sábado, fevereiro 19, 2022

RŪMĪ, JULIA BUTTERFLY HILL, RUTH RENDELL & FRANCIS PONGE

 

 

TRÍPTICO DQP – Vertigens de lembranças, a vida dentro de um sonho... – Imagem: ArtLAM, ao som de Ciclos - sons do silêncio, da calma, do vazio, do ciclo da vida: tropeços, acertos, branco, breu, pássaros voando (2021), do compositor Marwin Lima. - Desdontem ou quasempre, umoutremoção azulalva diadia. Ah, não, há muito o que fazer da vida no gerúndio, contra a abulia do nada dizer na travessia inconclusa e sonhos para lá de postergados. Ainda escuto longe Jalāl-ad-Dīn Rūmī: A razão é como um oficial quando o rei aparece: o oficial então perde o seu poder e ninguém mais se lembra dele. A razão é a sombra que some diante de Deus que é o Sol. Talvez sirva da minha loucura. O bom é que não há outros rostos no espelho reflexivo, muito embora seja tantos eus que perdi a conta. O cenário é quase o mesmo e reinvento a cada lâmina do tempo, cortes que não saram com o átimo do voo, olhos bem abertos na escuridão. O que vale é que a Julia Butterfly Hill me sorri: As feridas na paisagem externa existem primeiro na paisagem interna. Nós recriamos essas feridas internas do lado de fora, no planeta... Se vamos pedir às pessoas que se abram para a dor da terra, devemos ter sistemas implementados que nos permitam aliviar a dor uns dos outros... Ainda bem que suas mãos sorridentes me abrigaram para que eu pudesse estar pronto mesmo que o céu despenque ruinas subterrêaneas e tudo seja feito carnaval ano após séculos, com a batucada denunciando o reino da mentira e nuvens soprassem no dolorido coração que ainda há tempo. Não fossem meus braços hélices na imaginação, tragado já estaria pelo estupor na vacância da sensatez.

 


Demorou muito, será... - Imagem: da artista norueguesa Kesja Tabaczuk - Uma vez mais testemunho o meu país ruindo pelas tabelas do que se compra e se vende e tudo demora. No peito ainda os escalavros do que esperei e retardou demais, alguns até nem vieram ou serviram, outros se foram com a fumaça e fiquei como se ouvisse A hora chegou da poetativista australiana Louisa Lawson (1848-1920): Como ela lutou? Ela lutou bem. / Como ela ascendeu? Ah, ela caiu. / Por que ela caiu? Deus, que tudo sabe, / Só pode dizer. / Aqueles pelos quais ela estava lutando – eles / certamente iriam até ela? Não! / E a dor dela! Deles é o ganho. / Sempre o caminho. / Eles não a ajudarão a se levantar / Se houver morte em seus olhos? / Você não pode ver? Ela os libertou. / E se ela morrer? / Não podemos ajudá-la? Oh não! / Em sua boa luta é assim / Que todos os que trabalham nunca devem fugir / do sofrimento e da aflição. / Mas ela nunca vai deitar - / Em sua cabeça, na poeira, está uma coroa / Jóia e brilhante, sob cuja luz / Ela vai subir sozinha. Era um estalo no meio do tempo da gente e o de todas as coisas: um verso não brota à toa e o poema de Admmauro Gommes dizia que também sigo sozinho. Melhor nunca tive a satisfação cabotina da enrolação nem aos achegamentos hipócritas mais simpáticos, já me despi das carapuças, carapaças, amarras, camisas-de-força, grilhões, apenas um metido a beletrista que não passa de um escrevinhador cheio das pregas desembrulhando o presente, enquanto ouço o arrastado de relógios e calendários vidafora. Dela a voz da escritora inglesa Ruth Rendell (1930-2015) afagando os meus ouvidos: Sempre sabemos, quando estamos acordados, que não podemos estar sonhando, embora, ao sonhar de fato, sintamos que tudo isso pode ser real. Alguns dizem que a vida é o que importa, mas eu prefiro ler. Nela aprendi com as minhas mil maneiras de errar o próprio caminho entre tumultos e agonias, errâncias indissolúveis, desvios demais de perder o rumo e o atalho. Bati cabeça demais, agora já passou, resta o olhar de quem vai rasgando quantos nãos, os pés prontos para voar.

 


Os lábios da Sibila...- Imagem: do artista visual mexicano Armand Rom. - Demorei tanto para aprender o que sou e já nem tenho chão, só abismos. E a salvação se mostrava no meio do labiríntico verbo vital. Ainda bem que ela voltou tal Ariadne, com aquele Insignificante do poeta francês Francis Ponge (1899-1988): O que há de mais atrativo que o azul, a não ser uma nuvem, na dócil claridade? / Por isso prefiro ao silêncio uma teoria qualquer e, mais ainda, a uma página branca um escrito quando passa por insignificante. / É todo meu exercício e meu suspiro higiênico. O que fiz de mim foi nos lábios oraculares dela de Pítia Sibila e o que sobrou de ânimo diante de todos os mais fugazes relentos que me fizeram partir. Até mais ver.

 

A principal tarefa da educação moderna não é somente alfabetizar, mas humanizar criaturas.

 


Pensamento da escritora, pintora, professora e jornalista Cecília Meireles (1901-1964). Veja mais da autora aqui e sobre Educação aqui, aqui e aqui.