quinta-feira, maio 07, 2020

MARSHALL ROSENBERG, RACINE, SARA SÍNTIQUE, SHINTARO SHIRATORI & ADELAIDE IVÁNOVA


DA FACE AO ESPELHO, QUEM NÃO - De cara pro espelho não gostei do que vi. Só que estava ali e me desconhecia. Não quis fugir dessa vez e, mesmo refratário, encarei: a descoberta da não aceitação. Quantos disfarces para embelezar a feiura expressa, mil e uns ardis, truques dolorosos, tudo escondia quem realmente sou. Removi a primeira pele, crenças e temores: caiu a dolorosa máscara e, com ela, o chapéu que eu nem sabia possuí-lo. Nem era eu, uma camada grossa do meu subterfúgio. Se não encontrava a mim mesmo, pelo menos a lancinante segunda pele foi retirada, tegumento arrancado, vícios e fingimentos, outros disfarces e adereços ruíram. Quantos que nunca fui além do engodo e se alojaram para driblar a todos e a mim mesmo, uma mentira estupenda que até me dava prazer. Tanto fiz de não me reconhecer e eu só um pedido de ajuda, um monte de coisas: sair do aperto, incólume; limpar a ficha, impune; ficar bem na fita, ileso; simpatia geral, aplausos e sorrisos. Quanta dissimulação, afinal, elas ferram com tudo e nunca quis nem saber, ousava. Não bastava a chatura de todos ao redor, do contra sempre, enquanto só me queria por agradável para ser amado e me sentir incluído na simpatia de todos, nada mais. Por isso mesmo eu não era, sem a coragem de dar a cara à tapa, na tentativa de acertar o quê, meu Deus, nem eu mesmo sabia, só queria ser notado, sentido, nada mais. Nada demais errar e corrigir, refiz tantas vezes, mas não me dava outra vez equivocado por não saber das notas, quantas músicas; das cores primárias, quantos matizes; dos sabores, quantas degustações ao paladar; palavras que combinam e destoam, afinam e desafinam, quantas recombinações inesgotáveis e a mim só precisava a escolha certa e as energias confluídas, metia as mãos pelas pernas. De cara pro espelho não gostei do que vi: sou quem sabota a mim próprio, só para tirar proveito, esconder as unhas, sair de fininho, sem ter que dar o braço a torcer ou mão à palmatoria, como se outro fizesse e depois fugisse comigo mesmo, o único réu, o verdadeiro culpado de tudo quanto arruinado, o indiscutível responsável. Se nada fiz cônscio para algo diferente, só um personagem para melhoria, alter ego, recriminável era a minha desgraça, é porque não sou quem deveria ser, nem ouço ou vejo o outro que é diferente de mim, não algoz, antítese. Quis sempre ser outro que não eu mesmo, a desconhecer do outro que em mim não era e que, ao meu lado, ignorava até existisse, porque sempre fui o dono da minha razão e centro do universo. Não vejo mais quem realmente sou, precisava enxergar melhor depois de Fedra de Racine: assim como a virtude, o crime tem seus graus. Tanta coisa por fazer e eu aqui empancado com aquele que sorri no retrato e nem sou eu Dorian Gray, apenas o que fui sem que soubesse dos outros tantos que se arvoram a ser em mim. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.

DITOS & DESDITOS: Nós somos responsáveis pelo que ouvimos as outras pessoas falar e pelos nossos atos ou ações. Somos perigosos quando não estamos conscientes da nossa responsabilidade pelo modo como nos comportamos, pensamos e sentimos. Não pense que o que diz é empatia. Assim que pensa que o que diz é empatia, estamos distantes do objetivo. Empatia é quando conectamos a nossa atenção, a nossa consciência, não o que falamos. Quando nos concentramos em esclarecer o que está sendo observado, sentido, e necessário ao invés de diagnosticar e julgar, descobrimos a profundidade de nossa própria compaixão. Pensamento do psicólogo Ph.D. estadunidense Marshall Rosenberg (1934-2015), autor do livro Comunicação não-violenta: Técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais (Agora, 2010), que funciona como um manual prático e didático voltado para aprimorar os relacionamentos interpessoais e diminuir a violência no mundo. Para ele, o método comunicativo chamado de Comunicação Não-Violenta (CNV): pode ser efetivamente aplicada em todos os níveis de comunicação e em diversas situações: relações íntimas, famílias, escolas, organizações e instituições, terapia e aconselhamento, negociações diplomáticas e comerciais, disputas e conflitos de qualquer natureza. Para praticar a Comunicação Não Violenta é fundamental que eu seja capaz de desacelerar, de ter tempo para respirar, para passar de uma energia que eu escolhi, a outra que eu acredito de onde nós devíamos vir, e não aquela para a qual eu estava programado. Eu começo o dia com uma lembrança sobre onde eu quero estar. A CNV também é aplicada no desenvolvimento de novos sistemas sociais, orientado em prol de parceria e o compartilhamento de poder, principalmente na área de educação, e também no caso de Círculos Restaurativos, prática de Justiça Restaurativa aplicada em mais que 11 países. A obra é dividida em dois capítulos, no primeiro trata sobre a comunicação com compaixão, o ato de se expressar e ouvir, apresentando as 4 áreas de concentração do processo ObSeNePe, ou seja, observação, sentimento, necessidade e pedido, por meio de expressão muito clara de cada um desses itens, envolvendo o relacionamento familiar, escolar, negocial e profissional. O segundo capítulo trata das formas de comunicação que são alienantes e violentos, como a utilização de julgamentos moralizadores, culpa, insulto, depreciação, rotulação, critica, comparação e diagnósticos, juízos de valores, classificação e julgamento como estimulante para a violência, entre outros assuntos.

FEDRA DE RACINE: AINSI QUE LA VERTU LE CRIME A SES DEGRÉS
[...] FEDRA - São caros os instantes; escutai-me. Fui eu quem, sobre um filho casto e humilde, Lancei vista profana, incestuosa. Pôs em meu seio o céu chama funesta. Tudo o mais dirigiu malvada Enone. Temeu, que meu furor sabendo Hipólito, Amor, que lhe era horrível, descobrisse. Meu desfalecimento aproveitando A pérfida, apressou-se a criminá-lo. Já se puniu; fugindo minhas iras, Nas ondas procurou suplício leve. Já meus dias o ferro terminara: Mas gemia a virtude suspeitosa. Quis, para vos expor os meus remorsos, Ao Cocito descer mais lentamente. Eu tomei, e já corre em minhas veias Veneno, que Medéia trouxe a Atenas. Tendo em meu coração já penetrado, Desconhecido gelo infunde nele. Já por entre uma nuvem só diviso, Céu e esposo, qu’ultrajo em estar presente; E a morte, aos olhos meus a luz roubando, Torna a pureza ao dia que manchavam.
FEDRA DE RACINE - Trecho da tragédia Fedra (L&PM, 2001), do poeta trágico, dramaturgo, matemático e historiador francês Jean Racine (1639-1699), em que a filha do Sol é prisioneira das trevas de um amor absolutamente proibido - ama Hipólito, seu enteado -, foge da luz do dia e se debate entre a loucura, a exaltação, a inveja, o ódio, a autopunição e a vergonha pública. Do artigo Fedra, de Jean Racine: moral do século XVII e criação literária (Letras, 2014), da pesquisa da UFU, Maria Suzana Moreira do Carmo, a peça teatral retrata, para além de sua matriz grega, uma importante apreensão dos debates morais e filosóficos do século XVII, estabelecendo uma estreita relação entre os atritos de ordem teológica e a criação literária: [...] Embora a impregnação dos valores cristãos na obra de Racine seja um fato que tenha gerado controvérsias, é inegável que a estrutura do mito em Fedra reproduz a moral jansenista, que considera impossível a conciliação com valores de um mundo radicalmente perverso, onde imperam o egoísmo, a paixão e a ignorância. [...] O drama de Fedra converge para a ideologia pessimista do autor. [...]. Veja mais aqui, aqui & aqui.
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A ARTE DE SARA SÍNTIQUE
cato um búzio sempre que te vejo / quase não há mais lugar / e nem sei tua morada / longes longes / mas cato um búzio / sempre que te vejo / onírica / adorno a boca / o ventre / quase não há mais lugar / transbordo. / retenho.
SARA SÍNTIQUE – Poema porosidade, da atriz, escritora e educadora Sara Síntique, mestra em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Ceará (UFC), onde também se graduou em Letras Português – Francês. É autora do livro Corpo Nulo (Substânsia, 2015) e do Água: ou testamento lírico a dias escassos (Ellenismos, 2019). Tem poemas publicados no blog Leituras da Bel (Jornal O Povo) e na Antologia de Poemas Eróticos - Mulheres Cearenses, nas revistas Escamandro, Literatura BR, Diversos Afins, Gueto, Saúva e Olho de Peixe (v. 3), além de ministrar cursos na área de Escrita Criativa, Dramaturgia e Literatura Comparada. Também atuou nas peças teatrais Tudo ao mesmo tempo agora, Os Demônios, Ensaio sobre Hamlet, O Despertar da Primavera - O musical, entre outras, e nos filmes Ossos, Vando Vulgo Vedita e Iracema, mon amour, entre outros. Veja mais aqui.

A FOTOGRAFIA DE SHINTARO SHIRATORI
A arte do fotógrafo japonês Shintaro Shiratori. Veja mais aqui.

PERNAMBUCULTURARTES
de que adianta esse pôster de madonna na / parede da cozinha indicando de qual lado / estou se na papua nova guiné continuam / linchando mulheres a quem chamam de bruxa / a papua pode até ser guiné mas nisso não / tem nada de nova e se for para queimar uma / mulher por bruxaria que queimem logo todas / de que adianta beyoncé avisando que vai sentar / o rabo na cara do boy e de que adianta eu me / inspirar nisso para fazer igual ou parecido se na / papua nova guiné sentam senhoras em telhas de / brasilit e com elas amordaçadas abrem nacos de / carne e sangue que na foto escorria pelas rugas da / telha pelas rugas das costas da mulher essa mulher / de cabelo curto e preto de costas na foto parecia a / minha mãe eu perdi o controle não consegui mais / almoçar e sei que não vou conseguir dormir mas / de que adianta minha insônia e meu jejum e esse / poema se na papua nova guiné não iriam entendê-lo / e mesmo a compreensão dele não salvaria a vida da / mulher e mesmo no brasil onde se pode entendê-lo já / se sabe que poemas tal qual leis não mudam nada tudo / sobre isso já foi legislado e dito em todas as línguas / também em português mas meu deus / de que adiantaria meu silêncio? / de quem estaria meu silêncio a serviço?
Poema sobre uma foto no huffington post, em 01 de novembro de 2015, da premiada fotógrafa, poeta e tradutora Adelaide Ivánova, que estudou jornalismo na Unicap e fotografia na Ostkreuzschule, em Berlim. Editou o zine anarcofeminista Mais porn PVFR e é autora dos livros automoty (2014), Polaroides (2014), erste Lektionen in Hydrologie - und andere Bemerkungen (2014), O martelo (2016) e 13 Nudes (2019).
A emparedada da Rua Nova (1886), republicado entre os anos 1909-1912, como folhetim no Jornal Pequeno, de Recife, pelo escritor Joaquim Maria Carneiro Vilela (1846-1913) aqui.
Hermilo Borba Filho e a dramaturgia: diálogos pernambucanos, organizado por Anco Márcio Tenório Vieira, João Denys Araujo Leite e Luís Augusto Reis aqui.
A poesia da poeta e artista visual Mariana de Matos – Maré aqui.
A arte de João Câmara aqui.
A fotografia do jornalista, escritor e artista visual Chico Ludermir aqui.
A música de Leandro Vaz aqui.
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As trelas do Doro aqui.