terça-feira, junho 30, 2015

TCHÉKOV, PÍNDARO, ANAXÍMENES, HAYWARD, CLARKE, VERNET, SAINT-PIERRE, LIEPKE & A ARTE DE FURTAR.


VAMOS APRUMAR A CONVERSA? PRECISO DE UM CULPADO! - Apesar de ser e estar cônscio de que sou eu mesmo responsável por tudo que me ocorre na vida, preciso de um culpado! Sempre tive comigo e por toda minha vida que sou o único responsável por meus infortúnios, escolhas, naufrágios, derrotas, escorregadas, topadas e reladas de venta. Sempre soube que são meus atos, palavras, ações, gestos, atitudes e comportamentos que me fazem ganhar ou perder, ser feliz ou não, alcançar êxito nas coisas ou ser defenestrado das oportunidades, sair comemorando pra galera ou me esconder nos porões da vergonha nas horas de apertura. Sempre soube disso e assim sei que tudo que tenho e sou é responsabilidade exclusivamente minha e que sou eu mesmo o único culpado por ser ou não merecedor do que tenho por resultado, pela lisura e liseu, pela abastança ou miserê, pelo triunfo ou arrastado, pelo brilho ou apagão do que sou e tenho. Mas como todo mundo coloca a culpa nos outros, vou na onda. E já que coloquei a culpa na Dilma por tudo que aconteceu e acontece hoje na humanidade, quero um culpado pra minha situação! Preciso de um culpado para desafogar o peso que carrego! Apesar de saber de Drummond: “Os ombros suportam o mundo e ele não pesa mais que a mão de uma criança”, eu preciso de um culpado pra descansar o peso dessa mão de criança gigante que eu carrego sobre meus ombros (ô mãozinha pesada essa, viu?). Preciso de um culpado para abrir meu coração, afinal “A boca fala do que está cheio o coração” e o meu tá entupido de coisas, fatos, momentos e emoções. Preciso limpar minha chaminé, cortar minhas cebolas. Preciso de um culpado (ou culpada, oxalá!) para que me diga que a culpa é dele ou dela e que eu estou nessa por simples e exclusiva sacanagem dele (ou dela). Preciso transferir tudo que me consome por dentro pra esse culpado. E aviso logo: preciso desse culpado (ou culpada) que seja de grátis e na amizade pra pagar minhas dívidas e resolver minha insolvência; para assumir meu karma e me deixar na boa de férias por uns tempos; pra atender meus clientes chatos e inadimplentes; resolver meus pepinos com meus credores quizilentos e malquerentes, pra trazer meus amigos e amigas sumidas, pra me adiantar a restituição do Imposto de Renda, pra me arrumar crédito porque estou sujo na Serasa e no SPC; pra me deixar um automóvel, uma casa na praia e uma dinheirama preu passar uns quinze dias desligados das braburas e só no bem bom; pra ir pras filas quando eu precisar de qualquer órgão público; pra me trazer só créditos dos meus feitos; pra me mostrar que não existe hora, nem distância, muito menos duração na vida pra só ficar na sombra e água fresca; e que esteja sempre alerta e vigilante para qualquer décimo de segundo que eu precisar. Pronto. Por enquanto só preciso desse culpado pra isso – é o que me lembro, por enquanto. Então, alguém se habilita? Vamos aprumar a conversa & tataritaritatá! Veja mais aqui, aqui e aqui.

Imagem: Study of Olympe Pelissier as Judith (1830), do pintor francês Horace Vernet (1789-1863)

Curtindo Night School: An Evening With Stanley Clarke & Friends (2007), do compositor estadunidense de jazz, funk, rock, pop e R&B, Stanley Clarke, com o objetivo de levantar fundos para a Musicians Institute de Hollywood, que fornece bolsas de estudo para jovens que desejam aprender Música.

PERI PHYSEOS – O filósofo grego Anaxímenes de Mileto (588-524aC), foi discípulo e continuador da obra de Anaximandro. Escreveu, como seu mestre, também o livro Peri Physeos (Sobre a natureza), praticando o materialismo monista dedicando-se especialmente à meteorologia. Foi o primeiro a afirmar que a Lua recebe luz do Sol e, também, a analisar geometricamente aspectos das sombras para medir as partes e a divisão do dia, desenhando o relógio de sol denominado Sciothericon, em vista disso passou a ser considerado a figura principal da escola de Mileto. Das suas ideias tem-se apenas fragmentos encontrados em Plutarco, Simplício e Hegel, este último afirmando que em lugar da matéria indeterminada de Anaximandro, põe ele novamente um elemento determinado da natureza, destacando ser necessário para a matéria um ser sensível e o ar possui, ao mesmo tempo, a vantagem de ser o mais liberto de forma. Ele é menos corpo que a água; não se vê, apenas se experimenta o seu movimento. Dele tudo emana e nele tudo se dissolve. Assim, para ele, o princípio é o ar e o infinito e que do ar tudo se produz e nele se dissolve: como nossa alma que é ar, nos mantém unidos, assim um espírito e o ar mantém unido também o mundo inteiro; espírito e ar significam a mesma coisa. Com isso o filósofo demonstra muito bem a natureza de seu ser pelo exemplo da alma, caracterizando a passagem da filosofia da natureza para a filosofia da consciência ou a renuncia ao modo objetivo do ser originário. Como a alma, o ar é o meio universal: uma multidão de representações sem que esta unidade, continuidade, desapareçam. Ele é tanto ativo como passivo, saindo da unidade as representações, dispersando-as e sobressumindo-as, presente a si mesmo em sua infinitude. Veja mais aqui e aqui.

A ARTE DE FURTAR – As edições que tive acesso – e que foram muitas, tanto do Brasil, como de Portugal - do livro Arte de Furtar: espelho de enganos, theatro de verdades, mostrador de horas minguadas, gazua geral dos reynos de Portugal: offerecida a el Rey nosso Senhor D. Joaõ IV, para que a emende (1625 – Lisboa, 1991), alguma davam conta da autoria de Padre Antônio Vieira (1601-1667), outras de autoria anônima e, por fim, a que convencionou a autoria como sendo do jesuíta Manuel da Costa. Trata-se de um monumento da prosa barroca e uma obra emblemática dos costumes dos séc. XVI a XVIII e o período da Restauração, inscrita como ironia das artes de proposito didático, desmascarando as múltiplas espécies de ladrões, denunciando que a roubalheira e a corrupção são gerais, desde o clero à burguesia, da Inquisição, militares até a nobreza desvelando as unhas das traças de ladrões. Compreende denuncias de ladroagem que vão desde gastos inúteis, tributação excessiva e guerras injustas, roubos, os que furtam com unhas bentas, política e a sua genealogia diabólica, a cobiça universal, a ganância desenfreada e insaciável, benesses e títulos, opressão, entre outros crimes. Da obra, destaco os trechos seguintes: [...] De três maneiras pode um rei ser ladrão. Primeira furtando a si mesmo. Segunda a seus vassalos. Terceira aos estranhos [...] Clerigos, e mais de cincoenta mil embaraços de consciencia em leigos ; e todos movem demandas de lana caprina ; porque o Frade quer comer na mesa travessa ; a Freira quer janela [...] tratou de o assegurar logo repartindo igualmente com o seu moço que o guiava, e para isso concertou com elle que o comessem bago e bago alternadamente; e depois de quatro idas e [...] que pretendia das rendas de sua senhora, que ensaccou em ouro, para voar mais leve ; e com dez ou doze mil cruzados, que dois annos de serviço lhe deparárão, se passou para outro hemispherio, sem dizer a ninguem: Ficae-vos embora. «Digão agora os professores das sciencias e artes mais liberaes, se formárão nunca syllogismos mais correntes. [...] Ia o criado por essa ribeira com a moeda de oiro de três mil e quinhentos, comprava aqui a perdiz, acolá o cabrito eo leitão no dia de carne; e no dia de peixe a pescada, o sável, o linguado, ea lagosta; comprava até a couve, o nabo, a alface, o queijo, o figo ea passa, e todo o [...] Todos falam na política, muitos compõem livros dela, e no cabo nenhum a viu, nem sabe de que cor é. E atrevo-me a afirmar isto assim, porque, com eu ter poucos conhecimento dela, sei que é uma má peça, e que a estimam e aplaudem, como se fora boa; o que não fariam bons entendimentos, se a conheceram de pais e avós, tais, que quem lhos souber, mal poderá ter por bom o fruto que nasceu de tão más plantas. E para que não nos detenhamos em coisa trilhada, é de saber que no tempo em que Herodes matou os inocentes, deu um catarro tão grande no Diabo, que o fez vomitar peçonha; e desta se gerou um monstro, assim como nascem ratos ex materia putridi, ao qual chamaram os críticos Razão de Estado. E esta senhora saiu tão presumida, que tratou de casar, e seu pai a desposou com um mancebo robusto e de más manhas, que havia por nome Amor Próprio, filho bastardo da primeira desobediência. De ambos nasceu uma filha a que chamaram Dona Política. Dotaram-na de sagacidade hereditária e modéstia postiça. Criou-se nas cortes de grandes príncipes, embrulhou-os a todos. Teve por aios o Maquiavelo, Pelágio, Calvino, Lutero e outros doutores desta qualidade, com cuja doutrina se fez tão viciosa, que dela nasceram todas as seitas e heresias que hoje abrasam o mundo. E eis aqui quem é a senhora Dona Política [...] Veja mais aqui.

AS ODES PÍTICAS – O poeta grego Píndaro (533-443aC), é autor de Epinícios – ou odes triunfais, que são divididos em quatro livros: olímpicas, píticas, nemeias e ístmicas. Dele destaco a primeira ode pítica, na tradução de Haroldo de Campos: Lira de ouro, bem comum / de Apolo e das Musas de trança violeta: / os passos de dança, princípio de júbilo, / te escutam, os aedos / obedecem teu sinal / quando pulsas vibrada os primeiros compassos / dos prelúdios condutores de coros. / Consegues apagar o pontiagudo raio / de fogo semprefluente. Sobre o cetro de Zeus / adormece a águia, / que recolhe de um flanco e de outro suas asas rápidas, / rainha dos pássaros. / Toldas sua cabeça em gancho de uma névoa escura, / doce claustro das pálpebras; possuídas por teus sons / ela crispa no sono o dorso flexível. / E mesmo o violento Ares / rejeitando a rudeza das armas / arrefece o coração que dorme. Sábios, / teus dardos aplacam o íntimo da alma dos deuses / por arte do filho de Latona / e das Musas vestidas de dobras sinuosas. Porém todos os que Zeus desamou / estremecem ouvindo o clamor / sonoro das Piérides / na terra ou no mar indomável. / Assim aos deuses adverso / Tífon o de cem-testas / jaz, no terrível Tártaro. / Nutriu-o outrora a cilícia / gruta polinome / e agora as escarpas que o mar rebatem / obre Cumas / e a Sicília / esmagam-lhe o peito de saliente felpa. / O Etna, todo neve, nutriz dos gelos cortantes, / pilar do céu, / o detém. / Fontes de um fogo inacessível / puríssimas rebentam-lhe / da mais interna entranha. / E rios de dia vazam / abrasadas torrentes de fumaça. / E púrpura na treva / uma chama rolando / repulsa ao mar profundo / um tumulto de pedras. / O monstro ali está. Ele é quem jorra / os fachos de Hefesto, aterradores. / Prodígio de se ver. Prodígio ainda / senão de ver, de ouvir de quem já viu. / Assim no Etna entre o píncaro / (folhas negras) e o plaino / preso / ele jaz, / numa cama de pontas / descarnando as costas contrapostas. / Dá-nos, Zeus, a graça de agradarmos / a ti, dominador dessa montanha / fronte e frente de uma terra fértil: / a cidade vizinha um fundador ilustre / ilustrou-a em seu nome / e o arauto o proclamou na arena pítica / celebrando Híeron na corrida de carros / belo de vitória. / Ao navegante principiando a viagem / primeiro prêmio é um vento favorável / que ao cabo prenuncia um propício retorno. / Pensar no que passou promete a esta cidade / por igual um porvir glorioso de corcéis / e coroas de festa / e um nome renomeado em canoros triunfos. / Dono de Lícia e Delos, Febo, / amador da castália fonte do Parnaso, / que este augúrio te agrade e faças desta terra / um solo fértil de heróis. / Da máquina dos deuses / procedem as virtudes dos mortais: / ciência, vigor dos pulsos, fala fácil, tudo / eles engendram. / Meditando o louvor deste herói, / espero não lançar fora da liça / o dardo de brônzeo topo suspenso em minha mão, / mas no extenso arremesso ultrapassar os meus contrários. / Que o restante do tempo lhe promova / um próspero porvir, o pleno dom dos bens / e o olvido das penas. / Ele há de rever-se nas batalhas / - coração de coragem - resistindo, / e pela mão dos deuses vencedor. / Heleno algum colheu igual seara, / orgulhosa coroa de conquistas. / Agora segue o exemplo a Filoctetes / quando se lança à luta. No nó do necessário, / mesmo o soberbo suplica o seu favor. / Quase-deuses heróis (dizem) a Lemnos / vieram e levaram o filho de Póias, / o arqueiro, que uma chaga afligia. / E ele destruiu a cidade de Príamo, / pôs um fim aos trabalhos dos Dânaos: / o destino movia-lhe os membros malseguros. / Assim a divindade / dirija reto Híeron / pelos dias que avançam passo lento, / sempre a tempo lhe dando o que mais queira. / Atende, Musa, e junto a Dinomedes / vem celebrar a esplêndida quadriga / no prêmio de vitória. / Que não se alheia o filho ao júbilo paterno. / Vem, inventa comigo / um canto caro ao soberano de Etna. / Para ele Híeron fundou esta cidade / seguindo à risca os preceitos de Hilos, / com liberdade, divino edifício. / Dorianos, / os descendentes de Pânfilo, / e também os da estirpe de Hércules, / que habitam junto às penhas do Taígeto, / querem preservar perenes os princípios de Egímios. / Levantando-se do Pindo, / afortunados tomaram Amiclas, / agora - profundos de glória - / vizinhos dos Tindáridas de cavalos brancos. / E floresceu a fama da ponta de suas lanças! / Zeus, / perfazedor! / Junto às águas do Amenas, / que a palavra dos homens para sempre assegure / aos cidadãos e aos reis um tão nobre destino. / Com teu respaldo o príncipe / seguido pelo filho / na honra dirija o povo para a concorde paz. / Filho de Cronos, / eu te peço um aceno de cabeça: / aprova que o Fenício se aplaque em sua morada, / contém o alarido de guerra do Tírseno, / Lamentando navios por seu desplante, / eles revêem o infortúnio de Cumas. / Que revés! / Do alto dos navios de proa rápida, / seus jovens eram jogados ao mar, / domados pelo senhor de Siracusa / que redimia Hélade da servidão mais dura. / Meu salário será por Salamina / a glória dos Atenienses; / em Esparta cantarei a batalha de Citéron, / derrota para os Medas de arcos recurvos; / mas à margem do Hímera de águas copiosas / cumpro meu hino aos filhos de Dinomedes, / prêmio por seu valor / quando bateram o inimigo. / Se falas o justo no momento justo / e tens as cordas do muito retensas na curva do breve, / a censura dos homens pouco te persegue. / O tédio saciado embota a ávida espera. / No ouvido de cada um, / no coração calado, / pesa a demasia da ventura alheia. / Preferível porém o ciúme à compaixão: / por isso não te detenhas no curso do que é belo. / Preciso no leme, governa o povo, / forjando na bigorna da verdade uma linguagem de bronze. / Uma frívola faísca de nada / avulta, vinda de ti. / Árbitro de muitos, muitos, / - no bem ou no mal -  / atestam fiéis os teus atos. / Guarda em beleza a flor do teu caráter. / Se amas sempre ouvir o que é doce de ouvir / não te canses de ser generoso: / como o bom piloto, livra a vela ao vento. / Amigo, não te iluda a isca do lucro fácil. / Aos oradores e poetas / somente o renome além-morte ressoando / revela os fatos dos que foram. / Cresus, alma aberta, não perece. / Mas Fálaris, coração cruel, / torrava suas vítimas no búfalo de cobre; / por toda a parte o ódio cerca sua memória. / Nenhuma lira sob os telhados / nenhuma o recorda, / para o suave acorde das vozes de crianças. / Primeiro bem: boa fortuna. / Segundo: bom nome. / O homem que a ambos recolhe, / colhe a suprema guirlanda. 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PLATÓNOV – A peça teatral em quatro atos Platónov (Órfão de Pai, 1881), do dramaturgo e escritor russo Anton Tchékov (1860-1904) é um drama com elementos realistas com aguda visão do mundo e da sociedade russa no final do século XIX, quando ocorre a primavera prestes às recepções típicas no verão, no qual uma jovem viúva de um general se reúne com os amigos de diferentes classes sociais para esperanças e renúncias, empréstimos e perfídias e que sonham com uma vida melhor. Da obra destaco a Cena II do Ato 1: [...] Entram Glagóliv 1 e Voinítsev. Cena II Os mesmos, Glagoliev 1 e Voinítsev. GLAGÓLIEV (Entrando.) Pois sim, meu caro Serguei Pávlovitch. Nesse aspecto, nós, os astros descendentes, somo melhores e mais felizes do que vocês, os ascendentes. E o homem não perdeu, como vê, e a mulher saiu a ganhar. Sentam-se. Sentemo-nos, que estou extenuado… Nós gostávamos das mulheres, como os melhores cavaleiros, acreditávamos nelas, adorávamo-las porque víamos nelas pessoas melhores… E a mulher é uma pessoa melhor, Serguei Pávlovitch! ANNA PETROVNA Para quê fazer batota? TRILÉTSKI Quem está a fazer batota? ANNA PETROVNA Quem é que pôs aqui esta peça? TRILÉTSKI Foi a senhora que a mudou. ANNA PETROVNA Ah, sim… Pardon…  TRILÉTSKI Bem pode dizer pardon. GLAGÓLIEV Tínhamos amigos… No nosso tempo a amizade não era tão ingénua e tão inútil. No nosso tempo havia círculos literários, e clubes… A propósito, no nosso tempo uma pessoa era capaz de se lançar ao fogo pelos amigos. VOINÍTSEV (Boceja.) Bons tempos! TRILÉTSKI Nestes tempos horríveis existem bombeiros precisamente para se lançarem ao fogo pelos amigos. ANNA PETROVNA Tolice, Nicolas! Pausa. GLAGÓLIEV No Inverno passado vi em Moscovo, na ópera, um jovem chorar sob a influência da boa música… Não é formidável? VOINÍTSEV Talvez seja até muito bom. GLAGÓLIEV Eu acho que sim. Mas porque é que as senhoras e os cavalheiros sentados ali perto sorriam ao olhar para ele? De que é que sorriam? E ele próprio, ao notar que aquela boa gente via as suas lágrimas, agitou-se na cadeira, corou, compôs um sorriso penoso no seu rosto e depois saiu do teatro… No nosso tempo as pessoas não se envergonhavam das lágrimas honestas e não se riam delas… TRILÉTSKI (para Anna Petrovna.) Esse meloso havia de morrer de melancolia! Tenho horror a isso! Fura-me os ouvidos. ANNA PETROVNA Psiu… GLAGÓLIEV Nós éramos mais felizes do que vocês. No nosso tempo as pessoas que compreendiam a música não abandonavam o teatro, escutavam a ópera até ao fim… Está a bocejar, Serguei Pávlovitch… Eu estou a maçá-lo… VOINÍTSEV Não… Mas acabe, Porfírii Semiónitch! São horas… GLAGÓLIEV Ora bem… E assim por diante… Para resumir agora tudo aquilo que eu disse, temos que no nosso tempo havia pessoas que amavam e pessoas que odiavam, e por conseguinte, que se indignavam e desprezavam… VOINÍTSEV Muito bem, e nos nossos dias não existem, é? GLAGÓLIEV Acho que não. Voinítsev levanta-se e caminha para a janela. A inexistência dessas pessoas é que faz a desgraça deste tempo… Pausa. VOINÍTSEV Isso é conversa gratuita, Porfíti Semiónitch! ANNA PETROVNA Não posso! Ele deita um fedor a esse perfume barato que até me sinto enjoada. (Tosse.) Chegue-se um pouco para trás. TRILÉTSKI (Afasta-se.) Está a perder, e o pobre patchuli é que tem a culpa. Que mulher espantosa! VOINÍTSEV É injusto, Porfírii Semiónotch, fazer acusações baseadas apenas em suposições e parcialidades em relação à passada juventude!... GLAGÓLIEV Pode ser que eu esteja enganado. VOINÍTSEV Pode ser… Neste caso não há lugar para o “pode ser”… A acusação não é brincadeira! GLAGÓLIEV (Ri-se.) Mas está a ficar zangado, meu caro… Hum… Isso prova que não é um cavalheiro, que não sabe respeitar devidamente as opiniões do adversário. VOINÍTSEV Isso prova que eu sou capaz de me indignar. GLAGÓLIEV Eu não condeno todos, naturalmente… Também há excepções, Serguei Pávlovitch! VOINÍTSEV Naturalmente… (Inclina-se.) Muito lhe agradeço a pequena concessão! Todo o encanto dos seus meios consiste nessas cedências. Mas se encontrasse pela frente um homem inexperiente, que não o conhecesse, e que acreditasse nos seus conhecimentos? Era capaz de o convencer de que nós, isto é eu, Nikolai Ivánitch, a maman e em geral todas as pessoas mais ou menos novas, somos incapazes de indignação e de desprezo… GLAGÓLIEV Mas… Ora… Eu não disse… ANNA PETROVNA Quero escutar Porfírii Semiónovitch. Vamos parar! Já chega. TRILÉTSKI Não, não… Jogue e escute! ANNA PETROVNA Basta. (Levanta-se.) Estou farta. Acabamos o jogo depois. TRILÉTSKI Quando eu estou a perder, ela fica sentada, como colada, e assim que começo a ganhar, apetece-lhe escutar Porfíti Semiónovitch! (Para Glagóliev.) E quem é que lhe pediu para falar? Só serve para incomodar! (Para Anna Petrovna.) Faça favor de se sentar e continuar, se não considero que perdeu! ANNA PETROVNA Pois considere! (Senta-se em frente de Glagóliev.) [...] Veja mais aqui e aqui.

WITH A SONG IN MY HEART - O drama With a Song in My Heart (Com uma canção no meu coração, 1952), do cineasta Walter Lang, roteiro de Lamar Trotti e música de Alfred Neuman, conta a biografia da atriz e cantora Jane Froman, no início da sua carreira como cantora humilde que vagava por emissoras de radio e que possuía um aleijão por conta de um acidente aéreo ocorrido em 1943. Ela, apesar das muletas, entretinha as tropas na II Guerra Mundial. O destaque do filme vai para a atriz estadunidense Susan Hayward (1917-1975), uma das minhas primeiras admirações na telinha. Veja mais aqui.

IMAGEM DO DIA
Imagem: Espetáculo de dança Un Peu de Tendresse Bordel de Merde!, do coreógrafo franco-canadense Dave Saint-Pierre.

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(Imagem: Woman Reading, do artista plástico estadunidense Malcolm Liepke)
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