ENTRE TOPADAS E ESCORREGÕES, EU INSISTO,
PERSISTO, RESISTO E ATÉ PERSEVERO - Sempre rio de mim e de tudo, brinco.
Sisudez é para engravatados e donos da razão. Eu, não, reles saltimbanco,
mambembe. Não sou importante nem assim me vejo e assim sorrio da minha desimportância
um tanto dionisíaca, irresponsável. Pra falar a verdade, nunca levei nada tão a
sério: paletó e gravata não são pra mim, teimo. A vida é linda demais pra
perder tempo com seriedade extrema. Desastres? Ora, muitos! Sou suscetível ao
karma (e adoro Carma, Dona Carminha, minha avó de todos os afetos), sem bússola
ou reló6gio, à deriva: bicho solto que só teve janelas gradeadas: da minha mãe,
do casório, o tio prest’atenção – sobrou o ouvido na música de todos os tons,
os olhos nos livros de todas as aventuras. Para quem queria fazer profissão no
teatro, represento histrião, o melhor que pude: o gravador, a máquina de
escrever, rascunhos, versos e gritos, depoimentos na barreira das derrotas, a
cabeça ao muro, arranhões quase escoriações, arame farpado entre avelós. Quando
eu ia pescar já tinham passado a rede de arrastão: nada no anzol. Caçar, não,
nunca tive pontaria; jogo, também não, nenhum, conservo-me perna-de-pau pra
qualquer tipo de jogada – só umas arriscadas beócias com peões, rainha, torres,
bispos, rei e cavalos. Problemas? Muitos, quando alguns, sexo e mulheres. Para
onde? Parte alguma, barata tonta, piolho no alheio, encruzilhada à frente.
Minha vida: cabeça de água nas nuvens, pés no céu da Terra. E tudo de pernas
pro ar, de cabeça pra baixo. Se levasse tudo tão a sério não resistiria em meio
tantas hostilidades, sacrifícios, mendacidades, fracassos, traições. A vida é
assim mesmo: nunca sai como se espera. Os tempos eram outros, não mais, tudo um
saco! Quase se perde a esperança, às topadas, a vida pendurada na pele crua,
tudo segurado à unha, dentes cerrados e rangentes, no peito e na raça, quase
não sobrar nada de mim. Insisto, persisto, resisto e até persevero: saio
juntando cacos, trapos, retalhos e retraços de planejamentos destroçados,
previsões pras cucuias. Projetos? Muitos; farei quando puder. O que tenho a
dizer, pouco importa, faço da minha insular existência como se resumida a este
dia, todo dia, o último dia. Por tudo isso, só me resta continuar sonhando para
não sucumbir, pois só me resta rir da minha tolice. Principalmente num momento
como este em que não se tem lá muito o quê comemorar. Só minha gratidão procê!
Obrigado, um milhão de beijabrações procê. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
UMA
MÚSICA
Curtindo Chansons de légende (Alby Music, 1997),
da cantora e performer francesa Catherine Ribeiro.
PESQUISA: A POESIA BRASILEIRA - [...] No nível estrutural, já foram sugeridas tensões que alicerçam os
significados e se organizam em torno da contradição maior, prazer-dor, tornada
coerente pelo sadismo, que consiste justamente na sua combinação. Em torno
deste eixo é construído o poema, com a sua sonoridade forte, o seu verso
inicial que situa o leitor em pleno universo da poesia, com um poder que
transcende o nível apenas lógico. [...] Na
poesia brasileira (penso no que dizem os versos, não no comportamento dos
poetas), é visível a vertente dos desvios da norma: sadismo em Bernardo
Guimarães, masoquismo em Casimiro de Abreu, erotismo solitário em Álvares de
Azevedo, voyeurismo em Bilac, necrofilia em Alberto de Oliveira, senso da
decomposição em Augusto dos Anjos, angústia do impulso sexual irregular em
Mário de Andrade, autocastração punitiva em Drummond. Mas enquanto em quase
todos esses casos o traço é extraído pela análise do critico, no soneto de
Fontoura Xavier há um tratamento intencional e declarado por parte do poeta,
que assume conscientemente a representação da crueldade sexual transgressiva. Trechos
extraídos da obra O discurso e a cidade
(Duas Cidades, 2004), do sociólogo, literato e professor Antonio Cândido, reunindo ensaios em que analisa autores que com
sua literatura se preocupam em construir a impressão de verdade por meio de
narrativas aderentes ao real, com uma fidelidade aos dados externos que as faz
parecerem documentários. Veja mais aqui.
UM LIVRO:
[...] Quase ao mesmo tempo, entraram na sala a mãe
e Eglé. Vendo Eglé, Rohán sentiu por ela uma imensa ternura. Ternura de marido,
não de namorado, algo de intimo agradecimento e muito de intensa proteção,
sentimento que conhecem os casados, um dia depois, de fazer para a esposa uma
injustiça.
Trecho
do romance História de um louco amor
(Mercado Aberto), do escritor uruguaio Horacio
Quiroga (1879-1937).
PENSAMENTO DO DIA: O OLHAR - [...] Mas
o que é ver? Por que Aristóteles escreve esti idein? Da raiz indo-europeia
weid, ver é olhar para tomar conhecimento e para ter conhecimento. Este laço
entre ver e conhecer, de um olhar que se torna cognoscente e não apenas
espectador desalento, é o que o verbo grego eidô exprime: eidô – ver, observar,
examinar, fazer ver, instruir, instruir-se, informar, informar-se, conhecer,
saber -, e no latim, da mesma raiz, vídeo, ver olhar, perceber e viso – visar,
ir olhar, ir ver, examinar, observar [...]. Aquele que diz: eidô (eu vejo),
o que vê? Vê e sabe o Eidos: forma das coisas exteriores e das coisas
interiores, forma própria de uma coisa (o que ela é em si mesma, essência), a
ideia. Quem vê o eidós, conhece e sabe a ideoa, tem conhecimento – eidotés – e por
isto é sábio videnete-eidulius. [...]. Trecho do artigo Espelho da alma, janela do mundo, extraído da obra O olhar (Companhia das Letras, 1990), da
filósofa e educadora brasileira Marilena
Chauí. Veja mais aqui.
UMA IMAGEM
Extraídas do livro Xingu:
Detalhes de uma Cultura (Raízes, 1978), da fotógrafa inglesa
naturalizada brasileira Maureen
Bisilliat.
Veja mais sobre Paixão Legendária, Psicologia
Cultural, Lilith, Jerzy
Milewski, Francisco Quevedo, Menandro, George
Grosz, Narrativas de Uji Shui, Fernando França, Literatura Infantil, Cida Lima
& Escritores Alagoanos aqui.
E mais:
As trelas do Doro, o bacharel das chapuletadas
aqui.
A
filharada do Zé Corninho aqui.
A greia
na Fúria dos Inocentes aqui.
Fecamepa:
de Pindorama à Carta de Caminha aqui.
Proezas
do Biritoaldo: quando não se pensa
direito, a cara sofre a maior vergonha aqui.
DESTAQUE:
A arte da bailarina japonesa Caralotta Ikeda
(1941-2014).
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
A arte do pintor sueco Anders
Zorn (1860-1920).
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra: a arte do fotógrafo estadunidense Spencer
Tunick.
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.