domingo, novembro 29, 2020

MARINA TSVETÁIEVA, AUGUSTO MONTERROSO, VALERIE COLIN-SIMARD, ANDRÉS HENESTROSA, VALÉRIE DUPONT, LOUISE-VICTORINE AKERMANN & CHICO SCIENCE


  

TRÍPTICO DQC: VIDOUTRA – Ao som de Raua needmine (Curse Upon Iron, 1972), do compositor estoniano Veljo Tormis (1930-2017): Não sou eu que faço uso da música folclórica, é a música folclórica que faz uso de mim. – Estou só e a inquietude de tudo corre no meu sangue, poros, vísceras, interstícios. Alguém ronda o meu espaço, procuro e me deparo com olhos um tanto amedrontados que flagram uma flor num canto da janela. São olhos em todas as direções que pousam insistentemente na flor e logo se perdem em busca de algo indistinguível e, como o heresiarca de Uqbar, parecem abominar a cópula, o espelho e, também, a fotografia e os mortos que parecem perseguir seus passos. Nada dizem além das apreensões. Seus pensamentos dialogam com os meus e me dizem da sua infeliz situação de ser quem é, deseja ser outro, não aquilo a que estava reduzido. Interrogo com o olhar. Silencioso e com emissões de insatisfações por toda sua expressão responde tácito. De repente dá um chute na flor e distancia-se até sumir na escuridão. Idiota! Pela margem esquerda identifico a aproximação do escritor hondurenho Augusto Monterroso (1921-2003): Acredite em você, mas não tanto; duvide de você, mas não tanto. Na dúvida, acredite; Quando você acreditar, duvide. Nisto reside a única sabedoria verdadeira que pode acompanhar um escritor. Um tapinha às minhas costas, um cumprimento com um sorriso contido e boa noite. Volto ao panorama da janela e mergulho em meus pensamentos, até ser surpreendido pela bela jornalista franco-belga Valérie Dupont: Somos uma geração que viveu uma pandemia, mas também não era exatamente uma guerra. Para mim quase, não há como me defender do algoz invisível. Ela sorri, contempla o céu e o seu olhar maravilhado me contamina. Extasiado com sua companhia inesperada, a satisfação é maior e o visto até agora é nada diante do momento.

 


MEMENTO EXCADESCERE - Imagem: A arte da performática artista visual Marta Oliveira - Ao som do Ballet Fantasia: Simbolismo e vivência do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (1976), da compositora, pianista, violinista, maestrina e educadora musical Lycia de Biase Bidart (1910-1991) – A sua chegada ali me trouxe fiapos de ótimas lembranças e pudemos conversar por horas a fio, risadas e surpresas com a deposição de algumas situações vexatórias a qual me submeti durante toda minha vida. Simpaticamente receptiva, levou-me a encará-la e sua feição era a da poeta e tradutora russa Marina Tsvetáieva (1892-1941) a me dizer sorridente: Um engano que nos eleva é mais caro do que uma série de verdades baixas. A conversa rolou: os males da guerra, o mal-estar diante da pobreza e da miséria, os desgovernos e a prestidigitação política do poder, a destruição da Natureza, o desencanto e, enfim, as perspectivas escatológicas. Inevitavelmente a nossa interlocução foi levada às paixões e amores, ao que ela inquiriu: Qual é a principal coisa no amor? Para saber e se esconder. Para saber sobre quem você ama e esconder que você ama. Às vezes, esconder (vergonha) vence o saber (paixão). A paixão pelo oculto - a paixão pelo revelado. E sorriu lindamente. Essa dicotomia nos levou ao ápice na discussão e eu havia me lembrado de esquecer tudo que passou, precisava disso com a urgência de viver. Deslembrar, simplesmente.

 


MARE NOSTRUM - Imagem: A arte da artista visual & ilustradora Luda Lima. Ao som de Novo amor, da compositora brasileira Najla Jabor (1915-2001), na interpretação de Flávio Bastos Abbas (canto) e Anderson Daher (piano). – Memorações e remorsos se diluíam diante do seu olhar receptivo. E ela era agora a escritora francesa Louise-Victorine Akermann (1813-1890): Como é insuficiente o coração humano! Um longo amor acaba por cansar. Frase quase desapontadora, temia o descarte. Para quem entre sucumbências e devires bordejou as tantas e profundas águas revoltas das paixões, uma trajetória carregada de alheios pruridos, fobias e libertinagens, não foi brincadeira, entendia mesmo e muito do riscado. Percebi que ela mantinha entre as mãos o livro Quand les femmes s'éveilleront... (Albin Michel, 2008), da psicóloga, escritora e jornalista francesa Valerie Colin-Simard. Abriu o volume, folheou e numa leitura apurada foi encantando meus ouvidos às indagações: E se o feminismo apenas nos tivesse dado o direito de ser como os homens? Hoje devemos ser ativas, eficientes, competitivas, conquistadoras. Voltamos - como um só homem - ao molde do padrão masculino. Resta-nos hoje reabilitar um feminino há muito denegrido, amordaçado. Ousar o feminino também é ousar ser você mesmo. É também ousar a emoção, a vulnerabilidade, o vínculo, o amor, essenciais ao nosso equilíbrio físico e psíquico e da empresa. Às vezes também é ousar assumir a própria vulnerabilidade, para receber e não apenas doar, ser mulher sem necessariamente ser mãe. Graças às feministas, as mulheres agora são liberadas na sociedade. No trabalho como na vida privada, é hora de ousar apresentar esses valores do feminino com mais respeito pela nossa humanidade. Um novo feminismo? Imaginava tudo que dissera misturado ao fascínio que ela exercia sobre mim. Diante do meu silêncio, usou do escritor mexicano Andrés Henestrosa (1906-2008): O amor é a loucura mais lúcida que o homem tem... Nada mais aconchegante que ouvi-la noite adentro coroando o amor que nos enfeitiçava com o gosto de eternidade. Até mais ver.

 

A MÚSICA DE CHICO SCIENCE

O sol nasce e ilumina / As pedras evoluídas / Que cresceram com a força / De pedreiros suicidas / Cavaleiros circulam / Vigiando as pessoas / Não importa se são ruins / Nem importa se são boas / E a cidade se apresenta / Centro das ambições / Para mendigos ou ricos / E outras armações / Coletivos, automóveis, / Motos e metrôs / Trabalhadores, patrões, / Policiais, camelôs / A cidade não pára / A cidade só cresce / O de cima sobe / E o de baixo desce / A cidade se encontra / Prostituída / Por aqueles que a usaram / Em busca de uma saída / Ilusora de pessoas / De outros lugares, / A cidade e sua fama / Vai além dos mares / E no meio da esperteza / Internacional / A cidade até que não está tão mal / E a situação sempre mais ou menos / Sempre uns com mais e outros com menos / A cidade não pára... / Eu vou fazer uma embolada, / Um samba, um maracatu / Tudo bem envenenado / Bom pra mim e bom pra tu / Pra gente sair da lama e enfrentar os urubus / Num dia de sol, Recife acordou / Com a mesma fedentina do dia anterior.

A cidade, música do cantor e compositor Chico Science (Francisco de Assis França – 1966-1997), um dos principais colaboradores do movimento Manguebeat e líder da banda Nação Zumbi, com quem lançou dois álbuns Da lama ao caos (1994) e Afrociberdelia (1996). Veja mais aqui, aqui e aqui.


 


sexta-feira, novembro 27, 2020

MANUEL SCORZA, RADUAN NASSAR, ANNA KUTERA, EWA PARTUM, FANNY KEMBLE, FLÁVIO GADÊLHA & ANITA LEOCÁDIA PRESTES

 

TRÍPTICO DQC: JANELARIRÁ – Ao som da Freedom Qashoush Symphony, do pianista e compositor sírio-estadunidense Malek Jandali – Sou raiz arrancada de mato varrido e solto aos ventos das mil e uma noites de sonhos à janela. Voos atravessando encruzilhadas de espelhos e pisos falsos, redomas e armadilhas às quedas de errar e o erro constante, as escolhas mais difíceis e nenhum atalho, nenhum desconto. Se há um paradoxo, persigo. Até Kurt Gödel nesta hora: Todo erro se deve a fatores externos (como a emoção e a educação); a razão nunca erra. Logo agora e o que menos precisava era um paradoxo a mais e a incompletude e o que há de inconsistente. Sou peixe e escapei de iscas e redes de lagoas e rios, só tenho o corpo, a força do braço e amor do coração. Encontrei Duília de Melo no meio da noite e era uma estrela iridescente sem poupar minha desolação: É preciso não desistir e continuar um dia atrás do outro que uma hora acontece, a estabilidade chega e cada vez mais a gente vai adicionando conhecimento sobre o universo. Sua voz é um afago na minha resiliência de pés suspenso pelos descampados e ribanceiras, como se fosse P. D. James a me dizer: Não podemos vivenciar nada além do momento presente, viver em nenhum outro segundo de tempo, e entender isso é o mais próximo que podemos chegar da vida eterna. Não simulo os instantes, perdoei tudo e todos, nenhum ressentimento, nenhuma conta nem pendência. Recito o poema Desterrado de Manuel Scorza e a vida larilará.

 


FALANDO SOZINHO – Imagem: arte da videoartista, pintora e artista multimídia performática polonesa Anna Kutera, ao som da Tron Suite (1982), da compositora e musicista estadunidense Wendy Carlos & London Philharmonic Orchestra. - Só tenho paredes, meu abrigo. Da janela, a lonjura de tudo. Em mim dias e noites atravessam telhados e aerovias estelares, e me levo a percorrer o horizonte circundante para além dos limites e me pego como se o que fui de tão distante mundo afora, era lugar algum além daqui onde me encontro. Ouço vozes e alertam e anunciam o que não compreendo, estou atento e são tantas e se confundem com o voo das almas e aves noturnas. Distingo Horácio revelador: Quando a casa do vizinho está pegando fogo, a minha casa está em perigo. A adversidade desperta em nós capacidades que, em circunstâncias favoráveis, teriam ficado adormecidas. E uma vez lançada, a palavra voa irrevogável. E o silêncio impera mais uma vez e me perco na escuridão, como se Raduan Nassar me espreitasse: Há mais força no perdão do que na ofensa, há mais força no reparo do que no erro. O tempo, o tempo é versátil, o tempo faz diabruras, o tempo brincava comigo, o tempo se espreguiçava provocadoramente, era um tempo só de esperas, me guardando na casa velha por dias inteiros; era um tempo também de sobressaltos, me embaralhando ruídos, confundindo minhas antenas, me levando a ouvir claramente acenos imaginários, me despertando com a gravidade de um julgamento mais áspero, eu estou louco! Sim, acho que estou mesmo enlouquecendo e não tenho mais que um cubículo retangular para sobreviver e que me priva a oportunidade ser-me para além do outro e algo mais.

 


POR UM LUGAR ESPECIAL – Imagem: arte da poeta, cineasta, artista conceitual performática polonesa Ewa Partum, ao som da Cantilène pour violon (1990), da compositora suíça Geneviève Calame (1946-1993), na interpretação da violinista suíça Désirée Pousaz. - Desejo o seu desejo e ela está distante, por enquanto. Se ela chega e quando o faz, é festa noitedia. A espera é dolorosa. Subitamente, a porta se abre e ela invade luminescente com ar de Anita Leocádia Prestes: Mobilizar o povo é chave para transformar sociedade. Todas e todos se organizem pelas suas reivindicações. É na organização popular que a gente faz as coisas mudarem rumo a uma sociedade melhor. Está inquieta e me beija apressadamente como quem tem algo de muito importante para fazer. E eu só queria um beijo que fosse para matar a saudade saneando o possível instante de qualquer diferente paisagem, onírica e instantânea, e desse descanso ao meu tormento. Ela caminha pelos quatro cantos como se quisesse dizer algo inexprimível e gesticula buscando as palavras num esforço gigantesco. Logo se transforma na atriz e escritora britânica Fanny Kemble (1809-1893) e passa o texto: Eu quero fazer tudo no mundo que pode ser feito. Simplicidade é um grande elemento de boa criação. Muitas causas tendem a tornar bons senhores e amantes tão raros quanto bons servos. As grandes e rápidas fortunas pelas quais pessoas vulgares e ignorantes se tornam possuidoras de casas esplêndidas, esplendidamente mobiliadas, não lhes dá, é claro, os sentimentos e maneiras de gente gentil, ou de qualquer forma realmente os eleva acima dos criados que empregam, que estão bem cientes desse fato, e que a posse de riqueza é literalmente a única superioridade que seus empregadores têm sobre eles. Sua inquietação me comove e me envolvo na sua trama e somos dois aos motins e barricadas tentando nos salvar de qualquer jeito. Lá fora, tudo horror e ruína. Não temos tempo para enfrentar tantas adversidades. Precisamos viver o que nos resta e a nós a vida a passos largos pela entrega de se amar. Não titubiei, roubei seus lábios e os fiz com ósculos de música duradoura no seu corpo, meu cenário e moradia, tudo nela, o amor é o que vale. Até mais ver.

 

A ARTE DE FLÁVIO GADÊLHA

O retrato, para mim, é uma maneira de entender as pessoas, penetrar a alma, através do olhar, de gestos e posturas. Tem um sentimento que eu quero passar. Assistir às pessoas vendo a pintura, ver o que elas querem passar. Tudo isso eleva a inspiração que eu procuro. Eu gosto de pintar a família, os amigos e também pessoas desconhecidas, que têm características fortes e me inspiram. Quando pinto coisas despercebidas, elas se tornam muito importantes. Queria trazer à luz o descaso, o preconceito e ganância das grandes potências que está levando ao extermínio os povos indígenas.

A arte do pintor, escultor e gravurista Flávio Gadêlha, membro da Academia de Letras e Artes do Nordeste, formado em artes plásticas pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), restaurador do Museu do Estado de Pernambuco e já participou de exposições internacionais, a exemplo do Porto, Barcelona, Buenos Aires, Atlanta e Georgia. Veja mais aqui e aqui.


 

 


quinta-feira, novembro 26, 2020

ESQUIVEL, CESARINY, ARLETE SALLES, ADELE AUS DER OHE, MARCUS FAUSTINI, ELLEN WHITE & RAFA ELEUTÉRIO


  

TRÍPTICO DQC: JANELÚCIDA – Ao som da Suíte Sinfônica n.1 Paulista - I. Cantaretê II. Jongo III. Recomenda de almas IV. Tambu (1955), de César Guerra-Peixe, com a Orchestra Statale di Mosca diretta da Edoardo de Guarnieri – Anoiteceu e o som da música ditava o tempo. O espaço vazio do meu quarto era como sobreviver num vácuo inescapável. Um foco de luz e lá estava Adolfo Pérez Esquivel sentado num canto. Olhou-me e disse: Não se pode semear de punhos fechados. E ao escurecer, minha solidão e ele não mais ali, só o cenário da janela. Um novo foco e Gregório de Matos Guerra em tom de reclamação: O honesto é pobre, o ocioso triunfa, o incompetente manda. Fitou-me firme, deu-me as costas e saiu ao dar de ombros com Coventry Patmore que pigarreou soletrando: A tolerância, como agora é amplamente pregada, pode ser uma barganha muito unilateral. Não adianta deixar a falsidade e a idiotice moral dizerem à verdade e à honestidade: "Vou tolerar você, se você me tolerar". Empinou o nariz com ar de interrogação e, diante da minha mudez confusa, se foi para dar vez ao surgimento do Yukio Mishima: Como lidar com uma era que manchou tudo que noutros tempos era sagrado? Esperou um pouco, seguiu meu olhar e da mesma forma intrigante da sua entrada, saiu sem dizer mais nada. Foi aí que me surgiu Frances Hodgson Burnett, afetuosa e solícita: De alguma forma, alguma coisa sempre acontece antes que a gente chegue ao pior ponto. Eu tenho que lembrar sempre disto: o pior nunca acontece. Se você olhar bem, verá que o mundo todo é um jardim. Alisou meus cabelos, acariciou minhas faces, um beijo terno e um sorriso de despedida. Preciso sair, volto já.

 


MINHA RUA TEM HISTÓRIA – Ao som de The Roots of the Moment (Hatology, 1988), da acordeonista e compositora estadunidense, Pauline Oliveros (1932-2016) – É madrugada e estou na rua fria das luzes escassas pela neblina. Vagam lêmures e invisíveis pra lá e pra cá, feito aluados que se perderam do mundo e se encontraram em si. Inventei de sair e não sei como voltar, uma longa viagem pelo deserto do real. O chão imprime o trajeto dos que passaram o dia no burburinho da vida como entregador montado na urgência, ou aqueles que gritam promoções das vitrines, ou se passam por Papai Noel só pro chamariz das liquidações e beliscões nas bochechas infantis; ou comendo brebotes com caldo de cana na barraca dos camelôs, enquanto o vaivém de gente metida e afobada de pressa, mãos de pedintes, outranônimos e boçais, imundícies e parafinas. Cada qual sua história, teatro sem palco, cenas da hora que ecoam das Pedreiras desabitadas, da Bica do Bigode que secou ou quase, dos Quilombos periféricos e da Nova Cidade que emergiu entre desabamentos e escombros com todos os bairros dos santos, e não sabe mais do que era o Riacho dos Cachorros ou da buraqueira do arruado da usina pra dar em Pirangi, hoje só margem do cemitério. Ainda é novembro e ouço o eco dessas vozes e passos no meio da noite adentro. É como se estivesse no meio do Carnaval, bexiga, funk e sombrinha (2006) ou no meio das páginas de O Guia afetivo da periferia (Aeroplano, 2009), do diretor teatral, documentarista e escritor Marcus Faustini. E é ele que surge em plena madrugada: Acho que temos que mudar tudo. Acho que está tudo errado. Tudo isso com a ideia de que precisavam aparecer novas subjetividades, e que a função da arte talvez fosse agir no território popular e não representar o território popular. Paro para pensar e ao dirigir o olhar para ele, não mais, era Eugène Ionesco de sopetão: Mergulha, sem limites, no espanto e na estupefação; deste modo podes ser sem limites, assim podes ser infinitamente. O homem superior é aquele que cumpre sempre o seu dever. E vou catando em cada canto das esburacadas calçadas o que sobrou das tantas histórias perdidas nas ruas.

 


E SE NADA ACONTECESSE NADA VALERIA! – Imagem: arte da fotógrafa e repórter fotográfica Rafa Eleutério - Ao som de Eine Sage and Spinnlied, Op. 4, nº 1 & 4, da compositora alemã Adele aus der Ohe (1861-1937), na interpretação da pianista Erica Sipes. - Para quem sobreviveu a um monte de erradas, vexames, apertos e situações aversivas, despertar naquela manhã ao lado dela, era como tirar a sorte grande e nunca mais premir de nada. Acordar inebriado por seu hálito de rosa, seu perfume de carne fresca, sua nudez de deusa radiante, era mais que ganhar em qualquer situação. Sobretudo ao vê-la ali, desnuda, sentada e pronta para recitar o Monólogo de Molly do Ulysses de Joyce... eu adoro flor eu ia adorar entupir a casa de rosa Deus do céu não tem nada igual à natureza as montanhas virgens e aí o mar e as ondas quebrando... Fiquei atento até a última fala e aplaudi. Ela sorriu, olhos brilhantes, e num gestou brusco, pulou sobre mim, agarrando-se ao meu pescoço com beijos zis apaixonados, a me recitar um pequeno poema de Mário Cesariny: Tu estás em mim como eu estive no berço como a árvore sob a sua crosta como o navio no fundo do mar. Outros tantos beijos e me falou como se fosse a escritora estadunidense Ellen G. White (1827-1915): O valor do amor está vinculado a soma dos sacrifícios que estás disposto a fazer por ele. A alma cresce à altura daquela que admira. Eu sabia que ali, dagora em diante, o dia inteiro era só nosso e nada me demoveria disso e dela, íntimos e sós. Até mais ver.

 

A ARTE DE ARLETE SALLES

Há um vazio na minha alma. O que faz uma pessoa achar que tem o direito de interferir na vida do outro? Como um adulto apedreja uma criança porque ela está saindo com a roupinha de sua religião?... Mas ser mãe dos 16 para os 17 anos não é o ideal. O maior compromisso que você assume na vida é a maternidade, e nessa idade você está descobrindo a vida. Mas não lamento nada. É a minha história e isso foi vivido com sustos e surpresas, mas chegamos aqui e chegamos bem. Não mudaria nada. Só sinto falta de não ter muito um espírito empreendedor, de produzir. Não tenho essa combinação do talento para o ofício e para o administrativo. É o que lamento quando olho para trás. Teria mais autonomia e não ficaria dependendo de ninguém.

A arte da premiada atriz, radialista, comediante e apresentadora, Arlete Salles, que iniciou sua carreira aos quinze anos de idade como locutora na Radio Jornal do Commércio, em Recife; integrou a companhia teatral de Barreto Júnior, na qual foi premiada pela atuação na peça A cegonha se diverte (1958) e, a partir disso, fez sua gloriosa trajetória pelo rádio, teatro, cinema e televisão. Veja mais aqui, aqui e aqui.


 


quarta-feira, novembro 25, 2020

BA JIN, KATHERINE ANNE PORTER, TRISHA BROWN, CHARLAINE HARRIS & TÂMARA DORNELAS

 

TRÍPTICO DQC: JANELIVRE - Curtindo FandangoTres Canciones Espanola (1951), do compositor, pianista e violonista espanhol Joaquin Rodrigo (1901-1999), na interpretação do premiado violonista Fabio Lima. Fandango vai quase não volta, eita, que coisa boa! Marinheiro nunca fui, só de primeira viagem, avalie. Dos sete mares, só em sonho. Indagora mesmo, depois de uma golada bem dada, navegante das cheganças, ouvi o Gajeiro de lá: O vento é tanto que me faz chorar! Que é que é isso, vamos pelas embaixadas aos versos tantos da Nau Catarineta: Minha mãe bem me dizia / Que eu não fosse me embarcar / Que esta nau se perderia / E eu me lançaria ao mar. Ora, ora, é só se deixar correr pela correnteza das águas. Assim, mesmo perdido, ela ali estava no meio doutras tantas na dança lasciva. E isso entre catraieiros, pescadores, trapicheiros estivadores, armadores e o que mais, aquela mesma que foi proibida por Pombal lá pelos tempos de antanho. Agora não, os tempos nem são tão outros, cuidado nunca é demais. Estou ligado nela, se cochilar fico na mão e era uma vez a possibilidade de um grande amor. Só perdi de mesmo a cisma com a chegada do grande escritor anarquista chinês Ba Jin (1904-2005): Esta batalha para salvar vidas será vencida. Não podemos esquecer o que aconteceu e a história não deve se repetir. Ah, tudo pela amizade e paz, jamais a guerra! Talvez tenha passado da hora, mas nunca é tarde, há sempre o que fazer. Ele se foi e eu cantarolei: Adeus que eu me vou. Meu navio a sorte inventa.

 


MEU CORAÇÃO ESTÁ NA MONTANHA – Curtindo Navilouca Ao Vivo (Universal, 2010), da banda Pedro Luís e a Parede: Segure nave louca / Que eu sou pedra rolando / Que está despencando / Em precipício propício / Pra esse movimento de agora / Esse monumento ao momento / Monumento de hospício / Silêncio na avenida Presidente Vargas / É mergulho bem pra dentro de si / Fotografei você na minha dragoflex / De olhar aceso esperando por mim / Então / Segure nave louca... – Para quem não tem mais paradeiro, no meio da festa toda, feito Net&Salomão, apareceu lá longe a Stultifera Navis de Brant, sem considerar aonde voo. Vão todos ao lado daqueles que se despedaçaram da La Nef des fous de Bosch, com os intemperantes e avarentos. Todos consideram: É melhor seguir sendo laico do que comportar-se mal dentro das ordens. Como não sei das estrelas do céu, nem dos ventos ou estações do ano, ouvi do Ship of Fools (Open Road, 2015), de Katherine Anne Porter: O lugar para onde você vai ainda não existe, você deve construí-lo quando chegar ao ponto certo. E não eram as cenas de Stanley Kramer, nem a pintura de John Alexander. Enfim, todos achavam que o louco era eu. E digo a verdade: ela estava ali e era em Abaton. Não era um totem nem o paraíso cretense de Chersonissos. Não, não era. Era ela reinando num cenário jamais visto. Confesso que nada vi, meus olhos eram dela. Para não mentir, as coisas que lá vi foram duas: Virginia Woolf fugitiva da sua loucura: A vida é como um sonho; é o acordar que nos mata. E o Eça de Queiroz aborrecido: Políticos e fraldas devem ser trocados de tempos em tempos pelo mesmo motivo. O amor eterno é o amor impossível. Os amores possíveis começam a morrer no dia em que se concretizam. A arte é um resumo da natureza feito pela imaginação. Afora isso, todos me diziam que ali era Abaton. Nem sabia mesmo onde é que era e como de lá me safei. Só soube do que se tratava muito depois, quando vi My heart’s in the Highlands (Edimburgo, 1892), do Thomas Bulfinch (1796-1867). Pois é, enquanto todos vagavam em busca daquilo que só sabiam apenas suspensa no horizonte ao anoitecer, completamente inacessível e duvidável, posso dizer, com certeza: fui ao lugar que ninguém nunca foi, nem sabia. E fui levado pelo fandango ao coração dela.

 


ÍSIS INSEPULTA, A MORTA-VIVA - Baseada na história da desaparecida Ísis Dias de Oliveira (1941-1972) – Ao som de Song From the Uproar (2012), da compositora e pianista estadunidense Missy Mazzoli, baseada na vida da exploradora suíça Isabela Eberhardt (1877-1904) – Foi lá que ela bailou com melancolia para encenar o seu texto: Sou Ísis de batismo, nem sei se viva ou morta, apenas que sou e nem sei quem ou onde estou. Não tenho mais familiares, nem o que de mim restou. Da Ilha das Flores o meu voo sem saber para onde ir. Sei apenas que sou desaparecida atravessando décadas para nunca mais. Sou também Dulce e as tantas outras filhas da dor. Ao final, num raio de luz do luar, ela dançou a coreografia de Trisha Brown (1936-2017): Prefiro guardar os meus segredos para mim. Em vez de falar sobre minha dança, prefiro simplesmente dançar. A verdade é que quero dançar a vida toda. Nunca quero parar de dançar. E se trancou em si, envolvida por meu abraço. Um beijo e disse Charlaine Harris: A vida continua. Ou, neste caso, a morte continua. Às vezes, você só precisa se arrepender e seguir em frente. Ali, nosso coração era um, mútuos e siameses, batidas de comunhão. Até mais ver.

 

A ARTE DE TÂMARA DORNELAS

A arte da bailarina Tâmara Dornelas, que é formada na Escola de Dança do Teatro Municipal do Rio de Janeiro e que atualmente atua na austríaca Europaballett St. Pölten. Veja mais aqui e aqui.


 

 


terça-feira, novembro 24, 2020

ARUNDHATI ROY, TOULOUSE-LAUTREC, JULIETA VENEGAS, PARK CHAN-WOOK & NHÔ CABOCLO


  

TRÍPTICO DQC: POEMÁTICA – Ao som de Appello - I. Quietly, and with a cruel reverberation - II. A vague chimera that engulfs the breath - III. ...a perhaps hand (which comes carefully out of Nowhere) - e.e. cummings - IV. And I remembered the Cry of the Peacocks - Wallace Stevens, da compositora estadunidense Barbara Kolb, for solo piano, played by Jay Gottlieb. - A minha solidão de Toulouse: Não era Saint-André-du-Bois, nem Paris, nem Alagoinhanduba. Noite alta madrugada adentro, nenhuma estrela no céu e o dia amanhecerá logo logo. Sei e ouço lá longe o alvoroço do pau-de-arara levando os ticoqueiros para o corte da cana. Esse o anúncio de que o dia já se avizinha. Não sei como eles vivem de safras e entressafras aqui e acolá pelas estradas sazonais. Sei das famílias penduradas nos morros e eles lá da botada à pejada, da aurora ao anoitecer, chova ou faça Sol. Ouço pegadas, alguém se aproxima da janela. É Toulouse-Lautrec: O amor é uma doença que nos enche com o desejo de ser desejado. Ah, sim, o amor, sempre o amor. Sinto o seu ar de Moulin Rouge, um aperto de mão e um brinde. Não estou escondido em Montmartre, apenas no meu próprio casulo. Não tenho nenhuma Carmen Gaudin para posar, nem ouvi Yvette Guilbert, nem vi a dançarina Louise Weber, a La Goulue, nem a Jane Avril. Faço hoje apenas colagens imitando o que fez de design gráfico e revolucionou os cartazes litográficos para a Arte Nouveau. Nenhuma revolução nas minhas pretensões. Toparia tomar o seu Terremoto, embora só me reste a Teibei! – Deus me livre, quem é doido, hem? Outro brinde, mudo como chegou assim permaneceu até seguir pela trilha do horizonte e a solidão é maior que a noite.

 


O REINO DA LOUCURA – Ao som da Symphonie de Printemps (1986) – 1. Spring – Incantaion, Autum – Poetic, 3. Winter – Unrealistically, 4. Summer – Finale, da compositora e pianista francesa Ida Rose Esther Gotkovsky. - Este quarto é a minha prisão. Não sei que horas são, nem que dia é hoje, perdi a noção de tudo. Ainda é noite na solidão, só o que posso distinguir à janela. Nenhuma culpa, nenhum crime, se me privo é por conta do risco, apenas o estar só a esta hora e manter-me vivo, o que importa. Tento sair e não consigo. É como se estivesse protagonizando o premiado drama de mistério Oldeuboi (2003), o segundo da Trilogia da Vingança, do cineasta sul-coreano Park Chan-wook, baseado num mangá homônimo japonês, de Nobuaki Minegishi e Garon Tsuchiya. Mas eu não sou Dae-Su para ser mantido em cativeiro por longos anos num quarto de hotel e sem qualquer contato com o mundo lá fora. Muito menos tenho uma missão obsessiva por vingança nem sou acusado de assassinar ninguém, nunca! Longe de mim o suicídio e não entendo porque seria perseguido pela justiça ou por quem quer que seja, numa rede de conspiração violenta. Para minha surpresa me chega a atriz sul-coreana Kang Hye-jung que me fala coisas em um idioma que sou incapaz de entender, repetindo insistentemente Mi-do e se desnuda aproximando-se sedutora e a me cativar com sua expressiva beleza.

 


A REDENÇÃO DA CHEGADA DELAImagem: arte do escultor dinamarquês Kai Nielsen (1882–1924). - Chegou com o amanhecer toda Julieta Venegas de Primer Día. Um beijo ensolarado e já nem me lembrava do que passei solitário durante toda noite. Dormiu bem? Agora já nem sei. Quer brincar de quê? De viver. Que tal eu virar uma estátua e você Pigmaleão descobrir em mim a sua Galatéia? E fez poses a se desnudar cantarolando Andar Conmigo: Dime si tu quisieras andar conmigo, oh-oh-oh / Cuéntame si quisieras andar conmigo, oh-oh-oh / Dime si tu quisieras andar conmigo, oh-oh-oh / Cuéntame si quisieras andar conmigo, oh-oh-oh. Depois de muito encher o ambiente com seus zis encantos, achegou-se íntima a se esfregar em mim, ousada, atrevida, deliciosa. Venha! Sou apenas um , não possuo talento de artesão, mas hei de amá-la mais e mais para sempre: sou seu; você, minha. E riu e ria com seus beijos picantes incendiando minha alma e libido. E me disse Arundhati Roy: Nós não pertencemos a nenhum lugar. Navegamos sem âncora em mares turbulentos. Podemos nunca ter permissão para desembarcar. Nossas tristezas nunca serão tristes o suficiente. Nossas alegrias nunca são felizes o suficiente. Nossos sonhos nunca são grandes o suficiente. Nossas vidas nunca são importantes o suficiente... para importar. Sim, eu sei. Esta vida é uma passagem, só o amor faz imortal. Até mais ver.

 

A ARTE DE NHÔ CABOCLO

Não conheci ninguém, nasci só. Não gosto de coisa de loja. Gosto de trabalhar peça para museu: museu de matuto. Gosto de fazer peça de penas e guerras. É muita luta e o derradeiro a ficar vivo sou eu mesmo.

A arte do escultor, carpinteiro e sapateiro Nhô Caboclo (Manuel Fontoura 1910–1976), descendente indígena, representante da arte popular e explorador de matérias-primas como o barro, a madeira, o metal e as folhas de flandres, imprimindo em suas obras os sentidos de luta, guerra e escravidão. Veja mais aqui e aqui.

 



domingo, novembro 22, 2020

HALLDÓR LAXNESS, MARJANE SATRAPI, GEORGE ELIOT, CIARA & MOMBOJÓ


  

TRÍPTICO DQC: JANELÚDICA - Ao som de Kosmogonia (1970), de Krzysztof Penderecki (1933 - 2020), na interpretação da soprano polonesa Olga Pasichnyk, Rafał Bartmiński, Tomasz Konieczny & Warsaw Philharmonic Choir and Orchestra, Antoni Wit – O mundo na janela, o coração enlutado – quantos serão ceifados em nome da incúria e sordidez desgovernada do Fecamepa. É dele o que me sobra ser no meio da barulhada das britadeiras, motores, furadeiras, motosserras, rangidos outros, chiados incógnitos da desumanidade. É como se o meu desconsolo nas mãos do algoz. Sei, não tenho inimigos, pelo menos acredito nisso. De qualquer forma o céu estrelado me diz: em cada uma delas as dores de quem se foi, vidas apagadas irresponsavelmente ressuscitam para iluminar a imensidão de quem se perdeu e quase já não é mais. Só me resta a tentativa de voar com o peso do passado, em busca de um ventre por refúgio e lamber os talhos da carne em qualquer paz possível. Neste instante, solidária é a chegada do escritor islandês e Prêmio Nobel de 1955, Halldór Laxness (1902-1998), a me presentear o seu inestimável Gente independente (Globo, 2005) e a me dizer: Um homem não é independente a menos que tenha a coragem de estar sozinho. O homem é essencialmente só, deve-se ter pena dele e amá-lo e chorar com ele. Um aperto de mão e ninguém mais ali. De volta ao cenário e solitude, enquanto jogam sujo, eu ludo, brincante onde a poesia, um coração vive.

 


A VIDA AINDA É ASSIM POR AQUI – Imagem: Arte do pintor e fotógrafo britânico Sigmar Polke (1941-2010), ao som dos 12 Prelúdios (1957/58), de Claudio Santoro. - Quantos nomes escondem estigmas de ferradas em carne viva - Quem de cor ou qualquer outro desvalor, de gentio ou fêmea, escravos milenares, a ordem imposta dos conluios patriarcais. Quem não um rótulo arrancado, como me dissera Mary Ann, mascarada em seu nom de plume para escapar dos estigmas e estereótipos, só uma exigência mínima de respeito para ser levada a sério. Não é gata disfarçada de zebra ou antílope, é o peso da herança tanto do batismo como das regras seculares inventadas para convívio e jogo. Não era ele, chegou-me postiça: paletó, gravata, voz máscula impostada e rouca, um romancista britânico George Eliot (1819-1880): Não existe desespero tão absoluto quanto aquele que surge nos primeiros momentos de nosso primeiro grande sofrimento, quando não conhecemos ainda o que é ter sofrido e ser curado, ter se desesperado e recuperado a esperança. Em cada despedida existe a imagem da morte. E me chamou também de George. Sim? Vem cá, George! Veio se despedir? Sim, mas do que me fiz para ser apenas o que sou de verdade, venha, quero apenas ser, inominável e oculta. E arrancou os disfarces, e se desfez das vestes, e se desnudou por inteiro e me envolveu como se fosse um moinho à beira do rio.

 


ELA BRIZOMANTE – Curtindo o álbum Beauty Marks (WB, 2019), da cantora, compositora, atriz, dançarina e modelo estadunidense Ciara. - Ao amanhecer ela chegou como sempre: cantarolando, só que em outro idioma, o que para mim tanto faz, sou péssimo demais no vernáculo para dar conta de outra língua. Ela dançou e, qual pitonisa, brincou de mágica: estalava os dedos e eu era outro, friccionava-os e ajeitava aqui e ali, artesã moldando tudo, além do que sou, vísceras, interstícios, alma – era na sua manipulação como se, ao mesmo tempo, mergulhasse dentro de mim e viajássemos por todas as dimensões, umas noutras e tudo por escalas e vibrações, até o topo do universo. Está vendo? Sim. E ela, astromante, disse: Tudo é você e eu. E num pulo abissal, descemos em queda livre. Saiu-se e me fitou. Enfim, ao espelho, não era eu, outro: Fui buscar outra encarnação sua. Como? Na versão anterior você não era nada que se aproveitasse, mas a sua versão anteontem, ah, essa sim, a antes de antes, digna de nota! Exatamente no ponto! Não havia como me reconhecer, estranha condução. E ela já era encantadora Marjane Satrapi: A vida é curta demais para ser mal vivida. Na vida você encontrará muitos idiotas. Se eles te machucarem, diga a si mesmo que é porque eles são estúpidos. Isso ajudará a evitar que você reaja à crueldade deles. Porque não há nada pior do que amargura e vingança. Mantenha sempre sua dignidade e seja fiel a si mesmo. Abraçou-me brizomante e a vida era em nós. Até mais ver.

 

MOMBOJÓ

A arte musical da banda Mombojó, formada por Chiquinho, Felipe S, Marcelo Machado, Missionário José e Vicente Machado. Na sua discografia constam os ótimos álbuns: Nadadenovo (2004), Homem-espuma (2006) e Amigo do Tempo (2010), afora Toca Brasil Nadadenovo e Trilhas, entre outros. Veja mais aqui e aqui.

 



sexta-feira, novembro 20, 2020

HARUKI MURAKAMI, JUDITH MCNAUGHT, CATHY O'NEIL, MARIA DE MEDEIROS, RUUD KOOPMANS & JANAÍNA ESMERALDO


  

TRÍPTICO DQC: JANELÍRICA – Ao som do Concerto nº 3 in C major, Op. 26, do Sergei Prokofiev, com a legendária pianista Martha Argerich e a Singapore Symphony Orchestra Recorded, regida por Darío Alejandro Ntaca, ao vivo no Esplanade Concert Hall, Singapore, 2018. - Estava em um local em que havia apenas uma única porta para entrada e saída. Mal cheguei e fui recepcionado por uma mulher de beleza misteriosa, vestida numa túnica transparente de ver-lhe as proporções corporais. Estendeu-me a mão com um sorriso e disse-me: Você só está aqui porque foi predestinado para essa honra por nascimento ou golpe do destino. Se você possui a capacidade de sonhar e de acreditar nele, seja bem-vindo. Assenti e me acompanhou no embarque com uma caravana até a fronteira. Na alfândega, ela conduziu para um funcionário que me deu dinheiro e uma passagem de trem para a capital. Ele perguntou-me pela mala e eu apenas com as mãos abanando. Ela fez um cumprimento para ele e me puxou: Vamos para Perla! Durante a viagem me explicou que não é permitido ali nada novo, só se usa o que for de segunda mão. Como eu só tinha a roupa do couro e a coragem, a minha admissão se deu sem muita burocracia. E foi me contando sobre as coisas dali, de gente espiritualizada que possui a consciência das inter-relações de seus mundos individuais e acreditam apenas em seus próprios sonhos. Pude ver algumas cenas estranhas, como a cópula de um gorila que mordia inexoravelmente a cabeça de uma submissa e fogosa mulher nua. Mais adiante me deparei com uma mulher simpática com corpo de caveira e faces, barriga enorme e pernas humanas. Vi passar The Lady on the Horse, como também uma mulher nua deitada de quatro e com as ancas empinadas diante de uma gigantesca cobra com cabeça de tigre. Do outro lado, um cachorro gigante priápico que encurralava uma jovem donzela nua e indefesa que seria por ele estuprada. Mais adiante presenciei o estupro de uma camponesa da Morávia, assistida pela mulher que casou com um elefante e um grupo de homens estupradores com muitas mulheres nuas numa igreja. Antes que me impressionasse com o que via, ela, ao meu lado, passou-me um livro, cujo título estava grafado The other side - Die andere Seite: ein phantastischer Roman (Berlim, 1908), do ilustrador e escritor austríaco Alfred Kubin (1877-1959). Folheei e a narrativa era repleta de ilustrações, muitas delas registrando exatamente todas as cenas que vi durante a viagem. Chegamos, Florian! Hem? Sou Anna Sand, vamos antes que o estranho continue nos seguindo. Quem? Vamos realizar nossos sonhos: a liberdade absoluta! Perla? Não, El Dorado. Um anão nos recepcionou e nos abriu a porta para uma localidade barroca carregada de bizarrices e devassidão. Vi as faces dela afogueada e apertava minha mão com se os desejos e vontades desenfreadas acometessem seu ser. Foi então que explicou ser ali o Reino dos Sonhos, um refúgio para os insatisfeitos, todas as necessidades materiais são dadas de mãos beijadas, todas. Esta localidade foi fundada no final de século XIX pelo extravagante caçador Klaus Patera que, em um confronto com o raríssimo tigre persa, foi ferido e só curado pelo chefe de uma estranha e rara tribo isolada que praticava ritos excêntricos e indescritíveis. Foi ele quem construiu Perla e depois separou seu reino do mundo circundante com uma grande muralha, guarnecido por fortificações poderosas. Pude perceber pelas paisagens que uma parte território era montanhosa e, a outra, plana com colinas, grandes florestas, um lago e um rio. As coisas mudavam a cada passagem, agora tudo se parecia com o cenário do Traumstadt (1973), a versão do livro que eu levava e que foi dirigido pelo cineasta alemão Johannes Schaaf (1933-2019). Fiquei assustado e logo me percebi noutro sonho do reino quando ela me chamou de Lobo Negro. Era ela mesma, só que agora se chamava Jennifer e mudava meu nome vez outra, me tratando também por Royce. Demorei a entender que ela era uma rebelde prisioneira em busca do amor e que só o encontrou em mim, o seu captor. Como? Ela então me abraçou com um beijo irresistível e demorado. Não sei se pelo movimento das pessoas por perto, ou se algo a fez sair avisando que logo voltaria, me entregando outro livro: Um reino de sonhos (Bertrand Brasil, 2018), da escritora estadunidense Judith McNaught. Comecei a lê-lo sem perder a noção de que tudo mais mudava ao meu redor. Intrigado com tudo que me ocorria, a autora deste livro sentou-se ao meu lado, se apresentou e disse: Existirão algumas vezes na sua vida em que todos os seus instintos lhe dirão para fazer algo, algo que desafia a lógica, perturba seus planos, e pode parecer loucura para os outros. Quando isso acontecer, você deve fazê-lo. Ouça seus instintos e ignore tudo o resto. Ignore a lógica, ignore as probabilidades, ignore as complicações, e apenas vá nessa. Ela sorriu e saiu sem se despedir. Voltei à leitura e me senti bastante sonolento. Deveras, cansado de tantas acontecências e da loucura dos sonhos.


 

LIRISMO & ARMAS DE DESTRUIÇÃO – Ao som da Symphony nº 1 - Chimera (2006), de Lera Auerbach, witch Düsseldorfer Symphoniker, conductor John Fiore. - Meus dias foram noites ininterruptas e, apesar da monstruosidade e do alarido dos horrores, os pássaros cantavam ao Sol. Isso era raro e maravilhoso para quem só sabia máquinas, buzinas, motores, ventoinhas, luminosos, pigarros e cuspidas. E o mote era: quem foi, foi; que não, ficou. Quem voltou, que vá. Senão, não. Tudo fenece ao sabor dos disparos de armas destrutivas. É o que alerta a matemática, cientista de dados e escritora estadunidense Cathy O'Neil, com a publicação do seu livro Weapons of Math Destrution (Crown, 2016): Os privilegiados são analisados por pessoas; as massas, por máquinas. Algoritmos sempre funcionam bem para as pessoas que os projetam, mas não sabemos se funcionam bem para as pessoas-alvo desses algoritmos. Com algoritmos, estamos tentando transcender o preconceito humano, estamos tentando lançar uma ferramenta científica. Se eles falham, eles fazem a sociedade entrar em um ciclo destrutivo, porque eles aumentam progressivamente a desigualdade. É o que o sociólogo holandês Ruud Koopmans também considera ao observar no seu Movements and Media: Selection Processes and Evolutionary Dynamics in the Public Sphere (Theory and Society. 2004), que a partir das definições de visibilidade, ressonância e legitimidade, ou seja, visibilidade como extensão da cobertura que os veículos de comunicação de massa dedicam a determinado tema; ressonância como a capacidade de um tema gerar debate; e legitimidade como o tema gerando consenso a respeito de si mesmo; para concluir, sob esta perspectiva, que os discursos polarizadores tendem a ter mais visibilidade e ressonância na esfera pública pelo fato de não serem, em sua maioria, consensuais ou legítimos, gerando debate e focalização do assunto. Sim. Para onde nós vamos? Não sei, desconfio que nada de bom sairá disso tudo.

 


ELA, MARIA – Curtindo Caso de amor, música de Milton Nascimento & Wagner Tiso, na voz da atriz, cineasta e cantora portuguesa Maria de Medeiros. - Ela chegou cantarolando com sotaque lusitano, um beijo e um toque suave. Meu coração era só retreta e fogos de artifícios em sua saudação. Diante do meu entusiasmo, disse-me toda Anais Nïn: A vida se contrai e se expande proporcionalmente à coragem do indivíduo. Não vemos as coisas como são: vemos as coisas como somos. A nossa vida em grande parte compõe-se de sonhos. É preciso ligá-los à ação. E rodopiou, saias aos ventos seios livres, para o prazer do meu sonho de tê-la a todo instante, nua e lindamente exultante, entre meus beijabraços, como pássaros eternos por penínsulas e continentes. Depois de afagozos, afastou-se um pouco e recitou do escritor japonês Haruki Murakami como se fosse uma revelação: A coisa mais importante que aprendi na escola é o fato de que as coisas mais importantes não podem ser aprendidas na escola. Seja lá o que esteja procurando, não virá da forma que você está esperando... No fundo, todos aguardam o fim do mundo. Era ela a poesia viva, nada mais tão real quanto ela olhos grandes riso largo em mim. E veio até mim, saltitante Nadime Gordimer: A poesia é ao mesmo tempo um esconderijo e um alto-falante. A solidão da escrita é muito assustadora. Está muito perto da loucura, desaparecemos por um dia e perdemos o contato. Sim, sempre nos perdemos. E reconstruímos o mundo que era só nosso e em nós, e nos refizemos conosco mútua e solidária com a nossa loucura repleta de vida. Até mais ver.

 

A ARTE DE JANAÍNA ESMERALDO

A arte da quadrinista e ilustradora Janaína Esmeraldo, autora da newsletter de quadrinhos Cabelo-nuvem e dos zines independentes Frutila – quadrinhos autobiográficos; Cosmo – uma história de amor futurista; e O Polegar de Ouro – uma história única e autobiográfica. Veja mais aqui e aqui.


 


quinta-feira, novembro 19, 2020

GUIMARÃES ROSA, MAGDA SZABÓ, IMRE MADÁCH, EMMA LAZARUS, HIROSHI OSAKA, ÁGNES BERTALAN, HERMILA GUEDES & LAGO DOS SONHOS

 

TRÍPTICO DQC: JANELONÍRICA – Ao som da abertura d’A Louca, do compositor, maestro e professor Elias Alvares Lobo (1834-1901), com a Orchestra: Orquesta Sinfonica Nacional da Radio M.E.C., condutor Alceo Bocchino. – Adormeci ainda cedo da noite e logo um sonho para lá de estranho. Não sei como fui parar num hospital e sentei-me numa poltrona da sala de espera. Sem perceber fui picado por uma seringa que fez o mundo girar e eu como se estivesse a bordo de um eritrócito navegava por correntes sanguíneas. Apareceu uma senhora jovem muito bonita e vestida à moda oriental. Ela criava palavras de três letras de um alfabeto de apenas quatro, manipulando todas as combinações possíveis, diante de tabletes de argila vitrificada. Uma mão me puxou pelo braço e fui conduzido a subir os degraus de uma escada até chegar ao topo e recepcionado por um homem corpulento que nunca vi. Vestido de um blazer com o escudo da Universidade de Cambridge, estava acompanhado de um outro muito desalinhado com seu tênis sem cadarço. Ambos me conduziram a uma visita pela dupla hélice, o núcleo e os compartimentos citoplasmático. Era tudo muito estranho. Ao retornar recebi o auxílio de um gigantesco mensageiro para uma viagem em movimentos brownianos levados pela agitação molecular de partículas coloidais por um ambiente homogêneo de baixa densidade. Não entendia nada. E me deparei numa praia de músculos na qual doutos professores dialogavam estranhos problemas científicos. Maravilhado com o cenário, fui então informado de que aquela dama oriental que vira anteriormente, nada mais era que a dama Enzima, na verdade, senhorita DNA polimerase, que presidia a replicação do código genético. A escada que eu percorri, era dela, a do DNA. Lá me explicaram que ali era o Lago dos Sonhos, local onde se cantam fórmulas mágicas que fazem com que as nuvens assumam formas fantásticas. De fato, ao recitar o estranho cântico, logo se faziam das nuvens imagens de dinossauros, gliptodontes e pterodátilos às travessuras no céu. Ao acompanhar os discursos daqueles sábios, uma inhaca me incomodava, fedentina terrível. Um deles me explicou ser estrume. Sim? Respondeu-me cortesmente que os bois são animais atômicos que funcionam da mesma maneira que centrais nucleares de alta performance. E? É que o resíduo é fertilizante e a energia que usam vem indiretamente do sol por meio das plantas que comem. Ah, tá. Curiosamente tive outras explicações muito informativas, como, entre outras, a respeito da matemática da combinação dos genes, coisas que mais pareciam aulas de ciências do ginasial e colegial, nem lembrava mais. Não sei como retornei são e salvo. Dei pela presença do físico ucraniano George Gamow (1904-1968), que apertou forte minha mão com um riso largo e foi me questionando a respeito da viagem ao lago, se havia gostado ou não, estava curioso e nem me deixava falar de tão entusiasmado com minha experiência, a ponto de me informar entre perguntas irrespondíveis e gargalhadas soltas, que ali era o único do mundo em que é possível se pescar enquanto faz um curso geral sobre termodinâmica aplicada à biologia. Hem? Ele mais rio. E muito. Foi logo me presenteando a obra Mr. Tompkin inside himself, adventures in the new biology (Allen & Unwin, 1967), dele em parceria com o microbiologista lituano Martynas Yčas (1917-2014). Nossa, que sonho estranho! Lembrei do Quintana: Sonhar é acordar-se para dentro. E foi exatamente isso que me ocorreu. Chaplin passou e me disse em tom satírico o cochicho: Falar sem aspas, amar sem interrogação, sonhar com reticências, viver sem ponto final. Mais mordaz ainda foi a inesperada chegada de Shaw: Alguns homens veem as coisas como são, e dizem 'Por quê?' Eu sonho com as coisas que nunca foram e digo 'Por que não?'... Acho que estou ficando louco no meio da minha interminável solidão. Nisso aparece Anatole France: Para realizar grandes conquistas, devemos não apenas agir, mas também sonhar; não apenas planejar, mas também acreditar. Sei, com esses encontros e desencontros, me sinto o sujeito mais perdulário. Nada não, sei que a vira gira num redemoinho sem fim, não há como escapar: sempre se volta por onde passou.

 


A TRAGÉDIA DO HOMEM - Ao som do The Poem of Ecstasy, Op. 54 (1905-08), de Alexander Scriabin, played by the Philharmonia Orchestra and conducted by Esa-Pekka Salonen (2010). - Ela chegou nua ao amanhecer. Era Eva n’A tragédia do homem (1860 - Salamandra, 1980), de Imre Madách. Na cena escura ela recitou um trecho da cena II: E embora a luz do céu se apague no alto, aqui embaixo eu a encontro nos teus olhos: onde mais a encontrar, se não em ti, eu que devo o meu ser ao teu anseio? Se até o Sol, com seu jorro de luz, para não ficar só no mundo, pinta a própria imagem no lençol das águas e, alegre de ter par, com ela brinca, generoso a esquecer que é simplesmente um reflexo da sua própria luz, que, sem ela, se apagaria logo! Aproximou-se e quase senti sua respiração compassada num trecho da cena IV ao meu ouvido: Me esmaga, Faraó, mas me perdoa se a dor do povo não me deixa em paz! Sei muito bem que sou escrava tua e vivo só para te dar prazer, esquecer tudo o que existe em redor - grandeza e miséria, ilusão e morte - para ter riso alegre e beijo ardente. Mas quando o povo, este ser de mil braços. geme lá fora ao estalar do açoite, eu, filha do povo, e dele arrancada como um pedaço de um corpo doído, sinto em meu peito o que ele inteiro sofre. Deu uma volta ao meu redor e na minha nuca sussurrou um trecho da cena V: Na alma da gente há uma voz muito alta: a ambição! No escravo, ela está dormindo, ou, em tão baixo nível, gera o crime. Mas, provando o sangue da liberdade, é uma virtude cívica que esplende no que há de mais digno e mais grandioso. Quando é forte demais, vira-se contra a própria mãe - e uma das duas morre. Se em teu pai essa voz fosse mais forte e o levasse a trair a pátria amada, seria a maldição! Rezemos, filho! Deu mais uma volta e outra como se investigasse minha atenção. Não sei como, ouvi Lúcifer: Não passa o tempo: nós é que mudamos. Sim e ela já era a atriz húngara Ágnes Bertalan na adaptação fílmica em animação da peça, Az ember tragédiája (2011), dirigida por Marcell Jankovics. E me envolveu num longuíssimo sonho em que eu era Adão levado pelo falante Lúcifer numa visita às grandes civilizações do mundo a questionar sobre o significado da vida. Logo sou o Faraó Djoser que me apaixono por Eva agora uma escrava, e sou Milcíades conenado à morte, sou Tancredo iconoclasta, sou Kepler buscando a sabedoria, sou o sanguinário Danton e desperto entre ideias duradouras e poderosas. Não sou nada diante do penhasco. E ela, agora Magda Szabó me diz baixinho: Deus geralmente nos ignorava quando pedíamos algo, mas invariavelmente concedia o que temíamos. Eu ainda era bastante jovem, e não tinha pensado sobre isso, quão irracional, quão imprevisível é a atração entre as pessoas, quão fatal é sua corrente. Então ela afastou-se e à porta: Vem!

 


ELA OMNIRIDESCENTE – Imagem: do fotógrafo japonês Hiroshi Osaka. Curtindo o album Life Goes On (ECM, 2020), de Carla Bley with saxophonist Andy Sheppard and bass guitarist Steve Swallow. - Ela me leva pela mão e sua nudez reluz na minha gula. Num canto da sala ela me beija, vira-se de costa e me leva a comprimí-la contra a parede. Leva a minha ao seu sexo úmido e a outra a acariciar seus seios, enquanto ela me diz da poeta estadunidense Emma Lazarus (1849-1887): Parece que sempre tenho uma pequena janela voltada para a vida. Até que sejamos todos livres, nenhum de nós é livre. A poesia deve ser simples, sensual ou apaixonada. E mais se contorcia com o meu contato, meu sexo remexendo por sua carne caudalosa. Sussurrou excitada João Guimarães Rosa: É preciso sofrer depois de ter sofrido, e amar, e mais amar, depois de ter amado. Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. Felicidade se acha é em horinhas de descuido. Viver é etecetera. E o amor se fez entrega e a vida mais que eterna em nós. Até mais ver.

 

A ARTE DE HERMILA GUEDES

Quero personagens que me transformem. Tive sorte por ter surgido trabalhos maravilhosos para mim. Mas também escolho personagens que me desafiam como atriz. Como não estudei artes cênicas, a minha escola é o trabalho, a maneira como sou conduzida pelos diretores é onde aprendo. Escolho personagens que me desafiam como profissional e como pessoa, que me transformam, que possam acrescentar e com os quais eu possa aprender muita coisa.

A arte da atriz Hermila Guedes, que estreou no teatro com a peça A Duquesa dos Cajus (1999) e depois atuou nas peças teatrais: Noite Feliz (2000); Paixão de Cristo (2001-2005), Meia Sola (2003); Angu de Sangue (2004); e, no ano seguinte, Três Viúvas de Arthur. Atuou em filmes como Cinema, Aspirinas e Urubus, de Marcelo Gomes e daí por diante vários filmes levaram-na para a televisão, atuando em especiais e telenovelas da TV Globo. Veja mais aqui e aqui.