segunda-feira, setembro 02, 2024

LARISSA BOMBARDI, UDA KIYOKO, MIA SOSA & IMPRÓPRIO POÉTICO

 

 Imagem: Acervo ArtLAM.

Ao som do álbum Ressemântica (2022), da violeira, violonista, arranjadora, pesquisadora e arteducadora Laís de Assis.

 

PERDI A VEZ DO ÚLTIMO PEDIDO... - Estava à procura de um amigo para fazer meu último pedido, muito embora soubesse de antemão que não os tenho desde o tempo em que todos estavam vivos. Hoje em dia é coisa mais rara. Escrevi a carta e, como ainda não o encontrei, perambulei pelo mundo afora e voltei: onde nasci não mais existe. A casa demolida, o rio escondido e desconheço todos que moram por ali. Sinto que foi naquele lugar, sim, sigo pela rua revivendo tudo. Da minha casa ao rio bastavam passadas. Até ouço agora a voz de outrora da minha mãe desesperada, às carreiras, para me afastar da beira do rio - para ela a minha maldição. É que prestes a dar à luz, uma enchente repentina. Quase nasci afogado, não fosse a prestimosa ação da minha avó materna: nasci entre um rio e um sorriso de mulher... Todas as minhas fugidas não dava outra: era para a beira do rio. Tinha um pavor atormentado com coração de Jesus pendurado na viga da casa na sala e não entendia o fato de nascer já condenado carregando o pecado original e, por isso, deveria reverenciá-lo por salvar a mim e toda humanidade. Era a única forma de me manter vivo e em paz: cultuando a sua imagem – diziam, reiteravam. Desobedecia, claro, razão pela qual as tramas da vida pros meus desvios, o perdedor, sujeito apenas à subalternidade que tanto negara. Liberto, não mais e por aqui estou: procurando amigos e só encontrava dissimuladas que fingiam ajuda, quando não mais atrapalhavam o meu já tão tortuoso caminho e sem que pudesse jamais chegar a lugar algum, mudando de casa, fugindo do não sei o quê - hestórias que foram exaustivamente contadas. Acho mesmo que estou sonhando e não consigo sair dessa. Devo mesmo ter enlouquecido no abandono. Tanto pior, a apetência e a avareza entre devotos e ímpios, sempre tangenciando o apático e os desatentos, sem vínculos afetivos, muito menos conectividade social. Mergulhei no medo de ficar só e a rua é outra, não mais aquela. Talvez tenha morrido e nem me dera conta ainda transitando insone errante pelos lugares mais estranhos que me dão a sensação da mais íntima familiaridade. Talvez estes sejam os meus fracassos em ser livre, independente pelos labirintos das armadilhas. Resta-me apenas uma lápide sem nome nem epitáfio, completamente esquecido – e com a recomendação de que se alguém ousasse lembrar, fosse ali incontinenti rechaçado imediatamente. Quero apenas morrer em paz, porque sou ontem e amanhã agora. Até mais ver.

 


Kafka: Eu preciso da solidão para a minha escrita; não como a de um ermitão — isso não seria o suficiente — mas como a de um homem morto... Sim, o homem é de afligir de tristeza, porque em meio à subida constante das massas ele fica cada vez mais solitário, de minuto em minuto... Veja mais aqui.

Alina Paim: Não corte voltas quando não forem como você queira, nem tudo está de acordo com a nossa vontade. Às vezes a vida inteira corre à revelia de nosso desejo, e por isso não deixamos de enxergar as coisas como são em toda sua intensidade e em toda sua significação... Veja mais aqui.

Ione Skye: Qualquer coisa menos que extraordinária é uma perda de tempo... Veja mais aqui.

 

HAIKU

Imagem: Acervo ArtLAM.

Estou meio \ sonhando, meio \ na neve\ Metade do meu corpo está sonhando e metade do meu corpo está na neve\ coelho de verão \ morrendo de fome \ e sonhando\ Coelho de verão morrendo de fome e sonhando\ ainda viva \ a libélula secando \ em uma pedra\ Uma libélula seca ainda viva na pedra\ borboleta de outono \ eu poderia matá-la \ com um dedo\ Borboleta de outono \ O que pode ser morto com um único dedo \ matar é feio, \ borboleta de inverno\ Uma borboleta de inverno feia demais para matar\ caixões na neve \ empilhados como blocos de construção\ Coloque-os um em cima do outro como blocos de caixão na neve\ decepção \ pela manhã à noite \ na noite dos insetos\ Decepção pela manhã, à tarde, à noite dos insetos\ sob nuvens brancas \ com um caranguejo sombrio\ Há um caranguejo da depressão sob as nuvens brancas.\ Minha febre alta é um feijão vermelho \ roxo profundo\ A febre alta tende a ser flores de feijão roxo\ queda de neve \ nos olhos de um pássaro \ é um milagre\ Neve caindo nos olhos de um pássaro é um milagre\ minha alma \ meus seios e outono \ em meus braços.\ O outono está em meus braços, tanto na minha alma quanto nos meus seios\ campo nevado \ a onisciência do corvo \ em roxo\ Para o onisciente Murasaki do corvo do campo nevado\ uma mariposa-falcão de asas prateadas \ esvoaçando e girando \ completamente apaixonada! \ Eu me apaixonei pela mariposa celestial prateada.\ Gaguejando em \ uma árvore na colina \ corvo de verão \ Um corvo de verão gaguejando entre as árvores da colina\ antes que você perceba, \ até as mudas \ crescem orelhas, línguas\ Antes que você perceba, há muitas orelhas e línguas nas mudas.\ Como a lua de verão dos cabelos brancos do imperador \ A lua de verão está nos cabelos grisalhos do imperador \ trazendo para casa \ um crisântemo selvagem \ para cada um dos meus inimigos\ Traga de volta tantos crisântemos selvagens quantos inimigos \ Buracos do cosmos do jardim \ perfurados em suas gargantas \ Eu me pergunto se Akizakura está morrendo de emoção com um buraco na garganta. \ caindo em um poço profundo \ enquanto ainda dormia \ asas de borboleta\ A asa de uma borboleta cai em Fukai enquanto ele dorme.\ subindo em palafitas, \ esqueço \ o nome do primeiro-ministro\ O nome do primeiro-ministro esquecido ao subir em palafitas\ O lago japonês cheirava \ vivo ou morto, \ dobrando seus corpos \ O cheiro dobra seu corpo tanto na vida quanto na morte.\ por causa de seus olhos negros, \ ratos são mortos\ O rato é morto por causa de seus olhos roxos.\ enquanto espero por alguém \ eu chamo o gatinho\ Dê um nome a um gatinho enquanto espera por alguém\ açafrão– \ o filme de ontem \ matando alguém \ Açafrão e filmes matam pessoas de ontem \ suspenso no ar \ minha luva \ e um cisne\ Minhas luvas e um rato pairando no ar\ o interior do caixão \ mesmo que eu esteja morto aqui \ cheira bem\ Cheira como se eu pudesse morrer aqui no caixão.\ Me sinto tão só \ quando escrevo meu nome \ na madrugada de verão ! \ Quando escrevo meu nome, me sinto sozinho no início do verão.

Poema da premiada escritora e editora japonesa Uda Kiyoko.

 

O PIOR PADRINHO - […] Há espaço para diferentes tipos de grandeza. Mesmo que você chore fazendo isso. Caramba, especialmente se você chorar fazendo isso. [...] Mas eu quero companheirismo, a segurança de saber que alguém está me apoiando, a habilidade de confortar e ser confortado. Amizade. Férias. Talvez até filhos um dia. Alguém sólido. Previsível. Uma pessoa que não precisa de paixão e faíscas para construir um relacionamento duradouro. Não sei se algum dia encontrarei esse indivíduo — e isso me deixa extraordinariamente triste. [...] Olha, há diferentes maneiras de se chegar a um desfecho, e uma delas pode ser deixar alguém infeliz só para satisfazer sua alma mesquinha. [...]. Trechos extraídos da obra The Worst Best Man (Avon, 2020), da escritora estadunidense Mia Sosa, que na sua obra The Wedding Crasher (Avon, 2022), expressa que: […] Sabe, eu acho que quanto mais algo é importante para nós, mais sentimos que perderemos se não der certo. Então nos convencemos a não querer a coisa [...] Meu instinto não é olhar para ele e dizer "meu, meu, meu". Tudo o que consigo pensar é: "Querido, eu sou sua, sua, sua. [...] Algumas pessoas plantam raízes; outras espalham sementes e deixam que outros cuidem do crescimento. [...]. Veja mais aqui.

 

AGROTÓXICOS & COLONIALISMO QUÍMICO – [...] Estamos sendo contaminados em uma grande medida. O Brasil é um dos maiores consumidores mundiais de agrotóxicos e o maior importador mundial de agrotóxicos. Dos dez agrotóxicos mais vendidos no Brasil, três são proibidos na União Europeia (UE) porque são cancerígenos, ou porque são teratogênicos, quer dizer, provocam malformação fetal, ou porque provocam infertilidade, ou desregulação hormonal, ou mal de Parkinson [...] Trecho extraído da obra Agrotóxicos e colonialismo químico (Elefante, 2023), da geógrafa Larissa Bombardi. Veja mais aqui.

 

IMPRÓPRIO POÉTICO

Onde começa inverno de que poema se ceva? \ Enxames de chaminés... ou de galáxias? \ Quantas gotas de fôlego náufrago gasta... até que último sopro afogue? \ Pássaro de pedra no vácuo voa? \ Tudo para delírio ou trabalho dos lírios. \ Nada ao vão e a seus fundos desvãos. \ Num lapso de ética, futuro solapa. \ Num ípsilon de ótica, tudo expia ou sublima. \ Tanta pelúcia me alucina.

Ecos cônicos patéticos – monósticos quase absolutos, poema extraído da obra Impróprio poético (CriaArt, 2024), do poeta e advogado Vital Corrêa de Araújo. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.

 

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MÃE DA TERRA

Arte do bibliotecário e artista visual João Paulo de Araújo, co-autor da obra Tungando a vida (CriaArt, 2024). Veja mais abaixo e também aqui.

 

UM OFERECIMENTO:

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Tem mais:

TUNGANDO A VIDA

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Livros Infantis Brincarte do Nitolino aqui.

Poemagens & outras versagens aqui.

Diário TTTTT aqui.

Cantarau Tataritaritatá aqui.

Teatro Infantil: O lobisomem Zonzo aqui.

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VALUNA – Vale do Rio Una aqui.

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Crônica de amor por ela aqui.