BLOCO
DESCONTENTES DO FECAMEPA - Imagem: Meu frevo, art by Cristiane Campos. - Carnaval que se preze sai do usual: a mundiça
manda ver e capricha no figurino inusitado. Do que presta ao imprestável, tudo
finda em fantasia. Haja gente pra botar pra fora o que foi reprimido a vida
toda. Quando o frevo pipoca o primeiro acorde, tem quem acenda o candeeiro, ou
desenvulte ou corra lobisomem, afinal, vale tudo pra desencucar as neuras e
soltar os cachorros na folia. Começa tudo com ar de organização: fantasias
assim, cortejo assado, isolamento, contagem dos membros, alegoria, o escambau:
finda mais desorganizado que as ventas dos pariceiros. Copo vai, golada vem,
depois de muito empurra e chega pra lá, anuíram o tema: a besta fubana.
Lembraram do desfile do Bloco dos Artistas, lá por meados dos anos 1980. Fizeram-na
gigante: o que soltava de peido e arroto, tinha de tamanho de peia no meio duma
carreira de peito que não tinha mais tamanho que desse. Foi preciso uma carreta
com prancha maior que a doidice deles pra caber a distinta. No bucho da
aloprada botaram uma tuia de tonel, tudo cheio de raiz-de-pau, uma mangueira
com suspiro emendada noutras e passando por cada um deles, findando no chapéu do
vaqueiro da bimbona dela. Fizeram o teste e ficaram todos cheios dos quequeos de
tanto chupar no bico da rola da besta. Uma festa! Tudo acertado, luz como a
praga – quando não eram as lâmpadas pisca-pisca, era a turma acendendo a
fluorescente do frosquete! Quando avaliaram tudo, algumas coisas checadas eram
indispensáveis: quanto mais incomum estivesse, ora, valendo dizer: quanto mais
putaria, melhor! A macharia deu por falta de hormônio feminino: só tinha cueca
no recinto: - Assim não presta! Tá faltando priquita na zona! Quando as meninas
chegaram quase que não tinha mais graça! Tudo biritado já com intimidade um pro
outro. Foi quando Doro gritou: - Vamos acabá com essa viadagem qui as madame
chegaru! Vôte! Bastou elas se fantasiarem tudo de índias pro negócio pegar
fogo! Queriam pinturas no corpo, apareceu pintor até de um olho só! Maior
presepada. Nessa hora até bandido vira artista! Algumas se rebelaram com todo
direito: queriam desfilar com as fantasias que trouxeram: Virgem Maria, freira,
beata, primeira-dama, coisas do tipo e de grã-finagem. Quando iam protestar, o
Doro acalmou cochichando: - Deixa elas tomá no bico da pica da besta que elas
findam com a saia na cabeça, destá! Ah, aí sim. Outra que queria sair de Eva
deu trabalho para arranjar uma folha de parreira: colocaram um tapa-sexo e tudo
resolvido! Foi aí que os marmanjos capricharam: Doro saiu de presidente – smoking, faixa presidencial, descalço e de
bermuda -, segurando o cartaz: Fora Temer, agora sou eu! Robimagaiver vestiu-se
de investigador federal com uma faixa: PCC virou governo! Zé-corninho chegou de
alter ego: fantasiado de viking e com uma tanga mamãe de quase deixar os
possuídos de fora, gritando PPP. – Que droga é nove, Zé? Festa de pobre tem que
ter pinga, puta e puliça! Danou-se! A coisa foi engrossando, papagaiada fora do
gibi, gente como a praga. Quase que rola um quebra-pau, porque de tão
democrático, dentro do próprio bloco surgiu a dissidência de uma troça: os do
contra. Esses louvavam um juiz como santo do pau oco, outro um militar pra
presidente, tinha até um casal que saiu de viva o golpe: ela dava bundada nele
e ele dava bimbada nela. O negócio ia firme melhor que o emendado, comendo
arroiado, subindo morro, descendo ladeira, tome trupé! A cada arroto da besta,
um peido ineivado na maior fumaceira. E a bimba dela de boca em boca, de um
lado a outro, servindo a maior manguaçada. Na hora da volta com o dobrado do
frevo rasgado batendo biela, o trucado enganchou na manobra: gaia de bebum sobrando
pela direção entre os pedais do freio, acelerador e embreagem. Resultado: a
monstra não se segurou com o vai e volta, de arriar lá de cima no maior teibei pra
desespero dos foliões: - Num deixa perder a birita, porra! Foi um banho de
aguardente, mais parecia barragem rompendo na maior cheia de inundar tudo. Só se
via neguinho se atrepando nos telhados pra pinotar no maior timbungado. Foi um
alvoroço danado! E só ouvia: - Isso é que enchente de vergonha! E viva o
carnaval e o freto da Santa Folia! Vivaaaaaa! © Luiz Alberto Machado. Veja mais
aqui.
Curtindo os álbuns das óperas Wozzeck (1922) e a inacabada Lulu (1935), do compositor austríaco Alban Berg (1885-1935), o romântico do
dodecafonismo.
Veja mais sobre:
No reino do Fecamepa nada pode dar certo aqui.
E mais:
Terça-feira no trâmite da solidão aqui.
Auto do Maracatu aqui.
Baile de Carnaval aqui.
Karen Horney, Manuel Castels, Edson
Cordeiro, Carmen Miranda, Amelinha, Mônica Waldvogel, Frevo & Branca Tirollo aqui.
A literatura de Dostoiévski aqui.
Dois poemetos de amor demais pra ela aqui.
Doro invocado denuncia abuso em mais uma presepada aqui.
Zé Ripe entre amigos & pé de serra aqui.
A esfíngica amante aqui.
Literatura de Cordel: Melancia & Coco Mole aqui.
O ser humano e seus papéis
construtivos e não-construtivos aqui.
A mútua colheita do amor aqui.
Padre Bidião & o papa Chico aqui.
Psicopatologia & Semiologia: sensação, percepção e
consciência aqui.
&
DESTAQUE: FREVO DE VÁRZEA
Tô entre o santa
cruz e a espada
no peito
com a corda no pescoço
avanço
um passo
na barreira cara
a cara e a coragem
para suportar
torcer
contorcer pelo santa
cruz e credo
tudo é carnaval
do futebol
até o sol
raiar
resistir é preciso
no riso
de pileque
com meu lado moleque
um pique vadio
em terreno baldio
Frevo de Várzea, do poeta Wilson Araújo, extraído da antologia Poesia viva do Recife (CEPE, 1996),
organizada por Juareiz Correya. Imagem: Frevo,
de Márcio Melo.
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
A arte de Cristiane Campos.
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra: a arte do pintor de arte de rua e de corpo Andy Golub.
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.