terça-feira, setembro 23, 2014

MAJA HADERLAP, TESSA DE LOO, VERONICA FRANCO & DELIA DERBYSHIRE

 


AH, VERONICA, A LUTA PELO AMOR... – Aquela bela veneziana teve o ofício herdado da sua mãe que, ao casar-se com seu pai, abdicou de sua vida para ser a dama de um cidadão. Morreu-lhe o pai, fato que fez com quem a sua mãe regressasse de onde viera. E ao completar 16 anos, logo foi levada a casar-se com um médico amante do jogo e da bebida: o sofrimento lhe batia à porta. A jovem esposa enfrentou o arrojo da gravidez do primeiro filho aos 18 anos, enfrentou seu marido e separou-se, estava cansada de ser espancada. Logo reclamou seu dote para ser dona de sua vida. E assim o fez. Ao lado da mãe exerciam turnos distintos, levando-a a figurar entre as citações do Tariffa dele puttane. E aos 20 anos foi listada no Catalogo de tutte le principal et più honorate cortigiane di Venetia. Tornava-se a mais respeitada entre as cortigiane oneste que habitavam a cidade, uma exótica beldade culta e refinada, de vasta cultura e domínio das artes e das letras, gozava da liberdade e da autossuficiência. Não olvidava de passar diante da Igreja de Maria Formosa, mesmo que um beijo seu fosse duma valia tão avultada. Bela e delicada no trato, inteligente e culta, um dia lá seus olhos enfeitiçantes pousaram os meus. Não havia como escapar e me fez hóspede de seus banquetes, arcos triunfais, concertos e fogos-de-artifício. E fez-se presente exclusiva e particular, como se eu fosse o rei entronizado ali, levando-me ao seu ateneu. Depois de festiva noite me levou à sua alcova e lá fez-se a Dama que descobre os seios. Diante de mim o Retrato de dama em carne e osso, completamente nua e pronta pros meus caprichos mais ousados. Depois dos beijos, abraços e trocas de pernas nas mais avassaladoras das entregas, recitou-me seus sonetos e uma compilação de seus poemas. Fez-me presentear o volume de tom erótico de seus versos no Terze Rime. Deu-me o volume do Lettere familiari e diversi, o qual continha um compilado de cartas do gênero epistolar, com descrições da sua vida cotidiana. Passou a ser a musa do meu coração e de tantos artistas, como Tintoretto, Comin, a Vênus de Aretino, Montaigne, poetas tantos enamorados, como Venieri e dos maldizentes: Veronica, ver única puttana... E vencedora do duelo poética, expunha-se a mais linda cortesã da tez branca, dos cabelos acobreados, olhos claros e feições finas, enfeitada de pérolas, exultante fêmea para todos os desejos mais exaltados. Dias depois não mais a vi, sumira enfrentando perseguições por ter sido denunciada por um amante despeitado ao inexorável “Santo” Ofício, acusada de falta de zelo religioso e prática de feitiçaria. Encarcerada, viu-se declinando com a perda quase total de todos os seus bens. Não se safou de difamações, viu-se às voltas com acusações de bruxaria e encantamentos mágicos, levada ao julgamento inquisitorial por dias, finalmente libertada. Veio então a epidemia da peste que vitimou muitos, dos seus 6 filhos, apenas 3 sobreviveram à infância. Exilada e insultada por sua beleza e sedução, vistas como perigosas, servas de tiranos e demônios, manteve sua voz enfrentando quem a ousasse calar, dizendo-se uma mulher real, nunca uma deusa: ... Doce, gentil, sua valorosa amante, \ Aquela que, longe de você, na miséria vive... Estava ela prostrada de devoção, sua casa fora saqueada. Retirou-se, enclausurada em sua mansão, negociou um asilo para acolhida de outras cortesãs doentes e idosas, e o ensino de um ofício, porque todas estavam condenadas a comer pela boca de outros, a dormir pelos olhos de outros, a movimentar-se de acordo com o desejo de outros, correndo em manifesto naufrágio sempre das faculdades e da vida. A iniciativa malogrou, mas ela continuou tão admirada quanto temida, sua vida com o recheio das reviravoltas por conta de sua desafiante luta contra os padrões e com sua coragem encantadora: Amar sem razão é a única maneira de amar... A vida tornou-se obscura para a poeta do desafio, cobiçada cortesã e heroína em luta pelo amor, Veronica eterna no meu coração. Veja mais abaixo e mais aqui e aqui.

 


DITOS & DESDITOS - Dançamos nossa juventude numa cidade sonhada, Veneza, paraíso, orgulhosa e bonita, Vivíamos para o amor e a luxúria e a beleza, O prazer então nosso único dever. Flutuando entre o céu e a terra E bebendo em abundância a alegria abençoada Nós nos considerávamos eternos então, Nossa glória selada pela própria caneta de Deus. Mas descobrimos que o paraíso é sempre frágil, Contra o medo do homem sempre falhará... O amor é um campo de batalha e já travei muitas batalhas. O amor é um jogo em que sempre se trapaceia. O amor não é para os de coração fraco; é para as almas corajosas que ousam sentir. Ser ousada no amor é conquistar o mundo. Pensamento da poeta e cortesã veneziana Veronica Franco (1546–1591). Veja mais aqui, aqui e aqui.

 

ALGUÉM FALOU: Isto é uma espécie de disciplina. As pessoas pensam que os compositores sentam ali com a caneta sobre o papel manuscrito, e Deus envia sua inspiração no topo da caneta no papel. Bem, em em alguns casos, parece que sim; talvez Mozart. Mas em outros casos é preciso impor uma disciplina, e a disciplina de número é uma excelente disciplina. A sequência de Fibonacci as pessoas usam há séculos. Os números da natureza; o número de folhas de uma samambaia, o número de sementes de um girassol cabeça, e como eles estão dispostos... este é o Fibonacci sequência, usada em arte, arquitetura e música. Embora quando você ouve isso na música, não é reconhecido... Meu som mais bonito na época era um abajur verde e surrado da BBC. Era da cor errada, mas tinha um lindo som de toque. Eu bati no abajur, gravei isso, fiz fade out na parte do toque sem o início da percussão... Analisei o som em todas as suas parciais e frequências, peguei os 12 mais fortes e reconstruí o som nos famosos 12 osciladores da oficina ... Pensamento da compositora britânica Delia Derbyshire (1937-2001), pioneira de música eletrônica e música concreta inglesa.

 

CAMA NO CÉU - [...] A cor é uma questão de opinião pessoal. [...] Eu gostaria de saber como alguém deve viver. Eu gostaria que alguém tivesse me ensinado. Por que as pessoas que consideramos autoridades quando éramos crianças nos decepcionam nesse aspecto? Quem nos dirá o que é certo? A cruz, o crescente, a foice e o martelo, o Buda sorridente? Faça como seria feito por. [...] Como pode um rio que nasce numa floresta negra e desemboca num mar negro ser celebrado como azul? [...] As pontes simbolizam a paz e o contato humano. [...] Uma bela ponte é um poema. [...]. Trechos extraídos da obra Bed in Heaven (Arcadia, 2008), da escritora holandesa Tessa de Loo, pseudônimo de Johanna Martina Tineke Duyvené de Wit.

 

FRONTEIRAS - suas fronteiras criaram uma série \ de armadilhas e transgressões. \ nos anais da divisão a fronteira foi inscrita \ como vitoriosa. em tempo de guerra, a faixa fronteiriça \ oscilava para frente e para trás, as aldeias \ se desviavam, deslizavam para \ a periferia. seus habitantes \ selaram suas gargantas com cadeados toscos, \ vigiaram a silenciosa cena do crime \ na qual entro despreocupadamente. muitas vezes, seguido pelos \ seus olhos, eu tomava o caminho blindado para uma \ terra vizinha, para ouvir falar de tempos passados, \ quando cercas ainda ladeavam os pastos \ e um eco semelhante ligava \ todos os nomes. onde antes uma estrada passava, \ seu rastro desaparece. tudo é margem, \ esquecimento e transição. Poema da escritora eslovena-austríaca Maja Haderlap.

 


O CONDOR VOA – O livro O condor voa: literatura e cultura latino-americana, de Antonio Cornejo Polar, aborda temas como critica literária, pluralidade e totalidade, o corpus da literatura latino-americana, imediatismo e perenidade, a dupla audiência da literatura de fundação da República, os sistemas literários como categorias históricas, reflexões a partir de uma relação textual entre o Inca e Palma, discursos coloniais e formação da literatura hispano-americana, José Donoso e a nova narrativa, neo-indigenismo e Manuel Scorza, o discurso da harmonia possível, condição migrante e intelectualidade multicultural, Arguedas, estatuto sociocultural, voz e letra no dialogo de Cajamarca, heterogeneidade não dialética, entre outros importantes assuntos.

REFERÊNCIAS
POLAR, Antonio Cornejo. O condor voa: literatura e cultura latino-americana. Belo Horizonte: UFMG, 2000.

EROS E CIVILIZAÇÃO – A obra Eros e civilização: uma interpretação filosófica do pensamento de Freud, do sociólogo e filosofo alemão pertencente à Escola de Frankfurt, Herbert Marcuse (1898-1979), na primeira parte aborda sobre o domínio do princípio de realidade, a tendência oculta na psicanálise, o princípio do prazer e da realidade, repressão genética e individual, retorno d reprimido na civilização, racionalização da renúncia, civilização e carência, recordação de coisas passadas como veiculo de libertação, a ontogênese e origem do individuo reprimido, o aparelho mental como união dinâmica de opostos, estágios na teoria dos instintos de Freud, a natureza conservadora comum dos instintos primários, a possível supremacia do principio do Nirvana, Id, ego e supergo, a corporalização da psique, caráter reacionário do superego, avaliação da concepção básica de Freud, análise da interpretação da história na psicologia de Freud, distinção entre repressão e mais-repressão, trabalho alienado e o princípio de desempenho, organização da sexualidade, tabus sobre o prazer, organização dos instintos de destruição, dialética fatal da civilização, a filogênese e a origem da civilização repressiva, heramnça arcaica do ego individual, psicologia individual e grupal, a horda primordial, rebelião e restauração do domínio, conteúdo dual do sentimento de culpa, retorno do reprimido na religião, o malogro da revolução, mudanças nas imagens do pai e da mãe, a dialética da civilização, necessidade de defesa contra a destrução, a existência de sublimação, dessexualização, enfraquecimento de Eros e os instintos de vida, livberação da destrutividade, progresso em produtividade e dominação, controles intensificados na civilização industrial, declínio da luta com o pai, despersonalização do superego, contração do ego, alienação, desintegração do princípio de realidade estabelecido, interlúdio filosófico, a teoria da civilização de Freud na tradição da filosofia oriental, o ego como sujeito agressivo e transcendente, logos como lógica de dominação, o protesto filosófico contra a lógica de dominação, ser e devir, pernamencia versus transcendência, o erteno retorno em Aristótles, Hegel, Nietzsche e Eros como essência de ser. Na segunda parte, o autor trata além do princípio de realidade, os limites históriscos desse princípio, obsoletismos da carência de dominação, hipótese de um Novo Princípio de Realidade, a dinâmica instintiva do sentido da civilização não-repressiva, o problema de verificação da hipótese, fantasia e utopia, a fantasia versus razão, preservação do pasado arcaico, o valor de verdade da fantasia, a imagem da vida sem repressão nem ansiedade, possibilidade de liberdade autêntica em uma civilização madura, necessidade de uma redefinição de progresso, as imagens de Orfeu e Narciso, arquétipos de existência humana na civilização não-repressiva, Oferu e Narciso contra Prometeu, luta mitológica de Eros contra a tirania da razão, contra a morte, reconciliação do homem  e da natureza na cultura sensual, dimensão estética, a estética como ciência da sensualidade, reconciliação entre prazer e liberdade, instinto e moralidade, as teorias estéticas de Baumgarten, Kant e Schiller, elementos de uma cultura não-repressiva, transformação do trabalho em atividade lúdica, a transformação da sexualidade em Eros, a abolição da dominação, efeito sobre os instintos sexuais, auto-sublimação da sexualidade de Eros, sublimação repressiva versus livre sublimação, aproveitamento das relações sociais não repressivas, o trabalho como ação livre das faculdades humanas, a possibilidade relações libidinais de trabalho, Eros e Thanatos, a nova ideia de razão, racionalidade da gratificação, moralidade libidinal, a luta contra o fluxo de tempo, mudança na relação entre Eros e o instinto de morte e critica ao revisionismo neofreudiano. Veja mais aqui, aquiaqui & aqui.

REFERÊNCIAS
MARCUSE, Herbert. Eros e civilização: uma interpretação filosófica do pensamento de Freud. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.


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