quinta-feira, junho 08, 2017

O SONO & O CAPITALISMO DE CRARY, MARGUERITE DE YOURCENAR, EVERETT MILLAIS, JAN MATSON & O INSONE BIRITOALDO

O INSONE BIRITOALDO – Biritoaldo não se emenda mesmo! Depois de rastejar desatinado nos calcanhares das abundantes partes pudendas da voluptuosa, feiosa e cativante Munga, de ter se enrolado com estrépito na conflituosa relação com a Xica Doida, de quase morrer endoidado de desmedido amor com a descoberta de que a Amy Winehouse já era defunta fazia tempo, e de correr o mundo todo cão sem dono enamorado atrás da Rebel Wilson, agora, dessa vez, pelo menos, era mais próxima e ao alcance da mão: a prima da Vera, a Dalzuíta. Quando viu a moça pirou arrebatado na hora! Ao primeiro não baixou hospício como bipolar, ora se passando por Sansão à procura de Dalila, ora por Comte ensandecido por Clotilde de Vaux. Dois meses depois, quase restabelecido, não resistiu ao segundo não e arriou em coma por três longos meses. Convalescente, criou coragem na base do óleo de peroba e foi ter com a moça a depor seus sentimentos: nem que eu estivesse na lua! Ah, para ele isso era uma possibilidade. Foi aí que ele abriu os olhos de nunca mais pregá-los: só queria ficar rico pra impressioná-la, não conseguiu. Pra manifestar publicamente sua incurável devoção por ela, resolveu fazer uma enorme faixa com as inscrições: Dalzuita, eu amo você. Assinado: Biritoaldo. E sem piscar os olhos nem num cochilo, tentou de tudo para expor seus sentimentos, sempre aplacado por desafetos. Resolveu subir no prédio mais alto, não obtendo sinal algum dela, resolveu pular, até que foi interceptado por Robimagaiver, seu salvador na horagá: - Ô doido, se pular tu num sai vivo de jeito nenhum. Vamos simbora que eu já passei por isso, tô curado. Teve jeito não, ele pulou pra festa da mundiça lá embaixo. Eita! A sorte foi que a faixa serviu de pára-quedas e ele foi saudado aos aplausos e apupos. Tirante umas fraturas expostas por se enganchar em marquises e postes, restou vivinho da silva, dizendo: vou pra lua. Pronto, endoidou de vez. Virando a noite pelo dia, foi procurar quem pudesse enviá-lo pro satélite a fim de cumprir sua missão, ninguém levou a sério. Só tinha um jeito: ir a pé mesmo pra Nasa. E foi. Marchou sem jazer até lá, foi reprovado. Porém, não passou aperto, usou do expediente do jeitinho e foi incluído no treinamento de astronautas, ninguém sabe como, mas entrou. Cinco anos depois foi reprovado de novo; nem se avexou, jeitinho na hora e já estava selecionado pra prova final e, nessa hora, foi rejeitado. Já haviam se passado quase sete anos, fez de tudo nos semáforos: plantou bananeira, deu língua e salto solto, pintou miséria e amealhou uma grana boa pra comprar quem aparecesse pela frente. E ganhou, no dia certo lá estava ele confortavelmente aboletado no foguete, repetindo a contagem regressiva. Vupt! Lá se foi até chegar lá, abrir a faixa e prendê-la num cano que arrumou na hora, fincá-la no solo lunar e levitar segurando o mastro pra ver se de lá ela via o aceno dele vencedor pra ela. Chamaram-no para retornar, negou; queria ficar lá até receber um sinal dela, mínimo que fosse. Fizeram de tudo e não conseguiram demovê-lo, deixando-o à própria sorte. O bastão se desprendeu do solo e lá foi ele levado pela órbita, até dar uma abalroada num asteróide, de se agarrar nele vagando na imensidão. Pra não perder a faixa, enfiou o bregueço prendendo-o no cu, como se fosse um cometa que já não dormia há anos, agora nem podia relaxar, senão perdia a declaração de amor e a vida. O que importava pra ele era estar cônscio o tempo inteiro da paixão que lhe queimava a alma e o corpo, porque essa mulher, para ele, valia todos os sacrifícios até a insensatez. Alguma notícia dele? Perdeu-se, sumiu-se. E ela nem aí pro que havia dele. © Luiz Alberto Machado. Veja mais aqui.

O SONO & O CAPITALISMO DE CRARY
[...] A história mostra que inovações relacionadas à guerra são inevitavelmente assimiladas na esfera social mais ampla, e o soldado sem sono seria o precursor do trabalhador ou do consumidor sem sono. Produtos contra o sono, após agressiva campanha de marketing das empresas farmacêuticas, iriam se tornar uma opção de estilo de vida — e depois, para muitos, uma necessidade. Mercados atuando em regime de 24/7—24 horas por sete dias na semana — e infraestrutura global para o trabalho e o consumo contínuos existem há algum tempo, mas agora é o homem que está sendo usado como cobaia para o perfeito funcionamento da engrenagem. [...] A privação de sono como forma de tortura é aplicada há muitos séculos, mas seu uso sistemático coincide historicamente com a disponibilidade de luz elétrica e a facilidade para amplificar o som de modo contínuo. [...] A imensa parte de nossas vidas que passamos dormindo, libertos de um atoleiro de carências simuladas, subsiste como uma das grandes afrontas humanas à voracidade do capitalismo. [...]
Trecho da obra 24/7 – Capitalismo tardio e os fins do sono (Cosac Naify, 2014), do professor estadunidense de Teoria e Arte Moderna, Jonathan Crary.

Veja mais sobre:
Tunga: toro imaginário no interior de uma rocha, a poesia de César Vallejo, a estética do teatro de Redondo Junior, João Pessoa, a arte de Sônia Braga, a música de Ná Ozzetti & Os sapos da política de Edson Moura aqui.

E mais:
Vamos aprumar a conversa: segunda-feira, As conseqüências da modernidade de Anthony Giddens, Fedra de s Jean Racine, o cinema de Arnaldo Jabor & Sônia Braga, a literatura de Marguerite de Yourcenar, a música de Robert Schumann, a pintura de Francisco Ribalta & a arte de Ary Spoelstra aqui.
A personologia de Henry Murray aqui.
Literatura de cordel: A quadrilha junina de Francisco Diniz aqui.
Precisamos discutir sobre os próximos 20 anos, Vitórias e derrota de Zygmunt Bauman, A humanidade do estranho diário de Carolina de Jesus, o teatro de Tennessee William, o cinema de Jules Dassin & Melina Mercouri, Brincarte & Literatura Infantil, A vida íntima & privada de Fernanda Bruno, a coreografia de Janice Garrett and Dancers Heidi Schweiker, a pintura de Alessandra Tomazi, a entrevista de Rejane Souza, a arte de Arlinda Fernandes & Luciah Lopez, a música de Irina Costa & Canção de quem ama além da conta aqui.
Aprendi a voar nas páginas de um livro, O homem e seus símbolos de Carl Gustav Jung, O homem e a sociedade de Wilfred Ruprecht Bion, A atualidade de Georg Simmel, a escultura de Wilhelm Lehmbruck, Assombrações de Eduardo Caballero Calderón, o teatro de Oduvaldo Vianna Filho & Helena Varvaki, O direito de viver e deixar viver, a fotografia de Rebeka Barbosa, a arte de Karen Robinson & Luiz Paulo Baravelli, a música de Tarita de Souza, Tracey Emin & Samuel Szpigel, a entrevista de Katia Velo, Por mais que a gente faça nunca será demais & Do que fui e o que não sou mais aqui.
Para viver o personagem do homem, Educação e escolarização de Ivan Illich, Vínculo, afeto & apego de Edward John Bowlby, Platão, o teatro de Nelson Rodrigues, a entrevista de Geraldo Azevedo, a pintura de Cândido Portinari, a escultura de Georg Kolbe, o cinema de Shohei Imamura & Misa Shimizu, a música de Zap Mama & Marie Daulne, a coreografia de Katherine Lawrence, a fotografia de Ryan Galbrath & Mario Testino, Bastinha Job, A Notícia & Jamilton Barbosa Correia, a arte de Rachel Howard, Depois das eleições, De cara pro futuro, levando tudo nos peitos, munheca em dia & pé na tábua & O que deu, deu; o que não deu, só na outra aqui.
Quando o futuro chega ao presente, Escritos de Michel Philippot, A bússola dobrada de Phillip Pullman, A física do horizonte de Gilles Cohen-Tannoudji, A música de Antonín Dvořák & Alisa Weilerstein, a arte de Willow Bader & Lorenzo Villa, a fotografia de Katyucia Melo & a poesia de Bárbara Sanco aqui.
Mais que tudo o amor, Confesso que vivi de Pablo Neruda, o pensamento de Pierre Gringore, O teatro e seu duplo de Antonin Artaud, a música de Ana Rucner, a fotografia de Daniel Ilinca, a poesia de Mariza Lourenço & a arte de Luciah Lopez aqui.
Palestras: Psicologia, Direito & Educação aqui.
Livros Infantis do Nitolino aqui.
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O AMOR NAS MEMÓRIAS DE MARGUERITE DE YOURCENAR
[...] De todos os jogos, o do amor é o único capaz de transportar a alma e, ao mesmo tempo, o único no qual o jogador se abandona necessariamente ao delírio do corpo. Não é indispensável que aquele que bebe abdique da razão, mas o amante que conserva a sua não obedece inteiramente ao deus do amor. Tanto a abstinência quanto ao excesso engajam apenas o homem só. [...] Não conheço, fora do amor, outra situação em que o homem deva decidir-se por motivos mais simples e mais inelutáveis. No amor, o objeto escolhido deve valer exatamente seu peso bruto em prazer, e é ainda no amor que o mante da verdade tem maiores probabilidades de julgar a nudez da criatura. A partir do desnudamento total, comparável ao da noite, de uma humildade que ultrapassa a da derrota e da prece, maravilho-me ao ver renovar-s, cada vez, a complexidade das recusas, das responsabilidades, das promessas, das pobres confissões, das frágeis mentiras, dos compromissos apaixonados entre nosso prazer e o prazer do Outro, tantos laços impossíveis de romper e tão depressa rompidos! Esse jogo cheio de mistérios, que vai do amor de um corpo ao amor de uma pessoa, pareceu-me belo o bastante para consagrar-lhe uma parte de minha vida. As palavras enganam, especialmente as do prazer, que comportam as mais contraditórias realidades, desde as noções de aconchego, doçura e intimidade dos corpos, até as da violência, da agonia e do grito. [...]. Confesso que a razão permanece confusa em presença do prodígio do amor, da estranha obsessão que faz com que essa mesma carne, que tão pouco nos preocupa quando compõe nosso corpo, limitando-nos somente a lavá-la, nutri-la e, se possível, impedi-la de sofrer, possa inspirar=nos uma tal paixão de caricias simplesmente porque é animada por uma personalidade diferente da nossa e porque representa certos traços de beleza sobre os quais, aliás, os melhores juízes não estariam de acordo. Aqui, como nas revelações dos Mistérios, tudo se passa além do alcance da lógica humana. A tradição popular não se enganou ao ver no amor uma forma de iniciação e um dos pontos onde o secreto e o sagrado se tocam. A experiência sensual equipara-se ainda aos Mistérios quando a primeira aproximação provoca nos nã0-iniciados o efeito de um rito mais ou menos assustador, escandalosamente desligado de todas as funções até então familiares, como comer, beber e dormir, parecendo antes motivo de gracejo, vergonha, ou terror. Da mesma maneira que a dança das mênades ou o delírio dos coribantes, nosso amor arrasta-nos para um universo diferente, onde, em situação normal, nos é vedada a entrada e onde cessamos de nos orientar, uma vez apagado o ardor e extinto o prazer. Cravado no corpo amado como um crucificado à sua cruz, penetrei em certos segredos da vida que começam a desvanecer-se da minha lembrança por efeito da mesma lei que faz com que o convalescente, depois de curado, cesse de encontrar-se nas misteriosas verdades do mal, que o prisioneiro posto em liberdade esqueça a tortura, e o triunfador, a embriaguês da glória. [...].
Trechos do romance Memórias de Adriano (Mémoires d'Hadrien - Círculo do Libro, 1974), da escritora belga de língua francesa Marguerite de Yourcenar (1903-1987). Veja mais aqui.

PROGRAMA TATARITARITATÁ
Paz na Terra:
A arte do pintor e ilustrador pré-rafaelista ingles, John Everett Millais (1829-1896)
Programa Tataritaritatá, sexta, 09/06, meia noite. Confira aqui & aqui.