segunda-feira, abril 10, 2017

UIVOS DAS HORAS MINGUANTES

UIVOS DAS HORAS MINGUANTES - Imagem: Man morning Mexico, art by Thomas W. Schaller. - Da janela o mundo todo dentro do quarto, o quinhão: insetos, móveis empoeirados, utensílios e apetrechos, brebotes, tudo desarrumado e a vida qualquer. Da grade de segurança a selva da vizinhança como um coro de barítonos, o barulho e a aragem do dia nublado lá fora, contrastando com o abafado irrespirável de dentro: herança de descontentamentos, espólios fantasmas. A conduta ascética invalida a sanidade das regras sociais, a permissividade e o pernicioso imperam na vez do imoderado. A solidão é maior que a noite, a manhã pra se socorrer do desespero. Pra ganhar a vida por seus próprios esforços, muito pra fazer e dizer, nada pra falar às paredes com seus interlocutores invisíveis, a clausura da cidade. Na verdade, a gente não sabe o que diz; soubesse, primava pelo silêncio, além de crescer em si, evitaria muito aborrecimento. De boa vontade as promessas esborram como se entornassem esperanças, tudo às favas, bravura pra extirpar decepções e derrocadas. O que a gente fala ou escreve, maior desvalia, só pro outro solícito; cada qual entende ao seu modo, afeto ou grosseria, gentileza ou covardia. Muita ameaça no ar, umbigos na feira das vitrines, estalidos no zoadeiro das ruas. Se der o troco, repulsas e ofensas de nada, represálias e revides. Há de se preparar pra não passar por besta, pra ter serventia no curral da grana pra não ser lixo pra vermes. Para viver bastam sentir e agir; pra morrer, basta estar vivo, ambas se completam. As horas passam e corroem tudo ao redor. Muito chão pela frente, sobram escombros no âmago. Não há para onde ir, mesmo o panorama escancarado é um porvir inacessível: pra ir, não foi; se vai, não chega. Para alguém, senão todos que conheço ou convivi, não passo de passado, nada mais; para mim, todos são presentes, todo dia. O que fiz ou deixei de fazer noves fora nada, só o agora no vazio das mãos, vontade no peito e vielas por encruzilhadas. Tudo é pra quê e pra quem; e se assim não for, tão inútil será como. Os mistérios da esquina não resistem à chegada: era só o desconhecido, malícia sedutora do ignoto. E se vai pra esquerda ou vem da direita, acima do que vê, cai rente e passa por baixo. O afoito é não ter precisão. Objetivos de hoje podem virar descaminhos amanhã nas tardes como águas pro mar. Pra quem vai à deriva, seja como for. Só uma coisa: escrever é a minha maneira de existir. Como dizia Gullar: viver não basta. Amém e amem. © Luiz Alberto Machado. Veja mais aqui.

 A bailarina estadunidense Allison DeBona.

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