segunda-feira, maio 20, 2024

JUDITH SCHALANSKY, TRIIN PAJA, ANNA LEMBKE, VCA & CRÔNICA NA ESCOLA

 

Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som dos álbuns Morning Star (2021), Beethoven: Piano Sonatas nº 3 in C Major, Op. 2 & nº 16 in G Major, Op. 31 (2021), Salut d’Amour (2022), Colours of Villa-Lobos (2022), Mozart: Sonatas for Piano and Violin, Vols. 1 & 2 (2021-2023), Clair de Lune (2023), Brazilian Fruits (2023) & Corbani: Tarde de Outono & Other Songs (2024), da pianista e professora do Uzbequistão, Olga Kopylova, da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo e fundadora dos conjuntos Sexteto São Paulo e Duo Kopylova & Rakevich.

 

NONSENSE: CADEIRA VAZIA... - Entre, venha para a audição de Elis cantando Lupicínio: ... Vou te falar de todo coração \ Eu não te darei carinho nem afeto \ Mas pra te abrigar podes ocupar meu teto\ Pra te alimentar, podes comer meu pão... Venha, aqui poltronas e sofás vazios, fique à vontade. Por aí quantas pessoas e cadeiras vazias sem que um outro saia do fantasioso pro agoraqui empático que foi pro beleléu!... É isso aí. Tenho comigo o pavor dos acrófobos! Afinal, como já dizia Prabir Purkayastha: A bomba que ainda paira como uma espada de Dâmocles sobre nossas cabeças... Quem ileso aos pânicos, temores e interdições: as ameaças veladas, o desespero de invariavelmente correr riscos, a angústia das feridas, a inaptidão de lidar com os traumas da infância e experiências aversivas, as surpresas paralisantes, os pavores causados por eritrófobos psicopatológicos, afora a sujeição às dagora: Gaming disorder, nomofobias, phubbing, síndrome do texto fantasma, cibercondria, depressões, toques, dependência digital, et céteras... há sempre a boca seca, o frio na barriga, o chão fugindo aos pés, a vertigem, a sudorese, a taquicardia, as pernas fraquejantes e, o pior, como lidar com essa dor, ah... O medo nos protege e nos flagela: as advertências e a analgesia danosa. O risco das escolhas, a fuga e os revezes, a sobrevivência. Como ter calma se ouço Alice Munro: A felicidade constante é a curiosidade... As pessoas estão curiosas. Algumas pessoas são. Eles serão levados a descobrir coisas, mesmo coisas triviais... Da minha parte: enfrentei o desconfortável e nomeei meus demônios. Cônscio das minhas fraquezas, ciente da minha natureza: minha biografia prejudicada diante de tudo isso. E a constatação de Jacqueline Woodson: As pessoas vão te julgar o tempo todo, não importa o que você faça... Não se preocupe com as outras pessoas. Preocupe-se com você... Isso eu sei: não nos deixarão em paz para reconstruir, nunca! A cada degrau pro palco há sempre um monstro inexorável pronto pro ataque! Quem tem medo de cair não pule; quem teme voar, não ande; quem se apavora ante o iminente, não saia; aonde quer que vá, ambientes sombrios por aí e déjà vu. Muitos! Quem capaz de lucidez sóbria nestes dias tão agitados: passou da hora, estou pra lá de atrasado. Impossível não prever: é inevitável rever o monstro sob a cama todas as noites! Quem da chuva não se molha, quando fantasmas indesejáveis saltam das hestórias funestas e fake news: eles ganham cada vez mais vida pelas ruas diárias... A vida abre e fecha o fole da sanfona existencial: estamos por um triz! Tudo por fazer no meio dessa disforia nosense: o enigma se repete a cada dia. Urge fazer já alguma coisa, o que for que precise ser feito. E já! Saí do lugar e, quando voltei, mantive o olhar de fora: a mais plena gestalt e ataraxia. Pronto. E sei: as crianças que virão, com certeza, precisarão viver! Até mais ver.

 

DOIS POEMAS

Imagem: Acervo ArtLAM.

ENTRANDO – Eu li como velas feitas de gordura humana \ Brilha mais brilhante, como tudo \ pode ser visto nessa luz, \ - A fome, tu.\ Lembre-me e esqueça-me da sua cara. \ Pode ser o que Enheduanna, \ Sacerdotisa da lua suméria, \ escreveu: \Meu rosto lindo é pó . \ Um rio canta perto do seu túmulo. \ Eu te digo de um homem \ Envolvendo seu corpo no jornal \ antes de vestir roupas. \ Ele falou de uma parede de cozinha bombardeada, \ Mulheres atingidas pelo vidro ao dar à luz. \ Em Belgrado, a maioria tem histórias de guerra. \ em Sarajevo, é mais frio sob um céu \ cortado por minaretes \ , mas as mulheres também sabem como manter o solo \ para a colheita \ e o enterro.\ Eu falo com você, mas talvez você tenha se tornado \ um distante apága da costa, \ e a praia é você, \ Mas eu sou o mar, \ Sal-templo, dizendo seu nome \ embora não seja pérolas na concha do meu ouvido.

EM VEINHO DE VEINAR - a cama, estreita como um caixão, \ Crea como um cisne manso \ Quando eu acordo, \ faminto, durante a noite. \ Eu colho uvas da vinha \ com as abelhas que se foram delirantes \ de uma fruta podre. \ abaixo de uma folha, um inseto quiescente \ Os sonhos \ de quando era líquido \ em seu jade chrysalis, uma memória \ como impossível como a minha chegada: \ um pão lamacento em casa da mãe \ Mãos de magnínias. \ Eu pergunto, como as abelhas, \ Se a memória é sempre arruinada. \ se sob este chamfron de \ a maturidade, \ de maneiras, \ Eu ainda sou uma criança estupidamente generosa, \ um animal amaldiçoado\ Espreita nas videiras \ com a minha alegria surpreendente: o meu desejo de viver.

Poemas da premiada poeta da Estônia, Triin Paja, autora da obra Nõges (Verske Raamat, 2018), entre outros livros.

 

INVENTÁRIO DE PERDAS - [...] Meus princípios orientadores são: leia tudo o que pode ser lido. Coloque gosto com gosto e guarde tudo o que leu. Anote apenas fatos, conhecimentos que possam ser verificados. Sempre que possível, mantenha os fenómenos separados das regras estabelecidas e comece sempre pelo geral e trabalhe no sentido do individual. Porque o que está fora sempre aponta para o que está dentro. Você pode deduzir mais sobre minha essência do meu quarto do que do meu pulmão ou do meu coração. Isso porque o externo e o interno andam juntos, assim como os órgãos sexuais externos do homem e os internos da mulher são duas variantes da mesma coisa. E assim como o jardim é meu domínio, a casa passará a ser sua. Você verá que às vezes o interior e o exterior estão desequilibrados. Mas no verão a sombra dos castanheiros e as descobertas da ciência podem ajudar no calor, enquanto no inverno a filosofia pode ajudar no frio. Às vezes, no inverno, tenho que sair para me aquecer na neve. Uma bolsa de água quente pode salvar vidas. Se você colocar no fogão evita ter que adicionar água quente. Eu costumava ter uma garrafa de água de metal plana e curva para colocar aos pés. Hoje em dia uso uma mamadeira própria e seguro no local sensível entre as pernas, pois é a melhor forma de fazer o calor circular. [...] No final, tudo o que resta é simplesmente o que resta. [...] A cesura da morte é o ponto onde começam o legado e a memória, e o lamento é a fonte de cada cultura pela qual procuramos preencher o vazio agora escancarado, o silêncio repentino com cantos, orações e histórias em que o ausente é trazido de volta Para a vida. Como um molde oco, a experiência da perda torna visíveis os contornos da coisa enlutada, e não é incomum que ela seja transformada pela luz transfiguradora da dor em objeto de desejo. [...] Uma memória que retivesse tudo não reteria essencialmente nada. [...] Esquecer tudo é ruim, certamente. Pior ainda é não esquecer nada. Afinal, o conhecimento só pode ser adquirido através do esquecimento. Se tudo for armazenado indiscriminadamente, como acontece nos dados eletrônicos das memórias, perde o sentido e se torna uma massa desordenada de informações inúteis. [...] Durante muito tempo, três pontos seguidos ao longo da linha de base da escrita designaram algo perdido e desconhecido, e depois, em algum momento, também algo inexprimível e inexprimível; não mais apenas algo omitido ou deixado de fora, mas também algo deixado em aberto. Assim, os três pontos tornaram-se um símbolo que convida a pensar a alusão à sua conclusão, imaginar o que falta, um proxy para o inexprimível e o abafado, para o ofensivo e obsceno, para o incriminador e especulativo, para um determinado versão do omitido: a verdade. [...] Meu olhar pousou uma última vez no globo azul-claro. Logo encontrei o local. Bem ali, ao sul do equador, entre algumas ilhas dispersas, esse pedaço de terra perfeito ficava, distante do mundo, tendo esquecido tudo o que sabia sobre ele. O mundo, porém, apenas lamenta o que sabe e não tem a menor ideia do que perdeu com aquela pequena ilhota, embora, dada a forma esférica da Terra, esse ponto desaparecido pudesse facilmente ter sido o seu umbigo, mesmo que não eram as cordas resistentes da guerra e do comércio que os uniam, mas o fio incomparavelmente mais fino de um sonho. Pois o mito é a mais elevada de todas as realidades e – assim me ocorreu – a biblioteca é o verdadeiro teatro dos acontecimentos mundiais. [...] Não importa quantos números e fórmulas descrevam o cosmos, não importa que conhecimento ilumine a sua natureza: enquanto o tempo ainda existir - e quem poderia duvidar disso? - então cada explicação permanece nada mais do que uma narrativa, a história familiar de atração e repulsão, de começo e fim, de surgir e desaparecer, de acaso e necessidade. O universo está crescendo, se expandindo, separando as galáxias; é quase como se fugisse das teorias que tentam capturá-lo. [...]. Trechos extraídos da obra An Inventory of Losses (New Directions Publishing, 2020), da premiada escritora, editora e designer alemã Judith Schalansky, autora da frase: A história nunca está completa... Veja mais aqui.

 

NAÇÃO DA DOPAMINA - [...] A razão pela qual estamos todos tão infelizes pode ser porque estamos trabalhando tanto para evitar sermos infelizes. [...] O paradoxo é que o hedonismo, a busca do prazer pelo prazer, leva à anedonia. Que é a incapacidade de desfrutar de qualquer tipo de prazer. [...] Lições do equilíbrio. 1. A busca incessante do prazer e a evitação da dor levam à dor. 2. A recuperação começa com a abstinência 3. A abstinência apoia o caminho de recompensa do cérebro e com ele a nossa capacidade de sentir alegria e prazeres mais simples. 4. A auto-vinculação cria um espaço literal e metacognitivo entre o desejo e o consumo, uma necessidade moderna em nosso mundo sobrecarregado de dopamina. 5. Os medicamentos podem restaurar a homeostase, mas considere o que perdemos ao medicar a nossa dor. 6. Pressionar o lado da dor redefine nosso equilíbrio para o lado do prazer. 7. Cuidado para não ficar viciado em dor. 8. A honestidade radical promove a consciência, aumenta a intimidade e promove uma mentalidade de abundância. 9. A vergonha pró-social afirma que pertencemos à tribo humana. 10. Em vez de fugir do mundo, podemos encontrar uma fuga mergulhando nele. [...] Recomendo que você encontre uma maneira de mergulhar totalmente na vida que lhe foi dada. Parar de fugir de tudo o que você está tentando escapar e, em vez disso, parar, virar e encarar o que quer que seja. Então eu desafio você a caminhar em direção a ele. Desta forma, o mundo pode revelar-se a você como algo mágico e inspirador que não exige fuga. Em vez disso, o mundo pode tornar-se algo ao qual vale a pena prestar atenção. As recompensas de encontrar e manter o equilíbrio não são imediatas nem permanentes. Eles exigem paciência e manutenção. Devemos estar dispostos a avançar, apesar de não termos certeza do que está por vir. Devemos ter fé que as ações de hoje que parecem não ter impacto no momento presente estão de facto a acumular-se numa direção positiva, que nos será revelada apenas em algum momento desconhecido no futuro. Práticas saudáveis acontecem dia após dia. Minha paciente Maria me disse: “A recuperação é como aquela cena de Harry Potter, quando Dumbledore caminha por um beco escuro acendendo postes de luz ao longo do caminho. Só quando chega ao fim do beco e para para olhar para trás é que vê todo o beco iluminado, a luz do seu progresso. [...] Porque transformamos o mundo de um lugar de escassez para um lugar de abundância esmagadora: drogas, comida, notícias, jogos de azar, compras, jogos, mensagens de texto, sexting, Facebooking, Instagramming, YouTubing, tweeting. . . o aumento do número, da variedade e da potência dos estímulos altamente recompensadores hoje é surpreendente. O smartphone é a agulha hipodérmica moderna, fornecendo dopamina digital 24 horas por dia, 7 dias por semana, para uma geração com fio. [...] Estamos todos fugindo da dor. Alguns de nós tomamos comprimidos. Alguns de nós surfamos no sofá enquanto assistimos à Netflix. Alguns de nós lemos romances. Faremos quase qualquer coisa para nos distrair de nós mesmos. No entanto, toda esta tentativa de nos isolarmos da dor parece apenas ter piorado a nossa dor. [...] Mas há um custo para eliminar todo tipo de sofrimento humano com medicamentos e, como veremos, existe um caminho alternativo que pode funcionar melhor: abraçar a dor. [...] Empatia sem responsabilidade é uma tentativa míope de aliviar o sofrimento. [...] Além da descoberta da dopamina, os neurocientistas determinaram que o prazer e a dor são processados em regiões cerebrais sobrepostas e funcionam através de um mecanismo de processamento oponente. Outra maneira de dizer isso é que o prazer e a dor funcionam como um equilíbrio. Imagine que o nosso cérebro contém uma balança, uma balança com um fulcro no centro. Quando nada está em equilíbrio, está nivelado com o solo. Quando sentimos prazer, a dopamina é liberada em nosso caminho de recompensa e o equilíbrio pende para o lado do prazer. Quanto mais nosso equilíbrio oscila e mais rápido ele oscila, mais prazer sentimos. Mas aqui está o importante sobre o equilíbrio. Ele quer permanecer nivelado! isto é, em equilíbrio. Não quer ficar inclinado por muito tempo, para um lado ou para outro. Assim, sempre que o equilíbrio se inclina para o prazer, poderosos mecanismos de autorregulação entram em ação para nivelá-lo novamente. Esses mecanismos de autorregulação não requerem pensamento consciente ou ato de vontade, apenas acontecem como um reflexo. [...]. Trechos extraídos da obra Dopamine Nation: Finding Balance in the Age of Indulgence (Dutton (August 24, 2021), da psiquiatra estadunidense Anna Lembke. Veja mais aqui.

 

ÂNGULO DE ÁGUA & RELÂMPAGO DE GALÁPAGOS

[...] Eis a instável e irredutível palavra \ poética em ato despotencializado \ velhos significados e condenando ao \ inferno fisiológico os sentidos tradicionais. [...]

Trecho do poema Salmos pássaros, extraído da obra Ângulo de água & relâmpago de galápagos (CriaArt, 2024), do poeta e advogado Vital Corrêa de Araújo. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.

 

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