A MOÇA DO BRINCO DE PÉROLA – Dois colecionadores foram para um leilão de obra de artes e combinaram
que um não cobriria o lance do outro quando algum deles manifestasse interesse
por uma obra. Assim foi e ao suspeitar que se tratava de suposta obra de um
autor há muito esquecido, um deles arrematou e prometeu ao outro doar para o
Museu Mauritshuis, de Haia, quando morresse. Assim se procedeu e não fosse o Marcel Proust descobri-la
e dedicar páginas sublinhando a beleza dela e de outras obras do pintor em seu clássico
Em busca do tempo perdido
(1927), talvez nem tivéssemos mais notícia. A partir disso é que se passou a
trazer à tona a obra daquele que passou por mais de 200 anos em profundo
esquecimento: a do pintor do Realismo clássico holandês Johannes Vermeer (1632-1675), autor entre outras poucas obras de A Alcoviteira (1656); Vista de Delft (1660); Moça com Brinco de Pérola
(1665); O Astrônomo
(1668); O Geógrafo
(1669). Mas a obra em referência é a famosíssima Meisje met de parel (Moça
com brinco de pérola),
pintado pelo artista no ano de 1665, alcunhada de Mona Lisa do Norte ou a Mona
Lisa holandesa, apresentando a protagonista como uma jovem com ar sereno, doce,
angelical, um olhar casto e os lábios entreabertos, voltada para o para o
espectador e parcialmente de lado, como se algo a convocasse. Nascido em Delft,
na Holanda, em 1632, cidade conhecida pela fabricação de um tipo especial de
cerâmica esmaltada, ele além de pintor atuava como comerciante vendendo
pinturas de outros artistas da cidade. Porém, suas atividades entraram em
decadência com os desdobramentos da guerra entre a Holanda e a França, ocasião
em que uma grave crise econômica tomou conta do cenário. Com a sua morte em
extrema pobreza, ele caiu em profundo esquecimento. Ao ser descoberta a famosa
obra 200 anos depois, ela foi transformada em um livro com a história contada
pela escritora britânica Tracy Chevalier,
cujo título era Girl with a Pearl Earring
(Plume, 2001). Como pouco se sabe até hoje acerca do
pintor e da personagem da pintura, a escritora reuniu informações a respeito e
criou este romance histórico, contando a respeito de uma jovem de 17 anos,
Griet – nome este que significa grão de areia, coragem e firmeza -, que se
vê obrigada a trabalhar para ajudar no sustento da pobre família. Ela torna-se
então serviçal na casa do pintor e, por conta disso, chama atenção do filho do
açougueiro que começa por cortejá-la, desenvolvendo-se, com isso, um triângulo
amoroso. A sua história foi adaptada para o cinema em 2003, num longa-metragem dirigido
pelo cineasta Peter Webber, num roteiro adaptado por Olivia Hetreed, estrelado
pela atriz Scarlett Johansson. Ironia da vida, mais um exemplo da certidão de
que só depois da morte é que autor ganha reputação e alcança sua celebridade. Justiça
seja feita!
DITOS & DESDITOS - Cada idade tem sua felicidade e problemas.
Eu tenho apenas uma ruga e estou sentada sobre ela. Eu
tenho uma natureza bastante masculina. Eu não tenho medo de nada. Tive
prazer quando pude... agi com clareza e moralidade e sem remorsos. Eu sou muito sortuda. Eu tinha muita
força de vontade! Uma baita força de vontade, entendeu? E foi muito útil para mim. Tive que
esperar 110 anos para ficar famosa… Pretendo aproveitar o máximo possível. Espero a morte… e os jornalistas...
Depoimento da supercentenária francesa Jeanne Louise Calment (1875-1997).
ALGUÉM FALOU - A primeira necessidade é a
descoberta interior para saber o que se é verdadeiramente atrás das aparências
sociais, morais, culturais, raciais, hereditárias. No centro há um ser livre,
vasto, conhecedor, que se oferece à nossa descoberta e que deve tornar-se o
centro agente de nosso ser, de nossa vida... A maior parte de vocês vive na
superfície de seu ser, expostos ao contato das influências externas. Vocês
vivem, por assim dizer, quase que projetados para fora de seus corpos, e quando
encontram um ser desagradável, projetado como vocês fora do corpo, vocês ficam
perturbados. Toda a dificuldade provém do fato de que seu ser não possui o
hábito de recolher-se. Vocês devem sempre recuar um passo para o interior de si
mesmos. Aprendam a mergulhar profundamente no interior. Recolham-se e estarão
em segurança. Não se abandonem às forças superficiais que se movem no mundo
externo. Mesmo que estejam apressados para fazer alguma coisa, recolham-se por
um instante e descobrirão, para a sua própria surpresa, que farão muito mais
rápido e melhor o trabalho que tiverem que realizar. Se alguém encolerizar-se
contra vocês, não se deixem tomar por suas vibrações, mas, simplesmente,
interiorizem-se, e a raiva da pessoa, não encontrando em vocês nenhum suporte
ou resposta, desaparecerá. Permaneçam sempre em paz, resistam a toda tentação
de perder esta paz. Não decidam nada sem recolher-se ao interior, jamais digam
uma palavra sem recolher-se, jamais se lancem à ação sem recolher-se... Ponham
em prática essa paz interior, ao menos tentem um pouco e continuem a se
exercitar até que isso se torne um hábito em vocês...
Pensamento da artista, musicista e iogue francesa Mirra Alfassa (1878-1973),
que formulou os princípios de uma educação integral, vivenciando e descrevendo
processos que levem a uma consciência celular para supramentalização integral
do ser.
IDILIO - [...] Aqui na Inglaterra, nosso bacurau é apenas um migrante de
verão, um visitante dos pântanos enquanto os insetos abundam; e nós o escutamos ansiosamente no clima quente de maio. Ele vem até nós da África do Sul, onde passa o inverno
entre os zulus, ou melhor, escapa totalmente do frio do inverno no hemisfério
oposto. Pois ele deve ter insetos, insetos voadores nas asas, e
muitos deles. Damos as boas-vindas ao seu primeiro barulho entre os
pinheiros e samambaias como um sinal do verão; pois ele é um pássaro prudente e raramente comete erros,
conhecendo bem as marcas do tempo [...] Poucas aves
britânicas, de fato, mostram maior e mais próxima adaptação a condições
especiais do que nossos sonhadores night-jars, essenciais vendedores de insetos
do crepúsculo em planaltos abertos e sem árvores. Seus olhos grandes e misteriosos, suas bocas
escancaradas, sua franja esticada de cerdas, sua delicada plumagem de coruja,
seu vôo rápido e silencioso, seus movimentos ágeis, seu grito misterioso, sua
curiosa natureza apaixonada - tudo os marca como maravilhosamente variantes noturnas modificadas no tipo geral dos
andorinhões e trogons. [...] O ano costumava começar em março. Isso era simples e natural - deixá-lo começar seu curso
com o primeiro sopro mais quente do retorno da primavera. Começa agora em janeiro – o que não tem nada que
recomende. Não tenho certeza se a Natureza não nos mostra que realmente
começa no dia primeiro de outubro. "Outubro!" você chora, “quando tudo está mudando e morrendo! quando as árvores perdem suas folhas, quando as
trepadeiras ficam vermelhas, quando os cantores de verão abandonam nossas
florestas, quando as flores escasseiam no campo ou na sebe! Que promessa então da primavera? Que sinais alegres de um começo?” Mesmo assim, as coisas parecem de relance superficial. O outono, você pensaria, é a estação da decadência, da
morte, da dissolução, o fim de todas as coisas, sem esperança ou símbolo de
rejuvenescimento. No entanto, olhe um pouco mais de perto enquanto caminha
pelas alamedas, entre as samambaias douradas, mais gloriosas à medida que
desaparecem, e logo verá que o ciclo da vida do ano começa muito mais
verdadeiramente em outubro do que em qualquer outra data na mudança de doze
meses. você pode corrigi-lo facilmente. [...]. Trechos extraídos da obra Moorland Idylls (Chatto & Windus, 1896), do
escritor canadense Grant Allen (1848-1899).
DOIS POEMAS - I - Embora como o andarilho, \ O sol
se pôs, \ A escuridão está sobre mim, \ Meu descanso é uma pedra; \ No entanto, em meus sonhos eu estaria mais perto, meu
Deus, de Ti. II - Ele envia o sol, ele envia a chuva, \ -
Ambos são necessários para a flor; \ E alegrias e lágrimas são enviadas \ Para dar à alma
alimento adequado. \ Como vem a mim ou nuvem ou sol, \ Pai! seja feita a tua vontade, não a
minha. Poemas da escritora inglesa Sarah
Flower Adams (1805-1848), autora da obra Vivia Perpetua, um poema alegórico dramático
que retrata uma jovem esposa que se recusa a se submeter ao controle masculino
e renunciar às suas crenças cristãs, sendo, por isso, é condenada à morte, uma
denúncia sobre um conflito religioso, defendendo o livre pensamento, a
autonomia espiritual e intelectual feminina.
A PRISÃO DE CHANTAL DO BALCÃO DE GENET – A atriz Nilda Maria Toniolo Quadro de Barros foi presa
durante uma apresentação da peça teatral o Balcão, do controverso escritor e
dramaturgo francês Jean Genet (1910-1986), na temporada brasileira de
1969, encenada pelo diretor Victor Garcia. A peça estreou em dezembro de 1969 e
ficou em cartaz até 16 de agosto de 1971. Porém, em 5 de maio de 1970, a atriz
Nilda Maria, que interpretava a personagem Chantal, desapareceu. No segundo ato
da peça foi anunciado que a revolucionária Chantal havia sido presa e incomunicável,
e que sua cena seria suspensa do espetáculo até a sua libertação. O autor da
peça ao chegar ao Brasil procurou influir na liberação da atriz. Gaucha de
Santa Maria e nascida em 1935, a atriz começou sua carreira artística como programadora
musical da Rádio Santamariense, no Rio Grande do Sul. A partir de 1954, ela
passou a integrar um grupo de teatro amador em Porto Alegre, se mudando
posteriormente para São Paulo, onde passa a atuar no Teatro Brasileiro de
Comedia (TBC), no Teatro de Arena e no Oficina. Com Ruth Escobar criou o Teatro
Popular Nacional que se apresentava em praças públicas. Ao participar da
audaciosa montagem de “O Balcão”, em maio de 1970, ela foi presa e passou seis
meses no Departamento da Ordem Política Social (DOPS). No cinema ela atuou no
filme Grande Sertão:Veredas, de Geraldo Santos Pereira e na Televisão
participou da novela “Vila do Arco”, em 1975, escrita por Sérgio Jockyman, com
direção de Luiz Gallon, baseada na inspiradora obra de Machado de Assis. Hoje
aposentada de sua trajetória que durou de 1962-2010, participando de trabalhos
como Quarto de Despejo (1961), Os últimos (1968), Uma violinista no telhado
(1971;72), Como somos (1972), todas no teatro, além de Onde a cruz está marcada
(1975), Vila do Arco (1975), The Star (1979) e Eu e as coisas (1981), na
televisão. Veja mais aqui.