quarta-feira, janeiro 27, 2016

AS DUAS MORTES DE DONA ZEZÉ, BIRKIN, DIVA CUNHA, REGINA SOUZA VIEIRA & MUITO MAIS!!!!


TODO DIA É DIA DA MULHER: AS DUAS MORTES DE MARIA ZEZÉ - Dona Maria Zezé, setenta anos, independente, altiva, morava com o netinho e mais ninguém: não aguentava mais baforada de natureza alguma na sua vida. Usava de peito lavado o direito de ir e vir como bem entendesse. Sua vida era cuidar do netinho, comprar isso ou aquilo, ir pro culto de sua crença e fazer o que bem entendesse. Eis que, um dia, foi no centro da cidade fazer um exame de rotina, exigência da aposentadoria. Concluído, era hora de voltar pra casa, tudo certo. Na hora de subir pro ônibus, desatenção do motorista que fechou-lhe a porta, levou uma queda, fraturou o fêmur. Logo apareceu um moto-repórter que passou a informação para emissoras de rádio e, pouco depois, uma ambulância pública levou às pressas das sirenes pruma unidade hospitalar. Lá o médico desaprovou: - Não tenho como operá-la por um bom tempo! Asmática, sofrendo de osteoporose e labirintite, pressão arterial baixíssima. Vamos primeiro recuperá-la. Depois, cirurgia. E saiu. A enfermeira ouviu atenta e acompanhou as dores de Dona Zezé. Quase três meses depois, o médico foi fazer a primeira tentativa. Deu certo. Quinze dias depois, em casa: só que com um balão de oxigênio. Ela não conseguia mais respirar normalmente. Resultado: num desequilíbrio ao se levantar, caiu por cima do balão. Fraturou o fêmur da outra perna. Um vizinho de boa alma acudiu suas dores e foi pro hospital: foi barrado, não temos leito. E agora? Foi pra outro: nada de leito. Mais outro: não há leito. O coitado botou as mãos à cabeça quando ela, ainda se contorcendo em dores, lembrou que na casa dela tinha o telefone do médico que a operou anteriormente. Assim fizeram e voltaram todo caminho. Encontrado o número do telefone tentaram uma, duas, três e, na quarta tentativa, o médico atendeu e mandou que a levassem para o hospital informado. Chegando lá: – Mas D. Zezé, a senhora aqui de novo? -, perguntou-lhe o médico. – Vamos esperar um bom tempo até a sua pressão normalizar para uma nova cirurgia. Quase quatro meses depois, o médico fez a segunda cirurgia. Mas ela quase não sai do leito, não volta pra essa. Inspirando cuidados, saiu da mesa de cirurgia direto para UTI. E lá ficou mais uns bons três meses. Até o dia que o médico falou pros familiares: - Dona Maria faleceu, podem providenciar o sepultamento. O chororô foi grande, trataram logo de avisar aos demais familiares e providenciar o sepultamento numa cidade do interior. Família grande de passar a noite ligando pra um e pra outro, definindo local e horário do enterro. O dia amanheceu e quando foram com a funerária fazer os preparativos do corpo, havia sumido. – Cadê minha mãe? -, gritou a filha. Oxe, foi o maior corre-corre no hospital. O corpo havia sumido. Horas e horas catando dona Maria Zezé que havia desaparecido. Como pode? Será que ela reviveu e zarpou dali? Do jeito que ela era, do gênio dela, não era nada difícil. A hora se passando, uma, duas, três, chegou a hora do enterro e nada de darem cabo do corpo dela. O povo no interior apinhado em frente ao prédio onde aguardavam o féretro, já estava todo em clima de tensão e nervosismo, e nada dela aparecer. Os familiares começaram a ligar do interior para saber o que estava havendo. – Ué, o corpo dela sumiu! Uma bomba. Será que foi sequestrada? Ou ela aprontava mais uma pra cima dos parentes? Nada. No meio da tarde aparece uma enfermeira chamando os familiares para verificarem algo que ela encontrou: lá no fundo da UTI, esquecida, Dona Mariz Zezé estava vivinha da silva, reclamando do abandono. Uma trabalheira medonha para avisar todo mundo que ela fora encontrada viva na UTI do hospital. Lá se foi o enterro voltando. Começou então o bate-boca, médico se desculpando, enfermeira revidando, uma bronca. Lá se vão mais três meses, quase quatro, quando a enfermeira disse tremendo: - Dona Maria Zezé faleceu. – De verdade? Sim, agora é na vera. Ninguém acreditou, foi preciso vir a tropa toda do interior – na verdade, de umas cinco cidades do interior, ela tinha parente como a praga -, para conferir. Agora sim, era verdade. Quando começaram os preparativos pro enterro se certificaram que ela não tomava os remédios prescritos e que, enquanto estava sozinha, escrevia cartas e mais cartas pra cada um dos parentes, achegados ou não, alguns com desaforos, outros com conselhos e uns tantos com reprimendas das brabas. Finalmente, numa tarde azul ela foi enterrada da sua segunda morte. (Luiz Alberto Machado).

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PICADINHO

Imagem: Il nude, do pintor espanhor Rafael Hidalgo de Caviedes.


Curtindo o álbum Rendez-vous (EMI-Capitol, 2004), da atriz e cantora inglesa Jane Birkin. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

EPÍGRAFELes hommes font les lois, les femmes font les moeurs, verso do primeiro ato da tragédia O condestável de Bourbon (1775), do escritor e dramaturgo Jacques-Antoine-Hyppolyte, Conde Guibert (1743-1790), que tornou-se proverbial: os homens fazem as leis, as mulheres fazem os costumes. Veja mais aqui.

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER – No livro O que é violência contra a mulher? (Brasiliense, 2001), de Maria Amélia de Almeida Teles e Monica Melo, encontro que: [...] O gênero, no entanto, aborda diferenças sócio-culturais existentes entre os sexos masculino e feminino, que se traduzem em desigualdades econômicas e políticas, colocando as mulheres em posição inferior a dos homens nas diferentes áreas da vida humana. [...] Esse instrumento oferece possibilidades mais ampla de estudo sobre a mulher, percebendo-a em sua dimensão relacional com os homens e o poder. Com o uso desse instrumento, pode-se analisar o fenômeno da discriminação sexual e suas imbricações relativas a classe social. A violência de gênero pode ser entendida como “violência contra a mulher”, expressão trazida à tona pelo movimento feminista nos anos 70, por ser esta o alvo principal da violência de gênero. Enfim, são usadas várias expressões e todas elas podem ser sinônimos de violência contra a mulher. [...] A violência é uma das mais graves formas de discriminação em razão de sexo e gênero. Constitui violação dos direitos humanos e das liberdades essenciais, atingindo a cidadania das mulheres, impedindo-as de tomar decisões de maneira autônoma e livre, de ir e vir, de expressar opiniões e desejos, de viver em paz em suas comunidades; direitos inalienáveis do ser humano. Veja mais aqui.

BERNANDO, O IMPREVISÍVEL – No livro Bernardo, o imprevisível (Galo Branco, 2005), da escritora, tradutora e professora doutora em Letras, Regina Souza Vieira, destaco o trecho: De volta da lua-de-mel naquele dia, depois de duas semanas de ausência, Bernardo, logo à chegada, defrontou-se com suas responsabilidades. A correspondência avolumava-se debaixo da porta e alguns telefonemas tinhas de ser dados incontinenti. A esposa, desabituada a vê-lo ocupado, exigia a sua companhia, insistindo para que fossem primeiro ao restaurante ou que abrissem juntos as malas, onde inúmeras recordações agradáveis esperavam ser revividas. Pouco a pouco, o que tinha de ser feito se foi organizando até que chegou a hora de dormir e dar por encerrado o dia cansativo. Para Estela, esta seria, aliás, uma atitude normal e até instintiva, mas para o marido havia ainda algo importante para fazer antes de se entregar ao sono: digitar algumas listas ou, quem sabe, algumas páginas do romance que iniciara poucos antes de casar-se e que havia deixado sobre a mesa do computador, certamente preocupado em não se esquecer daquele trabalho [...]. Veja mais aqui e aqui.

ESSE RIO – No livro Poesia viva de Natal (Capitania das Artes/Nordestal, 1999), organizado por Manoel Onofre Junior, encontro o poema Esse rio, da poeta e professora potiguar Diva Cunha: Esse rio / que atravessa séculos / não é Grande, nem Pequeno / apenas Potengi no nome / que lhe tiraram, / das águas dos índios. / Suas raízes / se foram sólidas / - braços caudalosos - / não lembram os homens / que vaguearam terras / percorreram linhas / na busca do começo / que é todo começo de rio / um olho lacrimejante / que aponta da terra / e escorre / abrindo espaço / entre coxas morenas / que gotejam. / Margens de um rosto: / rio cavalo / rio peixe / rio dos camarões / onde a piroga canibal / abria os queixos / triturando contente / carnes portuguesas / - religiosas ungidas - / carnes batavas / - brancas ferrugentas - / dessedentadas, enfim / do ouro que / buscavam. / Caldo das raças / que moldando o rio / por ele foi criada: / a cidade nas dunas / o povo miúdo nos mangues / a pedra escura do Forte / onde o mar quebra os peitos / em noite de lua alta / e farta ventania. / Espelho da cidade / - suja, turva - / Rio-lagartixa / da pele cor de lixa / ofuscado pelo sol / arrastando lerdo na lama / as escamas. / Fio-de-merda / a escorrer melancólico / para a boca gulosa do mar. / Quem assim te vê / não sabe da saudade / rio-taba / rio-aldeia / ideia que a memória / te clareia / em rio / só / água. Veja mais aqui e aqui.

REFLEXÕES DRAMÁTICAS – Numa pesquisa sobre a História do Teatro Brasileiro, encontro que o ator e empresário teatral João Caetano dos Santos (1808-1853), publicou Reflexões Dramáticas (1837) e Lições dramáticas (1862), tornando-se pioneiro na arte teatral brasileira, até então muito influenciada pela tradição portuguesa. A sua obra Lições dramáticas é um excelente ideário estético da arte interpretativa, reproduzindo conceitos de Riccoboni, dando mostra de admirável consciência artística, testemunhada na análise que fez das próprias atuações. Ao lado da majestade do porte, do magnetismo da personalidade e da extensa sonoridade da voz, deve-se mencionar o esforço para corrigir os vícios declamatórios do estilo lusitano da juventude, a fim de aparecer mais simples e verdadeiro. Veja mais aqui.

BLOOD SIMPLE – O suspense Blood Simple (Gosto de Sangue, 1984), dirigido por Joel Coen, conta a história de um dono de bar que desconfia que a sua mulher o está traindo com um dos seus empregados. Ele decide contratar um detective para segui-los, e acaba por confirmar as suas suspeitas. Ele então faz um novo acordo com o detetive, propondo que ele mate a sua esposa e o amante dela enquanto ele estiver fora da cidade. O destaque do filme é a premiada atriz estadunidense Frances McDormand. Veja mais aqui.

IMAGEM DO DIA
A arte do desenhista, ilustrador e autor de histórias em quadrinhos estadunidense Frank Miller.

DEDICATÓRIA
A edição de hoje – em consonância com a manifestação da Comunidade Lagoa Manguaba - é dedicada à amiga Deize Messias.

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