A PRAÇA É UM
SONHO - Imagem: arte do artista William Merritt Chase (1849-1916). - As
crianças, mãos na terra, riso de tudo, bundacanasca e trelas, embalam e embolam
sonho, só querem saber de brincar, a vida é uma brincadeira, afinal, quem dera
minha infância. As moças seduzem e riem, zanzam e flertam pujante liberdade nas
bluzinhas e sotaques, um príncipe a qualquer momento surgirá dos sonhos e elas
bamboleiam nas algazarras como se a tarde pudesse outro dia. Os rapazes metidos
a sério de molecagens, gladiadores de nada, pelo futebol, pilherias e machezas,
indiferentes de tudo com seu onanismo nas horas roubadas da vigilância. As
mulheres, oh senhoras de luxo e nobreza, puxam seus filhos pra escola, pra
feira, pro salão de beleza e pras coisas de casa, ufanas de si e tudo pra
cuidar. Os homens apressados, compromissos na cabeça e nos bolsos, olhadelas
pra trás dum coito a tergo naquela que passou no balanço das águas, engomam seriedade na
hipocrisia, senhores de si e botam pra quebrar. Os velhos tagarelam descansando
a jogar conversa fora, dominós e baralhos, valetes nas mangas, a vida já pesa
no semblante do corpo claudicante à espera do remédio e da cova. O comércio em
alvoroço de negócios queima no consumo dos desejos e os cães ladram festivos
por gatos furtivos a se insinuarem entre ratos e mesquinharias do prazer,
enquanto insetos picam o trânsito nervoso das querências aos desaforos de sapos
escondidos pelos cantos mais recônditos e tudo salta fora nas pegadas que o sol
imprime na praça pelas ruas e passarelas, onde os religiosos de todos os credos
berram sua fé aos passantes indiferentes, entre motores, apitos, sirenes e
semáforos, aos gritos de que Deus não é surdo e pouco importa porque os
feirantes entopem as calçadas com ambulantes de todas as bugigangas e vendem as
nuvens e os céus, o canto dos pássaros, lápides e cercas, flores e frutos, a
fome e a agonia nos crediários, as gaiolas e o ar que respiram, e trocam e
passam troco na esperança de dias melhores com muambas e artefatos de todas as
guerras do tráfico, por sonharem com um país melhor na informalidade, porque
emprego e escravidão se confundem nas relações laborais, nas quais policiais e
meliantes seguem, uns aos outros no trajeto da girândola que emporcalha a
cidade e fazem de tudo uma festa em que nada se comemora e é só uma praça, nada
mais, uma praça de um lugar qualquer que é tomada e posta a venda em negociatas
para espólio desapropriados, devolução de gentileza que só a política sabe
transformar em matagal de máquinas que fabricam desertos na rede das jogadas, e
a praça é só uma memória de dias que foram e não voltam mais. © Luiz Alberto
Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS:
Grato pela palavra / que agradece. / Grato a grato / pelo / quanto essa
palavra / derrete neve ou ferro. / O mundo parecia ameaçador / até que suave / como
uma pluma / clara, / ou doce como pétala de açúcar, / de lábio em lábio / passa,
/ grato, / grandes a boca plena / ou sussurrantes, / apenas murmuradas, / e o
ser voltou a ser homem / e não janela, / alguma claridade / entrou no bosque: /
foi possível cantar embaixo das folhas. / Grato, és pílula / contra / os óxidos
cortantes do desprezo, / a luz contra o altar da dureza. / Talvez / também
tapete / entre os mais distantes homens / foste. / Os passageiros que
disseminaram / na natureza / e então / na selva / dos desconhecidos, / merci,
enquanto o trem frenético / muda de pátria, / borra as fronteiras, / spasivo / junto
aos pontiagudos / vulcões, frio e fogo, / thanks, sim, gracias, e então / a
terra se transforma em uma mesa: / uma palavra a limpou, / brilham os pratos e
copos, / ressoam os talheres / e parecem toalhas as planuras. / Grato, gracias,
/ que viajes e que voltes, / que subas / ou que desças. / Está entendido, não /
preenches tudo, / palavra grato, / mas / onde aparece / tua pequena pétala / escondem-se
os punhais do orgulho / e aparece um centavo de sorriso.
Ode à gratidão extraída da obra Navegações e regressos (MediaFashion, 2012), do poeta
chileno Pablo Neruda (1904-1973). Veja mais aqui.
A ARTE
DE WILLIAM MERRITT CHASE
A arte do artista William
Merritt Chase (1849-1916).
AGENDA:
&
A caça & a fuga do caçador, Jean-François Lyotard, João Antonio, Juliana Merçon, Úrsula Garcia, Gian
Lorenzo Bernini & Lucinda
Lyons, Jucati, Eliane Elias & Emerson, Lake & Palmer aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
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Tataritaritatá a
música do cantor, compositor, instrumentista e ator estadunidense Tom
Waits:
No visitors after midnight live, Rockpalast, Live in Bremem & On Broadway &
muito mais nos mais de 2 milhões & 900 mil acessos ao blog & nos 35 Anos
de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja
mais aqui e aqui.