quarta-feira, agosto 28, 2019

TRUMAN CAPOTE, FARADAY, BRÁULIO TAVARES, INGRID SILVA, BARÃOZINHO, GRIMM & FLAUTISTA DE HAMELIN


O MORTO QUE SE PERDEU – Quando o filho caçula do Barão rebentou foi um alívio. Na verdade, uma festa para mais de uma semana do lado de lá. A cidade inteira acompanhou o festeiro do lado de cá do rio. O regabofe teve todo tipo de pipoco: tiros e foguetórios do muito. Um estardalhaço de comemoração. Pudera, a filha dele, Maria Joãozinho, já estava virando mundo, casando e descasando como quem troca de roupa, avalie. Ela já ia pelo vigésimo matrimônio– ou era trigésimo? Sei lá. Ô mulher virada na gota! Destá. Era o cabra se afrouxando do sopapo dela e ela já arrumando outro na lata, fogosa, atirada. Que coisa! Entretanto, ela saía da manchete na família e entrava de férias no desassossego deles; a bola da vez era o bruguelo que berrava para felicidade do mais rico do lugar: Agora sim, um filho macho dignifica a família! E mimou tanto o pixote de quase deixá-lo pior que a filha: mimada e revoltada. Ensinou tudo de macheza pros dois, caprichando, evidentemente, no menino, que já crescia com os maus bofes e não queria errar a mão: Vai que por azar da sorte o presepeiro desse de desmunhecar, hem? Seria um desgosto duplo. Bastavam as doidices dela. Mas não, o pirralho adolesceu de virar um galalau disputado entre as recatadas, esvoaçantes e perdidas. Era o Barãozinho. Para se ter uma mínima ideia do que se sucedia com o sortudo, as casadas suspiravam, os homens queriam por amigo, as crianças faziam festa, os velhos endeusavam, afinal, duas eram as principais razões para tal: era o filho do Barão, meu; a outra, era gente boa, mão aberta, filantropo de nascença, um santo, no dizer de todos. As filhinhas de papai ou mesmo as mais assanhadas, disputavam às tapas e puxavanques, lasquinhas que fosse de pedras de ara, só pra servir de amuleto e prendê-lo às redes do amor. Ele escapulia, sabido; sapecava a bimbada, dava cheiro, presentes e carícias, depois arribava para as capitais, agitar noutras plagas. Enquanto isso, não faltava quem deitasse tapetes suntuosos ou tirassem as próprias vestes para que ele não pisasse em poças ou lamaçais. Ele, sempre grato, sacava dos bolsos cédulas e moedas, agradecendo com paga além do chaleirismo. Tanto é que bebiam o mijo dele – diziam ser curativo -, até achavam a bosta dele cheirosa, pode? Ô cabra perfumado da gota! Bebia suco de graviola, só pode ser. Qualquer um que se arvorasse a sair dos trilhos, como manda o figurino, logo era admoestado: Você não é o Barãozinho, fique quieto, amanse os cornos. Parecia mesmo ser um sujeito exemplar, todos que o digam. Na verdade, caiu nas graças do povo. Fizesse o que fosse, sempre incólume, indelével, imaculado. Chegou a ponto da Câmara de Vereadores de Alagoinhanduba, em uma das esfuziantes sessões, dar-lhe o título de cidadão local – apesar de ter nascido naquelas terras, o Barão fez questão de registrá-lo como se nascido na capital federal -, e logo emplacou proposta de canonizá-lo, o que recebeu a simpatia do padre que providenciou tudo para que o Vaticano assim procedesse. Aplausos, salves e vivas! Malogrou. Poderia até ter dado certo, não fosse um trágico acidente de automóvel naquela mesma noite, numa das curvas da rodovia de acesso à cidade. Não fosse isso, era bem capaz da gente hoje saber do Santo Barãozinho. Não duvido. Quando souberam da fatalidade, a cidade em peso foi pro local. Lá estava ele esmagado entre as ferragens. Trouxeram corpo de bombeiros e começaram o resgate: Oxe! Cadê o homem? Sumiu, era ele que estava aí dentro mesmo? Era, o carro é dele, ora. Estava o canto mais limpo: Ué, essa máquina não podia andar sozinha, né? Cadê o corpo, meu? Vasculharam. Até que alguém teve a iniciativa de abrir o porta-malas. Lá estava ele: nu e de pau duro. Como pode? Eita, parece que ele morreu de priaprisma. E agora? Chama o Barão, ele sabe o que deve ser feito. E lá vinha ele cagando raios. Que é que foi dessa vez, cambada? Quando viu o filho naquele estado, desmanchou-se na maior tremedeira. Segura o homem, gente! Aí caiu o maior pé d’água! Corre-corre, levaram o corpo para um lugar improvisado na casa grande, fizeram o velório e passaram três dias e três noites chorando de joelhos, até que a irmã chegasse embaixo do maior espalhafato. Maior lamúria de carpideiras, o mundo todo aos prantos no atacado e no varejo, até os céus choravam arreando a maior tempestade. Prosseguiam as cerimônias, orações exaltadas de padres e pastores, todos juntos em procissão até o local do sepultamento num terreno que o Barão mandou organizar como cemitério particular e, nessa hora, uma tuia de raios clareou o céu e revirou a terra. E tome coriscos, relâmpagos a granel, trovões retumbantes, mais de horas de aguaceiro. Todos correram e deixaram lá o corpo insepulto. Depois da procela, foram para lá e a urna funerária estava toda espatifada, lascas de madeira para todo lado. E o esquife? Sumiu. Perdeu-se. Nunca foi encontrado. Corre até uma lenda que ele ressuscitou e saiu errante pelo mundo afora. Ainda hoje esperam, todos esperam o seu retorno. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.

DITOS & DESDITOS:
[...] Os dois rapazes pouco tinham em comum, mas não se apercebiam disso, visto que possuíam um certo número de afinidades superficiais. por exemplo, ambos eram requintados e exigentes Depois daquela manhã de lubrificação, passaram cerca de uma hora no toilette da garagem. Dick em roupas interiores era muito diferente do Dick completamente vestido. Assim, parecia um rapazola magro, de altura média, descarnado e talvez com o peito metido para dentro; despido, via-se que não era nada disso, mas sim um atleta treinado em peso e alteres. O focinho de um gato tatuado em azul, com uma expressão de riso, cobria-lhe a mão direita; sobre um dos ombros floria uma rosa. Outros sinais, desenhados e tatuados por ele, ornamentavam-lhe os braços e o tronco: a cabeça de um dragão com uma caveira entre as mandíbulas; mulheres nuas de seios opulentos; um diabrete brandindo uma forquilha; a palavra PAZ acompanhada com uma cruz rodeada de riscos a imitar raios de luz; e duas composições sentimentais – uma delas um ramo de flores dedicado à MÃE e ao PAI, o outro um coração que celebrava o romance de Dick E CAROL, a rapariga com quem se casara aos dezenove anos e da qual se separara seis anos mais tarde, a fim de reparar a sua falta para com outra jovem, mãe do seu filho mais novo. (“Tenho três filhos dos quais tomarei definitivamente conta” - declarara ele ao ser liberto condicionalmente. “A minha mulher casou outra vez. Fui casado duas vezes, mas com a segunda não quero nada”) [...] Uma bátega súbita crepitava no telhado da arrecadação. O ruído, semelhante a um rufar de tambores numa parada, precedeu a chegada de Hickock. Acompanhado por seis guardas e o capelão que rezava em voz baixa, entrou no fúnebre local algemado e envergando um feio dispositivo de correias que lhe mantinha os braços ligados ao tronco. Junto da forca, o diretor da cadeia leu-lhe a ordem oficial da execução, um documento de duas páginas; e durante esse tempo os olhos de Hickock, enfraquecidos por meia década de sombra, percorriam a reduzida assistência, até que, não conseguindo avistar o que procurava, perguntou em voz baixa a um guarda se estava presente algum membro da família Clutter. Ao receber uma resposta negativa, o prisioneiro pareceu desapontado, como se achasse que o protocolo que rodeava este ritual da vingança não estava a ser cumprido à letra. Como é hábito, o diretor, no fim de recitar o documento, perguntou ao condenado se tinha qualquer coisa a declarar. Hickock sacudiu a cabeça:- Só desejo afirmar que não quero mal a ninguém. Vocês mandam-me para um mundo melhor do que este. - Depois, como que para acentuar a afirmação, apertou as mãos dos quatro homens que haviam sido mais diretamente responsáveis pela sua captura e condenação, e que tinham pedido expressamente para assistir à execução da sentença [...].
Trechos extraídos da obra A sangue frio (Nova Fronteira, 1965), do escritor e jornalista estadunidense Truman Capote (1924-1984), relatando o brutal assassinato de uma família estadunidense, dando a ideia inicial do crime até a execução dos assassinos. O livro descreve minuciosamente a reação dos moradores da cidade, a investigação policial e os passos dos criminosos durante a fuga, bem como a história pregressa dos mesmos. Poucos meses depois do crime, Richard Hickock e Perry Smith são presos pela chacina e, condenados à morte, em 14 de abril de 1965, eles são enforcados. Veja mais aqui.

PIED PIPER DE HAMELIN DOS GRIMM
Há muitos e muitos séculos atrás , na cidade de Hamelin, numa bela manhã seus habitantes encontraram a cidade repleta de ratos famintos, devorando todos os grãos armazenados nos celeiros dos ricos comerciantes do local. Apavoradas, muitas pessoas começaram a fugir da cidade, os moradores desesperados reuniram-se e decidiram oferecer uma grande recompensa a quem acabasse com aquela terrível invasão dos ratos. Logo surgiu um flautista a quem ninguém havia visto antes, e lhes disse: “A recompensa será minha. Esta noite não haverá um só rato em Hamelin”. O flautista pegou então sua flauta e saiu pelas ruas de Hamelin entoando uma linda melodia que encantava os ratos, e fazia com que todos os ratos o seguissem pelas ruas de Hamelin totalmente hipnotizados pela linda melodia oriunda da flauta. O flautista seguiu então por uma longa estrada, ao fim desta estrada havia um grande rio; os ratos ao tentar atravessar o rio para seguir o flautista, acabaram por morrerem afogados. Assim, os habitantes de Hamelin se viram livres da odiosa praga de ratos que havia lhes tirado o sossego. No dia seguinte, o flautista foi falar com os responsáveis pela cidade, que fizeram a promessa de entregar um grande recompensa em dinheiro a quem desse fim a todos os ratos. Porém o Conselho da cidade por pura avareza decidiu não pagar ao flautista pela exterminação dos ratos. Furioso pela atitude dos avarentos homens do conselho da cidade de Hamelin, o flautista desta vez decide se vingar. Num linda manhã quando todos os habitantes se encontravam na igreja em oração, o flautista começou a tocar a sua flauta e a hipnotizar todas as crianças da cidade, levando-as para uma caverna e aprisionando-as para sempre lá. Nunca mais as crianças apareceram e a cidade de Hamelin ficou triste, silenciosa e por mais que se procure lá nunca se encontra nem um rato, nem uma criança.
Fábula extraída da obra Contos dos Irmãos Grimm (Rocco, 2005), dos irmãos escritores Jacob e Wilhelm Grimm. Veja mais aqui e aqui.
PS: O escritor e compositor Bráulio Tavares também escreveu a respeito, O flautista misterioso e os ratos de Hamelin (34, 2008), em sextilhas rimadas e bem divertidas, contando, em forma de cordel, a célebre lenda do flautista de Hamelin, acrescida de toques engenhosos e alusões contemporâneas, não faltando tiradas e comentários engraçados sobre uma cidade que, além de ser vítima dos ratos, é vítima também de seus políticos corruptos. Veja mais aqui, aqui e aqui.

A ARTE DE INGRID SILVA
Eu sempre pensei que a dança poderia ser meu sonho e eu estou tão feliz, de compartilhar sobre minha vida e meu mundo de dança com você, a dança realmente mudou a minha vida.
A arte da bailarina Ingrid Silva, que iniciou sua carreira aos 8 anos de idade, no Projeto Dançando Para Não Dançar e continuou seus estudos na Escola de Dança Maria Olenewa e no Centro de Movimento Debora Colker com bolsa integral. Aos 17 anos, juntou-se ao Grupo Corpo como estagiária. Em 2007, ela ganhou uma bolsa de estudos para o Dance Theatre of Harlem School e, em 2008, no Dance Theatre of Harlem's Dancing Through Barries Ensemble. Atualmente ela é embaixadora cultural para os Estados Unidos ao dar workshops na Jamaica, em Honduras e em Israel. Participou do BrazilFoundation Gala, em 2014, no Lincoln Center, e foi destaque no filme Maré, Nossa História de Amor (Brasil). Recentemente, marcou presença na mídia nas revistas Vogue e Glamour, no Brasil, e tornou-se Embaixadora Global da Activia. Veja mais aqui.

A OBRA DE FARADAY
Nada é maravilhoso demais para ser verdade, se for consistente com as leis da natureza.
A obra do filósofo, físico e químico inglês Michael Faraday (1791-1867) aqui.