quarta-feira, dezembro 09, 2015

ANÍBAL, CHICO, CARPEAUX, MAURA, PEDRA DE ROSETA & MUITO MAIS!!


VAMOS APRUMAR A CONVERSA? ALÔ, ALÔ RECIFE, TÔ CHEGANDO! – Chegaram as férias e como eu sou que nem cantiga de grilo, pensei dar um pulo em Belô, mas lá a coisa está tão embaçada, tão mais pra Mariana, que se Valdick fosse vivo, cantava o seu cachorro assim: Eu não sou Aécio não pra viver tão humilhado, eu não sou Aécio não pra ser tão desprezível. E pra quem achou que eu estava destruído, pra lá de aniquilado, rasgou a boca. Eu estou é com o caçuá entupidinho com repertorio de Chico: trocando em miúdos o que sobrou do grande amor. É que a Rita sumiu, Januária se mudou e Terezinha foi-se com os três, só sobrou eu pra apagar a luz e me enforcar com as últimas tripas que sobraram do restinho do meu coração. Depois de morto morrido e matado na marra, na base do sacudido e pesunhado, deu-se a gota d’água: uma herança carregada de dívidas e mágoas mútuas. Eita! Mas isso não sou eu, parece mais Brasília, ou o que vai sobrar dela. Pois é, tá faltando vaqueiro com aboio direito, porque a manada pra lá está pior que corda de guaiamum. E pelo andar da carruagem, vai findar nocaute coletivo. Eu mesmo estou esperando a poeira baixar pra ver quem vai ficar de pé, pois periga cair o rei de espadas, o rei de paus, o rei de ouros, cai tudo de não ficar mais nada. Melhor que entregar o premio da vitória a quem não merecia sequer ter existido. Eu mesmo tô me guardando pra quando o carnaval chegar. A gente vai levando. Alô, alô, Recife! Tô que nem Arraes: voltando. Para quem estava liso de Jó, agora passo troco. Pra quem me viu tatu, não sabe que enxergo no breu, hé-hé. Parti pra outra, ora! Agora não abro nem prum trem, quer saber? Nunca cuspa no defunto, vai que ele ressuscita e o arrependimento deixa um gosto de última palavra. Alô, alô chicólatras, tô na área pedindo passagem, afinando a goela, ô abre alas, os dedos afiados pro pinho, e mandar ver na frevança até o dia clarear. E vamos aprumar a conversa aqui

 Imagem: A ilha do cão (1941 – óleo sobre tela), do encenador, escritor e artista plástico português António Pedro (1909-1966)

 Tinha cá pra mim
Que agora sim
Eu vivia enfim o grande amor
Mentira
Me atirei assim
De trampolim
Fui até o fim um amador
Passava um verão
A água e pão
Dava o meu quinhão pro grande amor
Mentira
Eu botava a mão
No fogo então
Com meu coração de fiador
Hoje eu tenho apenas uma pedra no meu peito
Exijo respeito, não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor
Mentira
Fui muito fiel
Comprei anel
Botei no papel o grande amor
Mentira
Reservei hotel
Sarapatel
E lua-de-mel em Salvador
Fui rezar na Sé
Pra São José
Que eu levava fé no grande amor
Mentira
Fiz promessa até
Pra Oxumaré
De subir a pé o Redentor
Hoje eu tenho apenas uma pedra no meu peito
Exijo respeito, não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor
Mentira
Curtindo o álbum Chico Buarque (Polygram, 1984), do cantor, compositor, escritor e dramaturgo Chico Buarque.

A PEDRA DE ROSETA – No livro O Egito dos faraós (Otto Pierre, 1976), de Jean-Marc Brissaud, encontro o relato acerca da Pedra de Roseta que é um fragmento de uma estala de granodiorito do Egito antigo com textos cruciais para entendimento do hieróglifos egípcios. Do relato destaco o trecho: A 15 de julho de 1799, circula no Cairo o rumor de que havia sido feita uma curiosa descoberta na pequena cidade costeira de Roseta, na embocadura do Nilo ocidental, no Mediterrâneo. O capitão Bouchard, um oficial de engenharia de 27 anos, recebe, das mãos dos trabalhadores que edificavam um fortum, um fragmento de basalto negro, com um metro de comprimento e cerca de setenta centímetros de largura. A 19 de julho, os sábios reunidos no Instituto do Cairo ouvem a seguinte declaração: “O cidadão Lancret, membro do Instituto, informa que o cidadão Bouchard, oficial de engenharia, descobriu, na cidade de Roseta, inscrições cujo exame pode oferecer muito interesse. A pedra negra que traz as inscrições está dividida em três faixas horizontais; a inferior contem várias linhas de caracteres gregos que foram gravados sob o reinado de Ptolomeu Filopátor; a segunda inscrição está escrita em caracteres desconhecidos e a terceira, em caracteres hieroglíficos”. A língua desconhecida era o demótico, falado no Egito na época greco-romana. Um padre de origem grega, membro da expedição francesa, Raphaël de Monachis, descobriu, nas primeiras cópias dos textos da pedra, os nomes de Zeus e de Ptolomeu. Ele decifrou a estela na qual estava escrito um decreto estabelecido no ano de 196aC., pelos sacerdotes egípcios em honra de Ptolomeu Epífano. Orgulho dos sábios franceses do Egito, a pedra de Roseta foi tomada pelos ingleses por ocasião da capitulação do verão de 1801. Ele é hoje um dos ornamentos do British Museum. Felizmente, inúmeros moldes foram levados para a França. Le Courrier de l’Egypte, jornal do corpo expedicionário, relata a descoberta em seu número de 29 de frutidor do ano VII (15 de setembro de 1799), anunciando que iria ser utilizada brevemente para a leitura dos hieróglifos. No entanto, seria preciso esperar 25 anos para que Champollion soubesse decifrar a escrita dos antigos egípcios. Conta-se que, por uma coincidência notável, o artigo do Courrier de l’Egypte chegou até a casa de Champollion. Veja mais aqui.

O INICIADO DO VENTO – No livro O menino e o vento (1967 – Cadernos de João – José Olympio, 2004), do escritor, professor e dramaturgo Aníbal Machado (1894-1964), destaco o conto O iniciado do vento: Quem poderá dizer que amanhã mesmo aquele passageiro não esteja na manchete principal dos jornais como herói dos acontecimentos que o levam à cidadezinha de…no alto da serra. A locomotiva ofegava entre margens de bananeiras. O passageiro abandonou o jornal, deixou cair as folhas. Lera os crimes de outros, passaria em breve o seu… crime. Baixou os olhos: na folha esvoaçante, as fotografias de um punguista e de um cáften expulso. Amanhã seria a sua fotografia… Lançada que fosse a notícia aos quatro ventos, não adiantava mais restabelecer a verdade, gritar sua inocência. A que ficará reduzido depois da provocação da publicidade, depois do temporal? No momento – pior que a revolta contra a injustiça – era o sentimento de pudor ferido, de invasão do seu silêncio. Olhou pela janela: ainda faltavam duas estações. Mais inquieto agora, quase chorando, disse adeus ao futuro… a certa imagem de seu futuro que insistia nos sonhos da mocidade. Estava escuro. Pelo vento que viera ao encontro do comboio e o envolvia num turbilhão, pressentia-se próxima a cidade. O viajante não reconhecia nesse vento o mesmo que soprava naquelas altitudes quando, concluída a ponte, buscara a estância de repouso levando ainda nos ouvidos o barulho do concreto a despejar-se nos caixões, e o rumor suave da correnteza na aresta dos pilares. Fora um trabalho arrasador; meses e meses ao sol, com os operários; e à noite, dentro da barraca, os cálculos no papel; a conversa com os trabalhadores; depois, os cigarros, a insônia, e a leitura até alta madrugada, – vício a que não sabia resistir. Afinal, a obra fora inaugurada dentro do prazo. E era uma bela ponte, ele próprio o reconhecia. Gente e mercadorias já deviam estar transitando entre as duas margens. Antes assim. Um pensamento amargo tirava-lhe porém o gosto dessa evocação: ia desembarcar não mais na capital do vento, senão numa cidade irreconhecível, cabeça de camarca e sede da administração da Justiça. Perante esta fora intimado a comparecer para ser interrogado. O processo correra até então à sua revelia. Seria mesmo crime o que praticara? Os homens inventam leis, modificam à vontade os códigos. Como saber o momento preciso em que os nossos atos passam da inocência ao crime, se a gente não distingue  bem a linha divisória. – Serei mesmo um criminoso? A imagem do desaparecido sorria-lhe de longe, como que respondendo. Mal se ouvira o apito do trem, a multidão que se deixara ficar até tarde da noite na praça encaminhou-se para a estação, enquanto o alto-falante anunciava: “Aproxima-se com o atraso habitual o trem que vem conduzindo a esta cidade o engenheiro José Roberto, o qual será interrogado amanhã pelo crime de que é acusado. O meretíssimo Juiz da Comarca recomenda a todos que se mantenham calmos, respeitando a pessoa do acusado e aguardando a decisão serena da Justiça.” Embora sede de comarca, era tão pequena a cidade que um grito ou gargalhada forte a atravessavam de ponta a ponta. Assim, não seria exagero supor que toda a população se achava reunida ali, àquela hora. Ao aviso do microfone, as mães apanharam as crianças adormecidas na grama do jardim, e se aproximaram da Estação. No cinema, o público, trocando o final de um filme sonolento pela chegada do engenheiro, abandonou a sala de projeção e se dirigiu para a sacada do prédio. Dali apreciaria melhor a passagem do acusado. Os coqueiros da praça ainda se mantinham imóveis. Mesmo que começasse a ventar, nã era razão para que as famílias se recolhessem, insensíveis que eram, de tão habituadas, àquele vento famoso. A pequena locomotiva foi entrando mais devagar, como convinha, batendo demais o seu sino. Era uma máquina antiga, e meio cômica quando apitava com estridência desproporcionada ao seu tamanho. A autoridade a todos que se afastassem. Cada qual queria ser o primeiro a ver a cara do engenheiro. Este, calmo e alto, surgiu na plataforma do vagão. Não sabia que viajara com algum personagem importante; mas logo, pela convergência geral dos olhares em sua pessoa, compreendeu tudo. E empalideceu. Alguém teria dado o aviso de sua chegada. Houve o silêncio de alguns instantes para a “tomada” de sua figura; em seguida, rompeu um murmúrio indistinto mas hostil, cortado pelas sílabas tônicas de alguns palavrões conhecidos, se não de palavrões sussurrados por inteiro. – Para o Hotel Bela Vista? Interrogou o delegado. – Sim, respondeu o acusado numa voz firme que reconheceu não ser a sua. Ao passar pela ala das moças, uma delas não se conteve: – Ah, ele é bonito! Exclamou. E depressa, arrependida, tapou a boca com a mão. Alguns o tinham visto, meses atrás, sem lhe guardarem bem a fisionomia. Era então, como tantos outros, um veranista de passagem. Agora, não. Vinha com a auréola do crime, ligado àquela terra por um processo judiciário, por um escândalo. Os moleques tinham combinado uma vaia com busca-pés que o perseguiam durante o trajeto até o Hotel. Maltrapilhos e abandonados, brigavam sempre entre si, mas o fato de ter sido um deles a vítima, unia-os agora no ódio comum ao engenheiro. Disso tirou partido o próprio escrivão do crime com a parcialidade que a população aplaudia, e que o juiz da Comarca, severo, mas sempre alto e distante no desempenho de suas funções, ignorava. De tal juiz se dizia que era bom demais para aquele burgo. Seu vulto, seu saber e dignidade moral, suas nobres maneiras estavam a indicar-lhe o aproveitamento nalgum Tribunal superior, a que presidisse com beca romana e frases latinas. Nunca porém o quiseram elevar àquelas cumeadas. Sempre elogios, jamais a promoção. A política negava justiça a quem melhor a distribuía. Era voz geral que, desgostoso, pedira contagem de tempo para aposentadoria. Mediante manobras mesquinhas que escapavam aos olhos do juiz sempre voltados para o mais alto e o mais longe, o seu esperto escrivão conseguiria prestígio e se fazia temido na cidade. Conduzia os processos, influía nas testemunhas. A vida e a liberdade de uma gente estavam em suas mãos – sobretudo agora, com um promotor sentimental, sempre no sítio do fazendeiro, por cuja filha se apaixonara. Por artes do escrivão, fora desrespeitada a recomendação de se preservar a pessoa do réu. O engenheiro vai subindo a ladeira entre busca-pés que lhe passam raspando pelas pernas. O hotel apresentava-se iluminado, todas as vidraças abertas. Parte da população, apenas curiosa, seguia o hóspede a certa distância. As famílias retiravam-se, enquanto as janelas começavam a se fechar para a ventania que não tardava. Queimados os últimos busca-pés, os moleques transformaram o resto da noite em passeata carnavalesca, esquecidos do colega morto e de seu indignado assassino. A este reservara a hoteleira o mesmo quarto onde hospedara a primeira vez, dando vista para o cemitério e para a colina fatal onde a vítima desaparecera para sempre. Já o vento corria forte. Mas o engenheiro evitava qualquer pensamento ou evocação que não se prendesse à sua defesa. A maneira como o receberam era um aviso. Agora que se fechara no quarto, sentia o quanto lhe perigava a liberdade. Sentado numa poltrona roída, perplexo diante do absurdo, fumava sem parar e pensava no que devia fazer. Às vezes, uma onda maior de revolta cobria o seu caso pessoal, ia alcançar os fundamentos da sociedade e da condição humana em geral, o que lhe produzia certa embriaguez momentânea em que se reconhecia profeta e vociferador. Chegava a achar-se cômico nessa vertigem, mas não queria nem podia perder-se em divagações: o caso concreto estava ali, como a ponta de um punhal aproximando-se de seu coração. Amanhã mesmo se acharia perante a Justiça, de seus olhos vendados, de sua cara falsa e fria. Enquanto fazia essas amargas reflexões, o vento não cessava um minuto de empurrar as venezianas, como que forçado a entrada. Pelo que dele escapava nas frestas-lâminas frias, finas – podia o engenheiro imaginar-lhe o ímpeto veloz e a noturna impaciência. Uma pancada suave na porta, e aparece a dona do hotel. Pousa no hóspede os olhos calmos e negros. A corrente de  ar do corredor, entrando pelo quarto, agita ao mesmo tempo os cabelos da mulher e o cortinado das janelas. Vem com a bandeja. Traz chá e frutas. – O senhor deve estar lembrado de mim. – Sim, como não? – Vinte e tantos dias o senhor foi meu hóspede, não é verdade? Colocou a bandeja na mesa. O engenheiro permanecia silencioso. A mulher dá um jeito ao travesseiro, passa o pano pelo aparador. – É bom ir tomando antes que esfrie. Reclina o corpo para firmar o trinco de uma veneziana, o que faz com propositada lentidão. – Foi pena ter acontecido aquilo… A hoteleira não leva a mal o mutismo do hóspede. Estava triste e preocupado, era natural. Relanceou o aposento. Não encontrou mais nenhum pretexto que a fizesse demorar ali por mais tempo. Ao sair, lembrou-se de dizer: – Há um advogado lá embaixo, na sala, querendo falar-lhe. A estas palavras, o engenheiro acordou de sua cisma: – Hein?… Faça-o subir, tenha a bondade. – Tome chá antes. O senhor deve estar fatigado. Se precisar de mim é só apertar o botão. Disse e retirou-se, deixando atrás, a relembrá-la, um perfume insinuativo. O advogado entrou ofegante. A porta bateu-lhe atrás com estrondo. Vinha oferecer os seus serviços profissionais. Ali, naquela terra, tirante o juiz, “fique certo seu doutor, ninguém mais presta, nem eu mesmo!” disse com ênfase, batendo no peito. – Sou um homem acabado… Minha mulher fugiu, meu filho não dá notícias. Desde estudante, com a graça de Deus, fui sempre uma criatura… Ouviu-se nesse momento um grito lá fora: – Morra o criminoso! O causídico interrogou o relato de sua vida para dizer: – Está ouvindo?!… Não se fala em outra coisa na rua. Acho imprudência o senhor sair hoje. – A que horas o interrogatório? Perguntou calmamente o engenheiro. – Ah, pois não! Três da tarde, no edifício do Foro, segundo andar, sala de audiências. Com a cara quase encostada à do engenheiro, foi-lhe segredando aos ouvidos, na sua linguagem profissional: – O processo é um amontoado de infâmias e incongruências. A denúncia apóia-se em indícios fracos. E o cadáver que foi visto descendo o ribeirão nas divisas do Município, dez dias depois, era um jovem de cor branca, não podia ser do Zeca da Curva. Não se atemorize. Havemos de pulverizar as testemunhas. Ao sentir-lhe o hábito de sarro de charuto e cerveja, o engenheiro recuou. – Há testemunhas? Perguntou. – A principal o senhor conhece. – Como? – Trouxe-lhe o chá ainda há pouco. Acabou de sair deste quarto. O engenheiro não deixou transparecer por palavras o seu pasmo; apenas pela expressão do olhar e um ligeiro tremor de ombros. Aproximando-se, o advogado relanceou a porta e disse baixinho: – Ela é influenciada pelo escrivão que lhe salvou o hotel de uma falência. Dizem que é séria, não sei. Duvido… O que se murmura por aí, à boca pequena, é que ele tem uma paixão secreta por ela. Criatura má… Veja o que fez comigo: quase duas horas me deixou lá embaixo na sala, com esse frio! Esquisitíssima! Não está ouvindo o piano? Pois é ela.. Não há hóspede que aguente. Ficou assim desde que perdeu o marido… Mas vamos ao principal: meus honorários não são de assustar. Prefere negar o crime ou alegar algum dirigi-me? – Não houve crime! Exclama o engenheiro. – Sim; compreendo… – disse o bacharel com cínica reticência. – Também era o que faltava se o senhor fosse confessar o crime… Mas comigo, em particular, o senhor poderá abrir-se. É segredo profissional, saberei guarda-lo. Perante o júri, sim, dede negar o fato. Dirá, por exemplo, que não conhecia o menino… – Mas eu conheci o menino! Privei com ele durante vinte dias. – E o lado sexual?! Pergunta o advogado. – Que lado sexual?! Exclama o engenheiro levantando-se com ímpeto. – Está no processo. Se não me engano, no depoimento de madama… – Que madama? – A que lhe trouxe o chá, e está tocando piano. – Vamos chama-la! O advogado mexeu-se na cadeira, reacendeu o charuto. Com esse gesto, despedia-se do ar subserviente com que entrara. Entre baforadas ressurgiu o profissional desembaraçado e loquaz. – Quer um conselho? Não o faça. O escrivão deve estar lá embaixo. Visita-a quase todas as noites. É um homem perigoso, simulador. Servil ou autoritário, conforme a conveniência. Deixemos para esclarecer tudo em juízo. Ao que consta, essa mulher tem paixão por outra pessoa. – Não me interessa… – Conforme. Se essa pessoa é o próprio denunciado, convém tomar o caso em consideração. – Por mim?!… – Sim. E talvez o senhor nem tenha percebido. Está-se vendo que é muito jovem, ainda não tem experiência. Se quiser passar agora a procuração… – Não. Eu me defendo sozinho. – Sozinho! Exclamou o advogado. E ainda desse jeito, confessando tudo!… Ah, meu caro, não brinque com a Justiça… Está muito moço para suicidar-se. Chegou à janela e olhando para a noite, começou a dizer: – Ninguém faz ideia do que seja a cadeia desta cidade! Ali não entra luz, a água mina das paredes. Venta noite e dia! Ali só os ratos e vermes são felizes!… Era uma advertência que o engenheiro achou declamatória e extemporânea. Pediu desculpas ao advogado, estava cansado, precisava dormir, amanhã lhe diria qualquer coisa. – Mas defenda-se, disse o bacharel despedindo-se com uma emoção que o hóspede não ficou sabendo se era sincera ou simulada. Mergulhou o rosto no travesseiro. Estava quase a soluçar. Lá fora o vento guaiava. Era agora um vento de tipo retórico e banal, o que corre em toda parte sem a menor afinidade com o outro, que era todo malícia, mocidade, fecundação. A discriminação gratuita entre as duas famílias de vento prendia-se no espírito do engenheiro às impressões deprimentes da chegada. Vestido como estava, dormiu. Acordou antes da cidade. Abriu a janela. No lusco-fusco da madrugada, a cidadezinha era um amontoado triste de casas. Despertada dentro de algumas horas, ela começaria a desprender seus venenos, faria andar seu aparelho de compressão. Já decidira o engenheiro o que ia fazer: tudo confessar, nada esconder. Que sabia da Lei? Nada. Que sabia do fato? Tudo! Batem à porta, a hoteleira apresenta-se. Pálida, contrafeita, os olhos quebrados pela insônia. – Desculpe-me. Vim eu mesma trazer o café. Essas criadas de hoje não se pode confiar nelas. Quebram tudo, servem mal os hóspedes. O piano o incomodou? – Não, minha senhora. – Fiz o possível para tocar baixinho, fechei as portas. É a minha reza da noite. Não posso deitar-me sem tocar nem que seja um pouco. Já tenho perdido hóspedes por causa disso. Esta noite pensei muito no senhor. O engenheiro não sabia como definir as intenções daquela mulher. Impressionado embora com as palavras do advogado, sentiu que era preciso resistir à doçura de maneiras com que ela procurava envolve-lo. Manteve-se num silêncio cauteloso, cortado apenas por monossílabos de estrita deferência. A mulher olhava para o retrato colocado sobre a mesa de cabeceira. – É a sua noiva? – É. – Eu também já fui moça feito ela. Os anos correm tão depressa… Retirou da mesa a bandeja da véspera, colocou a nova, cheia de frutas, queijo, pão e café recendente: – Convém alimentar-se bem. O senhor vai ter o que fazer. Não há de ser nada. Essa gente aqui é muito má. Felizmente nosso juiz… Já conhecia o advogado? – Vi-o ontem, pela primeira vez. – Não se entregue a ele, é o que lhe aconselho. Vive de combinação com o escrivão. Eu mesma… A mulher empalideceu, hesitou, deixou sair uma lágrima em vez da confissão que parecia querer soltar. Abradou-se o ânimo duro do engenheiro: – A senhora ia dizer que… – Nada… nada… – atalhou a mulher. Retirou as rosas de uma jarra, atirou-as pela janela: – Veja só, murcharam depressa… A audiência está marcada para as três horas, não é? Apanhou o roupão azul, colocou-o no cabide: – Bonita cor, bom tecido. Cisrcunvagou a vista pelo aposento: – É engraçado, quando entro para arrumar o quarto na ausência do hóspede, eu sei logo se ele é velho ou moço, solteiro ou casado. Até o cheiro é diferente… O engenheiro se mantinha mudo, na poltrona. – Não se preocupe, Nossa Senhora há de lhe ajudar. É só não excitar o ânimo da população. O menino era muito estimado. Se precisar de alguma coisa, pode me chamar. A porta de meu quarto está sempre aberta… Ante a expressão calada do engenheiro, um ar de ódio transfigurou o rosto da mulher: – No meu depoimento, eu só contei o que sabia… O homem encarou a mulher. Estaria diante de uma criatura diabólica? Ou de alguma incompreendida, disposta a queimar naquele hotel e lugarejo os anos maduros de sua vida, como se a renovação dos hóspedes lhe diminuísse a solidão e tornasse possível o encontro com alguém que de repente viesse mudar-lhe o destino? – Não passa de uma megera! Pensou. Por um momento chegou a pressentir nela uma possível aliada. Mas logo reagiu contra esse sentimento, receando novas ciladas. A cidade ia dentro em pouco receber o vento; o sintoma era aquela súbita imobilidade e anemia no céu. Já penetrava pelo quarto e fazia tudo vibrar. Era o mesmo que o engenheiro conhecera ali, meses atrás, quando em férias. Nada queria com ele, porém. Pelo menos por enquanto. Viera cuidar de sua defesa, de sua liberdade. Precisava ter a cabeça fria. Aquela invasão brusca e amistosa só vinha perturbá-lo. Veja-se o que acabou de fazer lá embaixo, justamente no edifício do Foro, onde, dentro em pouco, ia proceder-se ao interrogatório: soprou tão forte que quebrou a vidraça lateral, ferindo com os estilhaços uma mulher e um ciclista. – Mandaram dizer para o senhor comparecer às três horas, – veio informar um empregadinho que ficou a olhar para o hóspede. Às três e um quarto o acusado entrou no Foro. Ali funcionavam várias repartições municipais. Havia menos gente que na véspera, à sua chegada. Passou por entre duas filas de curiosos. Relanceou a vista pela praça. Bastou um grito que veio de longe e que, ouvido pela segunda vez, lhe parecia um slogan de vingança “eh, doutorzinho! Chegou tua hora!”, para que tivesse a medida do ódio contra a sua pessoa. Parou perplexo, com á espera de um guia. Suportou os olhares reunidos de quase toda a Câmara Municipal, do Foro e da Coletoria, que tudo funcionava no mesmo prédio. Era a condenação prévia. O oficial de justiça indicou-lhe a escada, acompanhou-o até a sala de audiências. No trajeto entre o primeiro degrau de pedra do saguão e o fim da escada, já no segundo andar, foi-se-lhe definindo na alma, apertando-lhe o coração, um sentimento que até então não imaginava tão atroz: o de ser renegado, o maldito. Para ele todo aquele aparato. O silêncio, as caras fechadas, a troca de olhares oblíquos, as folhas de papel que mudavam de mesa, o reabastecimento dos tinteiros, a campanha, o Cristo de madeira, as idas e vindas do oficial de justiça e do advogado da véspera, os sussurros deste aos ouvidos do escrivão, e uma risadinha geral subentendida, quando não explícita, tudo contra ele, tudo para sua desgraça. Ao entrar o juiz, o silêncio se fez maior. Aquele vulto alto e cansado, algo volumoso dentro da roupa preta, trouxe-lhe certo alívio. Sem o querer, associou o trio juiz-promotor-escrivão, já sentados à mesa sobre o estrado, à imagem das bancas examinadoras mais exigentes do seu curso de engenharia. Como fazer com que sua verdade tivesse mais poder do que a mentira armada com os aparelhos e o cerimonial da justiça? O que aconteceu e precisava contar era, de sua natureza, tão inverossímil que não seria compreendido pelo tribunal popular, caso o juiz o mandasse a júri. Acabara de ouvir a leitura da denúncia. Homicida!… Será possível? E, além de homicida, pervertido sexual! Assim dizia a denúncia do promotor. Era como se o punhal estivesse perto, doendo-lhe já no corpo. Sentiu necessidade imediata de dormir, escapar pelo sono. Mas reagiu. Tirou um cigarro, acendeu-o rapidamente; o escrivão observou que não era permitido ali. A sala foi-se enchendo. Todos, menos o juiz, o fixavam com interesse. O escrivão olhava espantado para a assistência. Achava exagerado o número de moças no reconto, fato inexplicável num simples interrogatório; e absurdo, irritante mesmo, o tom de piedade que transparecia dos olhos delas. – Até agora não constituiu advogado, nem quis ver o processo! Disse o escrivão aos ouvidos do promotor. Será liquidado. Ou então é louco! O juiz ficara lendo num livro que não se sabia bem se era a Bíblia ou o Código Penal. Quando finalmente levantou para o acusado os olhos congestionados e calmos, não era, a bem dizer, para enxergar nele a pessoa do engenheiro; era para o conhecimento de um caso a mais que ia apreciar como magistrado. Com voz pausada, fez as perguntas de praxe. Ao declarar o réu a sua idade, uma exclamação ao fundo da sala: “É uma criança!”, suscitou um psiu! Do escrivão que se voltara irritado para o lado das moças. – Tem alguma declaração a fazer? Perguntou o juiz. O denunciado respondeu que sim. Ia contar tudo, sem mesmo saber se estava se acusando ou se defendendo. Não lera o processo. E dispensara o advogado. Não por desprezo ao profissional que o procurara na véspera; nem por desatenção à Justiça. Mas porque “o que vou narrar a Vossa Senhoria, Sr. Juiz… – A Vossa Excelência, emendou o escrivão. – …O que vou narrar a Vossa Excelência, Sr. Juiz, não poderia constar no processo. Aqui uma nuvem escura envolveu-lhe o espírito. E quase toda a sala desapareceu. Do escrivão sobrenadava a gravata vermelha, depois o rosto liso, os olhos claros. A inibição do engenheiro foi demorada. E, para a própria assistência, difícil de suportar. Perdido o impulso inicial que continha os germens de tudo o que ia dizer, parecia-lhe haver soçobrado no momento mesmo de salvar-se. Sentiu num átimo a alma danada do homem que forjicara o processo, aquele tipo que agora o encara com sarcasmo. Só voltou a si, quando a voz do Juiz: – Vamos! Pode continuar. Sua consciência ia-se turvando outra vez, quando um novo “vamos!” do juiz o despertou. Ao fazer menção de prosseguir, a sala experimentou certo alívio. Recomeçou a falar com uma calma que não sabia bem de onde vinha. – “Senhor Juiz, o menino achava-se realmente comigo, no momento em que desapareceu.” Houve um frêmito geral. Só o rosto do juiz não acusava a menor alteração. “… Mas que eu o tenha matado ou me prevalecido dele para torpezas, não é verdade, oh! Não é verdade! Vou contar tudo tal como se deu, desde o momento infeliz em que desembarquei nesta cidade. Não sei o momento infeliz em que desembarquei nesta cidade. Não sei se o que vou dizer significa a minha defesa ou a minha acusação, mas é a expressão do que aconteceu. E o que aconteceu, advogado nenhum saberá explicar. Talvez nem eu próprio. Eis a razão por que o dispensei, embora Vossa Senhoria… Vossa excelência tivesse nomeado um para me assistir no processo. Poderá alguém acusar-me; defender-me, impossível. Porque o fato se deu: o menino está desparecido ou morto. Talvez eu tenha sido cúmplice involuntário de uma tragédia. Mas se há no caso algum criminoso, esse criminoso não pode ser responsabilizado. Oh! Impossível ser responsabilizado! Impossível, Sr. Juiz. Só contando…” Houve uma pausa longa, aflitiva. Depois começou a falar, como alguém que eu achasse sob estado de hipnose: “Senhor Juiz, sou engenheiro construtor de pontes. Procuro viver de coisas positivas e, tanto quanto possível, explicáveis. Não cultivo a atração do abismo. E o absurdo me aborrece. Se de meus pais herdei certa tendência para o sonho, eles próprios me preveniam contra as ciladas da imaginação. Também não sou amador de fatos estranhos da vida, posto que sempre aconteçam. Já disse que sou engenheiro e construtor de pontes. Sr. Juiz, há cerva de três meses desembarquei nesta cidade em busca de repouso. Estava esgotado, precisava refazer as forças. Desde criança, ouvira dizer que aqui ventava muito. E o nome deste lugar ficara-me na memória ligado à ideia de vento, como o de outros lugares à ideia de crime ou de tranquilidade colonial. “Durante a subida, não pensava em outra coisa. Tanto assim que ao desembarcar, ainda um pouco atordoado, interpelei logo o primeiro sujeito que se aproximou: – Onde o vento? “Não preciso dizer que ele me deixou sem resposta; mas também não se espantou, habituado que devia estar aos modos dessa gente que chega pela primeira vez à montanha, ainda com os tiques e esquisitices da cidade. “Olhei em redor. As árvores imóveis, a poeira no chão e, por cúmulo, abertas as vidraças. Então não há vento algum, pensei. Era lenda. Ou talvez eu tenha descido numa hora de calmaria. Podia não estar ventando no momento e ter ventado muito, antes. “Procurei os vestígios. A iluminação escassa não me permitia um exame profundo. Pela disposição das frondes próximas e na pele dos raros transeuntes talvez eu pudesse descobrir sinais de sua fustigação constante. Não havia; ou, se havia, era de difícil reconhecimento. Notei, é verdade, as pedras roídas nos alicerces, e escoriações no reboco das paredes. Mas não era o suficiente. Foi quando dei com as palmeiras. Aquelas que estão ali em frente, na praça.” Apontou para fora, todos olharam. Depois prosseguiu. “Tudo então se esclareceu. Tinham a copa entortada para o sueste; o tronco também. E cicatrizes de palmas arrancadas. Vento, portanto. “Não me enganara. Era pois este lugar a capital do vento. Ou pelo menos, uma cidade ventada. Enchi-me de alegria, vendo confirmar-se minha expectativa. Até na figura do garoto que me esperava segurando as malas – um menino de cabelos lisos, olhos espantados, pele bronzeada, e uma mobilidade extrema na fisionomia – eu via um filho do vento. É possível, Sr. Juiz, que eu exagerasse, que visse vento em tudo. Trazia a imaginação livre e os nervos um pouco desgovernados pelo cansaço. “- Você é daqui mesmo? Perguntei “ – Sou, sim senhor, respondeu o garoto. “- Você é descendente de índio? “ – Minha avó… “ A estação já se tinha esvaziado. “ – Mas cadê o vento? Perguntei. “ – Daqui a pouco ele começa. É pro Bela Vista que o senhor vai? “ – Sim. “Subimos a ladeira. Apressei os passos. Não desejava ser surpreendido pelo vento ainda na rua. Não me sentia preparado. “Ele, vem sempre? “- Ah! Todo dia… “O pequeno carregador parecia arquejar, perguntei-le se queria largar a maleta no chão para uma pausa. Respondeu-me que não; estava habituado. “Um casarão apareceu todo iluminado. “É ali o Bela Vista, disse o menino. “Você gosta de vento? “- Gosto. Quando ele não vem eu fico aborrecido. “Falava aos arrancos, a respiração difícil. Tinha o corpo inclinado, como contrapeso à mala maior. – Acho que o que eu gosto mesmo… é do vento… “Já no hotel começavam a fechar-se as vidraças. Compreendi logo: o vento não tardaria. “- O senhor também gosta? “Respondi com um aceno. “ – Então, se quiser, eu posso lhe arranjar um cavalo amanhã para o senhor apreciar lá de cima. O aluguel é barato. “A associação de cavalo e vento me exaltara subitamente. Parecia resgatar em mim todos os males que a fadiga acumulara. Eu falo em cansaço, mas não era só isso. A imagem de cinco operários mortos retirados do fundo da ensecadeira quando faltou a bomba-de-ar também não me saía da lembrança. Como ia dizendo, combinei com o menino; ele traria cedo o animal. “Entrei, mostrara-me o aposento que mal pude reparar como era. Adormeci, aflito para que amanhecesse logo. Foi um sono espesso, profundo, interrompido às vezes pelo barulho de uma ventania que eu não sabia bem se era do sonho – pois ventava também sonambúlico – se estou contando coisas inúteis. Se posso dizer tudo, se o senhor quer me ouvir até… – Se Vossa Excelência quer ouvir – corrigiu o escrivão. Gesto discreto do juiz fazendo sentir ao escrivão que aquilo não tinha importância. – Não sei, senhor Juiz – continuou como que voltando a si de um estado sonambúlico – se estou contando coisas inúteis. Se posso dizer tudo, se o senhor quer me ouvir até… – Se Vossa Excelência quer me ouvir – corrigiu o escrivão. Gesto discreto do juiz fazendo sentir ao escrivão que aquilo não tinha importância. – Não sei, senhor Juiz, se o senhor quer ouvir-me até o fim. – Sim, sim, continue – disse o magistrado. – Onde mesmo que eu estava? Toda a sala se preparava para escutar o resto da história. – Eu estava… eu estava… Ficou suspenso, tentando reatar o fio do relato. – Com o cavalo e o vento… – soprou uma voz feminina junto do balaústre que separa as duas metades da sala. “- Ah! Sim. No dia seguinte, cedo, me levantei. Não era o engenheiro fatigado da véspera; era um homem despreocupado, à espera de um menino com um cavalo. Eu ia descobrir os arredores e já recebia as primeiras virações da manhã. “À porta do hotel uma onda de bem-estar fazia de mim o homem, mas sem a recordação das canseiras e problemas da construção, e já na sua imponência de coisa concluída, útil a felicidade. Foi quando apareceu o menino. “Vinha de longe, rindo, montado no cavalo, a puxar o outro que me era destinado. Aproximou-se, quis saber se tinha escutado o vento daquela noite. Eu disse que não. – Pois o senhor perdeu. Mas não foi dos melhores. O bom mesmo, o senhor vai ver hoje. “Perguntei-lhe como se chamava. – Me chamam aqui de Zeca da Curva. “ – Que nome! “Passou a mão pela crina do animal e explicou gaguejando: “ – É porque nós sempre moramos lá em cima, na volta da estrada… “Dentro de alguns minutos, já fora da cidade, eu ia pouco a pouco entrando na intimidade da paisagem. O garoto parecia contente de se ver promovido de carregador a cicerone de turista. Deu-me o nome das colinas principais, mostrou-me as corredeiras, o vale. Contou que uma vez tinha havido um incêndio horroroso na fábrica, a fumaça cobrira tudo, até parecia noite, depois que veio o vento a cidade amanheceu de novo. Susteve o cavalo e ficou a olhar para o céu. “ – Acho que ele já vem vindo. “ – Ele quem? “ – Como sabe que vem? “ No corpo, uai… “ Mas o ar está parado. Que é que você sente no corpo? “ – Uma coisa… “Suas narinas farejavam os longes. Alguns instantes depois, ele tinha a cabeleira em desalinho, e o meu chapéu fora atirado à distância. Não era ainda o vento forte que eu esperava. Parecia a vanguarda de outro, maior, que vinha avançando atrás. E à medida que aumentava de velocidade, ia mostrando uma qualidade diferente daqueles que correm em outros lugares. Parecia soprar da minha infância, trazendo o que havia de melhor e de mais antigo no espaço. “Viramos os animais para recebê-los de frente. Era como se cada um de nós estivesse na proa de um pequeno barco. Subitamente se animou a paisagem. Todas as árvores se manifestaram. Principalmente as bananeiras do vale e dos bambuais da colina, que também são vistos daqui no espigão daquela serra.” O denunciado apontava para a serra que se deixava ver através da vidraça. Ante a maneira natural com que fazia a sua narrativa, a assistência foi perdendo a prevenção e começou a ouvi-lo com simpatia. Continuou: “-Agitavam-se de tal maneira que o apito de um trem que partia no momento ficou abafado no barulho. “- Não falei que vinha? Gritou o garoto, orgulhoso do seu vento. “E começamos a correr… O que era uma delícia! “Cavalo e vento!… “Com o sol no zênite, voltei ao hotel. Já o vento tinha cessado. O menino me perguntou quando é que eu queria mais; disse-lhe que me procurasse depois. Deixou o meu cavalo pastando nas ervas da rua e desapareceu num galope. “Entrei na sala de refeições que era limpa e cheirava a chão encerado e pratos guardados. Os poucos hóspedes comiam em silêncio. Pareciam chocados com a minha entrada. Mandaram-me olhares furtivos, antes que os meus os rechaçassem. Esses hóspedes tinham o ar tristonho e pareciam desejar que ninguém lhes perturbasse a paz. Eu também alimentava o mesmo desejo. A dona veio colocar em minha mesa uma jarra de flores silvestres, privilégio, segundo me dissera, dos hóspedes recém chegados. “Voltei ao quarto para a sesta. Meu primeiro contato com aquele vento deixou-me o coração preparado para uma aventura maior. Não se pode dizer, Sr. Juiz, que eu já estivesse dominado por ele, mas dormi com seu rumor nos ouvidos, por que não dizer na alma. Com o vento e também com a paisagem que ele transfigurara. “Durante dias e dias foi a minha obsessão. Nem cheguei a retirar da mala os livros de leitura com que pretendia encher o tempo. Só o vento bastava. Toda vez que começava a soprar mais forte, Zeca da Curva aparecia. De tal maneira, que a figura maltrapilha do desaparecido se tornara para mim como uma promessa de vento. “Entre mim e ele se estabeleceu curiosa camaradagem, na qual um expandia o seu espírito infantil e o outro, eu, o adulto em férias, procurava distração para as horas de ócio. Só que não podia esperar, Seu Juiz, que dessa brincadeira inicial resultasse desfecho tão triste: um homem perante a Justiça e uma criança desaparecida ou morta. O que começou como passatempo acabou em desgraça. “Preciso contar, Sr. Juiz, como se foi formando entre nós esse estado de espírito. Eram encontros e diálogos quase diários em face e dentro mesmo das correntes de ar que percorrem esta cidade, onde a vítima era tida como um vagabundo, fazedor de biscates. Talvez um solitário e, por certo, um incompreendido. Eu trocava pela sua intuição poética a minha experiência de adulto e meus vagos conhecimentos de meteorologia. “ A princípio cheguei a pensar que ele estivesse alimentando os meus caprichos, em busca de gorjetas ou de qualquer proteção de minha parte. Depois…depois é que vim a descobrir nele um verdadeiro iniciado do vento. “Se de fato morreu, e espero em Deus que não, ninguém mais do que eu deplora essa morte. Éramos vistos sempre juntos, à hora da ventania. E pelo que vim a saber ontem, posso bem imaginar toda a sorte de suposições maliciosas que essa intimidade despertava nos habitantes da cidade, especialmente os hóspedes de meu hotel. A dona me perguntou que graça eu achava em tal companhia. Eu não podia responder em dois minutos o que vou tentar explicar ao senhor… a Vossa Excelência, sem saber se o conseguirei. “Zeca da Curva e eu saímos todos os dias para estudar o vento, segundo a direção, a hora, a velocidade, o cheiro e as diversas coisas que ele faz bulir. Quase sempre deixava que o menino falasse; quando emudecia, era eu que o provocava com noções teóricas ou invenções gratuitas. “Logo na primeira vez, aproximando-se com seu cavalo, fez-me uma pergunta: “- Onde é que ele começa, hein? “ – Mamãe disse que é Deus que faz soprar o vento no mundo. “Respondi que também não sabia. O garoto ficou decepcionado; insistiu em que eu sabia, mas não queria dizer. “ – O senhor não reparou esta noite? Teve um vento danado.. Corria de um lado para outro, empurrava tudo que era porta e janela. Acho que ele não sabia bem o que queria. Fiquei o tempo todo espiando pelo buraco da fechadura; a língua fininha dele entrava no meu olho. O senhor não sabe aquela bananeira que nós vimos lá em cima, perto da caixa d´água? Pois parecia que estava pegando fogo. Acho que ela sofreu um bocado.” O interrogado fez aqui uma pausa. “- Estou-me esforçando, Sr. Juiz, por conservar o jeito especial de o garoto falar, mas vejo que não é possível, perco o que havia de mais saboroso na sua linguagem. “O segundo encontro foi na estrada do Cruzeiro. Alimentei a conversa: “- Ontem eu vi quando ele se escondeu na grota, disse-me o menino enquanto subíamos. “- Com certeza pernoitou lá. “- Com certeza o quê? Perguntou, fazendo uma careta. “- Pernoitou lá, repeti. “- O que é que é isso, pernoitou lá, pernoitou… pernoitou? “- Passou a noite, expliquei. “Ah, que palavra gozada! “- Olha lá… Quer dizer que o vento está correndo muito alto, você está vendo? “- Estou, mas eu gosto é quando ele passa baixinho e vem brincar no capim. “- Com certeza está indo para o mar. “- Pro mar! Como é que sabe? “- Porque a costa atlântica é para aqueles lados… “Costa o quê? “- A costa que dá para o oceano chamado Atlântico, nunca ouviu falar? “- Ah, agora tô me lembrando, a professora falava nesse nome… O vento que corre para o mar é diferente, não é? “- Conforme. Às vezes vai com grande velocidade, sessenta, setenta, noventa quilômetros a hora… “- Como é que sabe? “- A gente pode tomar a velocidade, há aparelhos para isso. “- Pois sim, vou acreditar! – respondeu em tom de zombaria. A gente tom a velocidade do vento é nas árvores e na roupa dos varais. E o que é que o vento vai fazer no mar? “Respondi que não sabia, mas achei melhor dizer qualquer coisa, dar largas à imaginação do meu interlocutor. “- Ajudar os veleiros, respondi. Animar as águas, preparar os temporais. Você já viu o mar? “Sua testa franziu-se. Era, creio, a segunda vez que lhe fazia tal pergunta e ele desconversava. Passou a cismar. Depois, em tom de justificativa: – O maquinista prometeu me levar escondido na máquina, mas mamãe disse que me bate, que se for, ela não vai mais querer saber de mim. “Parou a cismar. “- Lá o vento corre à vontade, não é? Não tem parede, não tem morro, não tem nada para atrapalhar… Assim, é fácil… “- Lá ele vira ventania, lembrei. “- Aqui também nós temos ventania, uai! O mês passado houve uma na hora mesmo da procissão. Atrapalhou tudo, nós corremos, o padre ia na frente, o andor caiu, foi uma coisa danada! Pergunta à Espiga de Milho! O vento faz cada uma! “- Quem é Espiga de Milho? “- Minha namorada. Mas é escondido, ouviu? Mamãe não sabe. “Com o correr dos dias, comecei a me apaixonar por esse jogo. Dei ao menino algumas noções elementares sobre deslocamento de massas quentes e frias da atmosfera. Não acreditou; desconfiava que eu estivesse dizendo bobagens. Falamos sobre diversos tipos de vento. Eu levava comigo um esboço de classificação para o qual me servira dos dados que ele mesmo me fornecera. Escrevera as notas durante a noite, no quarto do hotel. Pode parecer pueril, mas eu o fazia tanto para a recreação do menino como para a minha própria. “ Assim, segundo a nossa classificação, havia ventos maliciosos e ventos desordeiros, ventos calados e ventos que cantavam, ventos compridos, de grande velocidade, e ventos miudinhos, desses que começam a correr sobre a grama e logo desanimam aos pés do primeiro arbusto. Confessou que apreciava muito esse tipo de vento, chamado brisa, filhote do grande, que movimenta as nuvens; é, dizia ele, uma viração “que não dá nem para suspender as saias das moças mas serve para levantar os gravetos do caminho e os papeizinhos da calçada”. “As grandes árvores nem se mexem, pois não dão confiança a essa brisa, mas as plantinhas miúdas ficam felizes.” “Fizemos outras hipóteses e nos despedimos depois de acertarmos umas tantas ideias sobre o assunto. “Animado com a conversa, trouxe-me no dia seguinte uma hipótese nova. Disse que esteve pensando muito durante a noite: aquele negócio de massas frias e massas quentes, de que lhe falara na véspera, achava que era bobagem. O vento – afirmou – é soprado por gigantes enormes escondidos atrás da cordilheira; se é muito forte, chama-se ventania; quando fica escuro, chama-se furacão, pior ainda do que a ventania. “- Se o vento não tem cor, interrompi, por que diz que o furacão é escuro? “- Porque é escuro mesmo, respondeu. Eu acho que ele é assim porque passa com as lanternas apagadas. E continuou: – Ventania é danada pra virar canoa quando ela vem, e eu fico só gozando… “E os outros ventos? “- Ah, sim, tem o ventinho de todo o dia, respondeu. E apontando com o queixo: – Este que está passando aí, por exemplo… Muito bom para refrescar a pele e empinar papagaio… Parece que não vale nada, não é? Mas depois que chega é uma festa… Olha lá os bambuais como ficam! Olha o milharal!… “- E a brisa? perguntei. “- Ah! Essa sai da boca dos filhotes do gigante. Gosto muito de apostar corrida com o rio. “Só para excitá-lo, procurei qualquer definição especial para a brisa e disse: – É um vento que ainda não cresceu. “Olhou para mim, reflexivo: – Isso mesmo! “Sem querer, liguei no meu espírito a invenção do menino às coisas da mitologia, de que vagamente me lembrava. Na expressão do meu rosto teria notado o efeito de sua descoberta. Parecia orgulhosos. Deixei ficar. “A nossa intimidade, Sr. Juiz, foi assim crescendo à base de vento. Encontrávamo-nos sempre. Um dia, eu subia a estrada que leva à colina de onde se avista a cidade e a ala esquerda do hotel. Sobre as casas pairava a faixa de fumaça deixada pela locomotiva. Eu caminhava devagar. Mais devagar vinha descendo o garoto. Pela primeira vez aparecia penteado. Ia com certeza encontrar-se com Espiga de Milho. Falou-me: – Pensei que o senhor tivesse ido embora. “Olhou entristecido para a cidade e depois para a paisagem: “- Ele hoje não veio… “Mas tarde, com certeza, respondi. “- O mundo fica sem graça, não é? Tudo parece fotografia. “Circunvaguei a vista. Tudo parecia mesmo fotografia. Ar parado, árvores imóveis, inalterável ainda a faixa de fumaça. Pensei comigo: “- Este garoto está hoje diferente… Fora de seu natural. É preciso ventar para que ele comece a viver. “Corria nesse momento um ventinho de ensaio, as árvores maiores nem se mexiam. O garoto observou, apontando para alguém: – Olhe que gozado o ventinho nas barbas daquele velho!… “Atirou com o badoque uma pedrinha ao chão, disse até logo, e continuou a descer. Já se achava longe, quando gritou: – Olha, olha, lá nos bambuais”… “Não olhei para os bambuais. Olhei para o menino que voltava correndo. Sua cabeleira estava desfeita, ele mesmo todo diferente, subitamente transformado em personagem do vento. Mas ele foi logo diminuindo e cessou. Zeca da Curva assumiu um ar escabriado. Sem jeito, virou-se para os lados do vale: “ – Daqui a um pouquinho ele volta. Quer apostar? “Alguns segundos depois as janelas começaram a bater, as roupas arracaram-se dos varais, desfez-se a plumagem de fumo. Apareceu uma menina ruiva, com uma garrafa de leite.” “-Vem, Espiga de Milho! Vamos aproveitar! “Ela atendeu. De mãos dadas, sumiram-se os dois na curva. Fiquei de longe, a ver se repontavam mais adiante. Mas o céu começou a enfarruscar. Entrou outro tipo de vento, o vento de chuva, diferente do que nos interessava. Nós não gostávamos da chuva que atrasa a corrida do vento, sempre aflito por desembaraçar-se de suas malhas. “Alguns dias depois encontrei Zeca da Curva chorando. Estava indignado. “- Mamãe me bateu. “Vai ver que você fez alguma arte. “Confessou, amuado, queixando-se: “-O vento levanta a saia das moças, e a gente é que leva a culpa, ora essa! Só porque fiquei espiando… “Pensei logo em Espiga de Milho com as pernas descobertas e os sinais da puberdade se arredondando debaixo da blusa. E para fazê-lo esquecer a mágoa, apressei-me em voltar ao tema do vento. Inventei que nele correm também meninos invisíveis, os mensageiros. Sabia que essa ideia ia excitá-lo. “O quê? Inquiriu logo. “ – Mensageiros, repeti. “ Ah! mensageiros, mens… “ – São alados, completei. “ – Que negócio é esse, alados? “ – Que tem asas. “ – É verdade? “ Senti um frêmito, perpassar-lhe o corpo. “ – Sim, é verdade. “ – Bem que eu desconfiava… “ Fez uma pausa: “ – E no furacão? Tem crianças também? “ – No furacão passam os guerreiros terríveis, inventei. “ – Por isso é que ele faz tanto barulho, não é? “ – Exatamente, respondi. “ – Quando venta muito forte, eu sempre desconfio que está acontecendo muita coisa que ninguém sabe… “ – Onde? Perguntei. “ Aí por este mundo… O vento é muito importante, não é? “Então? Não sabe que ele ajudou a descobrir o Brasil? “- O vento?! “ – Sim, o vento. “ – Puxa! “Já havia esquecido a coça materna. Fazia inspeções pelo céu. “ – Está vendo aquelas nuvens lá? “ – Estou. “ – Pois amanheceram na mesma posição de ontem. Ficaram encalhadas. Ontem o vento andava mais devagar do que o rio. – Bateu na testa, lembrando-se de qualquer coisa: – Espera aí… Está na hora da chegada do trem. “Partiu voando para a Estação. Ia pegar as malas, fazer o seu biscate. “Esqueci-o por algum tempo; voltei às minhas leituras. Quando pensava nele, era para duvidar de sua sinceridade. Cheguei a supor que, talvez para ser agradável, talvez para chamar a atenção sobre si, ele forçava o assunto e simulava atitudes. Não estaria exagerando? Ou apenas se divertia? Ou procurava mesmo impor-se à amizade do turista para merecer-lhe favores? “Achei pouco provável a suposição, tão extraordinário e espontâneo me parecia ele. Eu mesmo lutava comigo para não me deixar arrastar por uma ilusão. “ A dona pouco provável a suposição, tão extraordinário e espontâneo me parecia ele. Eu mesmo lutava comigo para não me deixar arrastar por uma ilusão. “ A dona do hotel me perguntava se eu tinha esquecido o garoto. Não respondi. “ Na verdade, espacei os nossos encontros e já começava a duvidar da sua paixão pelo vento. Certa manhã, no início de um temporal, cheguei à janela levado pela curiosidade de saber como se comportava o menino diante daquelas lufadas. Se era sincero fora de minha presença. Minha janela abria-se para os barracos da colina, onde ele morava. Meti o binóculo, o seu casebre se aproximou. Logo avistei Zeca da Curva no terreno, a pular. Tirara a roupa, ficara nu no meio do vento. Correndo de um lado para o outro, esbarrou numa lata e rolou pelo barraco. De repente, ei-lo de braços abertos e olhos fechados, gozando, aspirando o espaço. Assim permaneceu alguns minutos, imóvel, feliz. “ Agora, pensei comigo, já não tenho dúvida: ele é mesmo o enfeitiçado do vento. Acertei melhor as lentes e percebi, Sr. Juiz, claramente percebi o que o menino fazia: mijava! Com o perdão da palavra, ele mijava, Sr. Juiz! Gritei. Não me atendeu. Nem podia, tamanha era a barulheira. A urina diluía-se em gotas cristalinas. Misturando-se ao ar um líquido de seu organismo, tive a impressão de que procurava sentir-se mais ligado aos elementos.” Aqui, o denunciado perdeu o impulso com que vinha falando. Cochichos da assistência e uma troca de sorrisos entre o promotor e o escrivão tê-lo-iam devolvido a um plano em que lhe seria impossível continuar com a mesma fluência e candura. Olhou para o Juiz, como que o consultando. Este lhe fez com a mão um aceno favorável. Que prosseguisse. Encorajado, continuou: -“ É possível, se Juiz, que o que estou contando não tenho relação real com o processo. Mas tem com a verdade. Muitas vezes se chega à verdade pelos caminhos mais absurdos. Desde o momento em que verifiquei como procedia Zeca da Curva quando se viu só com seu vento, comecei a acreditar mais nesse menino. Imaginei-o incompreendido entre os companheiros; incompreendido e calado, para não ser objeto de zombaria. O pequeno maltrapilho era meu mestre de vento, o verdadeiro iniciado. E eu, o discípulo, não me vexo de confessá-lo. Daí por diante, só o compreendia dentro mesmo do vento. De tal maneira que, sem a sua companhia, eu me tornava indiferente a qualquer viração. Mas evitava que ele percebesse o meu estado de espírito, e dentro de mim mesmo lutava contra as imagens delirantes, lembrando-me da advertência de meus pais. “Os hóspedes do hotel deviam achar-me cada vez mais esquisito. Minhas férias estavam a terminar, eu já pensava em arrumar as malas. “Certa manhã, acordei com a pancada seca de um objeto no espelho. Era uma gaiola atirada da rua. Cheguei à janela. Reconheci o menino embaixo: – Isso é modo de despertar alguém? “ – Hoje vai ter! gritou-me ele. “ – Como é que sabe? “ – Uai! A gente sabe sem querer… O corpo avisa. Os meninos já estão bulindo nas folhas… “ Ah! sim… os mensageiros… respondi sorrindo. Mas é para já? “ – Não. Vai ser de tarde, disse consultando o céu e mordendo uma goiaba. Olha as árvores grandes… por enquanto estão quietas, mas o senhor vai ver mais logo. “ A camaradagem entre mim e o garoto crescera até o ponto de que dava ideia esse episódio do projetil no espelho. Por volta de três horas, subimos a colina, lugar habitual de nossos encontros. Lá em cima, ele me foi indicando a pista do vento. E apontando para o horizonte: – Olhe aqui, ele vai partir de lá, quer apostar? E correr nesta direção. “Com o dedo ia traçando a direção provável do vento no espaço. “ Ficamos esperando algum tempo. O céu era de uma cor neutra, meio amarelada, tonalidade que para nós indicava lufada iminente. O garoto parecia desassossegado, com medo de ser desmentido. Afinal o vento começou. Não ainda na plenitude de sua força, mas já amplo e gostoso. “ – Depois vai ficar melhor, disse o garoto; por enquanto, são as primeiras amostras. “Mas já vinha com o cheiro de mato e de rebanho. Ganhasse um pouco mais de espessura e o agarraríamos com a mão. Era como um animal invisível, mas perto. Ficamos mudos, a sentir o perpassar de sua cauda interminável. “-Este de hoje está bom! Exclamou, deliciado. “Mantinha os braços abertos e os olhos fechados. Seus cabelos assanhados prolongavam a animação das frondes e pastagens. “ Fixei-lhe a fisionomia, curioso de verificar-lhe as mutações. Tanto vale dizer que larguei o vento pelo menino. Mas, tomado também pela força da correnteza, dentro em pouco éramos dois a experimentar a mesma embriaguez. No meio da polifonia, ouviu-se um som de lata velha. É uma mulher, espécie de bruxa desgrenhada, do alto da cafua chamava o garoto para a janta. “Bruscamente afastado de seu vento, o menino seguiu contrariado. Mas logo a corrente aumentava de velocidade; e se transformava em ventania, categoria mais alta segundo a nossa classificação. Devia vir da floresta, sua matriz longínqua. Com certeza recebera no trajeto afluentes que a enriqueceram, virações de campina, brisas de lagoa. Para mim, era naquele céu, por cima das montanhas, que se operava a combinação de sopros múltiplos, emanação da terra, extrato de paisagens percorridas. “Retido pela velha, o menino ia perder aquele momento. Sem a presença dele, o espetáculo não seria o mesmo. Sentindo porém a atração do vento, não resistiu e voltou. “Eu me agarrara ao tronco de uma árvore para não ser levado. Zeca da Curva parecia embriagado. Arrancou a camisa, estendeu os braços. Permanecia imóvel, tenso. De repente, ouvi-lhe a exclamação: – Com este eu vou! “Abalou-se pela rampa, saltou o valado, atravessou uma sebe, ganhou a várzea, diluiu-se na bruma… E reapareceu diminuído, lá para os lados de uma macega, correndo, correndo sempre, até sumir-se no longe. Fiquei só no meio do turbilhão, sempre, até sumir-se no longe. Fiquei só no meio do turbilhão. Com a sensação de que ele me abandonara. “ Pudesse eu fazer aquilo! Faltava-me a força e a pureza do menino. Fui tomado de um sentimento estranho: senti-me rebaixado perante mim mesmo. “ – Ele tem doze anos! Disse comigo, tentando anular meu despeito. “ As rajadas aumentavam empurrando-me para o espaço, como que me desafiando a imitar a proeza do pequeno companheiro. Não. Eu, não! Sou engenheiro, não sou criança! Construo pontes, tenho os pés fincados na terra… Loucura, querer emular-se, tenho os pés fincados na terra… Loucura, querer emular-me com o garoto, disputar com ele os mesmos direitos perante o vento. Tratei de sair dali. Amanhã, pensei, amanhã saberei onde largou a ventania. “ Já então, Sr. Juiz, só restava do vento a cauda leve e comprida. Passar o turbilhão, o lugarejo reapareceu calmo, lavado. Acendiam-se as lâmpadas. Uma a uma as vidraças se  abriram. Fui descendo a ladeira. Na portaria do hotel, mal fechei a porta, a dona espantou-se: – Mas o senhor lá fora, com um tempo destes! “ Não respondi à pergunta reticente. No dia seguinte, voltei para o Rio sem maiores apreensões. Porque estava certo de que o menino tornaria. E já o supunha reintegrado em sua cidade e no seu vento, quando vim a saber por uma carta anônima que me acusavam de seu desaparecimento e de práticas infamantes. “E foi tudo, Sr. Juiz, o que se passou entre mim e Zeca da Curva!… “Estes, os fatos. São simples demais para serem acreditados. Minha amizade com a malograda criança foi, como disse, unicamente na base do vento, assim como o meu encontro com ele foi o vento que propiciou. Encontro que será também com a desgraça, se Vossa Excelência, senhor Juiz, não quiser admitir que, além dos fatos habituais de nossa vida cotidiana, outros há, íntimos, que ocupam a parte maior de nosso ser; mas que temos vergonha de confessar para não parecermos infantis ou loucos. São justamente os mais secretos, e o senso comum se recusa a considerá-los.” Nova pausa do engenheiro. O olhar aflito da assistência parecia implorar-lhe que prosseguisse. “Há de parecer tolice o que contei; mas sei que não é crime. Não pode ser crime dividir com quem quer que seja um entusiasmo maior pela chuva, pelo fogo ou pelas plantas… “No tipo de intimidade que mantive com o desaparecido entrou muito de nossa imaginação e, de minha parte, certa vontade de espairecer-me. Envergonho-me de ter sido obrigado a contar num ambiente impróprio para que me acreditem coisas que parecem inverossímeis, e que não poderiam constar de processo algum. Um crime é um crime, e impõe respeito; mas a narrativa em juízo de uma aventura com o vento há de parecer coisa inventada e absurda. Eis por que falei tanto no vento. V. Ex.ª me desculpe. Se algum culpado houve, Sr. Juiz, no caso, foi mesmo o vento. Eu quero esclarecer que me refiro a um que sopra quase todos os dias e neste momento mesmo já começo a agitar as palmeiras lá fora.” Toda a assistência, menos o Juiz, voltou os olhos para a praça. As árvores principalmente a balançar. …”é um vento especial, morno, de um teor diferente, rico de qualidades…eu ia dizer de intenções.” O juiz voltou-se pela primeira vez para o interrogado. Fixou-o com expressão desconhecida. Sua aparente indiferença sofreu alteração visível. Disse com certa dificuldade: – O denunciado não precisa voltar a falar do vento. Queira limitar-se aos fatos. …”eu queria com isso, Sr. Juiz, explicar a influência exagerada que ele exerceu em mim e no menino. Não nego certa conivência da minha parte. Fizemos dele um emprego abusivo, confesso. O que começou em brincadeira acabou em revelação. Eu não podia prever tal desfecho.” Enquanto o acusado parecia chegar ao fim, o vento forçava as janelas. Vinha com aquela impaciência com que se comporta ante os obstáculos de vidro. Depois mudou de rumo e conseguiu uma brecha. Entrava às lufadas pela vidraça lateral, a que se havia partido de manhã. E por essa fresta, logo ampliada, invadiu o prédio. Levantava os papéis, fazia bater as portas. Dava a impressão que vinha da natureza da narrativa e do ambiente que se criara. O promotor ficara todo o tempo embevecido numa cisma remota. Ouvia-se um barulho na escada. E ainda as últimas palavras do engenheiro: – “E quem pode afirmar com segurança, Sr. Juiz, que Zeca da Curva esteja morto? Por que não admitir que ele tenha vindo com este vento e já esteja subindo pela escada?” Houve um suspense. A interrogação traduzia um começo de alucinação que contaminava a assistência. Todos olhavam em direção à escada. Ouvia-se um sussurro aumentado pelo vozerio lá embaixo, no saguão. Deus o juiz por terminada a audiência. Pouco a pouco a sala recuperou a atmosfera forense. O promotor descruzou as mãos sob o queixo, e voltou à realidade. Foi quando se fez ouvir a voz do escrivão. Queria saber se era para tomar por termo tudo aquilo e como. Mal pode disfarçar um travo de ironia nessa pergunta. Ao que o magistrado respondeu que não era necessário, e que lhe fizesse subir o processo. A sala foi se esvaziando. Duas moças deixaram-se ficar sentadas ao fundo. O Oficial de Justiça veio pedir-lhe que se retirassem, ia fechar as portas. Perguntaram se no dia seguinte ia ter mais. Mostraram-se contrariadas ao saber que não. Era como se tivessem interrompido a contragosto a leitura de um romance. Ganhando a praça, o engenheiro respirou livre. O peso na nuca, o peso que parecia querer guilhotina-lo, desapareceu. Que a máquina da Justiça viesse a fabricar-lhe a condenação, já não se importava, sentia-se livre. Chegou o ônibus da tarde com os jornais do Rio. Esperava-se o noticiário do escândalo, tal como o redigira o próprio escrivão a pedido do correspondente. O denunciado comprou uma das folhas, verificou, ele mesmo, o que pressentira. Não se abateu nem se revoltou; apenas sentiu a vontade de abandonar depressa aquele lugar. Populares deixavam-se ficar nas imediações do Foro. Era porém impossível trocarem impressões. O vento não deixava. Começou arrancando o jornal das mãos do promotor; depois, o chapéu de alguns. Aumentando de velocidade e enrolando-se em redemoinhos poeirentos, derrubou a prateleira do engraxate. Folhas de revistas espalhavam-se pelo chão e desintegravam-se no ar, enquanto as mulheres prendiam fortemente as saias. Ninguém conseguia ler a notícia até o fim: ou a ventania carregava de novo o jornal ou a poeira turvava a vista dos leitores. Das sacadas altas do Foro descia uma nuvem de escrituras, certidões e editais. Pairavam no ar antes de virem pousar nas frondes. Era o arquivo que se desmanchava. A praça assumiu um ar festivo. Os moleques se atropelavam na disputa dos papéis. Não longe, a caminho do hotel, o engenheiro contemplava aquilo e se emocionava. Queria resistir, manter-se impassível. Lembrou-se da recomendação paterna (“não se perder em devaneios”, “tratar só com a realidade”). Como porém recusar a evidência do que estava acontecendo? Não precisava que o vento viesse assim tão estabanado, pensou. Mas que maravilha! Será que ninguém percebia? Era de um tipo novo, menos desencarnado e musical. Com algo de rebelde e desordeiro. Pena que ali não estivesse o Zeca da Curva. O engenheiro tinha certeza de que ele continuava vivo. Voltaria escondido, para uma busca naquelas grotas de montanha. Ou será que ia encontrá-lo expatriado do seu vento, vagando triste pelas ruas da Capital? Eis agora o vento nas pernas do Meretíssimo!… OH, vento, respeita o varão austero. Por que empurrá-lo assim, por que atirar-lhe ao chão o chapéu? Um juiz-juiz não pode, não deve correr… Nem olhar para trás, nem apanhar o que caiu… Um juiz de verdade só caminha de cabeça erguida, a passos firmes como quem vai de braços com a Justiça. O pretinho veio correndo pela ladeira para dizer que no Bela Vista a dona estava chorando, trancada no quarto. E o escrivão? Lá embaixo, no bar, sem querer conversar. Seus amigos compreendem-lhe o silêncio. Um deles ameaça: – Aquele tipo não há de botar mais os pés aqui. O outro: – Só serviu para virar a cabeça do povo. O escrivão olha para fora, põe-se a cismar. Vê o engenheiro, de mala na mão, tomar o ônibus da tarde. Sente-se derrotado, confuso. Então aquilo era maneira de se defender? As árvores começam a sossegar. – Para mim, o vento é o bento e nada mais…concluiu com melancolia o escrivão, acenando com a cabeça. A dona do hotel nunca mais se apresentara a seus hóspedes. Nem acolhera o escrivão. Dizia-se que depois da meia-noite seu piano tocava em surdina. Eram tantos os quartos vazios que não havia quase ninguém para ouvir. O juiz não mais compareceu às audiências. Nem despachou processo algum. Qualquer coisa havia mudado na fisionomia moral da cidade. O vento começou a existir. Descobriram-lhe um sentido novo. Algo de estranho passara-se na consciência do magistrado. Transferido ou aposentado, desapareceu da comarca dias depois, sem nada dizer, sem se despedir de ninguém. A última vez que fora visto, vagava pela colina de onde Zeca da Curva partira para sempre. Notaram que sobraçava o calhamaço de um processo. E que falava sozinho. Qual fosse esse processo ninguém sabia. Sabia-se apenas que o vento soprava no calhamaço com força desconhecida e, uma a uma, arracavam-lhe todas as folhas… O texto em destaque foi transformado em documentário, Aníbal Machao – O iniciado do vento, dirigido por Eiane Terra e Karla Holanda, em 1994. Veja mais aqui e aqui.

AMOR, BAILADO & SALMO PARA O BEM-AMADO – No livro Poesia reunida e outros textos (ACL, 2004), da poeta, jornalista e professora Maura de Senna Pereira (1904-1991), destaco inicialmente o poema Amor: Em verdade te digo que não foi naquela hora / que te pertenci: / quando me tomaste nos teus braços poderosos / e me tiveste sob teus beijos e tua respiração. / Em verdade te digo que não foi naquela hora / mas quando, diante do teu, surgiu meu espirito livre e novo / de rebento inquieto deste século / e descobrimos todas as comunhões das nossas almas. / Quando conheceste as minhas derrotas / e disseste que eram triunfos. / Quando soubeste que nem sempre / os teus pensamentos são os meus pensamentos / nem os teus caminhos são os meus caminhos. / Mas o amor brilhou como nunca em tua face / e me surpreendeste com a cascata de palavras / de que eu tinha sede / desde a minha primeira hora consciente. / Foi quando te pertenci. O poema Bailado: Eras estrela, eras ave, eras / grande flor aberta / sobre o peito do homem? / Em verdade parecias / em teu bailado, Raissa, / um pássaro / pousando sobre aquele tronco / pousando e, no entanto, pronto / para voar. / Em verdade eras um símbolo / em teu bailado, Raissa, / pois no mesmo dia / surgia uma era nova / e da tua terra voava / uma nova lua / para no céu bailar. Por fim, Salmo para o Bem-Amado: Imprecações não ergo e sim ditirambos / e sim aleluias / e sim hosanas / às pedras e às dores do caminho. / Onde está a harpa do rei David / onde estão as cítaras hebreias / onde está Sulamita / e onde as virgens loucas? / A todas essas cordas e bocas eu conclamo / a todas ao meu lado quero / para ajudarem a benzer a tormenta / que me arrebatou a primavera / as geenas que padeci, / as pedras e as dores, as lutas e as revoltas, / a bendizê-las / porque foram elas que me aproximaram de ti. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.


TEATRO GREGO – No livro História da Literatura Ocidental (Alhambra, 1978), do ensaísta, critico literário e jornalista austríaco naturalizado brasileiro Otto Maria Carpeaux (1900-1978), recolho os registros sobre o teatro grego: [...] Ésquilo, Sófocles e Eurípedes são, para nós, figuras familiares. O teatro moderno criou-se com esses modelos antigos. Os enredos fazem parte da cultura geral de todos nós. Orestes e Prometeu, Édipo e Antígone, Ifigênia e Medeia são personagens do nosso próprio teatro; e quando no século XIX se fizeram as primeiras tentativas de representar tragédias gregas no palco moderno, o sucesso foi completo. [...] O teatro grego é de origem religiosa; nunca houve dúvidas a esse respeito. As tragédias – e, em certo sentido, também as comédias – foram representadas assim como se realizam festas litúrgicas. Mas quanto à liturgia que teria sido a base histórica do teatro grego, ainda não se chegou a teses definitivamente estabelecidas. As pesquisas da escola antropológica de Cambridge parecem ter confirmado, embora precisando-o, o que sempre se soube: a tragédia grega nasceu de atos litúrgicos do culto do Dioniso. Outros estudiosos ingleses procuram, porém, a fonte da inspiração trágica em ritos fúnebres, realizados em torno dos túmulos de heróis. A discussão continua. É da maior importância para a história da civilização e da religião gregas. Mas é de importância muito menor para a história literária. Podemos continuar adotando a intuição genial de Nietzsche: a tragédia grega é a transformação apolínea de ritos dionisíacos. Por isso, o único conteúdo possível da tragédia grega era o mito, fornecido pela tradição; enredos inventados pela imaginação do dramaturgo, que enchem os nossos repertórios, estavam excluídos. Tratava-se de interpretações e reinterpretações dramáticas de enredos dados. Mas não é esta a única particularidade do teatro grego, em comparação com o nosso: a diferença estilística não é menos importante. O teatro grego é mais retórico e mais lírico do que o moderno. Os discursos externos, que os gregos não se cansavam de ouvir, seriam insuportáveis para o espectador moderno, que prefere, a ouvir discursos, ver e viver a ação. O grego, ao que parece, frequentava o teatro para se deixar convencer da justeza de uma causa, como se estivesse assistindo á audiência de um tribunal ou à sessão da Assembleia. E os requintes da retórica, superiores em muito aos pobres recursos da eloquência moderna, não bastaram para esse fim: acrescentaram-se, por isso, aos argumentos do raciocínio as emoções da poesia lírica, acompanhada, como sempre, de música, de modo que a representação de uma tragédia grega se assemelhou, por assim dizer, às nossas grandes óperas. Mas a ópera moderna é gênero privativo das altas classes da sociedade, enquanto a tragédia grega era instituição do Estado democrático, e a participação nela era de certo modo um direito e um dever constitucionais. Assim, a tragédia grega era uma discussão parlamentar na qual se debatia, lançando-se mão de todos os recursos para influenciar o público, um mito da religião do Estado. Considerando-se isto, as concorrências dos poetas, que apresentaram peças, perdem o caráter de competição esportiva: a vitória não cabia ao maior poeta ou à melhor poesia dramática, mas à peça que impressionava mais profundamente; quer dizer, à peça na qual o mito estava reinterpretado de tal maneira que o público se convencia dessa interpretação e – podemos acrescentar – por isso o Estado a aceitava. Tratava=-se de um acontecimento politico-religioso, que ocorria uma só vez. O teatro grego não conheceu representações em serie. Com a representação solene, a causa estava julgada, a lei votada. O verdadeiro fim do teatro grego – assim reza a tese sociológica – era a sanção duma modificação da ordem social por meio de uma reinterpretação do mito. Esta interpretação do teatro grego não pode ser, evidentemente, de aplicação geral. Não se aplica, pelo menos em parte, ao teatro de Eurípedes; só neste sentido esse grande poeta representa a decadência do teatro grego. Mas já quanto a Sófocles há dúvidas das mais sérias: o sentido do seu teatro não é, evidentemente, social, mas religioso: duma religião antropocêntrica. Talvez seja mesmo impossível dar uma interpretação geral do teatro grego, porque não o conhecemos suficientemente. Só conhecemos o teatro ateniense, e deste apenas poucas peças, de três dramaturgos. Mas entre eles está o maior de todos, aquele que criou o verdadeiro teatro grego e já representa o seu apogeu. O sentido profundo do teatro grego revela-se em Ésquilo. [...] Veja mais aqui, aqui e aqui

STORYTELLING – A comédia-drama Storytelling (Historias proibidas, 2001), dirigido pelo cineasta Todd Solondz, com música de Nathan Larson, conta duas histórias que não estão relacionados e têm diferentes atores, intitulado "Ficção" e "Não-Ficção". A faculdade e o ensino médio serviram como pano de fundo para estas duas histórias sobre disfunção e turbulência pessoal. A parte ficção é sobre um grupo de estudantes universitários em uma classe de escrita criativa ministrado por um professor que tem negócios com seus alunos. A parte não-ficção é sobre a filmagem de uma família suburbana disfuncional de New Jersey com o seu filho adolescente que  passa pelo processo de aplicação da faculdade. O destaque do filme vai para a atriz de teatro, cinema e televisão estadunidense Selma Blair. Veja mais aqui.

IMAGEM DO DIA:
 Todo dia é dia de movimento contra a corrupção.

DEDICATÓRIA
Todo dia é dia de Viver, Saudar e Respeitar a Diferença!