DIÁRIO DO GENOCÍDIO NO FECAMEPA – UMA: SABE
AQUELA... O FUNDO DO POÇO & ANÁBASE - Da janela do meu quarto, a
solidão. O céu é azul além da galáxia, o infinito. Não sou nada no diário do Fecamepa, este o inexorável Hades de
agora em plena ebulição. Não há mais para onde ir, o fundo do poço. Não há
túneis, nenhuma luz. Alguém se aproxima e não consigo identificar, sei que
ronda no escuro. A voz sem portas esconde o terror lá fora, escuto e rodopio o
labirinto da conversa, ele me diz de anábase e é Xenofonte: Vejo, porém, que,
todos aqueles que ensinam, praticam o que ensinam a fim de edificar pelo
exemplo os que aprendem, da mesma forma que os estimulam pela palavra. As palavras
somem de repente, na escuridão não há corredores, degraus, azo. A sensação de calabouço,
cadafalso. Falo comigo mesmo, os meus outros eus escapuliram, fugaram. Mãos à
parede, delas a sentença fria, celerada. Algum lugar para onde ir, voo.
DUAS IDEIAS NO ESCURO, POEMÓPERA – Uma voz ecoa longínqua, pode
ser sonho, nunca se sabe. Loucura ou não, uma mulher a se debater, parece. Dela
a barulhada sonora do que é daqui e dagora, fanal alvissareiro e operístico, nem
sei onde. Sigo bússola bacorejante que vem de lá ou acolá, alguns sopranos solasidós.
Atento, espreita cega, ela chega quase imperceptível com a luminosidade de sua
pele branca, como se fosse Gaia, venerável
matrona e mãe dos deuses e gigantes, do bem e dos males, das virtudes e vícios,
dos monstros marinhos e de todas as coisas vivas e mortas. Chegou como se fosse
para minha redenção e coroada de flores invisíveis que brotam dos cabelos
prateados, a me mostrar nas suas vestes negras transparentes o que dos seus
seios jorram de leite à vida e do seu manto abrigo de céus e infernos. Dela uma
auréola de nuvens de pássaros às revoadas e cantantes. Solfeja ela poemópera e se
faz Gabriela Geluda, oh a minha vida, oh a minha vida, o meu
tesouro... e a girar e gira girando a me envolver na sua apoteótica e
performática expressão Penélope19,
de Armando Lôbo. Ah, giro a vida e
sonho. Ao final do espetáculo, olhos nos olhos, seus braços envolventes de
clausura e rompante, a me dizer Nélida Piñon:
O ser humano é um peregrino. É só na
aparência que ele tem uma geografia. Se vive e se escreve sem rede de
segurança. O escritor não deve apenas criar, mas deve também emprestar a sua
consciência à consciência dos seus leitores, sobretudo num país como o Brasil.
E me beija a vertigem e sou de volta o que desce para o que não há mais e são
ruas dos meus sonhos no seu corpo e ela vai embora como quem leva a minha vida
para nunca mais.
TRÊS PASSOS & A VIAGEM DE VOLTA – (Imagem: arte de Geraldo Barros) - A vida e só para
valer, só vale mesmo quando inventada e reinventada todo dia, o dia todo. Sim,
recomeçar, remover a casca, mudar de pele, outros arrebóis imaginados e vividos.
Os passos no chuvisco do tempo miserável entre perguntas e terrores, arrebatado
entre o que é permitido e não, tudo isso é nada. Em mim tudo amanhece no Hino de Akhenaton. Ouço da cidadede Campanella: o amor à coisa pública aumenta na medida em
que se renuncia ao interesse particular... ninguém deve apropriar-se das partes
que cabe aos outros. Aí me refaço, assim sempre fiz. Afinal, me
reconstruo com essa a lição: O Sol nasce para todos. Até mais ver.
ORQUESTRA POPULAR DO RECIFE
A arte de um dos mais importantes grupos pernambucanos, Orquestra Popular do Recife, idealizada em 1975 pelo escritor e professor Ariano Suassuna e, inicialmente, foi regida pelo Maestro Duda. A partir de 1977, a direção artística e musical foi assumida pelo maestro, arranjador, professor e compositor Ademir Araújo, o Formiga. Dela curtindo os álbuns E o frevo continua (2007) e Olha o Mateus! (2005). Veja mais aqui, aqui & aqui.