terça-feira, dezembro 12, 2023

SOPHIE KINSELLA, LUCÍA SAORNIL, ANNE CONWAY & BESTA FUBANA

 

Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som do premiado álbum Erosão (Risco\Fun In The Church, 2021), da baterista, cantora e compositora Mariá Portugal, uma expoente da musica experimental e fundadora do Quartabê – grupo formado por Maria Beraldo, Joana Queiroz e Chicão Montorfano.

 

ENTRE OBSESSÕES, IMPOSTURAS & COMPULSÕES... - Era a cidade feita de palavras ubíquas às diegeses insones. O que mais de assombroso quando se parecia um dia azul, outro nem tanto e a estupefação de nunca se saber como começou. Havia quem decodificasse algaravias ocultas, diziam das conversas de defuntos. O pior era um quase terror: as pessoas perderam a amabilidade e se empurravam umas às outras, e era para me escantear enrolado na trama da Trilogia da Estrada de Wim Wenders. O que de mim quase nada mais restou, apenas fruir dela Marion como se fosse radiante Lou Salomé, uma trapezista nas Asas do Desejo e um verso de Rilke: Uma única coisa é necessária: a solidão... O amor consiste nisso: dois solitários que se encontram, protegem e se cumprimentam... Graças a não sei quem havia a remissão à beira do rio: um elogio à imanência, entre o desvelar dos simulacros e a penitência. E a vida uma girândola com todos os fogos de artifícios atordoantes, para saber de Adélia Prado: Dor não tem nada a ver com amargura. Acho que tudo que acontece é feito pra gente aprender cada vez mais, é pra ensinar a gente a viver. Desdobrável. Cada dia mais rica de humanidade... Tudo então nos dividia e a divisão nos complementava – o contrário nos completava. A vida realizou a morte e quase nem se soube quandera manhã ou tarde, tanto faz, até a mesmice surpreendia, porque a sorte era só um aceno; a existência, uma lembrança. Então ali a praça fundiu casulos e conchas praquela rua que vai nem sei pra onde, porque nunca mais circos, só um monte púlpitos itinerantes, tudo muito chato, idolatria e o quão tedioso. Impotente, não havia dinheiro algum, não tinha nada, a doença do vazio – onde o tempo, qual espaço –, palimpsestos dos escarnecidos pecados incontáveis. Foi preciso Ella Baker: Uma das coisas que temos que enfrentar é o processo de espera para mudar o sistema, o quanto temos que fazer para descobrir quem somos, de onde viemos e para onde vamos... Dê luz e as pessoas encontrarão o caminho... Experimentei e tive consciência de matar a fome, mentir, maldizer, descalçar-me e desmascarar-me o quanto podia, sorria e chorava, nada mais. No decurso de um tempo qualquer que nem percebia, aparecia Rodin: Olhe pro jardim... E era Agnieszka Holland: Se você olhar com atenção, o mundo todo é um jardim.... Havia perdido o olhar e o duplo, nem de mim ali só, nenhuma aura fugitiva por interstícios das rachaduras do impermeável: o sonho era um filme e a vida, rendi-me ao afeto, afinal sou e sei como existíamos. Até mais ver.

 

HINO DAS MULHERES LIVRES

Imagem: Acervo ArtLAM.

Aponte para mulheres em todo o mundo \ para os horizontes gravídicos de luz \ devido a aceiros, o pé no chão a cabeça não é azul. \ Afirmar essas promessas dá vida \ Tradição do desafio \ Nós nos modelamos com argila quente \ de um mundo nascido de dor. \ Que o passado caiu num lugar nenhum. \ O que nos interessa aqui? \ Queremos escrever de novo. \ Uma palavra mulher. \ Vá em frente, mulheres do mundo, \ com um ponto elevado para azul. \ Em fogo quebrado, \ Vá em frente, diante dá luz.

Poema da escritora, jornalista e líder anarquista espanhola Lucía Sánchez Saornil (1895-1970). Veja mais aqui e aqui.

 

À PROCURA – [...] Acho que percebi que a vida consiste em subir, descer e se levantar novamente. E não importa se você escorregar. Contanto que você esteja indo mais ou menos para cima. Isso é tudo que você pode esperar. Mais ou menos para cima. [...] O problema é que a depressão não traz sintomas úteis, como manchas e febre, então você não percebe isso a princípio. Você continua dizendo 'estou bem' para as pessoas quando não está bem. Você acha que deveria ficar bem. Você fica dizendo para si mesmo: 'Por que não estou bem? [...] Não será para sempre. Você ficará no escuro o tempo que for necessário e então sairá. [...] A maioria das pessoas subestima os olhos. Eles são infinitos. Você olha alguém diretamente nos olhos e toda a sua alma pode ser sugada em um nanossegundo. Os olhos das outras pessoas são ilimitados e é isso que me assusta. [...] Quanto mais você se envolve com o mundo exterior, mais será capaz de diminuir o volume dessas preocupações. Você verá que eles são infundados. Você verá que o mundo é um lugar muito movimentado e variado e que a maioria das pessoas tem a capacidade de atenção de um mosquito. Eles já esqueceram o que aconteceu. Eles não pensam sobre isso. Haverá mais cinco sensações desde o seu incidente. [...] Já enfrentei idiotas suficientes no meu tempo. Eles nunca percebem que são idiotas. Nem uma vez. Qualquer coisa que você diga. [...] Às vezes, espero estar acumulando um estoque de risadas perdidas e, quando me recuperar, todas elas explodirão em um ataque gigantesco que durará vinte e quatro horas. [...] Mesmo quando você pensa que se perdeu, o amor ainda pode te encontrar. [...]. Trechos extraídos da obra Finding Audrey (Doubleday Childrens, 2015), da escritora britânica Sophie Kinsella. Veja mais aqui.

 

PRINCÍPIOS FILOSÓFICOS - [...] Eu digo, vida e figura são atributos distintos de uma substância, e como um mesmo corpo pode ser transmutado em todos os tipos de figuras; e como a figura mais perfeita compreende aquilo que é mais imperfeito; assim um mesmo corpo pode ser transmutado de um grau de vida para outro mais perfeito, que sempre compreende em si o inferior [...] Temos um exemplo de figura em um prisma triangular, que é a primeira figura de todos os prismas triangulares sólidos alinhados à direita, que é a primeira figura de todos os corpos sólidos alinhados à direita, onde em um corpo é conversível; e deste em um cubo, que é uma figura mais perfeita, e contém em si um prisma; de um cubo pode ser transformado em uma figura mais perfeita, que se aproxima mais de um globo, e deste em outra, que está ainda mais próxima; e assim ascende de uma figura, mais imperfeita, a outra mais perfeita, ad infinitum; pois aqui não há limites; nem pode ser dito que este corpo não pode ser transformado em uma figura mais perfeita: Mas o significado é que esse corpo consiste em linhas retas planas; e isso é sempre modificável para uma figura mais perfeita, e ainda assim nunca pode alcançar a perfeição de um globo, embora sempre se aproxime mais dele; o caso é o mesmo em diversos graus de vida, que têm de fato um começo, mas não têm fim; de modo que a criatura é sempre capaz de um grau de vida mais avançado e perfeito, ad infinitum, e ainda assim nunca pode atingir a igualdade com Deus; pois ele ainda é infinitamente mais perfeito do que uma criatura, em sua mais alta elevação ou perfeição, assim como um globo é a mais perfeita de todas as outras figuras, da qual ninguém pode se aproximar. [...]. Trechos extraídos da obra The Principles of the Most Ancient and Modern Philosophy (Cambridge University Press, 1996), da filósofa inglesa Anne Conway (1631-1679), que na obra Tangled Secrets (Usborne Publishing, 2015), expressa que: [...] Ele estava fazendo parecer que eu era forte e corajoso. Ele não percebeu o quão assustado eu estava por dentro. Como minha fita estava na minha bolsa. Como eu o encontrei enfiado na parte de trás da minha cama e ainda precisava dele apenas para passar o dia. Como eu nunca tinha feito nada corajoso em toda a minha vida. Seus olhos nunca deixaram meu rosto. “Se alguém pode entrar naquela sala, Maddie Wilkins – tarde, ou cedo, ou qualquer coisa – é você. [...]. Também noutra de sua obra Forbidden Friends (Usborne, 2013), também expressa que: […] Inclinei-me e, antes que pudesse mudar de ideia, beijei-o bem nos lábios. E então me virei e corri pela porta da frente. “Caramba, Abelha!” ele gritou atrás de mim. Mas quando olhei para trás, ele estava encostado no batente da porta, sorrindo. [...] Nós nos divertimos muito juntos [...] Ela é o tipo de pessoa que faz cara de corajosa mesmo quando tem vontade de chorar [...]. Veja mais aqui e aqui.

 

A BESTA FUBANA

[...] A desunião dos bichos era a desunião deles, empolgados e ambiciosos. A volúpia do poder enxotara o pássaro-guia e os deixara órfãos de luz e de proteção, entregues à sanha do inimigo [...].

Trecho extraído da obra O romance da Besta Fubana (Bagaço, 2019), do escritor Luiz Berto. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.