quarta-feira, junho 06, 2018

JUNG, VARGAS LLOSA, REXROTH, ROBBE-GRILLET, GAL COSTA, BENTHAM & NEWTON MESQUITA


ISSO É LÁ COISA QUE SE FAÇA, HOMEM! - Imagem: arte do artista plástico Newton Mesquita - Florilândio, o metido a Fulô das meninas, pensava que só ele era o sabido, o rei da cocada preta, arregaçava em todo o resto da humanidade, dele tratar feito um bando de jumentos levados na lábia, enrolava e saía invulnerado das suas presepadas. Quantas ele aprontou? Pintava e bordava arrotando vitória, nem, nem: Desarreda, mundiça, que lá vou eu. Gostava de passar calote aos trocados, dava cada salto solto, bastava aparecer qualquer abestalhado, era só dar o toque de arrodeio e sair lalarilará. E lá ia todo ancho. Tinha um papo de derrubar avião: quando não se vangloriava no amostramento, mendigava de dar pena pra ganhar a simpatia. Haja dissimulação, maior cara de pau. Se não fosse o barrunfado pra impressionar plateia, era autocomiseração por ter amado demais da conta e jamais fora amado no mesmo tanto. Ou seja, se não era o artista da hora, era o corno, dependia da ocasião e dos interesses dele. Ninguém acreditava nas suas estripulias, contudo, exitoso no fim das contas, sempre alguém era levado na conversa. Principalmente mulheres, o que mais lhe apetecia. Ah, alimentava um sonho: Seu Flor e suas duas maridas. Era. E quase conseguiu. Começou embromando a Lurdinaldina, a Lu Reboculosa, e nela impava e lavava a jega já de anos – era Fulô pra cá e pra lá, ais, uis; com o tempo, se viu enredado nos feitiços da Fatildita, a Fafá Virada, aos regalos e frouxidões – Fulô, mô fio, chegue, venha, venha mais, aiai. Ele só às gaitadas! Exibia as duas como troféu, uma não sabia da outra; soubessem, o pau cantava. Ele nem aí, julgando-se o irresistível que se safava de todas as broncas. Todo dia ele lá, tapiando uma e outra, altas horas da noite, tirando proveito da inocência delas, dia sim, dia não. Nem se lixava em precaução, confiava no taco e na sorte, se dizia corpo fechado. Um dia lá, as duas se toparam não sei onde e, no maior converseiro feminista desancando os machos da cidade, chegou o momento de uma elogiar seu próprio marido e a outra seguir no rastro na defesa do seu: Marido é o meu! Ora, o meu nem se fala! Cada uma delas rasgou enaltecimentos mais do tanto, que mais pareciam santos, a ponto de se desafiarem. No meio da disputa do quem é quem, um nome entrou na roda. Quem? Ué? Ele mesmo. Ih. O negócio fedeu. Como é mesmo? Certidão da lata dele lavrada, peraí, da arenga surgiu a sororidade e, no amiudado, se uniram para pegá-lo na virada: Vou acertar a tampa desse salafrário! Ele que se avie, desgraçado das costas ocas. Combinaram: a escolha do local e o dia aprazado. Só uma levava. Negócio fechado. Nem adiantou ele alegar compromisso inadiável, reuniões, negócios por fechar, obstáculos muitos e outras trampolinagens, foi na marra. Lá chegando, nem deu tempo de se sentar direito: deparou-se com as duas com as mãos no quarto. E agora? Açucareiros amargos pras bandas dele. Deu-lhe um ímpeto de avestruz, nem tinha pra onde correr, nem se esconder. Buraco no chão, não havia. E aí seu Flo-ri-lân-dio? Fu-lo-riiiiii-âaaaaan-diiooooooo, se explique! Seja homem, vá! Aquilo deu um arrepio dele sentir a morte tirar um fino nele. Fala, paspalho! Olhou prum lado, pro outro, todo mundo olhando, fez que ia, elas barraram, não foi; um sorriso amarelo, a cara amarrada delas. Fez que chamava o garçom, elas batiam o pé no chão, implacável olhar delas pra ele: E aí, como é, fajuto? Deu de ombros, coçou o bucho, fez cara lisa, mãos no quengo, pigarreou, alisou o bigode, apertou o queixo, enfiou o dedo numa orelha, conferiu os botões da camisa, arrumou o cinturão e as calças, ficou batendo no peito, se agachou e elas lá, impassíveis. Fez de tudo e como não tinha mais jeito, danou-se a chorar: A carne é fraca e o coração é bicho besta! Uma delas pegou-lhe pela beca: Por quê? Deu-lhe umas sacudidas: Vá, responda, seu safado! A outra veio, deu-lhe uns beliscões e depois o cobriram de tapas. Oi, oi, oi! Chute na canela, murro no espinhaço, puxada de cabelo, apertão nas ventas. Fala, seboso! Desembucha! E ele, aos prantos: A culpa é do amor. A outra: Como? Eu amo as duas. Cabra safado. E foi o maior teitei: cadeiras, cinzeiros, sapatos, toalhas, mesas, tudo pelos ares na direção dele. Fale, safado! Cínico! Filadaputa! O maior escarcéu e o cabra apanhando, teibei. O espetáculo passou pro prejuízo de outros, foi aí que interviram e as duas guerreiras prontas pra matar o cabra a pau, ainda deram-lhe oportunidade de falar, aos soluços: A culpa é minha, sou um cara que ama as duas. Foi pior, elas se enfezaram e partiram pra cima, apertaram seu gogó de quase matá-lo! Quem é você, seu cretino! Nojento! Cafajeste. Quem é você mesmo, hem? Ele grita esgoelado: Esse cara sou eu! Esse cara sou eu! Desculpa, perdão! Calhorda! Isso é lá coisa que se faça, homem! Aprenda, amaldiçoado. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com a música da cantora Gal Costa: Acústico MTV, Fantasia, Profana, Estratosférica, As melhores & Caras e Bocas & muito mais nos mais de 2 milhões de acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja mais aqui e aqui.

PENSAMENTO DO DIACrie toda a felicidade que você for capaz de criar; remova toda a miséria que você for capaz de remover. Fazendo isto todos os dias você irá trazer algo de bom aos outros ou diminuir seus sofrimentos. Pensamento do filósofo e jurista britânico Jeremy Bentham (1748-1832). Veja mais aqui.

AS MANDALAS – [...] Enquanto as mandalas cultuais sempre apresentam um estilo especial e um número reduzido de temas típicos quanto ao conteúdo, as mandalas individuais utilizam uma quantidade ilimitada de temas e de alusões simbólicas, que denotam facilmente serem uma tentativa de expressar, quer a totalidade do indivíduo em sua mundividência interior ou exterior, quer o ponto de referência essencial interno do mesmo. Seu objeto é o si-mesmo em oposição ao Eu, que é apenas o ponto de referência da consciência, enquanto o si-mesmo inclui a totalidade da psique de um modo geral, ou seja, o consciente e o inconsciente. Não raro a mandala individual mostra uma certa divisão numa metade clara e outra escura, com seus símbolos típicos. Um evento histórico deste tipo é a mandala de Jacob Böhme, a qual se encontra em seu tratado Viertzig Fragen von der Seele. Ao mesmo tempo, é uma imagem de Deus e como tal é designada. Isto não é casual, na medida em que a filosofia indiana, a qual desenvolveu sobremaneira a ideia do si-mesmo, do atmã, ou purusha, não diferencia em princípio a essência humana da divina. De modo correspondente, a scintilla, a centelha da alma, a mais íntima essência divina do ser humano também é caracterizada por símbolos na mandala ocidental, símbolos que podem também designar uma imagem de Deus, isto é, a imagem da divindade que se desdobra no mundo, na natureza e no ser humano. [...]. Trecho extraído da obra Os arquétipos e o inconsciente coletivo (Vozes, 2000), do psiquiatra e psicoterapeuta suíço Carl Gustav Jung (1875-1961). Veja mais aqui e aqui.

TIA JÚLIA E O ESCRIVINHADOR – [...] A família sabia de tudo desde o começo e tinha mantido uma atitude discreta pensando que era uma bobagem, uma coqueteria sem importância de uma mulher desmiolada que queria acrescentar ao seu prontuário uma conquista exótica, um adolescente. Mas como Tia Julia não tinha mais nenhum escrúpulo em se exibir por ruas e praças com o garoto e cada vez mais gente amiga e mais parentes descobriam esses amores ˗ até os meus avozinhos tinham se interado, por uma intriga de tia Célia ˗, e isso era uma vergonha, uma coisa que deveria estar prejudicando o rapazinho (quer dizer, eu), que, desde que a divorciada tinha lhe enchido a cabeça, provavelmente não tinha mais ânimo para estudar, a família resolvera interferir. [...] Tinha se aproximado dele, lívido, havia lhe mostrado o revólver, ameaçado dar-lhe um tiro se não revelasse onde estávamos eu e tia Julia. Morto de pânico (“até àquela hora eu só tinha visto revólver em filme, compadre”), Javier jurou e rejurou por sua mãe que não sabia, que não me via há uma semana. Por fim, meu pai havia se acalmado um pouco e deixado uma carta para que me entregasse em mãos. [...]. Trechos extraídos da obra Tia Júlia e o escrevinhador (Folha de São Paulo, 1977), do escritor, jornalista e político peruano Mario Vargas Llosa, Prêmio Nobel de Literatura de 2010. Veja mais aqui.

DOIS POEMASAS VANTAGENS DE APRENDER: Eu sou um homem sem ambições / E poucos amigos, totalmente incapaz / De ganhar para viver, ficando / Mais velho, fugitivo de alguma maldição. / Sozinho, malvestido, o que isso importa? / À meia-noite eu preparo para mim uma caneca / De vinho branco quente com sementes de cardamomo. / Vestido com um robe cinzento rasgado e uma velha boina, / Eu me sento no frio e escrevo poemas, / Desenhando nus nas margens deformadas, / Copulando com imaginárias garotas / Ninfomaníacas de dezesseis anos. SONHO COM LESLIE - Você entrou em meu sono, / Chegou com seus imensos, / Luminosos olhos, / E cabelo castanho-claro, / Atravessando cinquenta anos, / Para cantar novamente para mim aquela canção / De Campion, que nós um dia tanto amamos. / Eu beijei sua garganta, que vibrava. / Não havia pista, no sonho / De que você foi há muito, muito / Uma nova visita, / Com a alegre Helen, a branca Iope e as demais — / Somente a paz / Do cair da tarde / Num misericordioso outono / Na juventude. / E eu me esqueci / Que eu era velho e você uma sombra. Poemas do poeta, tradutor e ensaísta crítico estadunidense Kenneth Rexroth (1905-1982). Veja mais aqui.

A ARTE DE ALLAIN ROBBE-GRILLET
O escritor e cineasta francês Alain Robbe-Grillet (1922-2008) é um importante representante do movimento de vanguarda denominado nouveau roman, que enfatizava a linguagem igualmente como arte da imagem e da palavra, visando a desconexão com as convenções do real, caracterizado pelo violento contraste em relação às narrativas que partem da dinâmica tradicional, numa ruptura da causalidade. No cinema ocorre a desconstrução da realidade com o enfrentamento da irredutibilidade do real imposta pela imagem, utilizando manipulações que exploram possibilidades na montagem, cromatismo, enquadramento, composição, entre outras técnicas.


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