domingo, outubro 26, 2025

VINCIANE DESPRET, CRISTINA PERI ROSSI, MELBA ESCOBAR, THAÍS ALCOFORADO & PINTANDO NAS PRAÇAS

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Minha música foi revelada ao mundo através do lançamento do meu primeiro álbum e minha carreira musical começou a se desenvolver e crescer lentamente a partir daí. Foi uma progressão natural que eu alimentei, alimentei e continuei trabalhando duro para continuar seguindo em frente...

Pensamento ao som dos álbuns Becalmed (2010), Night Sky (2012), Wide Asleep (2016), Yonder (2017), Scattered on the Wind (2020), Echoes In The Valley (2021), A World Outside (2023) e Become the Sky (2025), da pianista e compositora australiana Sophie Hutchings.

 

A festa épica panapaná... – Era a vez do pastoril: Eu sou uma borboleta, pequenina e feiticeira, ando no meio das flores procurando quem me queira... E começou a encenação: Despertai ó humanidade: É a Festa do Sol no solstício de verão do nosso jardim repleto de paineira-rosa, caraguatás e gravatás, ora-pro-nobis e flor-de-fogo. Viva!!! A menina nasceu, Frei Gaspar, pra festa dos irmãos Valença. Viva!!! Despertai ó humanidade, chegamos desde o meio do Eoceno para celebrar o nosso Hanamatsuri! A orquestra de pau e corda está pronta com o terém-tém-tém da viola, o golpeado do pandeiro: potoc-toc-toc, o seu tremulado, o seu balançado. Viva!!! Vamos fazer as jornadas que a lua nasceu no Egito! E haja festa: É hora da louvação / louvem todas a voar / salves os vivos e mortos / e tudo mais vamos louvar! Louvemos a menina que nasceu! Viva!!! Louvemos a bem-aventurada Psiquê, que veio abençoar a natalidade! Viva!!! Louvemos as borboletas que, no Bhagavad Gita, é a mulher, o espírito viajante e a ressurreição. Viva!!! Louvemos o Tochmarc Étaíne dos Ulaide! Viva!!! Louvemos Itzpapalotl do paraíso de Tomoachan, com seu manto invisível de obsidiana. Viva!!! Louvemos os amantes Liang Shanbo e Zhu Yingtai! Viva!!! Louvemos a injustiçada rainha Lâmia! Viva!!! Louvemos Mariana, a protetora do lago do Pará e as irmãs turcas, Jarina, Herondina e Mariana! Viva!!! Louvemos Brites de Almeida, a padeira de Aljubarrota! Viva!!! Louvemos a pedra do fogo ctoniano oculto, o número do centro do mundo, o Sol do tempo da guerreira no céu das águias! Viva!!! Louvemos o trâmite do ovo, a pupa, a crisálida e a imago! Viva!!! É a hora do Auto dos Trovadores, a Gaia Ciência no XIV soneto de Cláudio Manoel da Costa: Quem deixa o trato pastoril amado \ Pela ingrata, civil correspondência, \ Ou desconhece o rosto da violência, \ Ou do retiro a paz não tem provado... E viva os brincantes: a Pavão-escarlate é a Mestra; a Azul-de-cauda-longa é a Contra-mestra; a Monarca é a Diana; e a Oitenta-e-oito, a Capitão-do-mato, a Olho-de-pavão, a Olho-de-coruja e a Zebra juntam todas as pastorinhas. Viva!!! E vamos pra longa viagem! Não tem homem nesta festa, não? Doro logo adiantou-se invocando Aguinados e Aurelianos pros Villancicos! Alto lá, adiantado, já vimos suas presepadas. E ficou na plateia entre floricultores, lepidopterista, entomólogos, taxidermistas, borboletários, mariposas, bichos da seda, mandrovás, lagartas, taturanas, besouros, joaninhas, marimbondos, abelhas, vespas e moscas. Nada de puçá nem motefobistas, nem orioles, aranhas, louva-a-deus, formigas, sapos, lagartixas e vespas, viu? Logo apareceu o velho Rabeca com uma glíptica asteca, fazendo mesuras em honra ao imortal jardineiro Yan-k'o. Viva!!! A menina nasceu! Viva o cordão azul! Viva!!! Viva o cordão encarnado! Viva!!! Quem é a mais bonita? Vamos pro baile das flores de Itapipoca! Bora!!! E todas exibiram seus diademas e tiaras, suas fitas e requebros, seus cintos e seus coletes decotados. “Quem quiser que se remexa / para ver se não apanha / minha volta é cruel / o encarnado é quem ganha!”. Logo surgiu a Borboleta Azul que invocou os seus simpatizantes. A festa corria solta e foi a maior disputa, cada qual a preferida de muitos. Com o impasse do empate, deu-se a despedida, quando soou o alarme: Beija-flor! Foi a maior correria, todas buscando abrigo. Psiquê interviu: Pare! Nobre deusa, quanta honra, minhas reverências! Você não é bem-vindo! Como assim? Este é um festejo privado! Ah, a senhora não sabe? Sou Coacyaba, vim ver minha filha Guanamby, encontrar minha noiva e anunciar meu casamento! A deusa então sorriu, pois sabia que fora Tupã quem a transformou, para que pudesse salvar sua filhinha aprisionada numa flor. E como ela está? Vou vê-la agorinha mesmo, majestade! Então, traga-a pra gente comemorar juntas e carregar os sonhos! E o trupé recomeçou até a apoteose depois de raiar o dia. Até mais ver.

 

Niki de Saint Phalle: Meu destino é criar um lugar onde as pessoas possam vir e ser felizes: um jardim de alegria... Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui.

Shere Hite: Considere a escolha entre ir atrás de dinheiro ou de ideais. Há tanta pressão para ir atrás de dinheiro que o idealismo tem pouca visibilidade. Faça algo que signifique algo para você... Veja mais aqui, aqui & aqui.

Roseanne Barr: Com tempo suficiente e sem outras opções, posso me adaptar a quase tudo... Veja mais aqui, aqui & aqui.

 

SALVE-SE QUEM PUDER

Imagem: Acervo ArtLAM.

Se fui amarga foi pela pena \ O capitão gritou, “salve-se quem puder” \ e eu, sem pensar, lancei-me à água \ como ávida nadadora, \ como se sempre tivesse esperado esse momento, \ o momento supremo de solidão \ em que nada pesa \ nada resta \ senão o desejo impostergável de viver; \ me lancei à água, é fato, sem olhar para trás. \ Se olhasse talvez não tivesse me lançado. \ teria vacilado olhando teus grandes olhos tristes. \ sinistros remorsos teriam me impedido \ de saltar ao espaço \ tocar a fria umidade do ar \ o noturno sereno \ e cair \ como recém-nascida \ na flutuante superfície do bote \ onde tudo haverá de continuar \ não se sabe onde. \ Se tivesse olhado para trás, \ teus grandes olhos tristes \ a vela suspendida \ os cabos soltos \ as câmaras inundadas \ como as memórias salgadas do mar. \ Se tivesse olhado para trás, \ “Salve-se quem puder” \ gritava o capitão. \ De ter olhado \ de ter voltado os olhos \ como Eurídice \ já não poderia saltar \ pertenceria ao passado \ ancorada entre as redes do barco, seu capitão, a ferrugem das cadeiras \ os versos que consumíamos nas noites de vigília \ tua preguiça de saltar, \ tua vingança de correr, \ presa entre as famosas trepadeiras dos versos preferidos, \ caso tivesse respirado mais o ar salino \ nem visto aparecer o sol; \ era um caso de vida ou morte. \ “Salve-se quem puder” \ tinha gritado o capitão, \ a vida era uma hipótese de salto, \ permanecer, uma morte segura.

Poema da escritora, professora, ativista e tradutora uruguaia Cristina Peri Rossi, que assim se expressou no seu autoexílio: Estritamente não se pode voltar porque é um tempo que já não existe... Veja mais aqui, aqui & aqui.

 

QUANDO ÉRAMOS FELIZES, MAS NÃO SABÍAMOS - [...] Maturidade também é um corpo, um gesto, uma careta, um passado mais do que um futuro. Maturidade é um personagem que apaga os limites do etéreo para desenhar com um cinzel e apagar toda aquela promessa. Maturidade é o desaparecimento progressivo de linhas inacabadas. É se tornar uma pessoa específica, determinada. No meu caso, é ser quem eu sou, ter uma compreensão cada vez mais clara disso e estar disposto a abraçá-lo, para o bem ou para o mal. [...]. Trecho extraído da obra Cuando éramos felices pero no lo sabíamos (Ariel, 2022), da escritora e jornalista colombiana Melba Escobar (Melba Escobar de Nogales), autora de obras como La Mujer que Hablaba Sola (2019), Bogotá Sueña. La Ciudad Por Los Niños (2007), Duermevela (2010) e Johnny e o mar (2014), entre outros. Veja mais aqui e aquí.

 

VIVENDO COMO UM PÁSSARO - [...] Se há territórios que querem ser cantados ou, mais precisamente, que só querem ser cantados, se há territórios que querem ser marcados pela potência dos simulacros da presença, territórios que se tornam corpos e corpos que se estendem em lugares de vida, se há lugares de vida que se tornam canções ou canções que criam um lugar, se há potências do som e potências dos cheiros, há, sem dúvida, muitos outros modos de ser, de habitar, que multiplicam os mundos. Que verbos poderíamos descobrir que evocassem essas potências? Poderiam existir territórios dançados (potência da dança a ser concedida)? Territórios amados (que só querem ser amados? Potência do amor), territórios disputados (que só querem ser disputados?), compartilhados, conquistados, marcados, conhecidos, reconhecidos, apropriados, familiares? Quantos verbos e quais verbos podem fazer território? E quais são as práticas que permitirão que esses verbos proliferem? Estou convencido, junto com Haraway e muitos outros, de que multiplicar mundos pode tornar o nosso mais habitável. […] Eu digo "habitar", eu deveria dizer "coabitar", porque não há maneira de habitar que não seja, antes de tudo, "coabitar". [...] Não esquecer que essas canções estão desaparecendo, mas que desaparecerão ainda mais se não lhes dermos atenção. E que com elas desaparecerão múltiplas formas de habitar a terra, invenções da vida, composições, partituras melódicas, apropriações delicadas, modos de ser e importâncias. Tudo o que faz territórios e tudo o que torna territórios animados, ritmados, vividos, amados. Habitados. Viver em nosso tempo, chamando-o de "Fonoceno", é aprender a prestar atenção ao silêncio que o canto de um melro pode trazer à existência, é viver em territórios cantados, mas também não é esquecer que o silêncio pode se impor. E que o que também corremos o risco de perder, por falta de atenção, será a coragem cantante dos pássaros. [...] Primeiro, era um melro. A janela do meu quarto tinha sido deixada aberta pela primeira vez em meses, como um sinal de vitória sobre o inverno. Seu canto me acordou ao amanhecer. Cantava com todo o coração, com toda a força, com todo o seu talento de melro. Outro respondeu um pouco mais longe, provavelmente de uma chaminé próxima. Eu não conseguia mais dormir. Esse melro cantava, como diria o filósofo Étienne Souriau, com o entusiasmo do corpo, como os animais podem fazer quando completamente absortos em brincadeiras e simulações de faz de conta. 2 Mas não foi esse entusiasmo que me manteve acordado, nem o que um biólogo rabugento poderia ter chamado de uma conquista ruidosa da evolução. Foi a atenção constante desse melro em variar cada série de notas. Fiquei cativado, desde o segundo ou terceiro chamado, pelo que se tornou um romance audiofônico, cada episódio melódico do qual eu chamava com um silencioso "e o que mais?". Cada sequência diferia da anterior, cada uma se inventava na forma de um novo contraponto. Daquele dia em diante, minha janela permaneceu aberta todas as noites. A cada crise de insônia que se seguiu naquela primeira manhã, eu me reconectava com a mesma alegria, a mesma surpresa, a mesma expectativa que me impedia de voltar (ou mesmo de desejar voltar) a dormir. O pássaro cantava. Mas nunca o canto, ao mesmo tempo, pareceu tão próximo da fala. [...]. Trechos extraídos da obra Habiter en oiseau (Babel, 2023), da filósofa, professora e psicóloga belga Vinciane Despret, autora da obra Au bonheur des morts (2015), na qual questiona: Ainda temos incerteza suficiente para manter um pouco de esperança no possível? Ainda temos imaginação suficiente, hábito suficiente para ver vaga-lumes brilhando no escuro?

 

A TORRE DE THAÍS ALCOFORADO

Como a construção \ A catástrofe também demanda paciência \ Ainda assim, o momento exato do desabamento \ Parece sempre repentino \ Os acontecimentos teriam sido devastadores \ Se eu não tivesse começado a me preparar \ Sem suspeita \ Justo a tempo \ Para todo tipo de emergências \ Tudo que veio antes, um ensaio \ Tudo o que vier depois, uma réplica \ Do choque primordial.

Poema Hefesto, extraído da obra A Torre (Primata, 2025), da escritora, advogada e trabalhadora humanitária, Thaís Alcoforado, que ao lançar a obra expressou: Percebi que quanto mais se escreve, mais se torna urgente e inevitável escrever. Agora, minha meta é manter aberto esse canal, criando espaços intencionais para que a escrita exista dentro da vida cotidiana. Veja mais aqui.

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PINTANDO NAS PRAÇAS

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ITINERARTE – COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:

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