

OUTROS
DITOS
Cinco minutos são
suficientes para sonhar uma vida inteira, tão relativo é o tempo... Toda vez
que você se apaixonar, não explique nada a ninguém, deixe o amor invadir você
sem entrar em detalhes... Você não deve prometer nada porque promessas são
grilhões horríveis, e quando você se sente preso você tende a se libertar, e
isso é fatal... Afinal, a morte é apenas um sintoma de que houve vida...
Pensamento do escritor e
ensaísta uruguaio Mario Benedetti (1920-2009). Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
PERDER
A MÃE, DE SAIDIYA HARTMAN
[...]
Se eu esperava me desviar da sensação de ser
uma estrangeira no mundo ao vir para Gana, a decepção me esperava. E suspeitei
disso muito antes de chegar lá. Ser uma estrangeira não se refere unicamente a
familiaridade, pertencimento e exclusão, pois também envolve uma relação
particular com o passado. Se o passado é outro país, então sou sua cidadã. Eu
sou a relíquia de uma experiência que a maioria preferiu não lembrar, como se a
pura vontade de esquecer pudesse resolver ou decidir a questão da história. Eu
sou a lembrança de doze milhões que cruzaram o Atlântico e de que o passado ainda
não acabou. Eu sou a prole dos cativos. Eu sou o vestígio dos mortos. E a
história é como o mundo secular cuida dos mortos [...] Não se pode perguntar “Quem é Vênus?” porque seria impossível responder
a essa pergunta. Há centenas de milhares de outras garotas que compartilham
suas circunstâncias, e essas circunstâncias geraram poucas histórias. E as
histórias que existem não são sobre elas, mas antes sobre a violência, o
excesso, a falsidade e a razão que se apoderaram de suas vidas,
transformaram-nas em mercadorias e cadáveres e identificaram-nas com nome
lançados como insultos e piadas grosseiras. O arquivo, nesse caso, é uma
sentença de morte, um túmulo, uma exibição do corpo violado, um inventário de
propriedade, um tratado médico sobre gonorreia, umas poucas linhas sobre a vida
de uma prostituta, um asterisco na grande narrativa da História [...]. O
romance de resistência que fracassei em narrar e o evento de amor que me
recusei a descrever levantam questões importantes sobre o que significa pensar
historicamente sobre assuntos ainda contestados no presente e sobre a vida
erradicada pelos protocolos de disciplinas intelectuais. O que é necessário
para imaginar um estado livre ou para contar uma história impossível? [...]
É preciso que o futuro da abolição seja performado primeira na folha de papel?
Ao me afastar da história dessas duas garotas, será que eu estava sustentando
as regras da corporação histórica e as “certezas fabricadas” de seus assassinos
e, ao fazê-lo, eu não tina selado seu destino? Não tinha também relegado as
duas ao esquecimento? No final das contas, foi melhor deixá-las como as
encontrei? [...]
Trechos extraídos da obra Perder a mãe:
uma jornada pela rota atlântica da escravidão (Bazar do Tempo, 2021), da
escritora e professora estadunidense Saidiya Hartman.
O
QUE O DIA DEVE A NOITE, DE YASMINA KHADRA
[...] A vida é um trem que não
para em nenhuma estação; ou você salta para longe ou fica parado na plataforma
observando-o passar. [...] Aquele que perde a mais bela história de sua
vida será tão velho quanto seus arrependimentos e todos os suspiros do mundo
não serão capazes de acalmar sua alma. [...] Para um homem pensar que
pode cumprir seu destino sem uma mulher é um mal-entendido, um erro de cálculo;
é imprudente e tolo. Certamente uma mulher não é tudo, mas tudo depende dela.
[...] Se você quer que sua vida seja uma pequena parte da eternidade, que
seja lúcido mesmo no coração da loucura, ame... Ame com todas as suas forças,
ame como se fosse tudo o que você sabe fazer, ame o suficiente para deixar os
próprios deuses com ciúmes... pois é no amor que toda feiura revela sua beleza.
[...].
Trechos extraídos da obra What the Day Owes the Night (Vintage, 2011), do escritor argelino Yasmina Khadra (Mohammed
Moulessehoul). Veja mais aqui.