segunda-feira, julho 11, 2022

LÍDIA JORGE, NANCY FARMER, ÉLE SEMOG, CECÍLIA MEIRELES & MANET

 

 

TRÍPTICO DQP: Eclosão do canto, memória viva!... - Ao som de Uirapuru, da pianista, compositora e musicoterapeuta Gisele Mallon, na interpretação da instrumentista Talita Passoni e pássaros do Espaço Musicoterapia, Salto –SP. - Um piado e o espanto; depois do som, um tom: silvos e assovios, trinados e gorjeios, quantos estalidos & Néstogas: o verbo canta. Tudo pulsa - fusas, mínimas e colcheias nas águas da correnteza, no vento das folhas, chuva na relva, poeira da brisa nas pedras, no desabrochar colorido das flores, nas ondas dos mares e marés, tudo respira buliçoso, seres e coisas dançam. São pisadas e passos de todas as feras e mansas nos quintais de todas as frutas e infâncias, nos braços de todas as raças e crenças, várzeas e campos, naus dos brejos, lagos e lagoas. Tudo é céu no meu solfejo para Tupã dormir. Tudo o mais é o espetáculo do amor, o sumo da existência. Não há como olvidar de nada, porque ali é como se ouvisse a escritora estadunidense Nancy Farmer segredar: As almas das pessoas são como jardins. Você não pode virar as costas para alguém porque seu jardim está cheio de ervas daninhas. Você tem que dar a ele água e muita luz do sol. É como se ouvisse tudo isso na canora expressão do Xexéu à minha janela. Toda manhazinha e ele lá como se me dissesse Sem amor estamos amputados de nossa melhor parte. A vida pode até ser mais tranquila e livre de dores quando não amamos. Mas trata-se de uma paz de cinzas. O amor não é fácil, a gente sabe disso. Para conseguir, para manter, para conservar, para renovar, é pedido da gente que exista um trabalho psíquico, que exista um trabalho mental. A pergunta é saber como a gente começou a imaginar que o amor ia ser essa coisa fácil, ao alcance de todo mundo e ao alcance de um sujeito muito tempo na vida ou várias vezes na vida. Convém lembrar: a vida nos olhos de todas as manhãs, o direito de viver e deixar viver.

 


O que é de céu senão da Terra... – Imagem: A arte do artista espanhol multimídia pós-conceitual Antoni Muntadas. - Aqui dentro eu posso tudo até o céu. Lá fora irrespirável inferno dantesco, porque do átrio da civilização saíram todos direto pra caquistocracia da esgotosfera coisonária! É vigente o poetar d’O íntimo dado (A senha) do Éle Semog: Cada vez que gritam: pobre! / me assusto. Recuo ao canto / mais perto do rés do chão. / Negro, fico sem cor. / Fúria, fico sem fala. / Pois sei que as balas dos patrões, / que as balas dos políticos, da polícia / correm atrás de mim sem-terra, / correm atrás de mim sem-teto, / correm atrás das minhas razões / por esses labirintos finitos / enredados de justiça e democracia, / só para eu sair nos jornais, / morto na foto, / sangue vazando pelos ouvidos. / Toda vez que eles gritam: pobre! / é a tortura, é o estampido, é a vala. / É a nossa dor que tranquiliza os ricos. / Alô rapaziada... tem de antenar o dia: / o vento que venta lá, venta cá. Lá fora tudo se parece andar para trás e eu teimo seguir adiante com a dor de Lídia Jorge: Os olhos frios da história precisam das lágrimas ardentes da literatura... Se não sei mais o que fazer, opto pela vida, reitero teimar seguir em frente, sempre adiante.

 

O que é da vida senão amor... - Imagem: a arte da fotógrafa e artista conceitual holandesa Laura Zalenga. - Não tenho asas e nem sei onde estou. Ela me abre os braços Boadicea por alento para que eu não me sinta recusado Manet no Le Havre et Guadaloupe, pelos mares tenebrosos de Conrad: Não há linhas na natureza, apenas áreas de cor, uma contra outra. Seu abraço Susanne Leenhof - a amante de meu pai -, é o apoio que eu não tive quando precisei e como prêmio se fez a Ninfa surpresa que junta meus pedaços como cacos de vidro às mãos: Não há simetria na natureza. Um olho nunca é exatamente o mesmo que o outro. Há sempre uma diferença. Todos nós temos um nariz mais ou menos torto e uma boca irregular. Ela me chama à câmara fotográfica e é lá que a sua nudez me ilumina ao toque do piano de suas mãos divinas. E se faz mais que amante Victorine Maurent para escândalo do Almoço na Relva na pele da controversa Olímpia: Em uma face, procure a luz principal e a sombra principal; O resto virá naturalmente - muitas vezes não é importante. E então você deve cultivar sua memória, porque a natureza lhe fornecerá referências. A natureza é como um diretor em um asilo lunático. Ele impede que você se torne banal. Não fossem a infecção na perna e a insuficiência circulatória eu teria mais para que ela feita Berthe Morisot, elegante e refinada entre as violetas com seus olhos escuros, feições marcantes, seu leque e suas cartas: Toda vez que pinto, me lembro na água para aprender a nadar. Era ela a pujança da jovem estudante Eva Gonzales, o que me fez saber qual o meu lugar. E mesmo que eu não tenha para onde ir nem o que fazer é nela que eu sei que a vida vale o amor, isso é o que me basta. Até mais ver.


 

A educação é uma das coisas deste mundo em que acredito de maneira inabalável. Hoje desaprendo o que tinha aprendido até ontem e que amanhã recomeçarei a aprender...

Pensamento da escritora, pintora, professora e jornalista Cecília Meireles (1901-1964). Veja mais Educação & Livroterapia aqui e aqui.

 


Conrad