DIÁRIO DE QUARENTENA – UMA: A MARÉ ESTÁ
BRABA, MAS NÃO PODE AMOLECER - O Brasil tem dessas coisas: a gente fica com
a bronca pelo pescoço, tentando não naufragar nas crises inventadas,
manipuladas e desembocadas só para quem tem e muito! E digo isso por décadas de
timbungada pelas sazonais desditas que sobram das mazelas escondidas dos que
comandam o país, avalie. Não dá outra, do lado de cá da corda, a coisa fica
para lá do horror com tudo à deriva, pagando o pato e só lapada no toitiço. Por
isso que, para mim, sempre vale o que vociferava a Emmeline Pankhurst: Nós não
queremos quebrar as leis. Nós queremos fazer as leis. Por isso, nunca se renda,
nunca desista da luta! E mais ainda: por já se saber de cor e salteado aqui
o que o Walter Benjamim deixou
sacramentado: Que as coisas continuem
como antes, eis a catástrofe! O capitalismo nunca morrerá de morte natural.
Pois é, os pilotos sabidos sempre se esconderam na horagá e, agora, mais do que
nunca, estamos desgovernados não se sabe para qual fundura ao deus dará. Vamos
nessa e às cegas, afinal somos todos um.
DUAS: CUIDANDO ENTRE OLHO ABERTO & OUTRO FECHADO - Entre
um piscado e outro dos olhos, constato: o que há entre o desiderato e o alarido
dos tormentos, só dão em prevalecentes aporias. Ou, melhor dizendo: o mesmo que
um meio de campo embolado pela retranca de desalmados aventureiros que não
estão nem aí pra gente na geral com o coração na mão e sem nem saber para que
lado torcer. Aí tudo é só pesadelo e manadas se formam umas atrás das outras e
quem fica com o olho aberto fica feito os 7 gols alemães. Sinto que aí a gente
foi sacaneado de um jeito ou de outro. Vamos lá. Quando me bate alguma emoção
onírica, recorro logo ao Jacques Derrida:
Eu sempre sonho com uma caneta que seria
uma seringa. O que não pode ser dito acima de tudo não deve ser silenciado, mas
escrito. Como ninguém me ouve nem deve, meto as catanas para cima e arrocho
nos garranchos até não querer mais de tão rouco. É isso.
TRÊS: MISTURANDO AS TINTAS DAS LETRAS & CORES - Nada
me basta mesmo, afoito que só! Nem bem comecei a soletrar umas escritas
recorrentemente desmanchadas por escansões inapropriadas, mormente confusão
entre os sintagmas e outros tantos solecismos, coisa de poetastro metido a
beletrista. Pois é. Ainda por cima, inventei de pincelar sem o devido domínio nem
das cores primárias – resultaram inúteis as repetidas consultas ao manual do Israel Pedrosa -, meti as mãos pelas
pernas e findei colando imagens sob tintas, o que deu na maior seboseira. Aí, tentando
esconder minha imperícia, achei melhor deixar meio que quase monocromático
abstrato para passar a ilusão dum p&b lá que meio desaprumado. É que eu
havia levado ao pé da letra Rembrandt:
Tente colocar em prática o que você já
sabe e fazendo isso, você descobrirá, com o tempo, as coisas escondidas sobre
as quais agora você se questiona. Pratique o que você sabe e isso ajudará a
tornar claro o que agora você não sabe. Quanto mais perigoso, mais belo! Ah,
ledo engano esse meu. Só que eu não sabia, esse o detalhe e a questão,
confesso. Taí, todo dia emplaco uma no cabeçalho daqui, mesmo convencido de que
nunca levei jeito para nada, sempre o imprestável: vai ser desajeitado assim no
raio que parta, broco! Digo pra mim mesmo: desculpa de amarelo é comer barro,
hehehehehe. Até amanhã. © Luiz Alberto
Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS: No
momento, nosso mundo de humanos é baseado no sofrimento e na destruição de
milhões de não-humanos. Aperceber-se disso e fazer algo para mudar essa
situação por meios pessoais e públicos, requer uma mudança de percepção,
equivalente a uma conversão religiosa. Nada poderá jamais ser visto da mesma
maneira, pois uma vez reconhecido o terror e a dor de outras espécies, você
irá, a menos que resista à conversão, ter consciência das permutações de
sofrimento interminável em que se apoia a nossa sociedade. A mediocridade não conhece nada mais do
que ela mesma, mas o talento instantaneamente reconhece o gênio. Aprendi a
nunca ridicularizar a opinião de ninguém, por mais estranha que possa parecer. Pensamento
do escritor e médico britânico Arthur Conan Doyle (1859-1930), aquele
mesmo das inventivas histórias do detetive Sherlock Holmes. Veja mais aqui.
A MULHER
DO ALGODÃO
[...] em uma escola particular, onde começaram a
circular boatos sobre uma tal mulher loura que aparecia no banheiro das
crianças em busca de seu filho morto. [...] E todos os dias estudantes saiam correndo do banheiro gritando: “Eu vi
a loura! Eu vi a loura!” O pavor era grande. [...] Certa vez, minha irmã mais velha – que estudava na mesma escola que eu –
sentiu vontade de ir ao banheiro durante a aula. Mas ninguém poderia acompanhá-la
naquele momento. As escadarias do colégio estavam desertas: já no caminho ela
sentiu um calafrio! E o banheiro estava escuro. Ao entrar, minha irmã
dirigiu-se ao cubículo mais próximo da porta, pois já pensava em ter que fugir.
Trancou-se na tentativa de ficar segura, usou o sanitário de olhos fechados e,
de repente, sentiu uma presença. Abriu os olhos e lá estava a loura parada em
sua frente. Tinha cabelos longos e claros, e uma expressão muito triste que só
não chamava mais atenção do que os chumaços de algodão ensanguentados no nariz.
Por um momento, a minha irmã pensou em fugir, mas a passagem estava bloqueada
pela mulher. Tentou se acalmar um pouco e ficou ali durante alguns segundos
observando o fantasma que, do mesmo jeito que apareceu, desapareceu sem deixar
nenhum vestígio. [...].
A MULHER
DO ALGODÃO - Trechos de um relato extraído da obra Histórias medonhas d’O Recife Assombrado
(Bagaço, 2002), organizado por Roberto Beltrão. Veja mais aqui.
A DANÇA DE CRISTINA MOURA
A confusão da arte contemporânea, o lugar do público e do intérprete, o
processo artístico, o estar em cena. O espetáculo fala do que vivemos hoje.
CRISTINA MOURA - A arte da coreógrafa, atriz, diretora, bailarina
e artista múltipla Cristina Moura,
que estudou e tornou-se membro da companhia EnDança e, depois, ingressou no
Coletivo Improviso. Desenvolveu as performances Como um idiota (Like an Idiot
- 2003), Im-Pulso e o mais recente solo
Agô. Veja mais aqui.
PERNAMBUCULTURARTES
RecorDança, um acervo do projeto de pesquisa,
documentação e difusão da memória da dança, realizado pela Associação Reviva,
desde 2003, reunindo o registro digitalizado de fotos, vídeos e programas de
espetáculos produzidos na Região Metropolitana do Recife.
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Os ambulantes de deus, do escritor, dramaturgo, tradutor e
advogado Hermilo Borba Filho. (1917-1976) aqui.
A obra do
médico, professor catedrático, pensador, ativista político e embaixador do
Brasil na ONU, Josué de Castro (1908-1973) aqui & aqui.
A música
do pianista, maestro e compositor Marlos Nobre aqui.
Sísifo, do poeta Marcus Accioly (1943-2017) aqui.
Das
quedas, perdas e danos aqui.
&