terça-feira, agosto 20, 2019

PUSCHKIN, CORA CORALINA, DÉCIO PIGNATARI, MEDINA AYLLÓN & BAILE PERFUMADO


NATALIE DE PUSCHKIN – Ah, Natalie, para quem sempre celebrou a liberdade, você surpreendeu minha vida de exilado pelas guerras e insurreições. Aquele inverno no mundo e na minha vida, uma menina tímida naquele baile, já cobiçada deusa da aldeia Karian, rainha de Tambov, o presente do meu destino: nunca tinha visto ninguém mais linda, nunca. Não bastava seu pai no mundo da lua, a sua mãe irritadiça, religiosa fanática, difícil, e eu um reles sujeito com versos no coração e nada nos bolsos. Que podia além da minha perseverança, se nem havia chão para abrigo. Quando me disseram não, deprimi – o oco do mundo no peito e a dor lancinante da desgraça. Na solidão do Cáucaso, escrevi: Quando a vi pela primeira vez, me apaixonei. Eu pedi a sua mão, pleno de rosas no ar, a resposta de quase enlouquecer. Graças a Tolstoi pude acessar sua casa. Ainda bem, enfim, o consentimento: renasci e me tornei feliz, apesar do anel no chão e a vela se apagar aos maus presságios. Nada podia superar minha felicidade ao seu lado. Não havia de ser nada. A ida para Moscou me deixou estúpido, sei. Ainda bem que em São Petersburgo estávamos felizes e você radiante, a mais linda do lugar: era a minha vida, a vida de poeta libertário e descendente feio de negros, não valia nada. Na sua ausência escrevi setenta e oito cartas para a madona do meu poema – avistei o Bridgewater Madonna de Raphael e a sua presença era real. As senhoras ao meu redor implicavam para ver-lhe o retrato. Elas não perdoaram por não tê-lo. Insistiam. Usei de Rafael e do poema, diante da imagem da minha Madona loira por consolo. Ela se parecia com você como duas gotas de água, e eu compraria se não custasse tanto. Nunca esperei por um amor grande e puro do centésimo décimo terceiro amor. Nunca esperei nada. Minha musa, o meu eterno amor, a cigana previu que seria exatamente por isso que eu morreria: de amor. Você me deu vida, eu só a morte. Estava escrito. Ao vê-la de joelhos, chorosa: Use luto por um tempo. Então se case com um bom homem. Sangro. Sangro no coração e nas vísceras. Lutei, lutaria com quem mais aparecesse; e lutarei por você até me tornar, apenas, uma estátua ao seu lado. Até sempre. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.

DITOS & DESDITOS:
[...] Povo infeliz, terra infeliz. ...Nós começamos com a ideia de "revolução agrária", que depois foi amenizada para "reforma agrária", que virou "revisão agrária", que se transformou em "estatuto da terra" - que já não significa mais nada. [...] Terra desgraçada, povo desgraçado. [...] Para nós, o osso - para os outros, o filé. A nós, só nos são dados assistir os primeiros ensaios, as primeiras fofocas, os primeiros cortes, os primeiros jogos de entrosamento contra esparros de categoria inferior e média. Assim que o quadro começa a tinir - vai-se embora. Cobre-se de biglórias lá fora e volta para recepções apoteóticas e mal tem tempo para algumas exibições extras (a maioria, no exterior), porque logo os clubes reclamam os direitos sobre os seus craques - e a seleção se desfaz. E começamos tudo de novo: embora mais desdentados do que tamanduá, já nos acostumamos a roer ossos. Para o povo brasileiro, o desespero-é-um-hábito - e a esperança, um vício. Povo infeliz, terra desgraçada. [...] Terra infeliz, terra desgraçada. [...] Povo infeliz, desgraçada terra. Acredito que os leitores, sorrindo mentalmente, gostariam de lembrar-me que, nisto tudo, voltei a esquecer do tutu, dos dólares. Não, não esqueci - esquecer quem há-de? Mas relembro também que já fomos campeões do mundo de futebol antes de começarem a rolar as auríferas águas. Se não soubermos nem pudermos fazê-lo de novo, então - chega de campeões! De que vale tê-los apenas como saltimbancos pelas estradas do mundo, de que vale tê-los apenas como medalhas de nossa pro-sápia, sem lhes ter visto os heróicos feitos? Quem quiser, que aceite o nosso bagulho: chega de campeões! Não vamos mais exportar campeões, não vamos mais exportar coisa nenhuma, não vamos mais exportar nossa gente - nem mesmo presidentes-da-república, como tem sido nosso luxo e moda ultimamente. É isto mesmo: não vamos exportar mais nada - pelo menos enquanto guaraná não for coca-cola. [...].
Trecho de Chega de campeões! – 2, extraído da obra Contracomunicação (Ateliê, 2004), do escritor, advogado, sociólogo, professor, tradutor e teórico da comunicação Décio Pignatari (1927-2012). Veja mais aqui, aqui & aqui.

BAILE PERFUMADO
[...] O filme recria uma história real: a trajetória do fotógrafo e cinegrafista libanês Benjamin Abrahão (Duda Mamberti), a única pessoa que ousou se aproximar e filmar Lampião (Luiz Carlos Vasconcelos) e seu bando de cangaceiros. O enredo foi sugerido a Lírio Ferreira e Paula Caldas pelo crítico e cineasta Fernando Spencer. Transformado em roteiro em parceria com Hilton Lacerda, com a consultoria do historiador Frederico Pernambucano de Mello, o projeto ganhou o Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro. As filmagens foram feita em seis cidades de Alagoas, Sergipe, Bahia e Pernambuco. [...].
Trecho extraído do livro A aventura do Baile Perfumado: 20 anos depois (CEPE, 2016), organizado por Amanda Mansur e Paulo Cunha, sobre o filme Baile Perfumado (1996), dirigido por Lirio Ferreira e Paulo Caldas, que narra a história do envolvimento do mascate libanês Benjamin Abrahão com o bando de Lampião no sertão brasileiro. Veja mais aqui, aqui & aqui.

A ESCULTURA DE JUAN MARÍA MEDINA AYLLÓN
A arte do escultor espanhol Juan María Medina Ayllón. Veja mais aqui.

TRES POEMAS DE PUSHKIN
AMEI-TE... Amei-te – e pode ainda ser que parte / do amor esteja viva na minha alma. / Mas isto, pois em nada hei de magoar-te, / não deve mais tirar a tua calma. / Sem esperança e mudo em meu quebranto, / morto de ciúme e timidez também, / eu te amei tão sincero e terno quanto / permita Deus que te ame um outro alguém.
POEMA: Se um dia esta vida te desiludir, / Não fiques triste ou aborrecida! / Num dia sombrio, resigna-te: / Tem confiança, dias melhores virão. / O coração vive no futuro; então; / E se a sombra invade o presente: / Tudo é efémero, tudo passará; / E o que passou torna-se, então saudoso.
MADONA: Eu nunca quis decorar minha morada média / Com linhas e filas de fotos finas e célebres, / Tirar dos convidados alguns reclusos aduladores e supersticiosos, / Atender como visões inteligentes dos especialistas têm fluído. / Não, no canto simples onde meu trabalho é feito, / Eu só queria, mas uma testemunha pintada / E apenas um: a partir dos céus, da lona, / A Virgem pura, apresentando seu amado Filho / Majestosa, ela e ele com sabedoria em seus olhos - / Há calmamente assistir em glória, sob um céu radiante, / Sozinho em Sião, sem anjos presentes. / Eles são o suficiente para mim. Madonna, você foi / Revelado para mim pela doce / Transcendência de Deus Todo Poderoso, / O modelo mais puro, da mais pura alegria da rainha. / Não há muitas pinturas de mestres antigos / Eu sempre quis decorar minha morada / De modo que o visitante se maravilhou com eles supersticiosamente, / Ouvindo o importante julgamento dos conhecedores. / Em um simples canto meu, em meio a um trabalho lento,/ Uma foto que eu queria ser para sempre uma espectadora / Um: para mim da tela, como nuvens, / Nosso Abençoado e Nosso Divino Salvador - / Ela é com grandeza, ele é com razão em seus olhos - / Eles pareciam mansos, na glória e nos raios, / Sozinho, sem anjos, sob a palma de Sião. / Meus desejos se tornaram realidade. Criador / Ele te enviou para mim, minha Madona, / O mais puro encanta a mais pura amostra.
Poemas do poeta, dramaturgo e fundador da moderna literatura russa Alexander Pushkin (1799-1837), dedicado à sua amada Natalie – Natalia Nikolayena Pushkina-Lanskaya (1812-1863). Veja mais aquiaqui & aqui.

A OBRA DE CORA CORALINA
Poeta não é somente o que escreve. É aquele que sente a poesia, se extasia sensível ao achado de uma rima à autenticidade de um verso.
A obra da poeta Cora Coralina (1889-1985) aqui, aqui, aqui & aqui.