quarta-feira, novembro 16, 2011

JOÃO CABRAL, BELLAMY, MAGTYMGULY PYRAGY, ALCIONE ARAÚJO, GOYA & OS PODEROSOS DE HOJE

 


A arte da cantora, bailarina e atriz alemã Ute Lemper. Veja mais aqui.

 


NUNCA MAIS ELA APARECEU – Homenagem à - Jana Moroni Barroso (1948-1974) – Quem era aquela linda moça, tão linda de nunca esquecer, ah, era Jana, uma cearense escoteira que foi de lobinha à bandeirante, mudando-se pro Rio para cursar biologia e se envolvendo com a juventude política no período da ditadura militar. Foi ali que a vi, meu coração aos reboliços. Logo soube que foi embora com uma carta e as razões políticas de A mãe de Gorki. Estava com vinte e um anos de idade e agora era Cristina no Pará, a professora de Metade, no Araguaia, e a flor da subversão na boniteza. Afora caça e plantio, o que mais poderia fazer uma belezura daquelas causando recorrentes emoções no meu coração. Pouco tempo depois, soube que foi vista pela última vez, no começo de janeiro de 1974, no Araguaia, ao lado da companheira Célia. A última carta enviada por ela para os familiares era de fevereiro de 1972. Detalhes me deixaram a par: voltando da cabeceira do Caiano, foi presa na Grota da Sônia, na região do Bico do Papagaio. Estava desarmada, mesmo assim um soldado disparou contra ela, vindo a falecer. Ainda tiraram uma fotografia e se foram, foi deixada lá, insepulta. Mas há quem diga que ela foi capturada, jogada dentro de um saco de uma caixa para uma jaula e levaram-na para Xambioá ou Bacaba, não se sabe ao certo, roupa rasgada, só de maiozinho e blusinha. Depois teria sido amarrada nua e colocada dentro de um saco que içado pelo helicóptero, foi jogada num cemitério clandestino, nas proximidades de São Domingos do Araguaia. Soube mais no Relatório Arroyo, que ela havia desaparecido no dia 2 de fevereiro de 1974, em uma Fazenda em Araguaia. Justo no dia que enviou a carta, ao que parece. O que sabe de mesmo é que ela morreu nas mãos dos militares, foi o que apurou o registro na obra Operação Araguaia: os arquivos secretos da guerrilha (Geração, 2005), dos jornalistas Taís Morais e Eumano Silva. Outras informações foram recolhidas no livro A ditadura escancarada (Cia. das Letras, 2002), do jornalista Elio Gaspari, mas oficialmente é dada como desaparecida política. Seus restos mortais jamais foram encontrados. Foi retratada no premiado filme Araguaya - a conspiração do silêncio (2004), escrito e dirigido por Ronaldo Duque. Também outro filme Araguaia: Campo Sagrado (2011), dirigido por Evandro Medeiros, conta sua história, bem como um outro longa Araguaia, Presente (2018), dirigido por André Queiroz e Arthur Moura, que conta com a participação do irmão dela, o ator Breno Moroni: O cinema é a máquina do tempo, que traz à tona os erros e acertos dos acontecimentos do passado. E o meu coração sobrecarregado de saudades. Veja mais aqui, aqui e aqui.

 


DITOS & DESDITOS - Minha definição de emoção não é nada de especial. É o que todos chamam de ‘emoção’. O que acontece é que me recuso a explorar essa coisa diretamente. O interesse do poeta não é descrever suas emoções e criar emoções, é criar outro objeto – se é poeta, um poema; e é pintor, um quadro – que provoque emoções no espectador. Mas não explorar nem descrever a própria emoção. Quando leio um poeta que só é capaz de provocar emoções correntes, como saudade, melancolia ou tristeza, essa coisa não me interessa. Ora se tenho minhas emoções, para que vou buscar emoções semelhantes numa outra coisa? Pensamento do poeta e diplomata João Cabral de Melo Neto (1920-1999). Veja mais aqui.

 

ALGUÉM FALOU: Que certeza tens de que a vida é tão longa? O que garante que as coisas se darão como dispões? Não te envergonhas de destinar para ti somente resquícios da vida e reservar para a meditação apenas a idade que já não é mais produtiva? Pensamento do tragediógrafo e filósofo estoico latino Lúcio Aneu Sêneca (4ac-65). Veja mais aqui.

 

OUTRA DITADA: A educação virou um processo de adestramento para a produção. Há uma produção cultural que está em estado de deliquescência, exangue. Então, é preciso trazer esse púbico, antes que ela se autodesqualifique completamente e vire mera reprodução da televisão. Pensamento do dramaturgo, escritor e professor Alcione Araújo (1945-2012).

 

O PROCESSO DO DR. HEIDENHOFF – [...] Mas uma coisa ela abriu seus olhos, e garantiu desde o primeiro instante de sua nova consciência, a saber, que como ela o amava, ela não poderia manter sua promessa de casar com ele. [...] Perdoar pecados, eu deveria saber, não é apagá-los. O sangue de Cristo apenas os torna vermelhos em vez de pretos. Isso os deixa registrados. Isso os deixa na memória. [...] Nenhuma garota, por mais frio que seu sangue possa fluir, pode ser pressionada contra o peito de um homem, latejando loucamente de amor por ela, e não sentir alguma agitação como consequência. Qualquer que seja o estado de seus sentimentos, há um magnetismo em tal contato que ela não pode livrar-se imediatamente. Aquele beijo levou sua relação com Henry a uma crise. Isso precipitou a necessidade de alguma decisão. Ela não podia mais segurá-lo e brincar com ele. Por aquele ataque ousado, ele ganhou uma posição vantajosa, uma certa atitude de mestre que ele nunca tinha antes. No entanto, afinal, não tenho certeza de que ela não estava apenas um pouco com medo dele e, além disso, que ela não gostava dele tanto mais por isso. [...] Ora, quando o mundo entender sobre isso, espero que dois homens ou duas mulheres, ou um homem e uma mulher, venham aqui e me digam: 'Nós brigamos e ofendemos um ao outro, ferimos nosso amigo, nossa esposa, nosso marido; lamentamos, perdoaríamos, mas não podemos, porque nos lembramos. Coloque entre nós a expiação do esquecimento, para que possamos nos amar como no passado. [...]. Trechos do Processo do Dr. Heidenhoff, do escritor estadunidense Francis Bellamy (1855-1931), autor do romance utópico Looking Backward (Dover, 1996), em que olha para trás, de 2000 a 1887, que defendia os direitos dos trabalhadores e a distribuição igualitária dos recursos econômicos. Por conta dessa obra, ele teve de fugir de Boston.

 

EM BUSCA DE... – Meu país é Etrek, meu povo é Goklen, / estou em busca de amor, / Minha alma está cheia de turbulências, / estou em busca do líder sufi para me abençoar com poder. / Estou longe dos meus pais, / Da minha pátria mãe, da íris dos meus olhos, / Perder a vida é mais fácil que a separação, / Estou à procura de um mercado para vender as minhas mercadorias. / Mammetsapa é meu irmão, / Mullah Mati é meu colega de classe, / Se Abdullah voltar, meu querido irmão, / estarei em busca da bênção do Profeta. / Há tanta dor no fundo do meu coração, / Sangue encheu meus olhos, escorrendo, O / destino não é um amigo em quem confiar, / Estou em busca da sepultura para escapar. / Sonu Dag, meu orgulho, / eu caminho no topo do seu pico, / eu sou um caçador caçando cervos da montanha, / eu estou em busca de uma cobra preta brilhante. / Magtymguly, este mundo, / trouxe tanta tristeza e dor. / Oh, minha nação turcomena! Oh, toda a humanidade! / Estou em busca de um riacho de fluxo livre e um vau para cruzar. Poema do poeta e filósofo turcomeno Magtymguly Pyragy (1724-1807).

 


Imagem: The Disaters of War, de Goya (1746-1828)

SOMBRAS DE GOYA – O maravilhoso drama do Milos Forman, Sombras de Goya (Goya´s Ghosts – Espanha/EUA, 2006), com Javier Bardem, Natalie Portman, Stellan Skarsgard e Randy Quaid, traz uma parte do genial artista espanhol, Francisco Goya, testemunhando o radicalismo da Inquisição Católica e a invasão das tropas de Napoleão Bonaparte, nos primeiros anos do século XIX.

A tragédia vivida pela belíssima Inés e sua família na última década do séc. XVIII, testemunhada pelo pintor e gravador espanhol Francisco José de Goya y Lucientes (1746-1828), também conhecido como Goya o Turbulento, tornou-se testemunha ocular da covulsão política e a degradação espanhola da época com todas as reviravoltas contraditórias e paradoxais da existência humana.

Quando flagro a lindeza da Natalie Portman, atriz que intepreta a bela Inés, fico cá comigo pensando: todos nós abominamos um ato de injustiça. Principalmente quando este ato de injustiça é cometido por altos dignitários de qualquer época, seja da medonha Inquisição Católica, da desumanidade hitleriana ou de ditadores ou fascistas, ou de poderosos que se acham acima de qualquer lei, ou ordem ou hierarquia. É sempre assim que se sentem aqueles que se acham acima de todos e que se encontram em nosso país no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, bem como gozando das hostes da elite mais canhestra e nojenta do planeta. Usando Goya: “O sono da razão produz monstros”. É preciso lembrar a esses donos do poder que quando eles cometem suas brutalidades, se acham acima de tudo e de todos, e que nunca a história nem os vencidos os trarão à tona. Chamando à consciência de quem faz o que quer e como quer (se é que podemos encontrar consciência no reino da perversidade), no amanhã haverá o crivo da história por ocorrência do verdadeiro julgamento mesmo que tardio da Justiça: os filhos os responsabilizarão e carregarão o anátema pra sempre. E veja mais aqui



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