sexta-feira, outubro 19, 2018

DIAS GOMES, MARIA RITA, JANNA SHULRUFER, I-POEMA & MAMÃO


O AMOR DA JUMENTA – Art by Janna Shulrufer - Aquele reles sujeito a quem todos tratavam pelo apelido chistoso de Mamão, era um sujeito sem índole, sem certidão de nascimento, sem família, sem nada, vivia apenas. Parece que caiu do céu ou fora a Lu-cegonha-preta quem recolheu o bicho dalgum lugar. Saber, nem ele sabia quem era quem, família, parentes, aderentes, nada. Data de nascimento? Não tem. Nome completo: onde? Feio que dói, olhos vesgos e pestanas emendadas, beiços salientes sob um nariz espragatado no meio da cara de prato, corpo disforme, pernas curtas, braços longos, manzorras, cabeça grande de pigmeu, pescoço encolhido no tronco, buchudo, tamborete de zona todo atarrachado, verdadeiro pau pendeu, um franchão, broco do cabelo ruim, pés de raiz de jacarandá, uma santa ignorância oriunda das brenhas onde havia sido criado nos cafundós de Judas e, de quebra, um certo desequilíbrio psíquico, descoordenando ainda mais o desconjuntado. Um quasímodo, horroroso mesmo. Será a mãe dele alguma Mary Shalley, que criara mais um Frankstein vivo? Nossa! Se esse bicho inventar de dormir no cemitério, alguém chegar a ver aquele busuntão ali, terror horripilante e, tenho certeza, do hediondo, todo mundo corre de medo. Vão dizer que ele veio do mundo dos mortos, do Hades, do inferno do centro da terra, do outro mundo, ou, sei lá, dalgum lugar dos extraterrestres mais feiosos. Era. Deve ser castigo tanta fealdade assim. E a mangação? Quando passava na rua, perguntavam logo: - Cadê a nave, Mamão? - e ele: vápápupariu! -, era a maior gaiatice. Nossa, abusavam mesmo do coitado. Tudo para ele ali era novidade, saído como saiu duma capoeira insólita onde o diabo perdeu as botas e, agora, desfrutando do progresso frenético de uma província em franca ascensão, pudera, tudo maravilha de bestão. Um monstrinho, deveras, no meio da civilização. Antes fugia dos automóveis, se escondia de ambulância, corria de caminhões, tratores - Isso é uma tuia de bicho feio, sô. Era um pavor. Um certo cidadão caridoso, Marquito Ladeira, mais conhecido pelo alcunha de Marquin Doideira, colheu o sujeito e resolveu documentá-lo. Foi ter num Cartório de Registro Civil com um certo amigo gaiato que era escrevente juramentado e combinou de dar-lhe vida assim do inventado. Nome? Chuta aí. Vôte! Idade? Da pedra. Filiação? Desconhecida. Assim num pode. Sei que foram para lá e para cá e se entenderam por nominar o ogro pelo nome de Manoel de Tal, nascido em dia ignorado, com filiação de Maria de Tal e Zé Qualquer, que mãe ele tinha de ter, ninguém que sabia. Seu Marquin testemunhou tudo, apossou-se do documento e falou: Agora tu é gente, Mamão! - ele quase chorou de alegria. Daí foram pro lambe-lambe, fizeram todo tipo de pose e fotografaram o beiçudo até plantando bananeira. Isso. Quanta munganga! Mamão adivinhava que não ia gostar das fotos, mas como num enxergava bem mesmo, passou batido. Meia hora depois estava no Cartório de Identificação ganhando um Registro Geral, melando os dedos das mãos numa almofada de carimbo: - Vou tocar piano com a mão melada, é? Daí a pouco, estava organizado com CIC, Título de Eleitor, Alistamento Militar, Carteira Profissional, tudo nos trinques. O monstrengo só tinha mesmo de lindo o CPF, documento este que seu Marquin Doideira vivia paquerando para pendurá-lo, como um morcego, numa valsa de um trambique em qualquer financeira. Mamão mesmo nem sabia o que era aquilo, pedisse mostrava logo todos os seus documentos mofados na carteira: RG com a foto borrada; certidão de nascimento ilegível pela exposição impensada a líquidos de chuva ou de rio; carteira de vacinação precisando atualizar; CPF se rasgando e impossibilitando a leitura do seu cadastramento; um galho de arruda e um dente de alho ressecados pelo tempo; uma flâmula do Flamengo; e três calendários com fotos de mulheres com a boceta arreganhada. É que ele quando via um riacho qualquer, timbungava, esquecia os documentos no bolso da bunda. Tudo molhado, maior seboseira. Mas Mamão vivia de soltar galhofas às meninas passantes, maneira própria de paquerar as beldades que nem sequer lhe davam bola. Mesmo assim, ao que parece dum relato colhido por Cassaco e que conhecia o feioso desde tenra idade, era um sujeito correto metido numas trapalhadas. Não fosse um dia seu Marquin Doideira levá-lo para assistir um circo na cidade, não saberia nem que aquilo existia. Ele se empolgou tanto com o espetáculo circense que queria construir um com suas tralhas e bichos do outro mundo, no quintal do seu protetor. Ficou com aquilo na cabeça por bom período de sua vida. Até que fora levado pelo protetor para uma pizzaria: Que droga de comer é esse? Fitou longo tempo e ingeriu uma pizza grande de uma só vez, sorvendo o refrigerante tão rápido de engasgar-se. Bateram tanto nas costas do coitado para desentalá-lo, que ficou com uma mancha grande e avermelhada à altura dos pulmões: Oxe, nunca levei tanto tabefe na vida! Propositalmente seu Marquim depois de enchê-lo até o tampo de comida, levou o destemido para dar uma corrida na montanha russa. Pra que isso, meu Deus? Mamão vomitou tudo, não sobrando vivalma que não fosse atingida pela gosma indesejável. Por isso ficou verde, mais parecia o incrível Hulk. Às pressas foi levado pro hospital: os olhos virando, a boca aberta, a baba escorrendo, nem piscava os cílios. Vai morrer! Nunca havia andado naquilo: - Aquilo é um invento do cão! Por causa do acontecido, seu Marquin teve pena do sáfaro e empregou-o na condição de carregador de mercadoria em seu estabelecimento comercial. O horroroso, coitado, não sabia nada, mas com o tempo foi assimilando suas obrigações, trabalhando com esmero e garantindo seu ganha-pão. Soube-se, então, contado por ele mesmo nas horas de sanidade que tivera por profissões as de caçador de carangueijo na maré de Roteirópolis; cobrador de cata-corno suburbano; cheleléu de perueiro; vigia de tartaruga; guardador de guenzo em casa de família; recadista de pousada do litoral; varredor de terreiro onde se criavam animais vários; lavador de gogo de isca; leva-e-traz de meretriz na zona do baixo meretrício de Coité do Nóia; e, por fim, gigolô da mulher do vereador Nezito Bico de Bule. De todos fora demitido por motivos diversos: de caçador de carangueijo porque a pata do guaiamum agarrava um de seus dedos, numa dor de virar caminhão, ele torava a peiticante, razão dos crustáceos chegarem aleijados, justo faltante a pata mais requerida pelos degustadores da iguaria que reclamavam a ausência da mais saborosa. Do outro emprego, arribou por não ter muita intimidade com dinheiro, sendo dispensado a chutes e pernadas do cata-corno porque quanto mais gente era transportada, menos sobrava dinheiro para cobrir os custos do transporte, ou seja, dava mais troco que recebia passagem. Qualquer um enrolava com valores ínfimos exigindo troco. Do seguinte, saiu por ser abestalhado demais, quando a kombi acabava de encher, não cabia nem ele, ficava toda vez ao deus dará: - Foi-se, eita porra! Dos seus desatinos, muitos restam como lorotas, como o fato de deixar fugir uma das tartarugas de estimação de dona Maria Cachacinha que, aborrecida, prestou uma queixa na delegacia, acusando-o de ladrão. Das investigações apuraram que o quelônio aquático havia realmente fugido. Doutra, os guenzos que ele cuidava com tanto carinho, ladravam muito de deixá-lo mouco dia após dia. O que fez, matou um, dos outros ficarem calados. Resultado: botaram ele para correr porque compareceram uns ladrões no recinto e ele achava que eram visitas da casa. Da pousada, quando levava bilhete escrito, tudo bem; mas quando era para guardar na cachola, toda vez ou se esquecia ou, invariavelmente, trocava as bolas; era esporro de manhã, de tarde e de noite. No terreiro onde exercia a nobre função de varredor, possuía tanto bicho de tantas qualidades, alguns até que ele nunca nem tinha visto, que quando ele terminava de varrer, de um lado a outro, estava tudo sujo de novo das bostas que os animais cagavam de propósito; varria tudo de novo e quantas vezes fosse necessário até espantar os bichos e cair no maior sono de três dias encarreados, dormindo que só São João, se acordando com os gritos do dono afugentando o displicente dali. Quer outra? Ao lavar um dos gogos para prendê-los na vara de pescar, gostava de brincar com eles, achando-os bonitinhos se relando no chão. Ora, sumia tudo, ou, então, quando, na hora da fome, comia um deles, não sobrando um sequer, já viu? O de leva-e-traz de meretriz, ele próprio escapulira do vento ruim, visto que, certa feita, levando um recado da sua patroa, a Maria-cheba-de-ouro, para o amor dela, o inspetor da polícia, ficou preso por desconfiança de conduta e, de noite, durante o interrogatório sobre sua procedência, o inspetor queria comer seu cu, visando desmoralizá-lo. Ôxe, que é que é isso, meu? Mamão relutou, brigou tanto de deixar o inspetor molezinho na cela, fugindo para nunca mais dar sinal de sua graça pela redondeza. Anos depois, regressando por aquelas bandas na calada da noite, foi surpreendido pela aflição de dona Bineca, mulher do vereador Nezito-bico-de-bule. Deu um carreirão pensando ser com ele o problema. Depois percebeu que a aflição dela era por conta de um incêndio ocorrido no botijão de gás, a qual foi socorrida pela providente atuação do desajeitado, apagando o fogaréu e se arriscando de uma explosão das boas no meio das fuças. Agradecida, Bineca pediu para que ele ficasse por ali àquela noite por motivo dela se sentir insegura e amedrontada, perdendo a total confiança de ficar sozinha naquela casa, podendo o incêndio voltar à tona a qualquer momento. Mamão nem se fez de rogado, sentou praça na cozinha, esperando o papôco de qualquer fagulha. Durante a vigilância ela serviu-lhe janta – ora, há dias que ele nem via comida pela frente, somente insetos e folhas – o que deixou o cabra ancho de quase morder as orelhas numa risada. Era o prato chegando à mesa, ele amolando os dentes com vontade, devorando a comida e dando uma dentada no prato de arrancá-lo um taco - eita! – e quase arrombar um dente, ficando banguela. Depois ela mandou que ele se banhasse e, durante o asseio, levou um pijama do digníssimo marido para que ele se esquentasse – mas espia só! - quando, pela sombra impressa, revelada pelo box do banheiro, percebeu o seu membro extraordinariamente desenvolvido, dando o  tamanho da macaca do descomunal, ela tomou um susto mas não arredou o pé, ficou o tempo todo estatelada, acompanhando o esfregamento dele embaixo do chuveiro. Mesmo sendo uma figura esdrúxula, bizarra, desengonçada, mesmo assim Bineca, uma senhora jeitosa, de formas graciosas e rosto muito atraente, sentiu-se atraída pelo tamanho da chibata do rapaz. Daí, de forma propositalmente descuidada, arrastou a portinhola do box e sacou ao vivo e a cores, aquela altaneira e retumbante tromba arriada barriga abaixo. Era um desaforo. Assustou-se ela com um gritinho tímido, charminho para chamar atenção. Ele escondeu o instrumento entre as mãos. E cabia? Ficara assim mesmo à mostra: Que é isso, meu filho? Esconda não. Mostra para mamãe o seu piupiuzinho, mostra! – ele empulhado, de escuro ficou rosado. – Mostra neném que mamãe quer ver! E ele, entre cheio de pernas e envergonhado, encostou-se na parede do banheiro. – Mostra, neném, mostra! –, ela insistia em ver-lhe a graça, arrancou-lhe as mãos e presenciou, in loco, o patrimônio ajegado dele.  – Que coisa mais linda, meu Deus! Deixa mamãe pegar, deixa! –, sem saída, encurralado entre ela e a parede, ele assentiu que ela chegasse ao seu membro e, ao leve manusear, ficou enrijecido e se prolongando a cada tocada dela. Mais assustada que nunca com o desenrolar da mangueira dele, começou carinhosamente a alisá-lo com as duas mãos, ora revirando os olhos, ora entrecortando a respiração, arrepiando-se toda, agitando-se, lábios entreabertos, ofegante, até que teve uma vertigem e caiu de joelhos frente aquela volumosa glande a qual ela começou timidamente a beijar, a passar pelos lábios, pescoço, orelhas, bochechas, testa, seios, depois alisou aquela pomba enorme com sua língua macia, delirando, sugando-a, engulindo-a aos poucos visto quase rasgar sua boquinha delicada, esfomeada, lambia, chupava, engolia, friccionava, punhetando-o avidamente, ele escorregando pela parede, devagar, até sentar-se no piso frio do banheiro, quando ela, largou a sua pêia, levantou-se, removeu a saia, livrou-se da calcinha e, comedidamente, foi se acocorando lentamente sobre a espada rija que se encontrava pronta para rasgá-la toda. Ela se contorcia devagar, requebrando, rebolando, se ajeitando até que sua vagina foi engolindo, centímetro a centímetro, dilatando suas entranhas, rasgando seu ventre, dinamitando seu prazer. Quando conseguiu introduzi-la por inteiro, ela respirou fundo e começou um sobe e desce cadenciado, doloroso, prazeirozo, emergindo por inteiro fora da sua xanha e depois afogando com força novamente até o mínimo milímetro sobrar além dos testículos dele. Veio então o frenesí, foi adiantando mais, pulando em cima, uns gritinhos de sensações suicidas, ele zarolho, ela no êxtase, blasfemando, vilipendiando-se, gritando, adorando, pululando, se contorcendo, gozando, enfim, do néctar dos deuses. Como se estivesse retalhada em postas, cansada, exaurida, ela foi lentamente arriando e se jogando devagar ao chão, a chorar baixinho, um choro lavado, completo, grato. Ficou um longo tempo assim, a bunda à mostra, Mamão quieto, de pau duro, só olhando as curvas de sua montanha do Cáucaso, apalpando a micula ovalada até esfregar o indicador no cuzinho cor de rosa dela. Esfregou, então, os olhos para ver melhor e, com sua manzorra, se apossou das ancas acetinadas dela e puxou brutalmente a bunda linda até a altura dos olhos, viu-lhe o pinguelo, deu-lhe uma lambida, ela, de cu pra cima, deu uma arrepiada de sussurrar fundo, passou a língua pelos lábios da priquita dela entumescida, levou o sobejo até o osso do mucumbú, colocando a ponta de sua língua no cuzinho dela. Ah! Ela gemeu. Lambuzou o esfíncter anal e começou um ajeitado com o dedo entre as pregas do ânus dela, com a outra mão alisando o cacete para ficar mais duro ainda. Ela ajeitou-se, ele passou a rôla na cheba melada, ía e voltava, ora no cu, ora na boceta; nessa tapiação ela ronronou e mandou ele enfiar logo a pica dura no papeiro dela. Nem trastejou, arregaçou a pomba no caneco da madame. Tome. Um gemido com um misto de dor e prazer foi ouvido, ele botava e tirava ferozmente, ela gritava, não se sabia se pelo fato de ser esfolada cu a dentro ou se possuída da forma que aprouvera. Depois de tudo, Mamão ejaculou brutalmente uns três litros de gala nos fundilhos dela, esborrando tudo, se lambuzando todo, meleguento, desenfiando a jamanta e abrindo o chuveiro para banhar-se demoradamente. Do jeito que estava, ela ficou, estendida de bruços no meio do sangreiro. O ignorante enxugou-se, vestiu-se do pijama alheio e se dirigiu para o quarto que ela lhe havia dispensado, dizendo ancho: Ô raça boa prá botar gaia! –, zombou ele dando o último cochilo no meio da noite. Nezito quando chegou de manhãzinha ainda encontrou a mulher em decúbito dorsal, no piso do banheiro: O que houve? Será? Assustado, o marido cobriu-lhe as nádegas desnudas e tentou levantá-la ao que se acordou zonza, sem saber o que havia ocorrido: Eita, ela menstruou e num tá nem sabendo! Onde estou? – inquiriu ela, totalmente perdida. Você estava desmaiada no banheiro, o que houve? Eu? Sim, desmaiada, o que houve? Menstruou de novo? Sei lá, estou totalmente leve, quero dormir! Vou chamar um médico! Não precisa, estou me sentindo bem, apenas com sono. Nezito carregou seu corpo trôpego até o quarto e a estendeu sobre a cama. Procurou pela empregada, não encontrando-a, também ainda era cedo para que ela já tivesse chegado. Ficou preocupado, mesmo assim, saiu, então, para resolver umas coisas na cidade. Intrigado, ficou o resto da manhã meio desconfiado, passando pela Câmara de Vereadores, assinando uns papéis, alegando aos companheiros que não podia ficar para a discussão porque sua mulher não estava bem e precisava resolver umas coisas e retornar rápido para o lar. De lá foi até a agência bancária, sacou algum dinheiro e retornou, uma hora e meia depois, para casa. Mais surpreso ainda: ela cantarolava no meio da sala. O que houve? Você chegou? Eu lhe encontrei desmaiada e nua no banheiro! Foi ? Foi. Ah! Deve ter sido a aflição! De que? O botijão incendiou, estava para explodir e eu, por sorte, encontrei um rapaz que ia passando, apagou o fogo e salvou a situação. Quase morri de medo. Acho que pelo nervosismo devo ter ido ao banheiro e de lá não sei mais nada... O marido ficou atônito com a narrativa dela. Foi até a cozinha e verificou que ainda estava fedendo a coisa queimada. Inquiriu a empregada e ela certificou de que estava tudo em ordem, apenas o fedor da mangueira do botijão queimada que se encontrava num canto da cozinha jogada, mas que fora substituída por outra e tudo estava perfeitamente em ordem. Ao retornar para a esposa, inquiriu se ela se encontrava bem ou se necessitava de algum acompanhamento médico, o que ela negou alegando estar muito bem agora. Tranqüilizado, Nezito dirigiu-se ao banheiro, tomou um longo banho e matutou, ouvia desconfiado o cantarolar da mulher no meio da casa. Saindo do banheiro, levou a toalha até o coarador, quando ouviu um ronco profundo e ameaçador. Digitígrado, investigou, abriu devagar a porta da despensa e flagrou um bicho horroroso dormindo na cama. Deu uma carreira e foi até o quarto, abriu a gaveta da cômoda e sacou de um revólver, quando a mulher assustada com a arma, instou sobre o que era aquilo, o que se sucedia, e ele informou que tinha um ladrão dormindo no último quarto, ao que ela contornou e explicou ser aquele o sujeito horroroso que salvou ela da explosão e que, como estava sozinha, pediu por tudo para que ele dormisse ali, prevenindo qualquer novo incidente, uma vez que ela estava amedrontada e aflita. Suavizado com o relato, Nezito acalmou-se e foi almoçar. Passaram-se então tardes, noites, dias, semanas, meses, anos, e Mamão tomando conta da dona da casa, não antes tentar se ajeitar com a empregada, o que levou uns bregues e um corretivo no maluvido para deixar a secretária em paz. Ficava ali, coçando os ovos, comendo do bom e do melhor, fodendo a dona da casa, enrolando o marido dela e ainda por cima querendo um chamego com a empregada. A pinica era jeitosa e toda metida às pregas, ele lá horas e horas acompanhando os afazeres dela para, quando descuidada, passar a mão na sua intimidade. Levou tabefe até umas horas da piniqueira para deixar de ser folgado. A madame quando chegava ele ficava todo murcho, pelos cantos. A doméstica reclamava à madame os maus procedimentos dele, eita! Virou uma jararaca pra cima do incauto. Mas a patroa deixou passar não antes dar-lhe o maior rela por isso. Chamou-lhe na responsa e disse-lhe umas poucas e boas, ameaçando ele de perder a boquinha: Quer comparar, é ? – ameaçou ela. Certa vez Bineca teve de viajar e passar uns dias fora com o marido para composição da chapa majoritária do partido que ela pleiteava a reeleição. Passou uns dezoito dias fora na convenção. Mamão sozinho, Ternência impune, fez de tudo com ela para molhar o biscoito. Oito dias se passara e ela nada. Ele já estava com o juízo apertado. Ela relutava em não dar bola pra ele, até que arretou-se, certa feita, quando ele intrometeu-se a apertar os peitos avantajados dela, arribando dali, só retornando quando a dona da casa voltasse para lhe contar os mínimos detalhes do assédio dele. Caiu então numa bruta solidão. Choroso pelos cantos da casa, não percebia sentido nenhum em viver assim. Foi quando, numa olhada de soslaio, percebeu a cadela Rosemarie deglutindo sua ração no quintal. Ele mirou, cheios de artimanhas se aproximou, alisou a cadela dócil, ficou brincando com ela, mexeu nas partes pudendas com um dedo, puxou a cabeça da cadela que lambia tudo, botou a pica pra fora, fez com que a cadela passasse a língua na cabeça da rodia dele, ficou excitado, alisou o cuzinho da cachorra que aceitava as provocações dele e no meio desse alisado, enfiou a macaca e a bicha gostou: Venha, cachorrinha, venha, tome! Danada! Fodeu três dias encarreados deixando-a mortinha e toda rasgada. Enterrou-a no quintal. Já estava mesmo enjoando da foda quando resolveu punhetar-se com as fotos do álbum de fotografias da Bineca, em poses sensuais, maiô de praia, com calções íntimos, de robe, deitada em trajes sumários, fazendo ginástica, escalando dunas, bebendo uísque, chupando picolés e sorvetes, tudo enriquecia sua imaginação. Dezoito dias passados finalmente retornara: Como está a casa, Mamão? Tubem! Cadê Ternência? Foiprácadopaidela! Ternência tá muito folgada, deixou você com fome, foi fofinho? Bineca deu-lhe um cheiro, alisou seu cacete e seguiu direto para o banheiro. O marido entrou e mal apanhou uns papéis na cômoda e escafedeu-se azuretado com os compromissos. Mamão foi pro quintal e sem ter nada o que fazer, recolheu-se ao seu quarto. Daqui a pouco, chega Bineca, assanhada, doidinha para atualizar a foda diária e lavaram a égua. Lá pelas tantas Bineca saiu e só retornou com o marido e a empregada na boquinha da noite. Mais três dias depois Bineca sentiu umas coisas estranhas escorrendo boceta abaixo, ficou atordoada, marcou consulta com o ginecologista, desconfiando que o marido havia pulado a cerca e colocado alguma doença venérea nela. Uma bomba! O médico tascou o diagnóstico: blenorragia de cachorro! Ela armou-se com uma mão de pilão e deixou uns quarenta galos na cabeça do marido, fato bem explorado pelo pessoal da oposição que levou para os palanques políticos a quantidade de gaias que coloriam a cabeça dele: Bem empregado, todo castigo para corno é pouco! E não ficou por aí, ela também expulsou debaixo da maior esculhambação o seu amante Mamão, que agora ficara com uma mão na frente e outra atrás, levantando a confirmação das suspeitas dos opositores dela e, ainda por cima, acometido de doença braba. Depois de tudo passado, agora não, agora ele estava como carregador eficiente na loja do seu Marquim Doidera, a Maluquim Móveis, aprendendo diversos afazeres, meio atrapalhado e pisando na bola de vez em quando. Recado era melhor que não mandasse por ele, trocava tudo. Beócio, misturava as coisas. Apreciando melhor, a única serventia dele, era levar grito, mais nada. Valia irrisória para sujeito tão biltre. Quando tentava justificar qualquer erro, era uma língua enrolada de ninguém entender patavina e, ainda, respondia com raiva, dono da razão dele. Mas estava quieto, havia pulado não sei quantas fogueiras, quase tudo lhe queimando o rabo. Relembrava, quando podia, toda sacanagem contada aos borbotões na maior mangação dos ouvintes que duvidavam de tudo, até de sua sanidade. Isso aguçava seus quereres. Dera-lhe, outro dia, portanto, uma agonia de querer foder. Meses assim, endoidava. Com quem? Era preterido por todas, quem se agarraria com ocrídio daqueles? Era o asco das meninas, não tomava banho, nem escovava os dentes, não penteava o tuim, asseio algum, um fedor insuportável, um bafo de lixo podre, uns grudes por todas as partes do corpo, remela olho abaixo, ele não era preto mas bem que se mostrava escuro. Seu Marquim, uma certa tarde, deu-lhe um banho de chorar três dias seguidos. Teve de usar até espátula para remover o grude infincado na pele do catingoso. Eita, descascaram o rapaz. Viu-se, então, que era moreno; jogou-lhe uns pingos de perfume, ardendo sua pele, uma coceira braba da cabeça aos pés, denunciando unheira, biqueira, perebas, chulé brabo, piolho, chato, lêndias, enfermidades a quatro, meu, aquilo não era gente, era a verdadeira boceta de Pandora! O patrão conseguiu depois de muita conversa no pé do toitiço que uma aleijadinha caolha e banguela, aceitasse dar uma trepada com o hediondo. Tudo acertado, o seu protetor mandou que ele fosse até o terreno atrás da paróquia, buscar lenha para a fogueira de São João. Lá foi catando os gravetos quando deu pela presença da aleijadinha, encostada ao pé do cajueiro, com a saia levantada mostrando a cheba prá ele. Agoniou-se e partiu com mais de mil, agarrou-se com ela e enfiou a manjuba priquito adentro. Ela deu um grito e saiu correndo de esquecer as moletas. Era uma vez, para nunca mais. Oxe, não botei nem o chapéu do vaqueiro e já saiu gritando a infeliz! Quando ele percebeu as moletas, ajuntou com a lenha e levou para queimar na fogueira. Estava triste e desconsolado. Risadagens deixaram-no mais chateado ainda. Sem ter o que fazer, rumou para o quartinho do depósito da empresa e no meio do caminho, seus olhos se abriram ao encontrar a presença de uma gaga que ele paquerava há tempos e deitou conversação mole pra cima dela. Era um ronronron dum lado, um quiquiqui, do outro; cacacacá, nenhum dos dois se entendiam. Ele perdeu a paciência, pegou a moça a pulso, agarrou pelos cabelos, ajoelhando-a e empurrando o caralho na boca da coitada. Era um humhumhum agoniante, um impado desastroso, ele segurando-a com força para que não escapulisse, em defesa ela deu-lhe uma dentada no pênis dele ver estrelas, ela deslizando, ele segurando com mais força ainda, deu-lhe uma rasteira, a bunda pra cima, arrancou-lhe a caçola e deu-lhe uma picada na perseguida dela da bicha gritar feito louca. Do rebuliço foi juntando gente, de terminar na maior carreira mata afora. A gaga foi hospitalizada, com fratura exposta do osso do mucumbú, rasgada de um lado a outro, ou seja, quando mijava, saía pelo cu; quando cagava, saía pela boceta; era um buraco só. Depois de trezentos e cinqüenta e dois pontos para colocar tudo no lugar, a danada deu de falar direito, toda gasguita, se elegendo, dez anos depois, na vereadora mais atuante dali. Foi o milagre da bimba fonoaudióloga do Mamão. Virou lenda no lugar. E foi mais ainda pela sua descomunal anomalia sexual, se já não tinha pela feiura, agora fêmea alguma ousava namorar, flertar, paquerar ou mesmo conversar com ele. Aí que começou o seu verdadeiro dilema. Enjeitado por todas, ficou sem alternativa, nem prostituta barata e mais afolosada que fosse, nem com salário dele todo, juntado meses e meses, ninguém se aventurava. Estava sempre em fuga, dos empregos, dos patrões, de tudo. Situação difícil mesmo, estava amargurado, não conseguia mais trabalhar, já variando, meio-dia em ponto, com uma fome das brutas, via galinha cocoricando, lôu! Visse porca ronronando, passou! Tinha até uma jumenta jeitosa que ficava no leirão dos Mendonatos, gente braba que possuía bichos de primeira, tudo de raça pura, e a jumenta era jeitosa, toda espadaúda, trucada. De tanto amorcegar as galinhas sequer notara que pela truculência do estupro matava as penosas, era uma mortandade no galinheiro de polícia e pistoleiro sair catando o responsável. A porca de seu Anastácio deu o maior rolo, a ponto de passar de raspão uns tiros de doze no toitiço, quase pega, tirando fino. Ôxe! Cochilasse ele papava: pata, gansa, coelha, cabrita e até gia, só surpreendido por intervenção de populares. Estava, então, vagando no meio do mormaço de mexer com seu juízo, quando viu no parapeito da janela, uma mulher de vida airosa, a formosura da mulher de Zé Corninho, com os seios expostos no decote da blusa. Aquilo revirou seus nervos, logo ele que estava com a morrinha, então, escondeu-se numa moita e ficou ali espreitando, quando ela, gaieira conhecidíssima, de vida dissoluta, perdida por rola, tinha mais hora de foda que urubu de voo, enrolou-se numa toalha felpuda, um batom encarnado nos beiços, uma franja deitada sobre os olhos, um rebolado frouxo, se encaminhou ao riacho Vertente, para tomar banho. Ele perseguiu a sestrosa, atravessou o mata-burro e se escondeu atrás do umbuzeiro. Lá entocado viu quando ela arriou a toalha, nuazinha em pelo, agitando os cabelos no meio das lufadas de vento que lhe cobriam, caminhando rumo ao riacho para um mergulho ruidoso naquelas águas. Mamão já de pau duro, pegou de uma folha de bananeira e encobriu o membro rijo. Na beira do riacho ele abriu conversa com Sandrosa: Ôi, Mamão, onde tu andava home? Trabaiando, trabaiando. É mermo home? Qué qui tu tais fazendo agora? Organizando as idéias, somente. É mermo home? Vem tomá banho comigo, vem, a água tá tão gostosa! Tô pensano nisso. Avia-te, home, vem-t’imbora, vem logo, a água tá tão boa! Vem ver? Tô pensano, ainda! Vem logo, abestalhado, deixa eu ver o que tu tem debaixo do calção, mostra! É mermo, Sandrosa? Bora, home, quero ver essa coisinha miudinha aí. Mamão abufelou-se, jogou pra lá a folha de bananeira e deixou à mostra a jibóia viva fazendo volume embaixo do calção. Vôte! Parece mai uma cobra gigante assim dibaixo do calção!! Vem-te, home, vem que eu quero ver de perto. Nem pestanejou, pulou dentro da água e foi logo se agarrando nela. Quando ela segurou forte o cacete dele, deu um gritinho de satisfação, se ajeitando toda, esfregando a cheba na mangueira de bomba de gasolina dele, se arrastando até a beirada e lá se arreganhando toda dele ficar impando que só bicho no cio: Vou enfiá o petrope devagarinho! Bota tudo, home frouxo, tais pensano o que? Atendendo seus pedidos, ele a colocou de quatro e arregaçou funda a manjuba no chibiu da manceba, uma chibatada que só o gogó deu uns dois litros e meios de viscosidade. No orgasmo dela, foi tanto ai ui ai uiuiuiuiui que ela liberou uns dez bilhões de milivolts, se acendendo toda que nem florescente no meio do vuque-vuque. Sem misericórdia empurrou tudo no furico dela. Depois arfantes, descansaram. Agora, gostoso, que você cumeu meu cu, vai tê de gozar na minha chiranha, tumbém, viu? Apenas com estas palavras ele já estava pronto para nova investida, enfiando até o topo, rasgando ela toda, da rôla bater na garganta, de quase engasgá-la. Ai que trepada boa! Ai que trepada boa! Um desmantelo era a fudelança deles, ela insaciável, ele a perigo, imaginem só. No meio do ato, eis que tudo leva ao desespero: Zé Corninho flagra os dois na safadeza. O corno que vira sua santa mulher amufanhada com sujeito tão torpe, tão desqualificado, ficou puto, coçou a testa, franziu o cenho, sentiu a gaia florindo no seu futuro, sacou de sua arma e largou uns tiros na pistola bala U, expulsando Mamão dali, na maior bronca, e ele não vacilou e logrou uma saída furtiva livrando-se da frege braba. De novo! O povo em peso já tava com pena do desgraçado, nada dava certo, mas todos mudavam de opinião, quando Cassaco lembrava de suas raízes, quando ele fora criado por uma mãe, que ninguém sabia mas que era adotiva, e que devido as escapulidas do marido dela, expulsou-lo de casa, ficando só com Mamão que por fim amasiou-se com ela, alegando, ainda, que matou-la no meio de uma foda. Amaldiçoado por todos, conseguia cobrir de indignação quem quisesse ajudá-lo. Mas da fuga do Zé Corninho, ficou ele escondido no mato, nu, esperando a noite chegar, sem dignidade e sem brio. Lá para as tantas, acocorado, sentiu uma cobra passar pelo rego da sua bunda: Êpa, qui é isso, qué me enrabar, é, condenada? Atrepou-se numa árvore mode não ser bolinado por bicho algum, nu daquele jeito. Depois de horas, vagou infeliz pela noite, sabia que estava nas proximidades do arruado da Usina Tosadinho, sem muxiba no moquém. Ali atrepado, ouviu o assobiu de alguém que vinha vindo. Escondeu-se mais, porém a pessoa notou a sua presença: Num adianta se escondê, tô lhe tirando faz tempo! Mamão olhou e era o professor Etelminiando, arre! Todo efeminado que desfilava faceiramente a procura dele depois que ouvira o barulho de sua mijada: Num adianta mermo, eu já vi! Tá precisando de alguma coisa, vamo lá em casa que eu te dou! Mais surpreso que temeroso, Mamão abaixou os olhos e não quis dirigir palavra alguma ao pirôbo. Mas o professor provocou Mamão dizendo do que possuía, comida, cama, roupa lavada, dinheiro quanto quisesse, casa para morar, tudo! Rejeitando a proposta, Mamão encolerizou-se: Qué qui eu bote esta rola no seu cú, é? Etelminiando admirou-se do volume que Mamão segurou e ficou gazela saltitante para que ele descesse, prometendo mundos e fundos, a lâmpada maravilhosa e um gênio bicha para realizar todos os seus desejos; festas e risos; luas e estrelas; imaginem, todos os seus sonhos para seguir o pederasta. Ele não tinha o que perder, estava na última lona, fodido e mal pago, de que adiantaria relutar? Orgulho? Ora se jamais possuíra vaidade alguma? Se a vida jamais prometera situação assim? Tentara, por fim, arranjar-se, esta era uma chance luminosa. Estava, portanto, de pança cheia, o ar refrigerado abanando os pentelhos do cu, de perna pra cima, todo pabo, liso que só, pediu dinheiro, dinheiro tinha; pediu mais, cédulas e mais cédulas; daí mandou o fresco ficar de quatro e rasgou o anel da veada com sua protuberância animalesca. A roseta da gazela levou um bocado de ponto para colocar as pregas no lugar, numa ruidosa risadagem estourada por todas as brenhas da região. “São Paulo é terra boa corre prata pelo chão, o professor tá enganchado na pomba do Mamão!” Endinheirado e só, Mamão aboletou-se na cadeira do papai e nem deu bola para a cantoria inventada pelos argutos enredeiros. Ficou a ruminar ideia alguma, tentando ligar pro telesexo com o fito de conseguir alguma garota de programa, mas não acertava girar o disco devido seus dedos roliços. Aporrinhando-se jogou o telefone que espatifou-se no chão. Foi até o frigobar ingeriu uma cerveja, duas, tres, quatro, variou, tomou mais, todas, cambaleou e ficou jogando prosa para as transeuntes que divisavam o portão da casa. Atravessasse quem fosse ele jogava uma lorota, resultado: tres cascudos, onze bofetes, treze mãozadas, oito murros, seis porretadas, dezenove esporros indignados, setenta impropérios na venta, nove foras, cinquenta e cinco xingamentos, vinte e nove vai tomar banho, sessenta e uma procura o teu lugar, dezoito vai te catar, cento e cinco não amola, cinco vai plantar bananeira, doze vai pra porra, catorze beliscadas, vinte e oito vôte e uma cadeirada de deixá-lo em nocaute por mais de hora. Zonzinho saiu catando uma corajosa que deixasse ele afogar o ganso até que, por fim, deparou-se com uma jumenta cobiçada, solitária no meio das brenhas. Conferiu e pensou capenga, flertou o animal, deu uma piscadela, ensaiou malabarismos sexuais, arrudiou-la num verdadeiro walkaround, passou a língua nos beiços e se ajeitou na garupa dela, levantando o rabo e metendo a língua ardorosamente. Da chupada a jumenta deu uma carreira, trotando doida, de ficar atrepada num pé de coco chamando por ele: Maaaaaaaaaaaaamão! Maaaaaaaaaaaaaaaamão! Então ele escalou a árvore, chegou no galho onde estava a abufelada, a bicha rinchou demorado, ajeitou-se para ser possuída, sacou do pepino gigante e meteu-lo na regada dela, realizando verdadeiras acrobacias sexuais. Foi um zoadeiro de acordar todo mundo. Lá para as tantas ele satisfeito desceu e foi dormir. No outro dia, ainda grogue das biritas, tomou outras tantas, mais lavado que no dia anterior, seviciou a jega de novo. E assim se foi, ao cabo de dois meses, já estava viciado, todo dia se atrelando na garupa da jumenta, na mesma hora, no mesmo local. Restabelecido do problema que fora acometido, o professor retornara ao lar e engalanara o rapaz de sua adoração. Aí chegou o dia de um casamento dum parente dele, mais precisamente um sobrinho do Etelminiando, numa cerimônia de parentes, amigos, aderentes, simpatizantes, escancha-parentes, padrinhos, coiteiros, alcoviteiras, beatas, merepeiros, presepeiros, fiéis, justos e fariseus, entupida de cabo a rabo. Mamão estava todo alinhado com um terno metido e costurado segundo as proporções do abestalhado, estava impecável, encaminhando-se para a igreja acompanhado do patriarcal professor. No meio da cerimônia, justo na hora do sim dos nubentes, que fale agora ou se cale para sempre, a jumenta invadira as dependências sagradas, com um violento vexame, afastara todo mundo, engolira cinco quilos de hóstias no maior berreiro, a platéia atônita fugindo pelo ladrão, em polvorosa, a revoltada saiu dando uns coices até chegar em Mamão, arreando a garupa num requebro estranho, como se sentando no ventre dele, rinchando que nem louca para ser possuída pelo amado que esquecera sua obrigação consuetudinária naquela noite. Foi um deus nos acuda. Hehém. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui e aqui.

DITOS & DESDITOS:
O Direito das Primícias, ou Direito de Pernada, ou Direito da Primeira Noite, (jus primae noctis) foi uma instituição que vigorou na Idade Média e que, em alguns países, como a França, chegou até à Revolução de 89 (Beaumarchais, O Casamento de Fígaro), havendo notícia de que tenha persistido na Itália (Sicília) até meados do século passado. Era o direito do senhor feudal de desvirginar as noivas na noite de sua boda. No Brasil colonial, como lei não escrita, semelhante direito foi largamente usado pelos senhores de engenho e pelos grandes senhores de terra de um modo geral, ainda que de maneira menos ostensiva, mais hipócrita, o que, entretanto, não lhe tirava o seu caráter de violentação da integridade da criatura humana. Aqui, quase sempre, o senhor não esperava pela boda, servindo esta apenas para acobertar a violência já cometida. Embora a humanidade tenha evoluído a ponto de tornar inadmissível hoje a prática legal de tal costume, sabemos que outras formas do direito de violentar (quer seja essa violentação física, moral ou política) continuam em vigor em certos regimes ditos autoritários, servindo o Direito de Primícias de apropriada ilustração a uma legenda que pode falar de acontecimentos do nosso cotidiano. [...].
Trecho extraído da peça teatral As primícias: alegoria político-sexual em 7 quadros (Civilização Brasileira, 1978), do escritor e dramaturgo Dias Gomes (1922-1999), que também na peça teatral O santo inquérito (Civilização Brasileira, 1985), expressa na apresentação do texto: Parece fora de qualquer dúvida que Branca Dias, realmente, existiu e foi vítima da Inquisição. Segundo a lenda, bastante conhecida no nordeste, Branca foi queimada, como Joana d’Arc. [...] “era jovem de boniteza excepcional”, não terminou seus dias numa fogueira, bem poderia ter tido essa sorte, pois os autos-de-fé de meados do século XVIII, em Lisboa, registram a condenação de cerca de quarenta mulheres procedentes do Brasil, Aqui mesmo, na Bahia, em fins do século XVI, a octogenária Ana Roiz foi queimada simplesmente “por ter, doente, tresvariando, dito desatinos”. Alguém (um ancestral dos modernos dedos-duros) ouvira e denunciara. [...] A mim, como dramaturgo, o que interessa é que Branca existiu, foi perseguida e virou lenda. A verdade histórica, em si, no caso, é secundária; o que importa é a verdade humana e as ilações que dela possamos tirar. Se isto não aconteceu exatamente como aqui vai contado, podia ter acontecido, pois sucedeu com outras pessoas, nas mesmas circunstâncias, na mesma época e em outras épocas. E continua a acontecer. Muito embora a Santa Inquisição tenha hoje vários defensores, que procuram amenizar a imagem que dela fazemos e diminuir a responsabilidade da Igreja [...] a verdade é que as razões apresentadas em sua defesa são as mesmas de todos os opressores, quase sempre sinceramente convencidos de que seus fins justificam os meios. São as razões de Hitler, de Franco e de MacCarthy. [...]. Neste, prevalece o sentimento de salvar-se a qualquer preço. Mesmo ao preço da própria dignidade. É a voz que não se levanta diante de uma injustiça praticada contra outrem, que não protesta contra uma violência, se essa violência não o atinge diretamente, esquecido de que as violências contra a criatura humana geram, quase sempre, uma reação em cadeia que talvez não pare no nosso vizinho. Seu receio de comprometer-se leva-o a assistir à morte de Augusto sem um gesto ou uma palavra em sua defesa. Essa omissão o torna cúmplice, como cúmplices são todos aqueles que se omitem por egoísmo ou covardia, podendo fazer valer a sua voz. Quem cala, de fato, colabora. [...]. Veja mais aqui.

A ARTE DE JANNA SHULRUFER
A arte da artista russa Janna Shulrufer.

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Hoje curta na Rádio Tataritaritatá a música da cantora, produtora musical e empresária Maria Rita: Samba meu, Segundo, O samba em mim & Ao vivo & muito mais nos mais de 2 milhões & 700 mil acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja mais aqui e aqui.