quinta-feira, setembro 20, 2018

EDNA MILLAY, PERSE, HUIZINGA, LÉVI-STRAUSS, ELEAZAR DE CARVALHO & TANIA BRITTO


A FOGUEIRA DAS ESCOLHAS - Imagem da artista visual Tania Britto. - Acordar e o primeiro pensamento aos pesadelos terríveis ou sonhos de amanhã, quem sabe qual na corda bamba, se na rede dos desejos tudo é sempre o que vem de jamais chegar ou já foi para nunca mais, só esperança retardatária no agora é tarde e Inês está pra lá de morta faz tempo. Melhor abrir os olhos bem devagar, o dia nem bem amanhecido, ainda o friínho da madrugada, tudo às claras, mas nem tanto, alguma sombra da escuridão emerge pelos cantos escondendo possíveis fantasmas jamais revelados, nem dá pra ver direito outro dia talvez no alvoroço dos pássaros, e tudo poderá acontecer de uma hora pra outra, ou não, o tédio de uma rotina; ou mantê-los fechados ou quase, demorar as pálpebras cerradas pra ver se pega o cochilo perdido e voltar a pensar nas coisas, fantasias desejadas, e descansar de um lado pra outro, pra ver se algo de repente muda tudo, não sei, nem sempre é possível verificar direito o que está acontecendo. Melhor levantar porque acordou Maria Bonita para fazer o café e a polícia ainda dorme ausente, só mais tarde é que o burburinho vai misturar buzinadas e sirenes e motores e passadas e vexames e corre daqui pra acolá, dali pra lá, pra direita ou esquerda, pra lá ou pra cá, pra frente ou pra trás, não há como repassar, só retornar e começar tudo de novo, da estaca zero; e se perder a viagem, não esquenta, pega a próxima ou desiste e vai pra outro lugar. Tudo pronto pra andar, um, dois, passo a passo, pula academia ou finge balançar o esqueleto; e se ficar, tudo pode passar e não terá outra vez; e se for, não vá se arrepender, aprenda como se fosse a primeira vez, passou batido, já era, não é mais, nem tudo volta ou vai duma vez, assimile. Relógio não para, o tempo mudou, não há que esperar coisa ruim nem por milagres que caiam do céu assim do nada, seguir adiante, às piruetas, mesmo que pareça não sair do lugar; não adianta se não sabe de cor, a refazer as pegadas, algum rastro pode desencaminhar e aí era ontem a mesma coisa, só achar o caminho de volta se puder ou pegar o atalho, passar pelo beco, sair na transversal só pra mudar o trajeto que dá no mesmo entre risos e fracassos, nem sempre alegria, nem sempre impune com as reladas de venta, sempre imprevisível, quase possível ou impossível, na vera: quase acusação, quase indefensável; qualquer dúvida olha pra trás e dobra a esquina pra surpresa, ou nada demais, era só expectativa e deu na mesma coisa do labirinto quase desvelado, mas não vá à toa, leme qualquer na bússola para não escarnecer da sorte, porque mesmo à deriva ninguém escapa das lâminas da escolha e o feito está feito, favas contadas. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com a música do maestro e compositor Eleazar de Carvalho (1912-1996): Sympnhony 1 Mahler & òpera Tiradentes – Abertura, 3º & 4º atos & muito mais nos mais de 2 milhões & 600 mil acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja mais aqui e aqui.

DITOS & DESDITOS – [...] Se queremos, pois, salvar esta civilização, se não a queremos submersa em séculos de barbarismo, mas antes consolidar os tesouros da sua herança em alicerces novos e mais estáveis, torna-se, sem dúvida, necessário que todos os viventes compreendam bem até que ponto a decadência já avançou [...] embora seja verdade que a sociedade vai tomando este rumo, isto é, a direção de maior controle técnico no exercício do poder e do cálculo prudente dos efeitos desejados, o tipo humano tornou-se ao mesmo tempo mais e mais indisciplinado, mais pueril, mais suscetível a reações do sentimento, e os nossos governantes não são homens de aço [...]. Trechos extraídos da obra Nas sombras do amanhã: diagnóstico da enfermidade espiritual do nosso tempo (Armênio Amado, 1944), do professor e historiador neerlandês Johan Huizinga (1872-1945), defendendo uma nova cultura no solo da humanidade para uma regeneração interior do individuo, uma modificação do habitus espiritual do homem. Veja mais aqui.

DE PERTO E DE LONGE – [...] Queria mostrar que não existe um fosso entre o pensamento dos povos chamados primitivos e o nosso. Quando, em nossas próprias sociedades, observávamos crenças ou costumes estranhos, que contrariavam o senso comum, nós os explicávamos como vestígios ou lembranças de formas arcaicas do pensamento. Parecia-me, ao contrário, que essas formas de pensamento estão sempre presentes, atuantes entre nós. Muitas vezes lhes damos livre curso. Elas coexistem com formas de pensamento que se apoia no testemunho da ciência; são igualmente contemporâneas. [...]. Trecho extraído da obra De perto e de longe (Cosac Naify, 2005), do antropólogo belga Claude Lévi-Strauss (1908-2009). Veja mais aqui.

AMERS – [...] Aquela que se derrama em meu ombro esquerdo e enche a enseada do meu braço, feixe odorante e lasso, não atado (e tão sedosa foi a história, a meu tato, dessas têmporas venturosas), Aquela que repousa sobre a anca direita, a face cerrada contra mim (e grandes vasos assim viajam, em seu suporte de um lenho muito tenro e em sua sela de feltro branco), Aquela que se anima no sonho contra o remontar das sombras (e estendi o tendal contra o borrifo do mar e o rocio noturno, a vela é enfunada para o mais claro das águas), Esta, mais doce que doçura ao coração do homem sem aliança, me é carga, ó mulher, mais leve que carregamento de espécies, de arômatas — semente muito preciosa e frete incorruptível no barco dos meus braços. [...]. Trecho extraído da obra Amers – Marcas marinhas (Ateliê, 2003), do poeta francês Saint-John Perse (1887-1975).

TRÊS POEMAS - O AMOR NÃO É TUDO - O amor não é tudo: nem carne nem / bebida, nem é sono, lar da gente, / nem a tábua lançada para quem / se afunda e volta e afunda novamente. / O amor não pode encher o pulmão forte, / pôr osso no lugar, tratar humores, / embora tantos dêem a mão à morte / (enquanto o digo) só por desamores. / Bem pode ser, na hora mais doída, / ou da minha franqueza arrependida, / buscando alívio à dor, seja capaz / de vender teu amor por minha paz / ou trocar-te a lembrança pelo pão. / Bem pode ser que o faça. Acho que não. OBJEÇÃO DE CONSCIÊNCIA - Eu morrerei, mas / isso é tudo que farei pela Morte. / Eu a ouço tirando o cavalo da baia; / escuto as pisadas no chão do celeiro. / Ela tem pressa; tem negócios em Cuba, / negócios nos Bálcãs, muitos chamados a fazer nesta manhã. / Mas eu não vou segurar a rédea / enquanto ela ajusta as correias. / Ela que monte sozinha: / não lhe darei apoio na subida. / Embora ela fustigue meus ombros com o chicote, / não vou dizer para onde a raposa fugiu. / Com seu casco em meu peito, não vou contar onde / o garoto negro está escondido no pântano. / Eu morrerei, mas isso é tudo que farei pela Morte. / Não estou em sua folha de pagamentos. / Não contarei a ela o paradeiro de meus amigos, / nem o de meus inimigos. / Ainda que me prometa muito, / não darei o endereço de ninguém. / Acaso sou um espião na terra dos vivos / para entregar pessoas à Morte? / Irmão, a senha e os planos de nossa cidade / estão seguros comigo. Jamais, por minha culpa, você será derrotado. PRIMAVERA - Por qual propósito, Abril, de novo retornas? / A Beleza não é suficiente. / Não podes me acalmar com a vermelhidão / Das folhinhas unidas se abrindo. / Eu sei o que sei. / O sol queima a nuca quando observo / Os espinhos do croco. / O cheiro de terra é bom. / É aparente que não há a morte. / Mas o que isso significa? / Não apenas sob a terra os cérebros / São comidos por vermes. / A vida em si / Não é nada, / Uma taça vazia, lance de escadas sem tapetes. / Não basta todo ano, descendo o morro, / Abril / Chegar como um tolo, balbuciando e espalhando flores. Poemas da poeta e dramaturga estadunidense Edna St. Vincent Millay (1892-1950) que também usou o pseudônimo em prosa de Nancy Boyd. Veja mais aqui.

A ARTE DE TANIA BRITTO
A arte da artista visual Tania Britto.

AGENDA
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Quem olha pros outros não vê a si mesmo, Cecília Meireles, Rubem Alves, Henri Focillon, Imre Kertész, Neurofilosofia, Deborah Poynton & Luciah Lopez, Almeida Prado, Viviane Hagner, Hans-Joachim Koellreuter & Ophélie Gaillard aqui.
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Sou da terra e a ela me dou, Luis Fernando Veríssimo, Martin Buber, Inclusão Escolar & Maria Teresa Eglér Mantoan, Biblioteca Fenelon Barreto & CED Dimensão, Baden Powell de Aquino, Alina Ibragimova, Antônio Meneses, Maria João Pires & Pi-Hsien Chen aqui.