TRÍPTICO DQP – Más
notícias do Fecamepa... - Ao som dos álbuns Mensageiro (2014) e O convertido (2013), do compositor, instrumentista, arranjador e
violeiro Adelmo Arcoverde. – O Norte queima: aos cinquenta
graus bafejam as águas quentes do império. O Sul congela e lá se vão estátuas
que se dissolvem com o piscar de olhos ao primeiro raio solar. Estou de frente
pro Leste e às minhas costoestes a mata é só carbono, não sei como será
possível sobreviver, porque o meu país sucumbe à fraude Coisonária em plena festa do Fecamepa
e a esperança é um pássaro extinto que, mesmo assim, teima em voar no meu
coração entoando aquele verso escatológico do Jayme Griz. Quase me rendo ao desespero, não fosse a linda ativista
saudita Loujain
Alhathloul a me surpreender: Todos nós temos que
perceber que criticar alguns fenômenos em nosso país não significa odiá-los,
desejar o mal para eles, nem é uma tentativa de abalar seu equilíbrio, é o
oposto total. Qualquer cidadão pode ficar chateado com alguns
incidentes que ocorrem por aqui, mas isso é apenas um sinal direto do interesse
na melhoria de seu próprio país e da esperança de vê-lo como um líder global. Continuo
muito otimista quanto a um futuro brilhante para meu país e seus cidadãos. Eu
vou vencer. Não imediatamente, mas definitivamente. Vê-la é o mesmo que ressuscitar num amanhecer
ainda escuro. E não satisfeita, recitou-me Attila József: Quando
nasci tinha uma faca na mão. / Dizem: é poesia. / Mas peguei na pena, melhor
ainda que a faca. / Nasci para ser homem. / Alguém soluça uma felicidade
apaixonada. / Dizem: é amor. / Chama-se ao teu seio, simplicidade das lágrimas!
/ Só contigo eu brinco. / Não recordo nada e também nada esqueço. / Dizem: como
é possível? / O que deixo cair mantém-se sobre a terra. / Se o não encontro, tu
o encontrarás. / A terra me aprisiona, o mar me dilacera. / Dizem: um dia
morrerás. / Mas dizem-se tantas coisas a um homem / que nem sequer respondo.
Assim, o seu beijo me tocou arrepiando a alma para, entre o verdadeiro e o
escatológico, sonhar e fazer.
A solidão de Dostoievski – Imagem: arte
da desenhista, pintora, professora e gravurista Iza Costa (1942-2021). – Não era eu, mas aquele a quem senti doer na
pele o pai alcoólatra, a engenharia entediante, a enfermidade militar –
precisava ser gente e deixara o exército para vê-lo assassinado. O único prêmio
foi esbanjar a herança com a poesia de Puchkin,
a prosa de Balzac, leituras de Fourier, e ouvir de Necrasov: Você sabe o que escreveu? Nem eu sabia,
era só gente pobre, os mesmos dos contos d’O
Dobro. Senti na pele a sua prisão por traição, condenado à morte. No local
da execução, a sentença para ouvi-lo dizer: Não
me restava mais que um minuto de vida! Ah, não! Mas, uma bandeira branca e
a comutação da pena: trabalhos forçados na Sibéria - triturando pedras,
carregando rochas, a epilepsia. As visões de quantos ali desencarnavam, outros
enlouqueciam, as cicatrizes das lembranças. Havia Maria, sim, aquela que era
Dimitrieva Isaieva, esperou por ela, a desilusão ao vê-la enviuvar: seria a
chance de ser feliz, pensara, não era, um desgosto - era ela, o filho e o
amante. Chegou a vez de Humilhados e
ofendidos. Por remissão, o elogio de Tolstoi:
Recordação da casa dos mortos. E o passeio
do leão enjaulado pela tardia, com tantos episódios violentos e torturas íntimas
no campo de batalha, os pesadelos patológicos e o intolerável sofrimento, o
desespero pela salvação, a pobreza e o Livro de Jó, as almas aflitas, a revista
censurada, o infortúnio e a perda de memória. Na solidão estava Polina
abandonada e morta de fome. A salvação no jogo e lá se foi a esposa que não
mais era, o irmão e a depressão: Vivo
como um mendigo. Era a vez de O
jogador e, depois, Crime e castigo. Não fosse a taquígrafa
Ana, a que era Grigorieva Snitquin, jamais haveria a autobiografia lúgubre:
Notas do inferno, cartas de além túmulo, o exílio dos credores. Precisava da
terra, do seu chão para se salvar da doença sagrada e escrever a vida. O retorno
e O idiota e, depois, Os possessos. Foi-se o primeiro filho,
segurou como pode o segundo, o sentimento de culpa, os tormentos: base
indispensável para O eterno marido e Os irmãos Karamazov. Parecia mais um fanático monge esfarrapado, e a hemorragia
na vida lôbrega e desequilibrada: um extravagante contraditório, um intolerante
com a indecência de dizer a verdade, as matérias da alma, as confissões, a
incontinência verbal. Ouvi-lo dizer: Quanto
mais gosto da humanidade em geral, menos aprecio as pessoas em particular, como
indivíduos... Às vezes o homem prefere o sofrimento à paixão... A maior
felicidade é quando a pessoa sabe por que é que é infeliz. Bem,
com ele as inquietações: se Deus existe,
não sei; só do amor entre todos! Um raio de Sol, a doença e a morte.
Seiscentos&sessenta&seis... – Só sei da
vida e quando fui em Floresta pela primeira vez, nem era ainda o Eixo Leste da
transposição do Velho Chico, vi na cabeça o navio e o dedo do poeta na única
nuvem dos meus avós maternos que já se foram para nunca mais. Dez ou cinco anos
atrás, nem lembro direito quando fui de novo e passeei pela margem direita do
Pajeú, comendo tomate e melancia, ouvindo os lamentos dos praieiros que fugiam
do meu rio no meio do sul da mata. Daquela nuvem eles riam porque eu estava
noutra tarde da Pracinha do Diário e ali, o então profeta, começou a me dizer
de pedra e de trivialidades por cima e por baixo doutras arestas e era como se
eu para lá retornasse seiscentas e sessenta e seis milhões de vezes e soubesse
da vidarte na caleidoscopia aplicada e o barulho da queda que vinha de lá do
farol de Olinda e ficou como se dois olhos não lembrassem. Seiscentas e outras
tantas vezes, meus avós no coração. Com isso tudo, então, segui a teia do Eclesiástico (Autor, 2021), o
poemevangelho de Gentil Porto Filho:
... velozes de dia, lentos à noite / recordes
de velocidade / recordes de luxúria / recordes de cochilo e insônia / vivendo
para bater recordes / conforme as oportunidades / desrespeitando ciclos e
estações / sem coordenadas xyt / casas de praia no campo / jangadas e cavalos a
postos / horas e dias que passam / uma hora de dois dias / um dia de duas horas
/ ontem mesmo durou duas horas / hoje, dois dias / se eu fosse sincero, diria
uma vida inteira etc... na última linha só me restava saudar o poeta e
celebrá-lo desde o Livro Fechado, desdantes! A vida, apesar de tudo, o que nos
cabe. Até mais ver.
E mais:
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