quinta-feira, março 07, 2013

WALTER BENJAMIM, GOLDSTEIN, HIROYUKI MORIOKA, KROSS, SUZMAN, LANTERI, EMILY CARR, JULIE WALTERS & JOSEFA ORTÍZ

 

TODO DIA É DIA DA MULHER – UMA: A PRIMEIRA PROVA – Quando tive acesso pela primeira vez ao trabalho desenvolvido pela médica e ativista argentina, Julieta Lanteri, pseudônimo de Giulia Maddalena Angela Lanteri (1873-1932), fiquei, deveras, bastante fascinado, sobretudo por suas palavras engajadoras: As chamas da emancipação feminina estão acesas, superando velhos preconceitos e deixando de implorar seus direitos. Estes não são mendigados, eles são conquistados. O homem pensa, estuda e trabalha e nunca se sacia sabendo porque a mulher pára?... De forma alguma se deve admitir isso e a prova é que um despertar prazeroso se manifesta na vida das mulheres em geral, e as faz entrar plenamente em evolução e progresso... Não aceito mestres nem quero ser patrono. Somos todos iguais. Não quero propriedade nem quero matar para mantê-la. A terra inteira é nossa pátria. Ninguém vai nos dar nada... Para ela minha solidária homenagem. DUAS: FORÇA & GARRA – Não menos fascinante a história da revolucionária mexicana Josefa Ortíz de Domínguez (1773-1829), bastante conhecida como a La Corregidora. Afora seus grandes feitos no processo que levou à guerra de independência do México, uma frase lapidar: Tantos soldados para custodiar uma pobre mulher, mas com meu sangue farei um patrimônio para meus filhos... Coragem de uma crioula meritória de aplausos! TRÊS: ENTRE A VIDA & A MORTE – Impressionante também o trabalho de profunda inspiração desenvolvido pela pintora e escritora canadense Emily Carr (1871-1945), na defesa dos povos indígenas da Costa Noroeste do Pacífico e sua ousada arte modernista e pós-impressionista na pintura. Dela, uma frase: Eu me pergunto se a morte será muito mais solitária do que a vida. A vida é uma questão terrivelmente solitária... Sigamos só comungando com todo mundo. E vamos aprumar a conversa!...

 


DITOS & DESDITOS - Então nós temos nossas saídas e nossas entradas. Nós somos talvez meros, mas acho que se alguém mantiver uma certa alegria na vida que deve estar em jogar, então é bom para um, mas é um pouco mais sério do que isso. Ainda acho que um tipo de triturar coração acontece quando vejo alguma forma de comportamento intolerante ou racista. Eu recebo uma dor real no meu coração. Eu acho que é um princípio muito central, é. Eu não posso suportar, não posso suportar desigualdade, não posso suportar mau comportamento para outras pessoas. Eu não posso suportar que as pessoas sejam malvadas com as pessoas que não podem ajudar o que são. Pensamento da atriz e diretora sul-africana Janet Suzman.

 

ALGUÉM FALOU - Ser mãe acrescenta outra dimensão emocional, um sentimento pelos filhos que eles não tinham antes dela. Eles eram uma dor antes... Eu me senti como minha mãe sobre o lugar. Não acho que isso me perturbe; mas eu não colocaria isso na frente dela... Sempre fui uma pessoa que vivia no futuro o tempo todo; era sempre a próxima coisa - sonhos de fuga... Nunca quis ser atriz porque tinha lido boa literatura ou visto um grande Shakespeare. Era mais do que apenas querer entender o que as pessoas realmente gostavam; por que eles me contaram todas as coisas estranhas que fizeram... Pensamento da premiada atriz britânica Julie Walters.

 

INCOMPLETUDE: A PROVA E O PARADOXO - [...] A necessária incompletude até mesmo de nossos sistemas formais de pensamento demonstra que não há fundamento inalterável sobre o qual repousa qualquer sistema. Todas as verdades - mesmo aquelas que pareciam tão certas a ponto de serem imunes à própria possibilidade de revisão - são essencialmente fabricadas. De fato, a própria noção do que é objetivamente verdadeiro é um mito socialmente construído. Nossas mentes conhecedoras não estão embutidas na verdade. Em vez disso, toda a noção de verdade está embutida em nossas mentes, que são elas mesmas lacaios involuntários de formas organizacionais de influência. [...] Nenhuma validação de nossa racionalidade - de nossa própria sanidade - pode ser realizada usando nossa própria racionalidade. Como pode uma pessoa operando dentro de um sistema de crenças, incluindo crenças sobre crenças, sair desse sistema para determinar se ele é racional? Se todo o seu sistema for infectado pela loucura, incluindo as próprias regras pelas quais você raciocina, então como você poderá raciocinar para sair da sua loucura? [...]; Trechos extraídos da obra Incompleteness: The Proof and Paradox of Kurt Gödel (W. W. Norton, 2006), da filósofa e escritora estadunidense Rebecca Goldstein, que em outra obra 36 Arguments for the Existence of God: A Work of Fiction (Pantheon, 2010), expressa que: […] Devemos acreditar que ele virá, mas nunca acreditar que ele veio. Não há Messias, mas um Messias que não veio [...] O autointeresse racional é sempre o que a moralidade resume. [...] Quando você não se obrigou a pensar em reconstruções formais, quando não captou esses momentos de arrebatamento sob a lente de premissas e conclusões, quando não os empalou e rotulou, como tantas borboletas espalhadas, sangrando o brilho transcendental diretamente deles, então... o quê? [...] E se o prodigioso gênio de Azarya Sheiner nunca encontrou a solução, então talvez isso seja a prova de que não existe solução, que o mais dotado entre nós é débil de espírito diante da brutalidade da incompreensibilidade que nos assalta por todos os lados. E assim tentamos, o melhor que podemos, fazer justiça à grandiosidade de nossa improvável existência. E assim vivemos, o melhor que podemos, para nós mesmos, ou quem viverá por nós? E vivemos, o melhor que podemos, para os outros, senão o que somos? [...].

 

CRISTA DAS ESTRELAS – [...] Era uma vez um viajante agachado de dor à beira da estrada. Um homem que passava sentou-se ao lado do viajante antes que ele pudesse pedir ajuda. O homem deu uma longa palestra ao viajante sobre ter um estilo de vida saudável para evitar doenças. Satisfeito com seu discurso, o homem se levantou e saiu. Seu nome é Humanidade Unida. Em seguida, uma mulher muito bonita se aproximou do viajante com um olhar inquisitivo no rosto. O viajante disse: "Bem, não fique aí parado, me ajude." A mulher respondeu: "Você quer que eu o ajude?" Ela então discutiu longamente a situação com o viajante até entender completamente o problema. E então ela assentiu e saiu. Pouco depois, a mulher trouxe consigo todos os médicos, enfermeiras e funcionários dos hospitais mais próximos. O nome dela é Humankind Empire Abh. [...]. Trechos extraídos da obra Crest of the Stars (Hayakawa, 1996 - 3 volumes), do escritor japonês Hiroyuki Morioka, abordando um futuro onde a raça humana coloniza as estrelas.

 

DESCOBRINDO O MUNDO - Todas as pessoas nasceram \ Junto ao mar azul. \ Todos os pais Estão debruçados sobre seus teares \ Tecendo a textura \ Seus filhos procedem. \ Todas as crianças correm da tagarelice do tear \ Para assistir na costa do mar azul, \ Com os pés na água, \ Navios desaparecendo no horizonte. \ Porque as crianças devem correr para lá \ E os navios devem desaparecer lá, \ E os dedos dos pés devem se molhar. \ E todos se põem a caminho \ Como todos devem partir. \ Todos \ Alguns para o bem de todos, \ Poucos para o bem de muitos, \ Cada um para o seu próprio bem. \ Porque cada um deve descobrir seu próprio mundo. \ A caminho\ Ele deve acalmar o murmúrio \ E sufocar as rebeliões \ Dentro de si contra si mesmo, \ Pois milhares de mãos as retêm. \ O hábito de se manter na costa \ Histórias de terror, recontadas por gerações, \ Sobre monstros aquáticos e mares sulfurosos vivos, \ E caindo no nada na borda do mundo. \ Medo de icebergs, cuja respiração \ foi sentida com os lábios, \ E de fúrias de fogo, \ Tendo testemunhado sua explosão, \ E algas parecendo cordões verdes flutuantes. \ E algo tão grande \ Sem ponto final pode ser colocado depois disso: \ O desconhecido \ E eles ainda chegam ao seu destino \ Como todo mundo chega lá até certo ponto\ E descobre um novo mundo, um novo continente \ Uma nova ilha, uma nova ilhota, pelo menos um novo pedaço de cintura, \ Um novo pé de chão para o coração ou pensamento de alguém. \ Mesmo que alguém tenha que usar \ Seus grilhões de tempo e espaço, \ Os ferros de seus próprios limites, \ Ou grilhões de inveja de seus companheiros, \Mesmo que mais tarde se descubra que o chão que ele encontrou \ Ou o pensamento que pensou, \ Ou o amor que amou, \ Não é de todo aquele que ele acreditava que era, \ Ainda assim, todos são \ Em nome de todos \ O vice-rei do mundo dele. \ Porque todos se metem no caminho \ E todos se atravessam até certo ponto. \ Todos os pais estão curvados sobre seus teares\ Tecendo a textura seus filhos procedem. \ E todas as pessoas nasceram \ Junto ao mar azul. Poema do escritor estoniano Jaan Kross (1920-2007).

 



WALTER BENJAMIM: O NARRADOR - O filósofo, ensaísta e critico literário alemão Walter Benjamim (1892-1940), era de ascendência israelita. A sua carreira universitária foi truncada quando a Universidade de Frankfurt recusou sua tese “As origens da tragédia barroca na Alemanha”, quando passou a se dedicar à crítica jornalística e à tradução. Era vinculado ao grupo de Frankfurt e, depois, tornou-se um refugiado judeu que escolheu o suicídio aos 48 anos de idade do que ser capturado pelos nazistas. Entre as suas obras destacam-se as reflexões sobre as técnicas de reprodução da obra de arte, particularmente do cinema, e as conseqüências sociais e políticas resultantes, quando aborda as causas e conseqüências da destruição da aura que envolve as obras de arte, enquanto objetos individualizados e únicos.
O seu escrito “O narrador” aborda a arte de narrar defendendo que esta “(...) está em vias de extinção. São cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente (...) A arte de narrar tende para o fim porque o lado épico da verdade, a sabedoria, está agonizando" e apresenta os dois tipos de narradores convencionais: "Quem viaja tem muito para contar", ou seja, o narrador como alguém que vem de longe, o marinheiro comerciante; ou aquele que "conhece suas histórias e tradições”, ou melhor, o camponês sedentário. No primeiro tipo, o teórico e erudito com muitas explicações sofisticadas sobre seu mundo. No segundo, os mais espontâneos que passam com mais fluidez e precisão seus estados interiores, suas emoções, medos e angústias de forma menos defensiva, mais transparente. Mais adiante Walter Benjamim assinala que: “A narrativa, da maneira como prospera longamente no círculo do trabalho artesanal – agrícola, marítimo e depois urbano – é ela própria algo parecido a uma forma artesanal de comunicação (...) Evidentemente só poucos ousaram descer às profundezas da natureza inanimada, e na literatura narrativa moderna não há muita coisa onde a vez do narrador anônimo, que preexistiu a qualquer escrita, ecoe de maneira tão perceptível (..) o artesão perfeito tem acesso ao mais recôndito recinto do reino das criaturas. Ele é uma encarnação do devoto. (...) Seu talento consiste em saber narrar sua vida; sua dignidade em narrá-la inteira. O narrador é o homem que poderia deixar a mecha de sua vida consumir-se integralmente no fogo brando de sua narrativa”. Imperdível.

FONTE:
BENJAMIN, Walter. O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994. Confira mais aquiaqui e aqui




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