quinta-feira, março 15, 2018

DERRIDA, SARTRE, PONTOPPIDAN, HEINE, OSWALDO MONTENEGRO & FERNANDA CANAUD, MARCUS ACCIOLY, CYANE PACHECO & BANDO DE MÔNADAS



BANDO DE MÔNADAS - Imagem: arte da artista plástica & visual Cyane Pacheco. - O poema e sete verdades, o lance do destino. Sou apenas palavras em ordem secreta, ao sopro do barro, aos olhos ávidos dos vivos. O reconhecimento da cumplicidade é o começo da inocência. O reconhecimento da necessidade é o começo da liberdade. O poema é um mundo enterrado num homem. Em mim lavra safra de murmúrios. A palavra por nossas veias trânsito da alma. Quanto mais estrelas, mais céu noturno. Quanto mais tempo, mais eternidade. O terceiro poema, caligrafia de sombras, parvo e torpe itinerário, sombra que enardece até a incandescência. O intérprete dentro do poema não é pranto de coração, nem turbilhão incontido de emoção rimada: o belvedere do significante mira o significado. Eis a moça que passa na manhã revelada, rompem-se os véus da volúpia. Eis a moça que passa ao largo do sonho. Quando ela passa me habita de silêncio, grassam ternuras espessas. Eis a moça e estridente desejo com seios estrelados, rosa dos mamilos para o pomar das mãos, último refugio da lascívia pura. Vivo amor sem treva ou tortura, à sublime leveza da nudez feminina, à folha ou falha da erva atapeta o púbis da menina, deixe apenas o poema debruçar-te sobre ti, deixando rastros de aromas, pira de perfumes, rendas de narinas. Eis a moça que cessa seu encanto noturno, refugio-me nos punhais acesos da solidão, dores de ouro e prata nos ermos intrincados da alma nas furiosas veredas das horas. Eu não sei onde quando aos erros te levaram, moendas do tempo leva à completa embriaguez verbal. À longa e grata satisfação do abismo e do adjetivo, ao eterno trabalho do pó, ao inútil trabalho dos lírios, estranho tornado de aromas. Eis cortejo doloroso de cinzas rosas no páramo, eis cinzas dos sonhos, que a vida ferina em coivaras tornou correndo a última rua do mundo, que buscas peregrino da aurora cavalgando ginetes de estrelas por estradas que a luz avassala. Busco o rosto que Narciso toldou com seu orgulho e espelhos para mirar-te jóias suspensas dum escrínio azul. Há lágrimas magnólias caindo do ramalhete dos olhos, do jardim do rosto despencado. O poema surge e ressurge. O poema acontece. Acontece, súbito relâmpago, voragem que escurece o jugo das palavras, incorpora-se à paisagem do tempo como a lava do vulcão à geografia do olho, encarna-se na passagem do fruto como a boca no mundo, emerge dado, acontecido, fato de palavras construído, o trama do inverso vertido para temperar metáforas, alicates metonímicos. O poema ergue-se de um reservatório de escombros, a essencia nua do trovar escuro não é a recolha de uma messe de letras de uma legião de dores. Poetas sucumbem ou se salvam. Vem a poesia ao poema em fragmentos de mundos, sob tempestades ou calmaria de palavras, da água para naufrágios, da ira para deserdados, de dor para os desamados, tudo para nada, sêmen e fuga, sete poemas sem causa, as mônadas dos sábados. Exortação ao leitor: faça alguma coisa, não deixe cair da mão esquerda a bandeira esfarrapada do poema, a vida não é digna dos incautos. Troque ócio pelo verso, rima por vício, cure com poesia enfermidade do tédio, sal da luz, a tona da verdade. (Letra-colagem para música sobre o poema Bando de mônadas, de Vital Corrêa de Araújo). © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

A ARTE DE CYANE PACHECO
A arte da artista plástica & visual Cyane Pacheco. Veja mais aqui e aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com a música do cantor e compositor Oswaldo Montenegro: Ao vivo 25 anos, 3x4 & Escondido no tempo; a pianista e compositora Fernanda Chaves Canaud: Radamés Gnatali, Lua Branca de Chiquinha Gonzaga & Coração que sente de Ernesto Nazareth; & muito mais nos mais de 2 milhões de acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir.

PENSAMENTO DO DIA – [...] Ser poeta é saber abandonar a palavra. Deixá-la falar sozinha, o que só pode fazer escrevendo. [...]. Pensamento extraído da obra A escritura e a diferença (Perspectiva, 1971), do filósofo francês Jacques Derrida (1930-2004). Veja mais aqui.

A LITERATURA - [...] Um grito de dor é sinal da dor que o provoca. Mas um canto de dor é ao mesmo tempo a própria dor e uma outra coisa que não a dor. Ou, se se quiser adotar o vocabulário existencialista, é uma dor que não existe mais, é uma dor que é [...]. Não porque o artista tenha paixões mais ricas ou mais variadas, mas porque suas paixões, que talvez estejam na origem do tema inventado, ao se incorporarem às notas, sofreram uma transubstanciação [...]. Trechos extraídos da obra Que é literatura? (Ática, 1989), do filósofo, dramaturgo e escritor francês Jean-Paul Sartre (1905-1986). Veja mais aqui.

AMOR DE MOCIDADE – [...] Se procurava tornar-ser bonita, não era para Jesper. Cada vez que eu pronunciava o nome do noivo, uma sombra passava pelo seu rosto. Era outro, um adventício, que conquistara seu coração e dava ao seu olhar um curioso brilho vacilante. Desde algum, ela adquirira uma atitude um pouco misteriosa, e sucedia-lje, se a contrariavam, ter verdadeiras crises de cólera. Era má, principalmente com Jesper. Uma noite em que ele quisera colocá-la à forçã sobre os seus joelhos, ela mordera-lhe fortemente o rosto. Eu tentava como sempre interrogá-la para desvendar seu segredo; mas desta vez nada me foi possível obter. Ela bancava a ingênua e respondia com gestos evasivos às minhas perguntas. Sondei a mãe, pensando que talvez soubesse alguma coisa: falou-me de um moço que “ficou por aqui toda uma tarde, para tomar uma xícara de café”; mas não pude obter nenhuma informação precisa, nenhuma explicação concreta. Eu pensava com ionquietude o que sucederia a Jesper surpreendesse um dia Martha com um estranho. Sabia que ele continuava a montar guarda nas vizinhanças do albergue, munido de um grosso bordão. Martha, de uma gaveta da cômoda, tirou roupa limpa, meias, um lenço, ao mesmo tempo que um laço de veludo negro com um medalhão âmbar, e pôs tudo sobre uma cadeira, junto ao espelho. Sem perceber, cantarolava uma canção, enquanto prendia os cabelos, punha as ligas e dava o laço nos sapatos. Um belo jovem caminhava nos bosques, sorriso nos lábios, alegria no olhar. De subido, lembrou-se que também havia na gaveta os antigos brincos de prata de sua mãe. Havendo calçado apenas uma das meias, aproximou-se saltitando da cômoda, e experimentou-os. Voltava a cabeça para um lado e outro, diante do espelho, após o que teve um gesto de satisfação. Uma donzela se aproximou timidamente, os olhos baixos. Havia nesses pedaços de canção alguma coisa que despertou minha curiosidade. Não pertenciam às nossas habituais canções. Entretanto, eu tinha a impressão de conhecer as palavras. [...]. Trecho extraído de O urso polar e outras novelas (Delta, 1963), do escritor dinamarquês Henrik Pontoppidan (1857-1943), Prêmio Nobel de Literatura de 1917.

POEMAVem, linda peixeirinha, / Trégua aos anzóis e aos remos. /Senta-te aqui comigo, / Mãos dadas conversemos. / Inclina a cabecinha / E não temas assim: / Não te fias do oceano? / Pois fia-te de mim. / Minh’alma, como o oceano, / Tem tufões, correntezas, / E muitas lindas pérolas / Jazem nas profundezas. Poema do poeta romântico alemão Heinrich Heine (1797 – 1856). Veja mais aqui e aqui.

A poesia de Rogério Generoso,
Viva Marcus Accioly (1943-2017) na APLE & muito mais na Agenda aqui.
&
Pelos caminhos da vida, a Lenda dos Índios Tembé, a música de Benedicto Lacerda - Benê, a arte de Alessandro Biffignandi, a fotografia de Diane Arbus, Ligia Scholze Borges Tomarchio, a pintura de Clodomiro Amazonas & Ferdinand Hodler aqui.