segunda-feira, outubro 21, 2019

ESPINOZA, LÉLIA GONZALEZ, ANA CAÑAS, PATRICK MEADOWS & AMIGOS DA BIBLIOTECA


A SOLIDÃO DE ESPINOZA – Nasci marrano, eu e todos os meus; nacionalidade contraditória, problemática. Sempre me vi apartado do mundo e dos judeus. Por meu nome abençoado, o sonho do meu pai era um rabino e eu em conflito entre a verdade e a prosperidade, heterodoxia distante do dinheiro e do dogma, a vida de indagações. Às voltas com a Bíblia, o Talmud, a poesia clássica e a ciência moderna, do primeiro amor, fui negado - como era mesmo o nome dela... era... não lembro. Era um poema, bela, bela, bela. Recitei e esqueci. O amor é a alegria acompanhada de uma causa exterior. Ela preferiu outro, eu não era gentio nem rico. As minhas ideias me levaram à sinagoga: queriam comprar o meu silêncio e a minha fé à ortodoxia. Recusei e fui submetido a intenso e malicioso interrogatório. Acusaram-me discípulo de Juan del Prado e eu indignado com a flagelação, banimento e suicídio de Uriel, o enforcamento público de Van den Ende e o assassinato de Witt. Fui excomungado, deserdado, acusado de ateu, um blasfemador, traidor, elemento nocivo à república. E Sócrates morreu por seus semelhantes. Contrário a superstição religiosa, política e filosófica – nunca teria o medo dos males e castigos, a esperança dos bens e recompensas: a cruz cristã é só dor e castigo. Reduzi-me a um leproso moral, expulso das tribos de Israel: o mar por uma estreita fenda na parede da prisão. Recolhi-me a uma água furtada no subúrbio e passei a polir lentes: bicho de seda no casulo. Encerrado à minha solidão, tinha apenas o movimento das aranhas – não me destruam as teias, por favor. A minha crença sempre foi a dos antigos profetas hebreus: o mistério de Deus, os seus múltiplos atributos e a poesia da vida: Aquele que tudo penetra perpétua e completamente. Que espécie de mundo é esse, quem nos pôs aqui e por quê: infinito, eterno, omnioperante, sempiterno, completo. Sabia que a maior vitória é a grandeza da alma, a interafinidade vital, a regra de ouro: o amor faz desaparecer o sofrimento da morte. Não é possível a alegria e o amor com as ruínas da razão, os desatinos da imaginação. Para quem ama o efêmero, a felicidade é perecível; e para me amar tenho que amar o outro, melhor fruído quanto mais repartido: só ajudo a mim ajudando os outros. A felicidade é mútua. Essa a razão pela qual recusei a fortuna de De Vries por duas vezes, a sua anuidade e a pensão de Luís XIV – nunca lisonjearia quem eu não admirasse -, nem mesmo a cadeira da Universidade: preferia morrer de fome a não falar a verdade. Com sempre soube, somos vermes rastejantes diante do Todo: onde tudo é e está o Eterno Artista que tece a teia bramante e vive dentro de nós e em cada folha da relva, cada torrão da terra, cada flor a desabrochar, cada criatura viva, e dispõe para desfrute de todos: a verdadeira essência da democracia. Mais ainda: o destino é maior do que se supõe. Não posso ferir o outro sem que me fira: uma injúria que sai da minha boca arranca meus próprios olhos. Uma guerra traz outra, nada tenho com ambições, rivalidades e ódio. Quase fui linchado por conta do meu pensamento universal, meu coração cheio de simpatia. Vivi meus últimos dias num quarto de Haia e não me salvei da obscuridade, ainda bem. Eu via a eternidade: nascemos para sermos felizes, de um sonho a outro, de uma estrela a outra e ao infinito. Sou circunstância e meio, um dente da roda na máquina cósmica. Sou apenas uma página no livro de tudo e todos. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.

DITOS & DESDITOS: [...] Quando criança, eu fui babá de filhinho de madame, você sabe que criança negra começa a trabalhar muito cedo. Teve um diretor do Flamengo que queria que eu fosse para casa dele ser uma empregadinha, daquelas que viram cria da casa. Eu reagi muito contra isso então o pessoal terminou me trazendo de volta para casa [...] É por aí que a gente deve entender que esse papo de que a miscigenação é a prova da “democracia racial” brasileira não está com nada. Na verdade, o grande contingente de brasileiros mestiços resultou de estupro, de violentação, de manipulação sexual da escrava. Por isso existem os preconceitos e os mitos relativos a mulher negra: de que ela é mulher fácil, de que é boa de cama [...] Nossa situação atual não é muito diferente daquela vivida por nossas antepassadas: afinal, a trabalhadora rural de hoje não difere muito da “escrava do eito” de ontem; o mesmo poderia dizer-se da vendedora ambulante, da “joaninha” da servente ou da trocadora de ônibus de hoje, é a escrava de ganho de ontem. [...] O 13 de maio trouxe benefícios para todo mundo, menos para massa trabalhadora negra [...]. Trechos extraídos de E a trabalhadora negra, cumé que fica (Mulherio, 1981), da antropóloga, filósofa e escritora Lélia Gonzalez (1935-1994), que ainda se expressa no trecho extraído De Palmares às escolas de samba, estamos aí (Mulherio, 1982): [...] Estamos cansados de saber que nem na escola, nem nos livros onde mandam a gente estudar, não se fala da efetiva contribuição das classes populares, da mulher, do negro, do índio na nossa formação histórica e cultural. Na verdade, o que se faz é folclorizar todos eles. E o que é que fica? A impressão de que só homens, os homens brancos, social e economicamente privilegiados, foram os únicos a construir este país. A essa mentira tripla dá-se o nome de sexismo, racismo e elitismo. E como ainda existe muita mulher que se sente inferiorizada diante do homem, muito negro diante do branco e muito pobre diante do rico, a gente tem mais é que mostrar que não é assim, né? [...].

A MÚSICA DE ANA CAÑAS
Mulheres estão se conscientizando, se unindo. É importante debater e questionar essas pautas. Instinto da mulher é tolhido e esmagado.
ANA CAÑAS – Curtindo os álbuns Amor e caos (2007), Hein? (2009), Volta (2012), Tô na vida (2015) e Todxs (2018), da cantora e compositora Ana Cañas, que é formada em Artes Cênicas pela ECA/ISP e participou do elenco do longa-metragem Amores urbanos (2016), da diretora Vera Egito. Veja mais aqui.

A ARTE DE PATRICK MEADOWS
A arte do ilustrador, quadrinista, muralista e artista visual estadunidense Patrick Meadows. Veja mais aqui.

A OBRA DE ESPINOZA
[...] Pela decisão dos anjos e julgamento dos santos, excomungamos, expulsamos, execramos e maldizemos Baruch de Spinoza... maldito seja de dia e maldito seja de noite; maldito seja quando se deita e maldito seja quando se levanta; maldito seja quando sai, maldito seja quando regressa... Ordenamos que ninguém mantenha com ele comunicação oral ou escrita, que ninguém lhe preste favor algum, que ninguém permaneça com ele sob o mesmo teto ou a menos de quatro jardas, que ninguém leia algo escrito ou transcrito por ele [...].
Trecho da excomunhão, promulgada pela comunidade judaixa de Amsterdam, a 27 de julho de 1656, contra o filósofo racionalista holandês Baruch Espinoza (1632-1677). Veja mais aqui, aqui e aqui.
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AMIGOS DA BIBLIOTECA
Realizou-se na última sexta, dia 18 de outubro, mais uma reunião de debate da minta estatutária de Amigos da Biblioteca, da qual participou Silvana Neves, João Paulo Araújo & Ricardo Cordel. Veja mais aqui & aqui.