nossa paixão mútua, cumplicidade que se estende todos os dias,
quando surge o sol, a lua e todas as estrelas que nem mesmo o céu as tem. III - Eu te dei tudo de mim: a alma, a identidade,
os sonhos, o sono e a vigília, a inspiração e todas as rimas... Adormeci ainda
menina, romântica, solta na imaginação. Acordei mulher, selvagem, presa nos
teus quereres, rainha no teu reino de mil sonhares em mim. Tu me roubas nas
madrugadas... Tu me prendes em tuas manhãs... Tu me tens em cada segundo do teu
existir que é meu... IV - E tu me sondas enquanto durmo regada do
teu amor ardente, vigiada pelo teu olhar vermelho de paixão incandescente,
desejos que se resguardam por instantes, enquanto o sono toma conta do meu
corpo que é teu. E tu me esperas acordar em teus braços que me amparam os
sonhos e a minha respiração se mistura ao teu odor delicioso, pele de seda,
sonho de vida, vida de amor... Você é minha jóia rara, e eu busquei sempre
alcançar todas as estrelas para transformar o seu chão em céu. Quem me dera eu
pudesse transformar-lhe as rugas de preocupação em risos vindos do coração,
seus momentos de tristeza em eternos pingos de amor a lhe regar a alma para que
saiba sempre que aqui, neste cofre onde você está guardado, bem cuidado e
amado, tudo será sempre "um sim" para todos os seus apelos, sonhos,
desejos e por que não, aquela "ordem" gostosa, imperiosa, quando você
toma conta, chegando menino e homem mandonista e eu sou quem você me fez e faz
ser. Jóia rara, você é em minha vida, a vida que me faz viva. Veja mais aqui, aqui e aqui.
CARAVANA & BOBEIRA PEGA – A trajetória do humorista e ator de
teatro, cinema e televisão Pedro Bismarck
(Ademilson Pedro da Cruz), inicia com a criação do personagem Nerso da
Capitinga, em 1981, na cidade de Juiz de Fora (MG). Foi a partir deste
personagem que ele foi convidado para integrar um grupo de teatro, no qual, fez
sua primeira apresentação ao público em 1984, em um quadro para o espetáculo
"Caravana Café Concerto, um Delírio!". Na peça, dirigida por
Robson Terra, Pedro Bismarck fazia imitações, cantava e contava piadas. Passou
a adotar o nome artístico de Pedro Bis, que posteriormente foi
modificado para seu pseudônimo atual. Em seguida vieram os shows Show de Humor
com Pedro Bis e O Melhor de
Pedro Bis, Neversário do Nerso (2004) e Bobeira Pega (2009). Em
1990, foi convidado por Chico Anysio para participar do programa Escolinha do
Professor Raimundo, após Chico ter visto uma fita de vídeo com apresentações de
Pedro. Por sugestão de Chico Anysio, o nome artístico foi alterado para Pedro
Bismarck. Teve rápida passagem pelo SBT (1993) e retornou à Rede Globo no ano
seguinte. Após o fim da Escolinha, em 1995, Pedro Bismarck atuou em
outros programas, como Estados Anysios de Chico City e Brava Gente. Em 1998,
fez uma participação especial no filme Menino Maluquinho 2 – A aventura, e
também foi protagonista de um episódio do programa Você Decide. Em 1999, Pedro
Bismarck integrou o elenco do extinto Zorra Toral e em 2000, participou do
filme Amélia. Veja mais aqui.
MONTENEGRO – A comédia de humor negro Montenegro - ou de suínos e as pérolas (1981),
dirigido pelo sérvio Dušan Makavejev, conta a história de uma dona de casa
americana deprimida, casada com um rico homem de negócios sueco com duas
crianças aparentemente perfeitas. Ela tenta
apimentar a sua existência com uma série de ações para fugir do tédio e da
angústia, quando ela come todo o seu jantar, toca fogo nos lençóis da cama e
envenenar o leite do cão de estimação, até ser apresentada a um psiquiatra pelo
marido, servindo apenas para continuar a sua frustração. Um dia, quando ela decide acompanhar o marido em uma viagem
de negócios, ela fica detida na alfândega do aeroporto e ao perder o voo se
envolve com imigrantes iugoslavos, se entregando ao seu fantástico e surreal
mundo regado a amor livre e prostituição. Tudo culmina com ela tendo um caso
passional com um jovem chamado Montenegro que trabalha em um jardim zoológico.
Depois de passar a noite com ele, ela mata o rapaz e
retorna para casa. Uma vez lá, ela serve sua
família um jantar gourmet, seguido por uma sobremesa leve de frutas, o que
acaba por ser envenenado. O destaque do filme
vai para maravilhosa atuação da atriz estadunidense Susan Anspach. Veja
mais aqui.
IMAGEM DO DIA
Esculturas de Annie Bidal
DEDICATÓRIA
A edição de hoje é dedicada ao
lexicólogo, tradutor, escritor e poetamigo Ivo Korytowski & Literatura & Rio de Janeiro. Veja aqui e
aqui.