domingo, novembro 13, 2022

ANNA GREEN, KRISTEVA, SEXTON, BENJAMIN. BARNBROOK. JOANA LIBERAL & ESTÉVÃO QUEIROGA

 

Ao som do álbum Ciranda das Mestras (2015-2021), da pianista, compositora e professora da UFRGS, Catarina Domenici.

 

TRÍPTICO DQP: - Fábula de truz... - O prólogo e nenhuma pausa para o que saiba de queda ou excelência, só a chuva persistente e a cidade submersa em sono profundo: a perdição do paraíso distante que se esquivara pelos sonhos evadidos. Agora só os pesadelos rutilantes daqueles soberbos que nunca souberam perder com seus detritos perfumados difícil de digerir. Era como se ao meu ouvido Anna Katharine Green: Palavras podem ser ditas em um momento que não serão esquecidas em anos. A culpa não tem o direito de lucrar com a generosidade dos inocentes. De nada adiantava no barulho da grande indústria do desperdício subestimando o que esperava do chamado jamais chancelado, porque é tudo muito distante e desanimadores passantes com seus noturnos afetos desviantes, enquanto escapo peregrino da destruição e era como se um abismo me engolisse pelas subterrâneas escuridões de inferno disfarçado de futilidades destroçadas, só mosca na sopa, calo no sapato, pereba na perna e a violência implícita nos olhos de algodão forjado de louvores falsos, incestos, façanhas delirantes, desastres tempestuosos, surtos ameaçadores, reinvenções inúteis e ataques de pânicos pelas exóticas extravagâncias de biltres desertores comovidos, um enfadonho prato cheio de choradeira, desespero e baixaria, tudo malcheiroso e daninho. Era o trunfo da dietrologia caricatural, de nenhum hiato no acesso da saturação e sem o discernimento às escolhas, porque Walter Benjamin na sua solidão: Não se deve dizer que o passado clareia o presente ou que o presente ilumina o passado. É em uma imagem, que o outrora encontra o agora em um relâmpago, que forma uma constelação. E ainda não é outro dia como desde sempre. Reconstituo o tempo e um outro mundo talvez só depois da morte e era o meu retrato no mundo comum e sem graça: sonho amanhã porque algo acontecerá...

 


Florescer esperançável... - Imagem: arte da fotógrafa, arte-educadora e artista visual Tatiana Altberg. - Luto lutas e é cada um por si e Deus que segure as pontas. Da janela o lixo escorre pelas valetas e esgotos com mentiras, heroína, mercúrio, incinerações; as paranoias com a alternância de fatos alucinantes e o derretimento de reputações, soropositivos, paraplégicos, psicóticos, obesos, e indigentes nos muros quedavam com a insolência dos gestos, os plenos pecados diluídos na luxúria. Essa a convivência desmantelada pelas arrastadas tensões de invasores alheios obcecados com sua pele de branquitude bastarda aos controversos acenos sórdidos nas travessias insólitas com seus tumultos tão decadentes para habitar o mundo, mesmo que ouça Jonathan Barnbrook me dizer: Nós estamos criando novas formas para a humanidade se expressar melhor. Será? Sei do olhar do outro e os meus pelas paisagens humanas, a busca incessante por não sei o quê, autorretratos: estereótipos e ostracismo. Tudo leva ao genocídio silencioso – o silêncio é cúmplice da violência, enquanto repetem alhures que tudo é interdependente e indivisível. E mais voo mais que A partida e o norte de Estévão Queiroga: O caminho muda e ele muda o caminhante É um caminho incerto, / não um caminho errado / Eu, caminhante, quero o trajeto terminado, / Mas no caminho, mais importa o durante... É duro caminhar sozinho, exilado...

 


Pelas ruas da minha janela... - Imagem: Água na boca, da artista visual Joana Liberal. - As águas dos rios extrapolaram as margens e lavaram meus pés no meio da rua. Das ondas ela emergiu remanescente atlante, ninfa oceânica, Vênus enfeitiçante. Noutro idioma ela me falou ter se tornado gueixa para que eu fosse o marinheiro de sua odisseia e seu anjo da guarda para salvá-la ao ser amaldiçoada por abjurar a fé de seus antepassados. Antes fosse, o que seria uma grande farsa de alcoviteiros inescrupulosos que a aprisionaram numa arapuca por quase um milênio e não foi vendida ao príncipe Yamadori outra vez por causa da minha intervenção na sua quase imolação e eu não sabia de nada disso. Talvez ela fosse louca e tão bela quanto o raiar do dia para me mostrar na pedra as formas opulentas das Vênus paleolíticas e a de Bassempony para decifrar mais de 70 mil anos de grafias abstratas com linhas triangulares que se entrecruzavam e eu me perdia no seu olhar como nos paralelepípedos da Marianne de Delacroix, contando uma das histórias da catedral de Notre Dame nos deslumbres dos vitrais da arquitetura gótica e o mapa de Eratosthenes ao colo da nudez realçada por robustas coxas voluptuosas e seios fartos debruçados para que eu enlouquecesse pela maior tesão de tê-la espalmada ao meu jugo priápico. Como se adivinhasse o meu tormento fitou-me tal Julia Kristeva: Cada obra é apenas a tecelagem de outras obras já vistas. Tão inocente parecia, esplendidamente trágica para que eu amasse aquela estranha como nunca e ela mais pressentia Anne Sexton: Como já foi dito: O amor e a tosse não podem ser disfarçados, Nem mesmo a pequena tosse. Nem mesmo o pequeno amor. Viva ou morra, mas não envenene tudo. A ventania serviu para mais me atordoar e ela sugeriu para que eu me suicidasse quando sempre tive motivos demais para não cometer nada disso, era como se me jogasse para ela e permitisse, assim foi, abrasados e mútuos. Às pressas, um passo adiante a buscar de esconderijo propício e demos de cara com Bispo do Rosário num buraco do metrô e ela foi audaciosa pelo cenário de sucata na demanda do Santo Graal. O que vai acontecer para preencher o vazio e o que fazer, quem sabe. Amanhã não será apenas outro dia e a ressurreição, tomara. Só enxergo seus lábios insinuantes, água na boca. E nela serei mais que inteiro além dos tempos de seu corpo sedutor, assim foi... noitedias. Até mais ver.

 


[...] a dimensão estética tem a ver com a corporeidade: o corpo que vê tudo que olha, que ouve tudo o que escuta, que sente tudo o que toca; o corpo que capta o mundo com sua presença, que evoca o passado e projeta o futuro no aqui e agora, que pensa, sonha, deseja e se emociona; o corpo que transforma e se transforma. [...].

Trecho extraído da obra O ensino e a aprendizagem da linguagem teatral na Educação de Jovens e Adultos (UFPB, 2003 – Dissertação de Mestrado), da professora e pesquisadora Maria das Graças Vital de Melo. Veja mais Educação & Livroterapia aqui e aqui.