quarta-feira, dezembro 06, 2023

COLOMBE SCHNECK, ALANNA COLLEN, MYRIAM SCOTTI, TEJUCUPAPO & ARTE NA USINA

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som dos álbuns A Dog's Purpose (Soundtrack, 2017), Their Finest (Score, 2017), Ask the river (Classical, 2020), Godmothered (Soundtrack, 2020) e Beyond the Screen (Crossover, 2023), da compositora britânica Rachel Portman.

 

SOU DA PAZ EM PÉ DE GUERRA – Em minha alma sufocada o apito ancestral. Era inevitável ouvir os lúgubres ventos ecoando os lamentos de soterrados seculares das matas devastadas, aruspícios primaveris jamais olvidados pelas indeléveis andanças. Nada mais restava e se desfazia no mormaço do meio dia daquela sexta feira no Córrego do Feijão, e um suposto terremoto trazia de longe o lixo tóxico como se reaparecesse Pompeia sobre Brumadinho no delíquio do tempo. Próximo! Ouvi ao longe a voz de Dionne Brand: Se estou em paz…não é paz, /está me acostumando com o mal... Era a dor da mulher deprimida, vítima de não sei quantas injustiças. Próximo! Seguia só. Não bastasse topar com o ermo e lá distante coisonazifacistas necrófilos escureciam o céu azul desatado, infortúnios estradafora e um rio de lama varria Bento Rodrigues do mapa naquela tarde depois de novembro e ninguém se lembrava mais das enchentes do Una de 2010. Próximo! Aplaquei um pouco a passada, olhei dos lados e, ao perscrutar, fui alertado pela Christina Rossetti: É melhor esquecer e sorrir do que recordar e entristecer-se... O silêncio é mais musical do que qualquer canção... Próximo! Era como se nunca chegasse a minha vez e as lembranças tomavam todas as formas corpóreas, próximo! E era como se eu estivesse prestes a ser despejado, abrigo embaixo da ponte, já que não tinha mais quem amasse e a companhia de quem parecesse nem mais existir, reduzindo-me a anfitrião de micróbios, bactérias, fungos, vírus, arqueias e outros sei lá quantos micro-organismos, perdido nas dimensões quânticas e a vertigem nas asas dos sonhos. Próximo! Havia alguém por perto, eu sabia, e ela era tal invisível Samantha do Her de Spike Jonze - um corpo de luz vers&prosa como gotas de chuva escorrendo poema livre na minha pele suada. Próximo! Já se fazia uma tarde cinza de quase agosto e ela me chamava: Theodore! Virei-me e pude ver-lhe o último aceno, como se fosse Mariana a deusa grávida enlameada, inexoravelmente tragada pela estrondosa tragédia. Quem veria meu lado tristonho e se parecesse divertida a minha aflição: em minha carne a dor dos mortos dali e dalém. Assim mesmo, ainda ouvia Irene Solá: Gosto de escrever pensando nas pessoas, porque é como um presente... A voz dela e a ventania forte nos meus passos perdidos por minas que são pedras falsas de areias movediças e mais me sentia lixo escorrendo pela sonda perdida: Sombras do chão no céu de Maceió... Até mais ver.

 

UM POEMA

Imagem: Acervo ArtLAM.

Como a chuva que cai p’ra limpar \ Nuvens carregadas que se espremem \ Tantas mulheres chovem p’ra vazar \ O que um coração quebrado sente. \ Pois que o choro nunca é fraqueza, \ natureza a cuidar do corpo, \ Levando os rejeitos para longe, \ Devolvendo o sorriso que se esconde. \ Chuva que limpa céu torrencial, \ Lágrimas que lavam a alma triste, \ Aliviam dor exponencial, \ Sem levar em conta dor que persiste. \ Desafio se há mulher que chova \ Sem transbordar angustia qu’insiste.

Poema extraído da obra Mulheres chovem (Penalux, 2020), da escritora Myriam Scotti, que também assim se expressa: A gente já sabe o que esperar dos vermes, das pessoas, não.

 

DEZESSETE ANOS – [...] Manter a gravidez significaria renunciar. Quero fazer ciência política, ser jornalista no Le Monde, apresentar o jornal das 20 horas, ser debatedora no rádio, ler livros proibidos, casar e ter filhos o mais tarde possível [...]. Trecho extraído da obra Dix-sept ans (Relicário, 2015), da escritora, jornalista e cineasta francesa Colombe Schneck, que expressa: Escrevo porque é através da escrita que chegamos a uma forma de verdade. Capitulamos, ordenamos, corrigimos, arrumamos as coisas, há uma espécie de artifício, e ainda assim, é só por meio da escrita que podemos chegar à realidade. Se posso ser a mulher que sou hoje, foi porque pude fazer um aborto aos 17 anos. Veja mais aqui.

 

QUANTO DE HUMANOS SOMOS – [...] Com quase 20 mil genes, o genoma humano [...] Mas esses 20 mil genes não controlam nosso corpo sozinhos. Não estamos sós. Cada pessoa é um superorganismo, uma coletividade de espécies vivendo lado a lado, em cooperação, para controlar o corpo que nos sustenta. Nossas células, embora bem maiores em volume e peso, são superadas à razão de dez para uma pelas células dos micróbios que moram dentro da gente e sobre nosso corpo. Esses 100 trilhões de micro-organismos – conhecidos como a microbiota – são predominantemente compostos por bactérias: seres microscópicos constituídos de uma só célula. Junto com elas, há outros: vírus, fungos e arqueias. [...] Os nossos micróbios são importantes para o nosso corpo [...]. Cada um de nós contém comunidades de micro-organismos tão singulares quanto nossas impressões digitais. [...] Passamos a depender de nossos micróbios, e sem eles seríamos uma mera fração do que somos.  [...] Tanto como indivíduos quanto na sociedade como um todo, passamos do frugal ao exagero; do tradicional ao progressivo; da escassez ao excesso de luxo; da assistência médica precária aos serviços médicos de excelência; de uma incipiente a uma próspera indústria farmacêutica; da vida ativa à sedentária; do provinciano ao globalizado; do fazer-e-consertar para o reformar-se e substituir; do decoro à desinibição. [...] Muitos pais esperam transmitir o melhor de si aos seus filhos, além de proporcionar a eles o ambiente mais feliz e saudável possível. O microbioma – com sua influência genética e um controle ambiental – dá aos pais o poder de fazer as duas coisas.  [...] Acolher os micróbios que viajaram conosco por milhões de anos é o primeiro passo para aprendermos a valorizar o que realmente somos e, no fim, nos tornarmos 100% humanos. [...] Trechos extraídos da obra 10% humano: como os micro-organismos são a chave par a saúde do corpo e da mente (Sextante, 2016), da bióloga, escritora e zoóloga britânica Alanna Collen.

 

FESTIVAL ARTE NA USINA: INOVAR & EVOLUIR

De 7 a 10 de dezembro, na Usina de Arte. Veja mais aqui.

&

TEJUCUPAPO

[...] Mesmo reconhecido pelo exército como o episódio onde se deu a primeira participação de mulheres brasileiras em conflito armado, a Batalha de Tejucupapo toi banida dos livros escolares [...].

Trecho extraído da apresentação da obra Tejucupapo: história, teatro, cinema (Bagaço, 2004), organizado por Cláudio Bezerra. Veja mais aqui, aqui e aqui.