quinta-feira, março 07, 2013

RUTH RENDELL, KLEE, ELIZABETH CARTER, TAYEB SALIH, DUCOMMUN & TALES DE MILETO


A ARTE DE PAUL KLEE – Em Münchenbuchsee de pais melômanos aprendeu do violino a música dos desenhos nos cadernos de Berna, as caricaturas promissoras fizeram com que saisse para brincar como quem leva a linha para passear. Viu o tempo passar observando o aquário, estudando o sistema circulatório, sem se deixar levar pela recusa de Munique, envolvido entre óperas, literatura e teatro. As aventuras seguiram ao conhecer Lili, uma amante enfeitiçada, notas e acordes, e saiu como se a morte fizesse cócegas com sua foice na viagem à Itália dos grandes mestres: Vivo com os mortos e os que vão nascer. O retorno e Dois homens se encontram, cada um pensando que o outro tem posição superior. Logo foi à Paris do Impressionismo e o retorno com o Retrato de Meu Pai e as criaturas grotescas das Invenções, com toda atmosfera infantil na pesquisa de forma e cor. Voltava para Munique e a Secessão de Berlim, era mais um cavaleiro azul e tinha o propósito de fazer ainda mais um grande esforço no campo das cores, com a experiência dadaísta e a Tunísia quando a cor tomou posse: A cor e eu somos um. Deu-se então a Vista de Kairouan, as litografias Morte da Ideia (1915), o escriturário da Guerra com Ab Ovo, Aviso dos navios, O Bávaro Don Giovanni, Arte Gráfica - o Credo Criativo, Angelus novuse e Senecio, a Bauhaus com os quadrados mágicos, o Arlequim de Goldoni, o equilíbrio instável e ser poeta experimentando o romantismo das abstrações, com as notações musicais, tudo registrado n‘O diário: Eu também aprovo estas competições de forças se o resultado for uma façanha. Quantas acrobacias, muitas faces, todas as máscaras: o derraeiro discernimento, o nascimento das coisas e as palestras e mostras dos Quatro Azuis na festa dos surrealistas, o Egito, a casa vasculhada e o auto-retrato Riscado da Lista, o pontilhismo de Ad Parnassum e a construtivista Teoria da Forma. A autoinvenção: eu sou o meu estilo – linha, cor e forma. Não fosse a esclerodermia e não conseguir a cidadania suíça, mais faria por telas, estopas, musselinas, linhos, gazes, papeis de todo tipo, metais, tecidos, carimbos, vernizes, óleos no meio de um humor seco e ânimos variadíssimos, o ensimesmamento. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

 


DITOS & DESDITOS - As guerras, por mais frequentes e destrutivas que sejam, nunca foram capazes de matar inteiramente o sentido intelectual e moral que eleva o homem acima da besta... Pensamento do jornalista Prêmio Nobel e ativista suíço Élie Ducommun (1833-1906)

 

ALGUÉM FALOU: Quero tomar à força a parte que me cabe na vida, quero dar abundantemente, quero que o amor flua do meu coração, amadureça e dê frutos. Há muitos horizontes que devem ser visitados, frutas que devem ser colhidas, livros lidos e páginas brancas nos pergaminhos da vida para serem escritas com frases vivas em uma caligrafia ousada. Pensamento do escritor sudanês Tayeb Salih (1929-2009). Veja mais aqui.

 

JULGAMENTO DE PEDRA - [...] alguns dizem que a vida é o que importa, mas eu prefiro ler [...] A alfabetização corre em nossas veias como o sangue. Ele entra em todas as outras frases. É quase impossível manter uma conversa real, em oposição a um intercâmbio de instruções e aquiescências, em que não se faz referência à palavra impressa ou em que não ocorrem as implicações de algo lido. [...] As admoestações daqueles que raramente protestam são mais eficazes do que as ordens dos rabugentos. [...]. Trechos extraídos da obra A Judgement in Stone ( Vintage, 2000), da escritora britânica Ruth Rendell (Ruth Barbara Grasemann – 1930-2015), escrevia com o pseudônimo Barbara Vine. Veja mais aqui.

 

A NIGHT-PIECE - Enquanto a noite em sombra solene investe o pólo, \ E a Reflexão calma acalma a alma pensativa; \ Enquanto a Razão imperturbável afirma seu domínio, \ E as cores enganosas da Vida desaparecem: \ A ti! presença onisciente! eu dedico \ Este intervalo pacífico de pensamento sóbrio.\ Aqui todas as minhas melhores faculdades confinam, \ E seja esta hora de silêncio sagrado tua. \ Se pelas cenas ilusórias do dia são enganados, \ Minha alma errante do caminho da Virtude se desviou: \ Enganado pelo exemplo, ou pela paixão aquecida, \ Algum falso deleite meu senso vertiginoso encantou, \ Meus pensamentos mais calmos a escolha miserável repreende, \ E minhas melhores esperanças estão centradas em teu amor. \ Privado disso, a vida pode proporcionar uma alegria! \ Seu máximo ostenta uma palavra vã e sem sentido. \ Mas ah! quantas vezes minhas paixões sem lei vagueiam, \ E quebre esses terríveis preceitos que eu aprovo! \ Persiga o impulso fatal que eu abomino, \ E violar a Virtude que eu adoro! \ Freqüentemente, quando o guardião do seu melhor espírito cuida \ Aqueceu minha alma querida para evitar a armadilha tentadora, \ Meu teimoso Will sua gentil ajuda repreenda. Poema da escritora britânica Elizabeth Carter (1717-1806);

 

Imagem: The Death of Sócrates, de Jacques-Louis David.

Dado o desenvolvimento lógico da filosofia grega, valor central da sua civilização, apresenta-se fácil e natural a divisão em períodos da história do pensamento grego.

O caráter fundamental do pensamento grego está na solução dualista do problema metafísico-teológico, isto é, na solução das relações entre a realidade empírica e o Absoluto que a explique, entre o mundo e Deus, em que Deus e mundo ficam separados um do outro. Este dualismo assumo o sentido da conclusão última do desenvolvimento especulativo grego, até que hoube desenvolvimento especulativo, a saber, até Aristóteles. Conseqüência desse dualismo é o irracionalismo, que fatalmente se introduz na serena concpção grega do mundo e da vida. O mundo real do devir e dos indivíduos depende do principio eterno da matéria obscura, que tende sim para Deus como o imperfeito para o perfeito e assimila, em parte, a racionalidade dele, mas jamais pode chegar até ele, porque não vem dele. Daí o conceito do Eterno Retorno, que domina todo o pensamento grego: o rodar perpetuo do devir em volta de “O que não pode devir”, o repetir-se eterno de tudo, coisas e eventos. Daí o Fado e o Destino, isto é, a necessidade irracional, que impende férrea e obscura sobre todas as coisas, divindade suprema e terrível, de que dependem, enfim, os próprios deuses: como os homens, eles vêm-a-ser, sofrem e terminam também, no encerrar-se dos ciclos do retorno eterno. A conseqüência desse irracionalismo só pode ser o pessimismo. Um pessimismo desesperado, pois o grego conhecia a necessidade racional do absoluto racional, mas sabia, ao mesmo tempo, que esse absoluto é estranho ao mundo e à humanidade, que ele não criou, não conhece e não governa. Tal pessimismo é imanente na concepção grega da vida, juntamente e não obstante o seu potente arremesso para a serenidade e o gozo, e tornar-se-á mais vivo e consciente com a experiência e a madureza do grande desenvolvimento da cultura grega. Do começo até o fim volta, na literatura clássica, o motivo da tragicidade, da vaidade, da monotonia da vida. “Entre todos os seres que respiram e se movimentam sobre a terra, nenhum é mais infeliz do que o homem”, está escrito já na Ilíada de Homero. E ainda: “As gerações dos mortais desaparecem com as folhas”. O elemento catastrófico da tragédia grega não depende da vontade transcendente e racional de Deus, ou da vontade humana, mas do arbítrio cego do Fado, do decreto férreo do Destino. E, na língua grega, o vocábulo que indica o trabalho é o mesmo que indica a fadiga e o sofrimento. Qual é o remédio a este mal da existência? Voltar-se para o instante fugidio e procurar saborear-lhe a doçura. Ressoa em toda literatura grega o conselho de gozar o presente. A embriaguez do prazer é, porem, envenenada pelo pesadelo da morte, única coisa certa no fluxo incessante dos acontecimentos, ultima meta da corrida veloz. E depois da morte ou o Hades, lugar de trevas e de silencio, onde os mortos vagueiam exangues e inconscientes, invejando o ultimo dos mortais sobre a terra, que goza o ar e a luz, ou o retorno eterno, o renascer ainda para sofrer e morrer de novo, o infindável ciclo dos renascimentos. Os deuses gregos, olímpicos e homéricos, não podem garantir ao homem afadigado a paz eterna. O grego recorrerá, então, ás divindades dos Mistérios, que – através da paixão e da morte – teriam conquistado a paz eterna, e podem compartilhá-la com quem a elas se assemelha pelo rito eficaz. Mas o sábio, o filosofo, após séculos de alta especulação e critica religiosa, não podia acomodar-se sem mais no mito. De modo que – reconhecida como vã também a gloria – ficará enfim, unicamente, o ascetismo, como suprema sabedoria da vida, a solidão interior e a indiferença heróica, a resignação e a renuncia: sustine et abstine.

Esse dualismo grego, que deverá em seguida finalizar logicamente na grande solução teísta e criacionista do problema teológico, realiza-se mediante a índole feliz, característica do gênio grego. As característica do gênio grego podem-se compendiar nalguns traços fundamentais. Antes de tudo, racionalismo, intelectualismo, quer dizer, consciência do valor supremo do conhecimento racional para dominar a realidade, construir a filosofia, orientar a vida. O racionalismo grego, porem, não é limitado, abstrato e sim integrado e fundamentado na experiência sensível numa síntese harmônica de inteligível e sensível, a qual tem uma grande significativa expressão no gênio grego e na obra artística dos gregos. A arte foi inspiração que tornou intuitivo o inteligível, como a filosofia tornou racional o sensível e, entre os gregos, ambas tiveram o mesmo objeto: o imutável, o universal, a essência, a idéia, a forma das coisas.

Assim, entre os gregos, o teorético levou vantagem sobre o prático, a contemplação sobre a ação, o intelecto sobre a vontade, as virtudes dianoéticas sobre as éticas; estas não foram anuladas, porem, mas subordinadas às primeiras. Segundo os gregos, o ideal da vida, a mais alta realização da vida humana, consiste na ciência, na filosofia e na arte. Os gregos foram um povo superior culturalmente (toda a filosofia e arte do mundo clássico e cristão e, em parte, do mundo moderno, dependem da Grécia), mas foram politicamente um povo pequeno, de modo que se compreende, como, no mundo grego, a filosofia nasceu não das exigências praticas e sim teoricas, não para resolver o problema da vida, mas o da realidade: a filosofia grega é, sobretudo, metafísica. Entretanto, a valorização grega da atividade teorética, cognoscitiva, do espírito não isolou o espírito em si mesmo, porquanto a atividade cognoscitiva era naturalmente considerada como instrumento apto e indispensável para atingir a realidade, o ser, de que os gregos tiveram igualmente fundada certeza como da razão: o racionalismo é alicerçado sobre o realismo. É um realismo, todavia, que não se fecha entre os limites da experiência do mundo, mas transcende a experiência e sobre até o Absoluto, pela profunda exigência realista de achar uma base que torne inteligível e explique a própria experiência. Em coerência com o racionalismo e com o realismo, o pensamento grego foi fundamentalmente otimista e enaltecedor da natureza do mundo e da vida, finalizando, porém, numa atitude pessimista e numa praxe ascética, devido, no fundo, ao dualismo anteriormente lembrado. Daí, no mundo helênico e helenista, o afirmar-se inicial, a fortuna crescente e o triunfo final dos mistérios orfico-dionisiacos, que encarnavam precisamente uma concepção asceitivo-pessimista do mundo e da vida, em conseqüência de uma maldição e queda originária. Pelo que foi dito, resulta imediatamente uma outra característica fundamental do gênio grego, a harmonia entre sentido e intelecto, conhecimento e ser, mundo e Deus, teoria e pratica, até uma síntese trágica de otimismo e pessimismo. E a filosofia grega foi constituindo, num igualmente harmônico desenvolvimento, essa síntese harmônica de elementos. Esse desenvolvimento foi vigiado, peneirado e afinado por uma critica livre, que não gerou misticismo, diletantismo ou ceticismo – pelo menos na época área da filosofia grega -, mas deu origem à mais límpida e sólida construção racional que já houve na história do pensamento humano. Entre as raças gregas, a cultura e a filosofia gregas são devidas sobretudo aos jônios, que souberam especialmente e em alto grau, exprimir o gênio grego. Jônios foram os primeiros filósofos gregos. Surgiram eles nas florescentes colônias gregas do litoral da Ásia Menor, a Jônia, e, em seguida, da Itália meridional, a Magna Grécia. Para aí se deslocou o centro da vida intelectual grega, depois que os persas subjugaram a Jonia (545 a.C.), e destruiram Mileto (499 a.C._Jonios foram também os atenienses, os mais dotados dos jonios. Após as guerras contra os persas, no tempo de Péricles, Atenas tornou-se o centro espiritual, a capital intelectual e moral da Grécia – bem como o centro político democrático do império marítimo e comercial grego.

No primeiro período, identificado como naturalista pré-socratico, o interesse filosófico é levado, naturalmente, para o mundo exterior, material, e aí é procurado o principio metafísico das coisas. através da crise sofista e da critica socrática, que puseram em foco os valores humanos e espirituais, determina-se a idade áurea da filosofia grega, se gundo período, denominado de sistemático, ou antropológico: porquanto, nesse período, se concretizam os máximos sistemas do pensamento de Platão e de Aristóteles, em que culmina o pensamento grego.

Depois de Aristóteles, o interesse filosófico do pensamento grego é voltado para o problema moral – cuja solução pressupõe logicamente a solução dos problemas metafísicos: daí ser chamado ético, o terceiro período.

Não se parte, porém da grande metafísica do período precedente, mas retorna-se à metafísica pré-socratica naturalista, tendo lugar um regresso especulativo evidente, que caracteriza o pensamento da idade helenista, juntamente com o seu interesse pelos problemas morais e religiosos. Essa mudança metafísica talvez fosse devida ao fato de que aquela grande sistematização racionalista não estava em condições de resolver o problema da vida, o qual angustia os pensadores desse período, estóicos e epicurus. E visto que a filosofia em geral, a razão, se mostravam incapazes de dar uma solução adequada a esse imprescindível problema humano, o pensamento grego envida todos os esforços, faz um esforço supremo para resolvê-lo> tenta superar, transpor o clássico dualismo grego para o panteísmo neoplatonico e integrar a filosofia, que tinha criticamente demolido a religião positiva grega da polis, com as religiões positivas orientais, misteriosóficas. Daí o nome de período religioso, dado à quarta etapa – e ultima – do pensamento grego, em que domina o neoplatonismo e, nesse, a figura de Plotino.

Com o neoplatonismo finda, mesmo oficialmente, o pensamento grego – mais ou menos no tempo da queda do império romano após doze séculos de vida – mandando Justiniano, imperador do Oriente, fechar a escola neoplatonica de Atenas (529 d.C.). Entretanto, os valores eternos de verdade, descobertos por esta tradição filosófica, que é a maior da humanidade, não podiam perecer: serão eles conservados e valorizados no pensamento cristão, bem como os grandes valores práticos, jurídicos, descobertos pela civilização romana.

FONTES:
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Atica, 2002.
PADOVANI, Umberto; CASTAGNOLA, Luis. Historia da Filosofia. São Paulo: Melhoramentos, 1978.
PESSANHA, José Américo Motta (Org). Os pré-socraticos. São Paulo: Abril, 1978.



Não é o homem, mas a água, a realidade das coisas”.

TALES DE MILETO: O PERIODO NATURALISTA – OS JÔNIOS
O primeiro período do pensamento grego toma a denominação substancial de período naturalista, porque a nascente especulação dos filósofos é instintivamente voltada para o mundo exterior, julgando-se encontrar ai também o principio unitário de todas as coisas;e toma, outrossim, a denominação cronológica de pré-socratico, porque precede Sócrates e os sofistas, que marcam uma mudança e um desenvolvimento e, por conseguinte, o começo de um novo período na história do pensamento grego. Esse primeiro período tem inicio no alvor do século VI a. C., e termina dois séculos depois, mais ou menos, nos fins do século V. surge e floresce fora da Grécia propriamente dita, nas prosperas colônias gregas da Ásia Menor, do Mar Egeu, a Jônia, e da Itália meriodional, da Sicília, favorecido sem duvida na sua obra critica e especulativa pelas liberdades democráticas e pelo bem-estar econômico.
OS JÔNIOS – A primeira tendência propriamente filosófica do pensamento grego é representada pela assim chamada escola jônica, que é também a primeira do período naturalista, preocupando-se os seus expoentes com achar a substancia única, a causa, o principio do mundo natural vário, múltiplo e mutável. Essa escola floresceu precisamente em Mileto, colônia grega do litoral da Ásia Menor, durante todo o século VI, até a destruição da cidade pelos persas no ano de 494 a.C., prolongando-se porem ainda pelo séc. V. os jonios julgaram encontrar a substancia última das coisas em uma matéria única; e pensaram que nessa matéria fosse imanente uma força ativa de cuja ação derivariam precisamente a variedade, a multiplicidade, a sucessão dos fenômenos na matéria uma. Daí ser chama esta doutrina de hilozoísmo, ou seja, matéria animada. Por esta razão, assinala Marilena Chauí que os historiadores da Filosofia dizem que ela possui data e local de nascimento: final do século VII e inicio do século VI antes de Cristo., nas colônias gregas da Ásia Menor, particularmente as que formavam uma região denominada Jônia, na cidade de Mileto. E o primeiro filosofo foi Tales de Mileto. Além disso, a Filosofia também possui um conteúdo preciso ao nascer, é a cosmologia que é composta de duas palavras: cosmo, que significa mundo ordenado e organizado, e logia, que vem de logos, que significa pensamento racional, discurso racional, conhecimento. Assim a Filosofia nasce como conhecimento racional da ordem do mundo ou da Natureza, donde, cosmologia.
TALES DE MILETO – Procurando reduzir a multiplicidade percebida à unidade exigida pela razão, os pensadores de Mileto propuseram sucessivas versões de uma física e de uma cosmologia constituídas em termos qualitativos: as qualidades sensíveis, como frio, quente, leve, pesado, eram entendidas como realidades em si. O universo apresentava-se assim, como um conjunto ou um campo no qual se contrapunham pares opostos. Segundo a tradição que remonta aos próprios gregos antigos, o primeiro filosofo teria sido Tales de Mileto. Ascendente dos fenícios, Tales era natural da Jônia, na Ásia Menor, cidade famosa pelo florescente comercio marítimo, pátria também de Anaximandro e Anaxímenes. Ele apareceu pelo ano de 585 a.C., e, segundo a tradição, é o primeiro físico grego ou investigador das coisas da natureza como um todo. De suas idéias, no entanto, pouco se conhece; nem há certeza de que tenha escrito um livro. Também não se conhecem fragmentos seus. Sua doutrina só foi transmitida pelos doxógrafos. Ele viveu no período compreendido entre o final do século VII e meados do séc. VI antes de Cristo. Famoso como matemático, alguns historiadores consideram que sua colocação pelos antigos entre os sete sábios da Grécia, devendo-se, principalmente, pela sua atuação política: teria tentado unir as cidades-Estados da Ásia Menor numa confederação no intuito de fortalecer o mundo helênico diante das ameaças de invasões de povos orientais. Para a história da filosofia, a importância de Tales advem sobretudo de ter afirmado que a água era a origem de todas as coisas. a água seria a physis que, no vocabulário da época, abrangia tanto a acepção de fonte originaria quando a de processo de surgimento e de desenvolvimento, correspondendo perfeitamente a gênese. Segundo a interpretação dada por Aristóteles séculos mais tarde, teria tudo inicio com Tales a explicação do universo através da causa material. Historiadores modernos, porem rejeitam essa interpretação que aristoteliza Tales, atribuindo-lhe preocupação de cunho metafísico. Assim, há quem afirme que Tales foi importante apenas como introdutor na Grécia de noções da matemática oriental, que ele mesmo desenvolveu e aperfeiçoou, e de mitos comogonicos, particularmente egípcios, que laicizou, dando-lhes sustentação racional. Noutra interpretação, o surgir da água significatia um processo geológico, sem acepção metafísica: tudo estaria originariamente encoberto pela água; sua evaporação permitiu que as coisas aparecessem. Por outro lado, alguns interpretes, consideram que outra sentença atribuída a Tales – tudo está cheio de deuses – representa não um retorno a concepções míticas, mas simplesmente a idéia de que o universo é dotado de animação, de que a matéria é viva, o hilozoismo. Um dos aspectos fundamentais da mentalidade cientifico-filosofica inaugurada por Tales consistia na possibilidade de reformulação e correção das teses propostas. A estabilidade dos mitos arcaicos e à estagnação da ciência oriental, os gregos, a partir de Tales, propõem uma nova visão-de-mundo cuja base racional fica evidenciada na medida mesma em que ela é capaz de progredir, ser repensada e substituída. Para Hegel, a proposição de Tales de que a água é o absoluto ou, como diziam os antigos, o princípio, é filosófico, e com ela a Filosofia começa, porque através dela chega à consciência de que o um é a essência, o verdadeiro, o único que é em si e para si. O primeiro estado de coisas que reside no que foi dito é o fato de que a existência singular não possui autonomia alguma, não é nada de verdadeiro em si e para si, apenas algo acidental, uma modificação. Mas o estado de coisas afirmativo é que do um emerge todo o resto, que o um permanece nisto a substancia de todo o resto, sendo unicamente uma determinação casual e exterior pela qual a existência singular se torna; também a situação de que toda existência singular é passageira, isto é, que perde a forma do singular e novamente torna-se universal, água. Isto é o elemento filosófico , que o um seja o verdadeiro.
Para Nietzsche, o Aristóteles fala com razão: aquilo que Tales e Anaxágoras sabem será chamado de insólito, assombroso, divino, mas inútil, porque eles não se importavam com os bens humanos. Ao escolher e discriminar assim o insólito, assombroso, difícil, divino, a filosofia marca o limite que a separa da ciência, do mesmo modo que, ao preferir o inútil, marca o limite que a separa da prudência. A ciência, sem essa seleção, sem esse refinamento de gosto, precipita-se sobre tudo o que é possível saber, na cega avidez de querer conhecer a qualquer preço; enquanto o pensar filosófico está sempre no rastro das coisas dignas de serem sabidas, dos conhecimentos importantes e grandes.
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FONTES:
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Atica, 2002.
PADOVANI, Umberto; CASTAGNOLA, Luis. Historia da Filosofia. São Paulo: Melhoramentos, 1978.
PESSANHA, José Américo Motta (Org). Os pré-socraticos. São Paulo: Abril, 1978.
SOUZA, José Cavalcante. Os pré-socrático. São Paulo: Abril, 1978. 


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