O FANTASMA DA CLEO VIRGINIA (OU ERA A
VIRGINIA CLEO, DUAS PESSOAS?)
– Todos chamavam-na de Cleo e assim a ela me reportava: aquela criança feliz de
Portsmouth. Adolesceu Virginia, filha de militar que se aposentou
comerciante, e de uma operadora de telefonia. Dali já nascia a expressão
daquela geminiana como duas: ela e outra dela. Haveria mais dela por aí? Certo dia,
tão exultante quanto travessa, não se sabe ao certo como, caiu das escadas da
escola. O que houve? A Cleo ou a Virgínia? Graves lesões nas costas, um trágico
acidente. Os médicos não reconheciam suas dores, um procedimento cirúrgico malsucedido
na coluna e uma artrite incapacitante levaram-na às muletas e cadeira de rodas.
Não se abateu: escreveu uma paródia
de Idílios do Rei, de Tennyson e, por conta disso, ganhou uma bolsa de
estudos, expondo-se vitoriosa com o diploma da Woodrow Wilson High School. Partiu para um curso de arte por
correspondência, quatro anos dedicados à sobrevivência, várias tentativas cirúrgicas
para corrigir os quadris e as costas. Seus desenhos e ilustrações faziam
sucesso. Com a morte do pai, seguiu com a mãe para Manchester e, depois,
para Apache Junction. Ajudava a família pintando retratos e ilustrando modas,
criativamente envolvendo-se em segredo com a escrita. Foi daí que fez o seu
primeiro manuscrito autobiográfico, destruindo-o por querer privacidade. Depois
foi a vez de Os Deuses da Montanha Verde, que permaneceria inédito. Teve
publicado numa revista popular o seu conto de ficção: Eu dormi com meu tio
na noite de núpcias... Quem ousaria? Então apareceu com The Obsessed, que virou Flowers in the Atlantic,
depois de muita reescrita e uma frase sintomática: Coisas
indescritíveis sobre as quais minha mãe não queria que eu escrevesse... Escrevi
em duas semanas... Inaugurava o sucesso contando a história de quatro
crianças contrabandeadas para o sótão de sua rica avó piedosa, e mantidas
prisioneiras lá por sua mãe. Seguiu-se Petals on the Wind,
um horror gótico sobre uma saga familiar, seus segredos e amores proibidos.
E fez como uma série: Dollanganger
If There Be Thorns, My Sweet Audrina e Seeds of Yesterday.
Depois: Heaven, o
romance introdutório de uma nova série, Casteel: Acho que
conto uma história muito boa. E não me afasto muito dela para material
descritivo... Foi quando apareceu
um câncer da mama, aos 62 anos de idade. E um fantasma. Como assim? Ela ressuscitava
entre seus manuscritos. E o primeiro romance inédito por toda sua vida Gods
of Green Mountain, definitivamente publicado. Eu não sou Andrew Neiderman. Salve,
Virginia Cleo Andrews (Cleo Virginia Andrews, VC Andrews – 1923-1986).
Veja mais aqui, aqui e aqui.
DITOS & DESDITOS - Há muita música criativa acontecendo no
underground, o que é um tipo de sinal muito esperançoso... Esses iniciadores
são geralmente meio excluídos - na maioria das vezes ninguém consegue se
identificar com eles. E está em todo o planeta; você vai e olha nos
becos e embaixo das portas, nas minas de carvão - eles estão lá, espreitando
nas sombras; uma quantidade significativa de pessoas em
diferentes partes do planeta que são genuinamente criativas. E eu me associo e me
apego a isso. Normalmente, quando vou a algum lugar
novo, tento descobrir com os músicos - eles costumam dizer 'esse cara não sabe
tocar' ou 'ele é louco', 'ele não está fazendo nada', 'ele é doente,' distorcido, demente
tolo' - e imediatamente tento encontrá-lo. Ele provavelmente é um de nós. Pensamento do
compositor e filósofo estadunidense Anthony Braxton, que na
obra The Tri-Axium Writings (Synthesis Music, 1985) expressa que: […] Pois a suposição
mais básica que ditou as minhas primeiras tentativas de responder aos
comentários musicais criativos foi a crença errada de que os jornalistas
ocidentais tinham alguma compreensão fundamental da criatividade negra – ou
mesmo da criatividade ocidental – mas esta suposição estava seriamente errada. [...]. Além disso,
ainda expressa que: Agradeço ao Criador do universo por ter
descoberto que a disciplina da música era o maior dom que eu poderia ter
recebido, a possibilidade de ser um estudante trabalhando no mundo... Eu
nunca pensei que estaria envolvido em estruturas narrativas. Como jovem, eu
estava mais interessado em modelagem abstrata. Mas à medida que envelhecia,
comecei a ver que não havia razão para me limitar a qualquer postulado
intelectual ou conceitual, quando na verdade sou um estudante profissional de
música.
ALGUÉM FALOU: Sabe, nós somos produtos da
sociedade em que crescemos... as pessoas são do tempo em que vivem... essas
pessoas já não são iguais, já não têm os mesmos sonhos, nem os mesmos projetos.
O mundo está a mudar... Pensamento da cineasta sueca Solveig Nordlund.
Veja mais aqui.
EU & TU – [...] O mundo como experiência
diz respeito à palavra-princípio Eu-Isso. A palavra princípio Eu-Tu fundamenta
o mundo da relação. O mundo da relação se realiza em três esferas. A primeira é
a vida com a natureza. [...] A segunda é a vida com os homens. [...]
A terceira é a vida com os seres espirituais [...]. Trechos extraídos da
obra Eu e Tu (Centauro, 2003), do filosofo, escritor e pedagogo
israelita Martin Buber (1878-1965). Veja mais aqui e aqui.
que careço
demais para isso
Te quero
Bolero
GERALMENTE
me tens ao céu posto
caindo sobre a nave
do teu seio
EU TE PASSO
e passo
livremente
de cantar
A TUA NUDEZ TEM CURVAS
SUAVES
teus pelos, loura primavera
Não te conheço teu instante simples
mas vejo-te passar pela caçada
Te olho indiscreto e talvez
até me vejas o olhar
Não ouso assustar teus passos
que existe tal como te criei
Amo-te mais que te imagino
pois a felicidade é forma genuína
do que sou
Rei
ORIUNDA ONDA
onde queres
me levar?
O QUE ME ENCANTA É O BRINCO
de tuas conchas
a precisão de teus pelos
aneladas voltas
composto corpo
no salto alto do teclado claro
AS DOBRAS DO VESTIDO SE
ENGOLFARAM
e ouço passar águas profundas
passam passos
A voz procura, acionando em
torno grandes flores de vento
Assim não se sentirá o não
que se aproxima
SER É PAGAR
para amor
Ser é aval
Aliado
Pelo ser
amar amado
POR ISSO UM MINUTO APENAS
para o carinho leviano
teus apressados olhos estudantes
batendo instantes em que te
vejo rápido
MEU AMOR
tua loura magreza não me toca
que afagarei teus pelos
com o beijo primordial
Seguro a mão que tu seguras
daquele que me encontro fonte
fantasma lavado e céu.
Ó meu amor que se mistura
à carnadura do estro
às cores coxas do sensível
Ó meu portátil amor
que se oferece
na aparente umidescência
da paragem suburbana.
DEITARAM-SE NUAS
deitaram-se nuas
no meio da noite
as meninas virgens
deitaram-se nuas
as doces meninas
e ainda eram virgens
e os seus esposos
acenaram logo
com as mãos erguidas
e logo chegaram
no meio da noite
como que perdidos
deitaram-se nuas
todas as meninas
escondendo as graças
e os seus consortes logo as sucederam
e imprimiram o selo
estavam tão nuas
e eram mais puras
que longínqua estrela
e na amena noite
só fugiu o tempo
envolto num lenço
e depois de amor
daquele conúbio
choveram diamantes
o fecundo hino
daquelas meninas
musas citadinas
naquela noite toda
caem as flores finas
deusas fesceninas
e os seus amigos
inventaram lira
e os seus caprichos
NÃO POSSO RETER OS TEUS BRAÇOS
Não posso reter os teus traços
Nem as notas de teu tema
Pois tua música se desvanece
Como as vozes do poema
Da paixão, que mais um traço
Foi do azul de minha pena,
E quando eu te vir já será garço
O repique da tua cena
e o afastado abraço...
(oriunda onda a que cerca de aço
me levarão tuas algemas?)
BALADA PARA TODO AMOR
todo amor é assim, plágio
cópia de cópia de si, no mesmo
sim na sua visibilidade
no seu sexo. Porque todo amor
é aquela alegre repetição
doença de sonho e de tensão
acontecimento que tanto faz
se desfaz. De que não posso
dizer o que quero, ou o que vale
nem mesmo vale a pena
[O amor, seu troco.]
O caro, o espaço, o caroço
o que sobra o que falta e o falho.
Todo amor falece. Não cresce.
Não é o que se espera.
Dele nada sobra. Além do gozo.
Da calma, da cama, do colo
da palavra: só as notas altas
o cantam. As baladas mais.
A exultação mais plena.
Pois todo amor é outra vez
o mesmo amor. É sempre. É pouco.
E só se estabelece quando
impossivelmente fala a falta
do tolo amor, que já é lembrança
excessiva. Que todo amor costura
um tédio. E tem a surpresa da morte.
Somos suas presas em suas levezas.
Corre o fundo tempo por seus lodos
mostra a sua sede à noite morta.
Quem me crê sabe o que digo:
o amor já vem perdido, pois perder-se
é o destino amante. Dele vem logo
o mote o trote o corte a espada
que o amor tem em seus dentes
pois sua loucura é o nada.