segunda-feira, julho 30, 2018

RILKE, TAHAR JELLOUN, JOSEPH CORNELL, KO HUNG, NEY MATOGROSSO, JESSIER & DORO


PÉ DO PULE - Imagem: arte do artista estadunidense Joseph Cornell (1903-1972). - Doro acordou com aquela milhar na cabeça, ganhou num sonho. Pegou no bolso o calendário com a pin-up dos sonhos, conferiu o dia e o mês, é hoje, entraria na história. É hoje. Nem se lixava mais com nada, o seu pensamento predominante: é hoje. Isso para quem estava só a pelanca, couro e osso, credores tudo no pé, uma ruma de bronca pra todo lado, nunca mais. Hoje é o dia. Levantou-se, asseou-se como de costume e, apressado, botou a cara na rua. Atordoado, pra onde se virasse, os números perseguiam: a casa da frente, eita! Ao atravessar a rua, quase atropelado de tão envolvido com a sorte: a placa do carro, danou-se! Olhou o relógio, vixe! É hoje. Pegou a conta da luz, o valor. Foi ter no açougue, o peso dos miolos de boi na balança, a milhar; e como nada dava certo, essa podia dar na cabeça. É hoje. Ah, foi ter logo com o cambista. Qual o pé do pule? Era ela, a mesma do sonho, a sua perseguição. É hoje. Tascou no palpite. Pronto, resolvido, é hoje. E saiu descompromissado de tudo. Passou o dia sonhando com os olhos abertos, devaneava toda sorte de ventura. Não mais a um passo da queda, sopesava; Passou a vida a limpo: quantos desdouros, vítima dos remoques e chasqueados, ah, esquecia a tuia de coprólitos deixados nos caminhos já passados, os borborigmos que permeavam seus conflitos e males, nada, agora era outro, tudo já era, e já se via fazendeiro dono de terras, bichos e posses, viajando na maior das jornadas pelas lonjuras dos roteiros mais chamativos das bandas estrangeiras, os sete mares, os quatros cantos do mundo, florestas de não sei de onde, desertos de lá longe, palácios de reis e rainhas, enfrentando perigos em todos os tipos de aventuras contadas para deixar todos de queixo caído com as mais tenebrosas façanhas e diabólicas situações; proprietário prestigiado de um harém com as mais reboculosas, uma para cada dia do ano, e mais tantas opulentas e sedutoras serviçais para as horas vagas; mandando e cagando raio a torto e a direito; cheio das extravagâncias. Imaginava fazendo doidice só pra se mostrar excêntrico, bancando farra, cagando dinheiro, limpando o rabo com nota de cem, aprontando desordens e estripulias nas maiores arruaças, pervertendo a ordem, todo impune pela fortuna, sem remorsos pelas infâmias e torpezas, sabia não mais ter que expiar, a remissão da indigência de sempre, peito cheio, agora dava pra pensar eleito prefeito, deputado, senador e, íntimo das castas do poder, governador, presidente numa ascendente e vitoriosa carreira política, já se dava por tudo e certo. Até que o dia já fraquejando pro império da noite, o relógio marcava: faltavam vinte pras cinco, a hora do resultado estava prestes, é hoje, foi conferir: tiro e queda. Ela inteirinha, dezena, centena e milhar, na cabeça. Disse pra si: pronto, quebrei a banca. Foi lá, vasculhou os bolsos, cadê? Nada, vixe! Cadê o danado do pule. Virou-se, revirou-se, remexeu bolsos e algibeiras, onde tinha se socado o danado, apareça desgraçado. Nada. Levou tempo e nada, enfrentou de cara lisa: acertei, quero meu prêmio. Cadê o pule? Perdi, não acho. Ah, não vale. Lembrou-se: o cambista? Ninguém sabia, lugar mais limpo. Oxe, quero meu prêmio, joguei, acertei, quero o justo no contado, tintim por tintim. Você está doido, é? Traga o pule e a gente paga, na hora. Não adiantou seu arrazoado, ou prova ou nada. Fez de tudo, a sorte fugia entre os dedos. Insistiu, esperneou, chorou, nada. Não era sonho, que pena. Fui engalobado de novo. Alegria de pobre dura pouco, acabou-se o que era doce. Sou um bucho inchado arrodeado de peidos por todos os lados. E tudo voltou ao antes, mais um dia atrás do outro. Era o Doro de sempre. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo & aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com a música do cantor, compositor, dançarino, ator e diretor Ney Matogrosso: Secos & Molhados, Batuque ao Vivo, Um Brasileiro & Canto em qualquer canto & muito mais nos mais de 2 milhões & 500 mil acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja mais aqui e aqui.

PENSAMENTO DO DIA – [...] Os objetos começam com o mundo; são o mundo. Mas além das coisas da natureza que saem de meios invisíveis para nós, existem outras, formadas pelo homem de acordo com o modelo daquelas que foram encontradas e vistas anteriormente. [...] Deve ter sido uma experiência estranha verificar que as coisas feitas com as próprias mãos eram tão reconhecidas, tão iguais em seu direito de existência, tão reais ao lado daquilo que existia. [...] E agora ter essa experiência – ver como aquilo que se imitava com ardor e ansiosamente, que, em sua perfeição, adquiria a mesma serenidade, a mesma dignidade, se unia às coisas, assim como os mortos se unem aos bem-aventurados: para perdurar – como aquilo se tornou estranho e, não obstante, conservou uma intimidade delicada e melancólica. [...]. Trecho extraído da obra Auguste Rodin (Nova Alexandria, 2003), do poeta alemão Rainer Maria Rilke (1875-1926). Veja mais aqui.

A VIDA & O BEM VIVER - [...] Pegue três libras de cinábrio e uma libra de mel branco, misture-0s. Seque a mistura ao sol. Asse-a no fogo até poder formar pílulas. Tome dez pílulas do tamanho de uma semente de cânhamo a cada manhã. Dentro de um ano, os cabelos brancos voltarão a ser negros, dentes cariados voltarão a crescer, o corpo tornar-se-á liso e resplandecente. Um velho que tomar esse preparado por um logo período de tempo se tornará jovem. Aquele que o tomar constantemente desfrutará de vida eterna e não morrerá. [...] É também perigoso para as pessoas que amam a vida confiar em suas próprias especialidades. Aqueles que conhecem as técnicas do Clássico da Dama Misteriosa e o Clássico da Dama Comum dirão que apenas a “arte da alcova” conduzirá à salvação. Aqueles que entendam o método dos exercícios espirituais dirão que apenas a absorção da força vital pode prolongar a vida. Aqueles que conhecem o método do alongamento e flexões, dirão que apenas os exercícios físicos podem prevenir a velhice. E aqueles que conhecem as fórmulas das ervas, dirão que apenas a medicina poderá tornar a vida eterna. Eles fracassam, em sua busca do tao porque são muito unilaterais. Pessoas de conhecimento superficial acham que sabem o suficiente quando de fato conhecem apenas um caminho e não percebem que a verdade é daquele que busca incessantemente, mesmo depois de ter conseguido algumas fórmulas. [...]. Trecho extraído da obra Nei p’ien: Estudo da alquimia chinesa (Xangai, 1928), do escritor esotérico e alquimista taoista chinês Ko Hung (Pao-Pi U Tz’u – 283-343).

COMITÊ POVÃOTem político que é feito banana de carboreto, engana com a cor da casca. Com essa enganação torna-se imprestável feito rede de bexiguento. Nunca tarde lembrar que trajetória política é feito carreira de raposa, sinuosa e sujeita a tiro e queda. Para o bom político no entanto, é prego batido e ponta virada. O político é feito papagaio do brejo, já nasce pedindo a palavra e tem discurso cor de arara. Com seu modo simples e fala vinda do céu, sabe microfonar a palavra e provar com voz de cimento que é caboco tutanudo, amarombado, que não tem guerra na alma e nem limão no pensamento. Já o mau político é macio por fora e por dentro é uma lixa doze de pessoa. É aquele olhar xingoso, mãos de visgo de jaca e solto na buraqueira. Em matéria de trabalho só tem bambeira nas pernas. É espremedor de gente, é coice de rifle ruim, tem queda pra desmantelo e discurso cor de viúva. O mau político é feito pombo, quando sobe, borra na cabeça do povo. Mas é como diz o matuto: um dia é da caça, outro é da checa. Por isso contra o mau político, use sua melhor arma: o seu voto! Trecho extraído da obra Política de pé de muro (Bagaço, 2002), do poeta, compositor e intérprete Jessier Quirino. Veja mais aqui, aqui e aqui.

PALAVRAS DE UM PERSONAGEM CEGO - As histórias que se contam são como lugares. São habitados por aqueles a quem pertenceram em tempos longínquos, não necessariamente por aquilo que alguém pode chamar de espíritos. Uma história é como uma casa, uma velha casa com diversos níveis, diversos aromas, quartos, corredores, portas e janelas, cavas e grutas. Espaços inúteis. As paredes são a memória. Raspe um pouco uma pedra, aproxima uma orelha e ouvirá coisas certamente! O tempo recolhe aquilo que o dia traz aquilo que a noite esparge. Cuida e aprisiona. O testemunho é a pedra. O estado da pedra. Como pedra é uma página, escrita, lida e cancelada. Tudo adere-se nos grãos da terra. Uma história. Uma casa. Um livro. Um deserto. [...]. Extraído do livro Criaturas de areia (L’Ermete, s/d), do escritor e dramaturgo marroquino Tahar Ben Jelloun.

A ARTE DE JOSEPH CORNELL
A arte do artista estadunidense Joseph Cornell (1903-1972).

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Colhendo sonhos nos galhos da vida, Voltando às raízes pra recomeçar do zero de novo, a arte de Vincent Hložník & Luciah Lopez aqui.

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Semafil Livros nas faculdades Estácio de Carapicuíba e Anhanguera de São Paulo. Organização do Silvinha Historiador, em São Paulo. Fone: 11 98499-2985.