segunda-feira, abril 04, 2016

SEGURA O JIPE!

SEGURA O JIPE! (Imagem: fotos do Jipe da Vera atolado!) – Vera tinha dois sonhos: balé e jipe. Por causa de um, realizou o outro. Ou quase. Pra falar a verdade não foi bem assim, mas foi: - Vou comprar um jipe! -, disse ela decidida a adquirir esse bem vultoso. Tico e Teco em funcionamento, uma ideia misturada com tabuada, conta nos dedos, noves fora, prova dos nove, resultado: raspou o tacho arrastando duzentos pila da conta de poupança e foi comprar peças íntimas pra negociar. Como ela matava todas as mulheres da cidade de inveja e ciúmes, o estoque adquirido não durou nem meia hora, até suas próprias peças íntimas foram misturadas no meio das vendas. Aí, zarpou para novas compras, motivada pelo negócio da China que empreendera. Uma semana depois novas contas, arengas matemáticas e a constatação: - Com esse apurando não compro nem a foto do jipe! No aperto, teve outra ideia: uma rifa! E botou na roda todo o seu guarda roupa e outros pertences de sua intimidade, a ponto de vender uns dez talões de bilhetes, reinvestindo na venda, quando propuseram comprar suas fotos em poses sensuais, ajuntando um bom trocado. - Vera tira uma foto cum eu? Vinte pila; de rostinho colado, trinta; abraçada com o Zé Mané, cinquenta; seminua, cem. Pagou, tirou. – Dança com eu! Valsa, cinquenta; meia hora, cem. Baile: - Ah, nem fodendo! Não tem homem à altura pra dançar comigo a noite toda. Mas quanto? Tô fora! Uma foto nua: - Não, senhor, ainda tá pra nascer quem vai ter Vera nua! Só o príncipe encantado. Um beijo na bochecha ou na testa: dez pila; uma bitoca: cinquenta. Beijo na boca de língua: nem vem que não tem. Tudo tabelado com suas respectivas restrições, só assim, nada assado. Chegou a ponto de fazer até leilão das suas coisas. Ia dando certo até a hora que a marmanjada propôs dela leiloar a calcinha que estava vestida na hora, bem como a blusa, o sutiã, a calça, o sapato, as meias. – Ué! E vou ficar nua? A plateia ficou em polvorosa. – Aí são outros quinhentos! Por causa disso, mais ideias afloraram: resolveu, eureca, fazer uma cabine erótica e um sex shop no anexo de sua própria casa. Tudo tabelado e por cinco minutos: vê-la dançar vestida, vinte pila; decotada de mini saia, quarenta; de shortinho e bustiê, sessenta; de calcinha e sutiã, cem. A negada ficava de queixo caído quando ela aparecia com as calças arrochadas de deixar a mostra os mínimos detalhes de suas intimidades. U-hu! No lado direito da cabine estava uma tabela com os respectivos valores de tudo que ela oferecia. No final havia uma indicação: outras propostas deixar foto pôster e telefone. E uma outra observação em letras garrafais: PROBIDO TIRAR FOTOS. Para isso, contratou um brutamonte de dois metros de altura e largura para catar aparelhos celulares e máquina fotográfica na porta da cabine, revistando tudo e todos, e organizando a fila que dava para mais de três quarteirões dali. O mais lucrativo dos produtos do sex shop era a venda da calcinha que ela estava vestida e tirada na hora pro freguês. Feliz, ela realizava o seu sonho: não seria uma bailarina clássica, mas fazia o que mais gostava: dançar e se exibir. Não seria uma Ana Botafogo, contudo inventara moda dançando do seu jeito! A galera delirava. Entre os recados dos clientes, teve um sujeito que deixou a foto e o aparelho celular. Como passou na revista? No outro dia um novo recado: Ontem deixei a foto e o aparelho pra você me ligar, o número é xis. De noite ela ficava conferindo as propostas pra ver se no meio apareceria algum que valesse a pena ela se envolver pra casar. Reprovou tudo, principalmente as propostas indecentes que não cessavam de chegar. Porém, a mais insistente solicitação era que ela dançasse nua. Foram tantos os pedidos que ela castigou no preço: duzentos por cinco minutos. Com uma restrição: não é permitido bater punheta. Ela se precavia da sujeira que ia ter que limpar no final do dia, oxente. Sabida. Ah, teve neguinho que vendeu penico, caçarola, brebotes e tranqueiras para vê-la nua, dançando e rebolando na vitrine. Ao cabo de uns quinze dias mais ou menos estava ela endinheirada a ponto de dar um pulo na capital pra fazer um consórcio do veículo e iniciar as aulas na autoescola. Mais uns quinze dias depois estava ela habilitada – até hoje o instrutor está no asilo brincando de passar os dedos nos beiços –, depois de dar um lance liquidando o consórcio e adquirindo na concessionária o sonho: um 4x4 conversível com capota automática. Como não sabia andar muito menos guiar direito pelas ruas e avenidas da metrópole, catou uma prima pra conduzi-la. Chegando em Alagoinhanduba foi organizar as compras que fizera: coleções de bonés, gorros, quepes e capacetes; coleção de botas de todos os canos e saltos; maquiagens, bustiês, blusões, blusinhas, calças acochadas, meias, óculos – inclusive comprou um RayBan importado dos USA – e outros tantos adereços e adornos para desfilar dirigindo sua máquina possante. Era final de semana e acertou com a prima de irem para uma praia que era um outro sonho dela. – E como a gente vai sem saber onde é? Ué, é só seguir as placas. E pegaram a rodovia desfilando pelo asfalto. Chegaram ao ponto de indicação de entrada do tal balneário, era uma estrada de barro. – Cadê as placas? Ela acionou o GPS: local não identificado. Foi pro aparelho celular buscar informações: sem sinal. – Danou-se, aqui não se pega nem doença ruim. Pé no acelerador. A certa altura da estrada, quando descia duma ladeira íngreme, Vera enfiou a venta do jipe num atoleiro, dele fumaçar, empancar e parar de vez de funcionar. – Num sei pra que esse negócio de 4x4, se fica enganchado numa besteira dessa! Nada, era uma rieira funda, daquelas que são capazes de sugar até avião que passe por perto. Não teve dúvidas: subiu um morro próximo e conseguiu sinal pra ligar pra seguradora. Aí a atendente perguntou sua localização pra enviar o socorro. E ela: - Ué, não sei! Vocês que disseram que meu carro tinha um dispositivo que vocês localizariam onde ele estivesse. Não deu. Quando foi informada que a apólice não cobria atolamento, ela ficou puta da vida e reclamou que o carro morreu e que não saía do canto. Pronto. Bate boca medonho, o dia todo perdido e quase escurecendo chegou o guincho. – Até que enfim, pensei que ia findar dormindo aqui no meio do mato. – Mas, minha senhora, cuma é que se atola um bicho desses? Ela olhou pro cínico, contou até dez pra não admoestar o sujeito folgado. Ao contrário, abiu mais uns dois botões da blusinha e soltou um botão do shortinho. O motorista botou um boticão de olhos, arrumou tudo às carreiras e deixou-las em casa. Em recompensa, as duas fizeram uma sessão especial de dez minutos pra ele na cabine erótica. O cabra saiu doidinho de pedra de quase não chegar ao destino. – Ô Vera e agora? Agora, minha filha, quando o carro ficar pronto vou expandir meus negócios é na capital! Destá. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.


Imagem a arte do escritor, arquiteto, professor e artista plástico alagoano Pedro Cabral. Veja mais aqui, aqui e aqui.

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CRÔNICA DE AMOR POR ELA
Imagem: Foto do jipe e da prima da Vera que inadvertidamente achou de ficar na frente na horagá do clique, o que fez com que ela jogasse a foto no lixo de tanta raiva dela por atrapalhar aquele registro histórico da sua vida. Eu também sou fã de jipe, gente!
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