domingo, junho 19, 2022

JAIME BATEMAN, KRENAK, ARNE NÆSS, MARCO BOBBIO, DOMENICO UHNG HUR & DAVI KOPENAWA

 

 

TRÍPTICO DQP: Insone insânia... - Ao som das obras Di-stances (Sistrum, 2006), Memórias Abstratas e Abstraídas (Funarte, 2012) e Karysma (Funarte, 1987), da compositora, pianista, professora e regeste Vânia Dantas Leite (1945-2018). - Onde estou quase não sei, nem consigo dormir e quem poderia depois do alarme 24/7 de Jonathan Crary. Já me sinto enterrado vivo, talvez restem sonhações: apenas pesadelos distópicos, Sidarta Ribeiro. E cada vez mais os piores povoados por ressurretos abomináveis e estúpidos dagora. Entre eles topo O doente imaginado (Bamboo, 2014), do médico italiano Marco Bobbio: A medicina obteve muitos sucessos ao salvar vidas humanas, mas poucos para garantia de vida sadia aos sobreviventes. Ninguém sabe que o céu caiu e quase nem ouço Davi Kopenawa: Tanta destruição nos deixa muito preocupados... Sei apenas que a Terra é mais sólida do que nossa vida e que não morre. Sei também que ela nos faz comer e viver... A constatação que fica é a de Domenico Uhng Hur: Estamos desterrados, com a sombra da morte, e sem modelos pressupostos a seguir. Sim, já é detectável o fim dos nossos mundos, Ailton Krenak, posso ver em cada olhar, em cada esquina, em cada gesto. Precisávamos saber o que diz Maffesoli: A vida só existe porque a morte tem nela seu papel. Melhor quem sabe seria o que diz o filósofo norueguês Arne Næss: A Terra não pertence aos homens. Sim, aqui tudo se parece com aquela nigeriana de Tremearne, o país todo se tornou o Vale do Javari. Como é doloroso amar em tempos de ódio...

 


Funâmbulo na corda bamba... - Imagem da artista, dramaturga e escritora russo-estadunidense Svetlana Boym. - Desperto no meio de uma tempestade onírica como se eu tivesse que reler as lições dos Cadernos de Rilke: viajar por muitas cidades e ver seres e coisas como o voo dos pássaros, as flores desabrochando, as regiões desconhecidas, as noites de amor, ter de acompanhar moribundos e ouvir os ruídos da rua pela janela, até que as lembranças se tornem sangue, olhar e gesto. Já me condenei a ousar previamente cônscio da lapada inexorável que virá depois: aqui se faz, aqui se paga. Sei que não é bem assim, essa a voz do povo; sou responsável por tudo que cometi e traço. Do que aprendi das leituras, às vezes um soco no estômago – o melhor é quando me defronto com o colombiano Jaime Bateman (1940-1983) cantando: Você tem que dançar e você tem que cantar. E não só para a morte, nem cantar só para as derrotas. Você tem que cantar para a vida, porque se você vive baseado na morte, você já está morto. As pessoas que vivem só de memórias estão mortas, a memória sem futuro a única coisa que traz é a tristeza, e a tristeza nunca gera briga, nunca... Há um fiapo de vida pela fresta do que flagro. E isso me basta, disso faço a imensidão do Universo...

 


No seio de Ixchel... - Imagens do artista conceitual argentino León Ferrari (1920-2013). - Entre acordormir sonhadiço, efialtas sobrevêm por entre dandões e quase me sinto esvair pelas espirais da loucura. Só me salvei porque daquela vez ela era Malinche e me contou desde quando menina e era Malintzin que cresceu Doña Marina até ser acusada de traição. Foi condenada e só conseguiu escapar porque era uma feiticeira de Trobriand, e se envultando dacolá pra depois, enfim, tornar-se a incólume deusa lunar Ixchel. Foi quando me chamou de Itzama e nem olvidei porque me levou para a ilha de Dcuzamil, na província de Ecab. Lá eu vi chegarem canoas de peregrinos, enquanto me mostrava manequins manuscritos com meus versos e canções. Entre um atrativo e outro chegou a me dizer que conheceu pessoalmente o lendário violonista e compositor conterrâneo, Normando Marques dos Santos – aquele mesmo professor que se apresentou em 1962, no histórico show bossanovista do Carnegie Hall, em New York – e que muito apreciou os álbuns de Siba – principalmente Avante (2012) e Coruja muda (2019) -, desde que ele fazia parte do Mestre Ambrósio e da Fuloresta do Samba. Não podia ser! E estalou os dedos e ouvi a música rolando no ar. Só tempos depois embalado pelos ritmos foi que me vi só, não estava mais ali. Ao procurá-la dou pra janela a surpresa: levantou a saia e mostrou-me as belas nádegas arredondadas e a sorrir safada de linda. E virou-se mantendo a saia levantada enquanto se tocava sedutoramente... Não sabia o que fazer, apreciava atento seus gemidos e mexidas. Ela saiu correndo, arrodeou o terreiro, adentrou ofegante e me encontrou priápico aceso para envolver-me com um beijo astucioso. Não, ela era humana demais para ser deusa. E mais cavalgava em meu ventre, recitando ao meu ouvido um poema de Cristina Peri Rossi: Nenhuma palavra / nenhum discurso / – nem Freud, nem Martí – / serviu para deter a mão / a arma / do torturador. / Mas quando uma palavra escrita / na margem na página na parede / serve para aliviar a dor de um torturado / a literatura tem sentido. E arreou exaurida sobre meu peito depois das faíscas do gozo extremo. Foi então que esticou o braço, pegou num banco perto e me entregou dois volumes: o livro do Popol-vuh e o códice de Dresden. Já anoitecia quando me disse TÚmiPoema e era María de España. Vê-la assim e em mim, talvez ainda seja possível sonhar mesmo. Até mais ver.

 

A meta fundamental da educação holística é promover uma educação integral, que permita à pessoa conectar-se consigo mesma e com tudo aquilo que a rodeia. Isso inclui o meio social e o meio natural. A vida na cidade, a vida moderna, altamente tecnicizada, afastou cada vez mais a pessoa do meio natural, sendo este um cenário distante, incompreendido e, portanto, não sentido. Perde-se, assim, a noção de que nossa vida depende dos recursos que nos são proporcionados por ecossistemas que não estão na cidade, normalmente muito longe, que são esgotáveis e cuja extração e transporte muitas vezes causam danos. Perdemos também a noção de que, embora os recolhamos diariamente, nossos resíduos, próprios de nossa forma de vida, produzem danos em ecossistemas mais ou menos próximos. Com esse conhecimento, o certo é adotar um comportamento pessoal e coletivo que minimize esses danos e não esgote os recursos para que as gerações futuras de nossa espécie e de outras espécies em geral habitem um planeta limpo e com recursos suficientes para viver. Por isso, a educação holística inclui a educação ambiental ou a educação para a sustentabilidade.

Pensamento do pedagogo e entomologista espanhol Rafael Yus. Veja mais Educação & Livroterapia aqui e aqui.