DIÁRIO DO GENOCÍDIO NO FECAMEPA – UMA: SABE
AQUELA... LEVIANDADE DEMAIS... - Apesar dos
milhares de mortos diários e do estouro de casos de reinfecção, a vida parece normalizada
para muitos indiferentes. Depois de quase seis meses enclausurado, saio às ruas
e as pessoas para lá para e para cá, como se nada de extraordinário acontecesse
no planeta. Fiéis de todos os credos saúdam entre si e não uns aos outros, o
que me chamou atenção, uma discussão entre rivais religiosos. Longe de mim os
donos do que dizem não mais que farsa do berço ao túmulo, os que governam sobre
aqueloutros nem tão incautos assim, teimosos que são sabidos e submetem a quem do
mando a caolhice para a verdade mais absoluta. Assim o fazem como se donos de
tantos outros, a se acharem doutos do destino alheio para obediência e temor
dos subalternos. É assim e definem o que é permitido ou proibido de sua crença
furiosa com seus castigos. Faça não, senão eles inventam no exótico de suas excentricidades
sofismáveis o que possa caber no entendimento das verossimilhanças mais esdrúxulas.
Ah, são eles lá coisonários e se acusam de infames, sequer ouviram Maria Montessori: As
pessoas educam para a competição e esse é o princípio de qualquer guerra. E guerras fazem com o seu embusteiro e
apoplético credo, jurando ao deus para que haja um céu pros seus escolhidos e
um inferno pros desafetos. Assim, só os asseclas e só eles são os irmãos da
verdade, em fé e vida, para o bem e o certo, os demais excluídos que fervam nas
caldeiras demoníacas das desgraças escatológicas. Enquanto isso, explodem escândalos
no noticiário com seus guias e mentores, nem se dão conta, os seus mesmo que cometam
crimes cabeludos, são santos e absolvidos na fé exclusiva. Pois é, a vida passa
sob todos os seus juízos sectários, incapazes da diferença. A vida passa, eu
sei, vou com Théophile Gautier: Nascer é apenas começar a morrer. E viver,
uma dança transformadora e muito longe disso tudo. Vou nessa.
DOIS ESTALOS E UM MONTE DE
IDEIAS – No meu
recolhimento de sempre, ouvia uma bela música, imagens tantas surgiram por cenário
e me davam um futuro possível da conquista embalado pelos tons. No começo um
tanto disformes, depois tomavam corpo e se apresentavam reais à palma da mão. Sabia
de Charles Baudelaire: A imaginação é positivamente aparentada com
o infinito. Como foi a imaginação que criou o mundo, ela governa-o. A canção
instrumental me embalou numa viagem imagética interminável até outra canção
soar com afago: era Délia Fischer cantando bonito o
Meu tempo (Tempo mínimo, 2019) e a me
dizer amável & linda: Exatamente, a minha busca é essa. Busco a
música, tem um acorde aqui, uma levada lá. Fico querendo entrar na música como
um todo. Me vejo a cada dia mais aberta para interpretar e buscar uma visão
própria, que tenha a minha marca.
E do seu talento desde o Duo Fênix vou curtindo umas e tantas interpretações, a vida é outra
que não esta de tanta calamidade, uma vida feita de sonhos em que viver em paz e
com todos é fundamentalmente possível. Nessa também vou.
TRÊS ESTALOS & UM OUTRO
OLHAR PARA AS COISAS – Ah,
os meus dias, persigo tão desajeitado quanto distraído, e algo me chama atenção
nas entrelinhas das coisas, isso sempre e a ponto de atentar para mínimos
detalhes entre o fecundo e o necessário. É nessa hora que ouço a troça de Angeli: Quando a gente vai ficando velho, percebe
que a adolescência é mais longa do que se espera. Sequer senti o tempo
passar tão rapidamente, nem o envelhecimento. Ainda ontem eu pulava o muro do
quintal para pegar a bola que pulou fora e a vizinha nua se bronzeando na
grama, aos gritos com minha intromissão. Quantas de anteontem ou do mês passado,
acho, sei lá, um dia desses aí e nem lembro. Mesmo com as dificuldades motoras,
as dores nos quartos e coluna, aqueles esquecimentos imprevisíveis, mesmo assim
o coração assobia como se menino entre pássaros e flores no quintal, com o Sérgio Godinho poeticamente cantando: Sem cordas que os amarrem a descoberta de
novos campos. Sem memórias, livres correm velozes ou a passo, por dias soltos.
Bonito esse seu Primeiro dia, assim
voo e vivo. Até mais ver.
A ARTE DE BETH DA MATA
Nossa história precisa ser reescrita.
Como artista e cozinheira, abri uma nova pesquisa que é a comida brasileira a
partir dos índios, que têm muitas técnicas que foram apagadas da história. Aqui
já havia a prática do pirão, bebida fermentada e o domínio da mandioca, por
exemplo, antes dos europeus chegarem. Os povos indígenas foram
muito silenciados. Há pouco conhecimento sobre sua cultura. Após essa
experiência de descolonização, estou em reconciliação com quem sou de fato.
A arte
da artista plástica e performática, curadora e gestora pública Beth
da Matta (Judith
Elizabeth da Matta Ribeiro), que também possui formação em Gastronomia e é atual
diretora do Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães (MAMAM). Veja mais aqui
& aqui.