quarta-feira, novembro 08, 2017

CONFÚCIO, ARNALDO TOBIAS, IGNEZ DE ALMEIDA PESSOA, JIM PETERS, MULHERES NO MUNDO & BELÉM DE MARIA

OS QUINZE ANOS DE CLARINHA – Imagem: arte do artista plástico e visual estadunidense Jim Peters.- Dois dias antes de debutar, Clarinha gritou por mim. Estacionei o veículo e ela veio às pressas com aquele seu pujante jeito de ser: blusinha de alças segurando os seios quase pulando fora e à mostra num decote acentuado, sainha curtinha cobrindo o estritamente necessário e deixando à mostra um par de coxas para lá de estonteantes e volumosas, uma juventude num rosto de riso nos olhos vivos e lindos de morrer. Depois de amanhã é meu aniversário, não se esqueça! Jamais poderia esquecer, nem que quisesse. Ao chegar à emissora, corri logo pra agenda e com letras garrafais, no dia marcado, inscrevi: aniversário de Clarinha. Envolvi-me nos afazeres e só, no dia seguinte, já de noite, lá vinha Clarinha tão bela quanto nunca, sempre com suas blusinhas de alças decotadas, sainhas minúsculas e recheio apetitoso esborrando das vestes. Para, para! Sim? Ah, me leva pra algum lugar, vai! Disse-me apressada já abrindo a porta e sentando ao meu lado no interior do automóvel. A surpresa de sua invasão não me impediu de uma olhadela na sainha dobrada ao quadril com o movimento das coxas, sem calcinha, e o decote dos seios fartos sem sutiã à mostra nos bicos dos seios empinados estufando na blusinha. Acelerei e engatei primeira pra segunda, segui a esmo rua afora. Seu aniversário é amanhã, né, Clarinha? É. A tácita resposta me deu a impressão de que não estava bem. Algum problema? Não, quero que me leve daqui pra algum lugar, só nós dois. Um restaurante? Não. Um barzinho? Não. Pra onde? Um motel! Não posso, você é menor de idade. Dê seu jeito, quero ir prum motel, me leve. Não posso. Tem de poder, eu quero. Aproveitei a aproximação de um posto de gasolina e estacionei: Não posso levá-la prum motel, você é menor de idade e seus pais são meus amigos. Tem que me levar, eu quero. Não posso. Eu quero o meu presente. Ah, seu presente eu ainda vou comprar amanhã. Quero hoje e agora. Não posso, o comércio já está fechado a esta hora da noite. Não precisa comprar, basta me dar. O que você quer? Quero um filho seu. Não posso, Clarinha, sou casado, você tem quatorze anos, é menor de idade, e seus pais são meus amigos. Eu quero meu presente agora: um filho seu! Não, Clarinha. Você não sente atração por mim? Não. Você não acha que eu mereço uma peiada e embuchar de você? Clarinha, eu tenho trinta e cinco anos, sou casado, tenho filhos. Eu quero um filho seu! Não é assim, Clarinha, sou casado, tenho responsabilidades, seus pais não me perdoarão. Ah, eu quero um filho seu, sou apaixonada por você desde minha infância, sonho com você, tenho sonhos e gozos com você todas as noites, me contorço na cama com você e me toco e gozo diversas vezes sonhando ser possuída por você, me dê esse presente, vá! Não, Clarinha, não é assim. De repente ela me agarrou, lágrimas nas faces e me beijou a boca com seu hálito de rosa dos campos, seu corpo de sedução das mil e uma noites de prazer, seus seios fartos enchendo as minhas mãos, seu sexo túrgido e nu todo se esfregando ao meu que foi retirado à força por suas mãos ágeis enveredando braguilha adentro e enrijecido pelo toque de seus dedos hábeis, apontado pra direção dos seus múltiplos prazeres e eu sufocado por seus beijos em meus lábios, faces, tronco aberto da camisa, até alcançar meu sexo sobejado pela saliva abundante de sua boca gulosa e quente, delirando ávida em me abocanhar até me provocar ereção enlouquecedora, não, Clarinha, não, mais ela felava e me arriava as calças para esfregar sua vagina em minhas pernas, ronronando louca e me apertando forte e me engolindo trêmula e traquina para que eu estertorasse o sacrifício de segurar o gozo enquanto ela atiçava labareda incendiárias com sua língua inquieta na boca faminta, não Clarinha, e me sugou e bebeu todo meu gozo como quem tivesse roubado o manjar escondido. Não, Clarinha. Não, nada, agora tenho você, se não me quer dar um filho, darei pro primeiro que cruzar e você vai ver, vou me vingar de você com o primeiro que me aparecer. Abriu a porta do carro e saiu correndo sem que eu pudesse alcançá-la. Tomou um táxi e sumiu. Segui adiante, fiz o retorno na via e fui direto em direção pra casa dela. Vi quando o táxi estacionou em frente a sua residência. Ela desceu e desapareceu lá pra adentro. Eu estava desconcertado, fui pra casa com ela perseguindo meus pensamentos. Nem consegui ir pra cama, deitei no sofá e logo dormi sonhando com as peripécias de Clarinha. O dia amanheceu e acordei com o telefone, atendi: Hoje é meu aniversário, não falte! Eu me levantei pro ritual de todas as manhãs e fui trabalhar. A cada hora o telefone: Hoje é meu aniversário, não esqueça! O dia pela tarde, noite entrante e o telefone insistente. Fui. Lá chegando, poucas pessoas, festa simples, os pais me recepcionaram alegremente, dei graças ao rever o poeta há anos que não tinha notícia, foi a minha salvação. Logo ela apareceu linda como sempre, deu-me um chauzinho de escárnio e puxou o poeta a um canto, conversaram e muito. Fui surpreendido pelos pais delas, conversamos, mais um pouco anunciei que ia embora. Não me deixaram, havia uma surpresa no ar, aguardei. Foi quando Clarinha anunciou o seu presente: o seu casamento com o poeta. Como? Ele vinte e cinco anos mais velho que ela, como pode? Os pais tão surpresos como eu, nada entendiam. O poeta no meio da saia justa deixou entender que se tratava de um arroubo dela, mas que era do seu agrado e desejo. Formalmente pediu a mão dela em casamento aos pais e me convidou para padrinho. No meio do mal-estar, depois de muito se olharem, não houve outra alternativa: todos aceitaram, não pude recusar. Seis meses depois reencontro Clarinha grávida de mãos dadas com o marido e um convite para que eu fosse o padrinho do bebê. Não deu tempo nem responder, Clarinha abraçou-me sussurrando: Você não me quis, mas esse filho é seu. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especiais s com o compositor alemão Carl Orff e a sua cantata Carmina Burana & Streetsong; a violinista britânica Chloë Hanslip interpretando Mozart, Cinema Paradiso de Ennio Morricone & Fantasy de Franz Waxman; o pianista Nelson Freire interpretando obras de Villa-Lobos & Debussy In Recital; e da pianista e maestro japonesa Mitsuko Uchida interpretando estudo de Debussy & concerto de Beethoven. Para conferir é só ligar o som e curtir.

PENSAMENTO DO DIA – [...] Quando se cultiva até o máximo os princípios de sua natureza e assim se procura exercitá-los segundo o princípio de reciprocidade, não se está longe do caminho. Não façais aos outros aquilo que não quereis que vos façam. [...]. Trecho do Elogio da vida na dourada mediania: a doutina do meio, extraída da obra O pensamento vivo de Confúcio (Martins, 1967), reunindo os quatro livros clássicos e os cinco livros sagrados do filósofo chinês Confúcio (551 a.C. - 479 a.C). Veja mais aqui e aqui.

ESCRAVIDÃO & ABOLIÇÃO - Grande é o coração, pura e sublime é a alma de um povo humanitário, que se revolta indignado contra a praga maldita chamada escravidão. Ontem, esta palavra horrenda, abominável e ignominiosa, esta degradante e tremenda maldição se ostenta cheia de caprichos sobre as cabeças uns míseros infelizes, que viviam espalhados em todo o Brasul. Hoje, porém, a providencia divina tem protegido a causa destes desgraçados. [...] Tudo caminha e a liberdade não pode estacionar. Por ventura não são os escravos os nossos irmãos, e por que haveremos de consolar as suas aflições, quebrando os ferros tremendos em que se acham agrilhoados? Ah! É duro viverem estes míseros escravos, sem luz, sem amo, sem proteção, submergidos nas trevas profundíssimas da ignorância, chorando amargamente a sua desgraça dos seus filhinhos. Avante democratas e abolicionista. Avante republicanos corajosos. A estrada do processo é muito lnga, caminhai e será completo o vosso triunfo, uma vez que pelejais em prol de uma causa santa, de uma missão honrosa e sublime, que é arrancar das mãos impuras e sanguinolentas dos escravocratas o punhal e o chicote com que retalham as carnes de seus próprios irmãos. Texto da abolicionista Ignez de Almeida Pessoa (Penumbras, 1892), extraído da obra Suaves amazonas: mulheres e abolição da escravatura no Nordeste (UFPE, 1999), organizado por Luzilá Gonçalves Ferreira, Ivia Alves, Nancy Rita Fontes, Luciana Salgues, Iris Vasconcelos e Silvana Vieira de Souza. Veja mais aqui, aqui e aqui.

BELÉM DE MARIA – O território do município era encravado ao de Bonito e teve sua divisão administrativa ocorrida no ano de 1933, quando o distrito criado por Lei municipal de 18 de setembro de 1930, passando a ser distrito de Catende, desmembrado de Palmares e Bonito. Belem de Maria foi constituído em município autônomo pela Lei estadual 3340, de 31 de dezembro de 1958, com território desmembrado dos municípios de Catende e São Joaquim do Monte, sendo instalado em 03 de maio de 1962. Administrativamente é formado pelos distritos sede e Batateira, anualmente no dia 31 de zembro comemora a sua emancipação política, em conformidade com a Enciclopedia dos municípios do interior de Pernambuco (FIAM/DI, 1986). Veja mais aqui.

MULHERES NO MUNDO - [...] o sujeito ideológico elabora um discurso que evidencia os papeis sociais desempenhos pelo homem e pela mulher, delimitando os valores e os comportamentos de cada um, os quais refletem valores e comportamentos nutridos em nossa sociedade. Apesar de muitas concepções de mundo terem sido modificadas e hoje nos deparamos com novos conceitos veiculados pelos meios de comunicação de um modo geral, ainda é prodominante a ideologia machista que define a mulher como um “ser doméstico”, que vive em prol da casa, dos filhos e do marido, isentando-se de uma vida cultural que é exterior ao domicilio familiar, porque todas as personagens femininas e adultas [...] são donas de casa ou são empregadas domésticas (com uma única exceção – a professora), e se apresentam, na grande maioria das histórias, usando avental, lenço e instrumentos de trabalho; em contrapartida, raramente aparecem se divertindo e nunca exercem qualquer atividade esportiva, cultural ou intelectual. [...]. Trecho do texto No discurso da história em quadrinho: uma revelação do preconceito no estereotipo da figura feminina, de Rosemary Evaristo Barbosa, extraído da obra Mulheres no mundo: etnia, marginalidade e diáspora (Ideia/Universitária, 2005), organizado por Nadilza Martins de Barros Moreira e Liane Schneider. Veja mais aqui.

CLARINHA DE ARNALDO TOBIAS
CAPÍTULO 1 – Acompanhei a sua roupa crescendo no varal. Do meu quintal eu assistia a esse espetáculo sob o sol e ventos. A anágua azul e a calcinha de rendas e flores bordando setembro e a primavera. Do seu quintal ela olhando para mim com a indiferença de ontem. A menina crescendo não sabia que eu escrevia poemas para ela e os guardava dentro de livros com pétalas de rosas vermelhas. CAPÍTULO 2 – A menina se fez moça e a roupa diminuiu no espço do corpo. A blusina curta mostrando o umbigo vertical com a covinha. Não vi mais anáguas azuis no varal. A sainha ou o vestido no meio das coxas róseas. Clarinha já tinha abolido o sutiã e o decote desceu oferecendo pretensamente o vértice dos seios. Um dia a surpresa foi tamanha que me invadiu o peito. Fui convidado de palavra para o seu aniversário de quinze anos. Senti o seu hálito tão perto que me subiu um calor no rosto e ela deve ter notado a minha emoção tímida. Prometi ir à festa e fu comprar uma camisa de cetim e um sapato social. Na festa (sem champanhe e de poucas pessoas). Clarinha confessou sua paixão por mim desde os nove anos. A paixão cegava os sonhos e desejos perturbáveis. O pecado consentido. Disse: Mas Clarinha, eu tenho exatamente quarenta anos. Vinte e cinco mais da sua idade. Disse-lhe: Para mim você é jovem e tão latente como o sol nascente. Respondeu-me com metáfora. CAPÍTULO 3 – Quando nos casamos no mesmo ano (sem véu e grinalda) a festa foi simples como a festa dos seus quinze anos. Clarinha não acompanhou minha idade avançando. Depois de quinze anos, ela ficou a balzaquiana mais bela do mundo e eu sessentão acometido de fortes dores na uretra. Tive de um dia submeter-me a uma inadiável cirurgia (que me impediu de fazer um filho em Clarinha) na impotencialidade sexual. Então o urologista arrancou-me a castanha da próstata deixando lá no fundo um carncer me matando de sofrimentos. Clarinha escusando-se dos meus tratos e asseios. Esquencendo o meu remédio na farmácia. Hoje a acompanho com resignação e tristeza vendo-a ter filhos com o jardinero. Pago muito bem ao rapaz para ele trazer rosas vermelhas e fazer Clarinha feliz. Satisfeita.
Conto do escritor Arnaldo Tobias (1939-2002), extraído da Panorâmica do conto em Pernambuco (Escrituras, 2007), organziado por Antonio Campos e Cyl Gallindo. (Imagem: arte do artista plástico e visual estadunidense Jim Peters). Veja mais aqui.

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A ARTE DE JIM PETERS
A arte do artista plástico e visual estadunidense Jim Peters.