domingo, outubro 25, 2020

MAYA ANGELOU, HENRY FLYNT, JUNG, DARCY RIBEIRO, MILTON NASCIMENTO, ALEXA MEADE & AGUINALDO BATISTA

 

TRÍPTICO DQC: PAIVRAS PALANÉIS - (ouvindo Yanamâmis e nós – Pacto de vida, de Milton Nascimento & Fernando Brant) - Depois de me desconstruir e às avessas de pisar e voar, doer errático pelos devires e pelos degraus da caosmose de Guattari, me vi só anti-édipo pelo rizoma & mil platôs. Foi maior a porrada: está muito difícil de respirar! Sim, porque não sou atleta do Estado e percebi o quão difícil é a convivência com o desgoverno do Fecamepa, a sindemia letal, a liquidez de Bauman, os delírios da hiperpolítica sacada por Sloterdijk – estamos todos no mesmo barco e parque dos horrores! - & o deserto do real denunciado por Zizek. Pelo que vejo e intuo, só a festa da morte nas platitudes dos cirurgiões magiares e mediocrização das campanhas políticas; no paroxismo delirante da gança e consumo na oferta e demanda; e na catatonia diante da lumeeira das desgraças. É tudo muito lúgubre, infelizmente, e na maior das ostentações, tagatés e celebrações. Vivo ou morto, tanto faz, apenas um dado estatístico para satisfazer o interesse daquele ou daquela irreconhecível. Ao abrir a porta o abismo e uma chuva de cinzas a cobrir o céu e a Terra. Ouvi Jung na sacada: Onde o amor impera, não há desejo de poder; e onde o poder predomina, há falta de amor. Um é a sombra do outro. Quem olha para fora sonha, quem olha para dentro desperta. Sequer havia um mínimo sinal de luz lá longe depois do fim do túnel. Nada. Não sei pronde vou, sei que voo.

 


SCHILDA, OUTRO NOME DO FECAMEPA – Curtindo You Are My Everlovin/Celestial Power (Recorded/LLC, 1986), do filósofo, músico, escritor, ativista e artista estadunidense Henry Flynt, associado à vanguarda de Nova York dos anos 1960 - À minha porta, um sujeito. Bate palma insistentemente. Cortez, atendo. Não conseguia entender o que solicitava, só gesto com mão pronunciando: Schilda! Schilda! Hospitaleiro como sempre fui, puxei pelo muque do estranho e o levei até a casa do poliglota erudito e autodenominado patafísico, doutor Zé Gulu. Socorra-me! Acho que é um caso parecido com aquele do javanês de Lima Barreto. Sim? E ouviu atentamente o cidadão que o apresentei. Ah, tá. Entendeu? Sim. Ele é schildbürger! Que droga é nove? Nascido em Schilda. Fodeu. Existe? Sim. Veja nesse livro aqui: Die Schildbürger (Dressler Verlag, 2000), do escritor, jornalista, cabaretista e roteirista alemão Erich Kästner (1899-1974), em que eles montaram um plano: estadistas e filósofos escolheram esse lugar para morar e, pouco a pouco, uma geração inteira de sábios reuniu-se. Sim, e? Reis e príncipes de outros países logo julgaram uma honra convidar um desses sábios para suas cortes, nomeando-o ministro e conselheiro pessoal. E daí? Quando restou apenas um homem adulto, as mulheres lançaram um ultimato: se seus maridos não voltassem, elas procurariam outros para substituí-los. Como é? A fim de servir a seus interesses sem ofender seus poderosos senhores, montaram um plano: começaram a se comportar de forma tão estúpida que os reis não os desejariam de volta. Lascou! Para ter uma ideia do problema, ouça, veja: A sala do conselho é o testemunho concreto do sucesso dessa política: um prédio longo e quadrado, sem a menor janela. Oxe! E como se reuniam? Na escuridão. Pronto, agora deu. Veja mais: Infelizmente, parece que a estupidez fingida dos pais se tornou efetiva em seus descendentes. Mesmo, como assim? Veja o que a principal autoridade da cidade fez: Encarcerou todos os habitantes do sexo masculino. Aí já é demais! Quando uma carta o acusou de liderar os republicanos, ele prendeu-se a si mesmo. Sem ninguém para fazer justiça, os schildbürher mofaram na prisão. Vôte! Pois é: Depois de algum tempo, no entanto, se deram conta do absurdo da situação, fugiram da prisão, anularam a antiga Constituição e proclamaram a república. Hoje é uma cidade-república com atmosfera de bonomia pequeno-burguesa, de semiconhecimento e bufonaria reinante. Ave! Nas escolas, somente pessoas ignorantes têm permissão para lecionar, na esperança de que aprenderão alguma coisa sobre as matérias que ensinam. Enquanto isso, inculca-se nos estudantes uma desconfiança total em todo o conhecimento, o que reforça a autoconfiança... Ora, isso é o Fecamepa! Aí ele olhou-me profundamente e citou Darcy Ribeiro: O Brasil, último país a acabar com a escravidão tem um perversidade intrínseca na sua herança, que torna a nossa classe dominante enferma de desigualdade, de descaso. Mais vale errar se arrebentando do que poupar-se para nada. Ora, ora. Seremos sempre os últimos! Nesse caso, quem copia quem? Isto é Brasilsilsilsilsil!!!!

 


DAS DORES, ELA NOITES & DIAS – Imagem: arte da artista estadunidense Alexa Meade - Ao regressar ela explorou os cantos como se repassasse texto de memória sobre o passeio por Paris e Berlim, cenas de Brecht e Molière narrando imagens da mitologia grega, a se ajoelhar como aprisionada às dores do pau de arara. Ergueu as mãos à cabeça como quem vitimada da coroa de cristo esmagando seus miolos. Sentou-se como quem expõe a hemorragia dos espancamentos na cadeira do dragão e três dias de choques elétricos na língua, seios e vagina na sessão torturante da Casa da Morte. Fitou-me severa e veio: Sou Heleny. Sim, sou Heleny Guariba (1941-1971), aquela que sucumbiu com Marilena, Helena, Labibe, Alceri, todas sou eu solidária na dor de morrer nos porões da História. Deu-me as costas e antes de sair olhou-me mais uma vez e recitou Maya Angelou: Você pode encontrar muitas derrotas, mas você não pode se deixar derrotar. Se não gosta de alguma coisa, mude-a. Se não puder mudá-la, mude a sua atitude. Não reclame. O sucesso é gostar de si mesmo, gostar do que faz e gostar de como fazê-lo. Mandou-me um beijo e se foi com um aceno triste. Guardei sua imagem de atriz e brinquei de imaginá-la comigo na viagem por palcos inenarráveis. Até mais ver.

  

AZARILDO & O XOTE ECOLÓGICO DE AGUINALDO BATISTA

Não posso respirar, não posso mais nadar. A terra está morrendo, não dá mais pra plantar. E se plantar não nasce, se nascer não dá. Até pinga da boa é difícil de encontrar. Cadê a flor que estava aqui? Poluição comeu. E o peixe, que é do mar? Poluição comeu. E o verde onde é que está? Poluição comeu. Nem o Chico Mendes sobreviveu.

Xote ecológico, música de Luiz Gonzaga em parceria com o compositor, radialista, humorista e ator Aguinaldo Batista (1930-1980), criador do afamado personagem Azarildo que atuou nas tevês Tupi, Excelsior e Record. Trabalhou na Rádio Tamandaré e Clube de Pernambuco, além de atuar nos filmes A compadecida (1969), A vingança dos 12 (1970), Terra sem Deus (1963) e A pele do bicho – amor e traição (1974). Veja mais aqui, aqui e aqui.